Achou bem mais difícil se concentrar nas brocas aquela tarde e quando deixou o edifício ás cinco horas, continuava tão preocupado que deu um encontrão em alguém parado ali à porta.
— Desculpe — murmurou, quando o velhinho cambaleou e quase caiu. Levou alguns segundos até o Sr. Dursley perceber que o homem estava usando uma capa roxa. Não parecia nada aborrecido por ter sido quase jogado no chão. Ao contrário, seu rosto se abriu em um largo sorriso e ele disse numa voz esganiçada que fez os passantes olharem:
— Não precisa pedir desculpas, caro senhor, porque nada poderia me aborrecer hoje! Alegre-se, porque o Você-Sabe-Quem finalmente foi-se embora! Até os trouxas como o senhor deveriam estar comemorando um dia tão feliz!
E o velho abraçou o Sr. Dursley pela cintura e se afastou.
O Sr. Dursley ficou pregado no chão. Fora abraçado por um completo estranho. E também achava que fora chamado de trouxa, o que quer que isso quisesse dizer. Estava abalado. Correu para o carro e partiu para casa, esperando que estivesse imaginando coisas, o que nunca esperara que fizesse, porque não aprovava a imaginação.
Quando entrou no estacionamento do numero quatro, a primeira coisa que viu — e isso não melhorou o seu estado de espírito— foi o gato listrado que notara aquela manhã. Agora ele estava sentado no muro do jardim. Tinha certeza de que era o mesmo; as marcas em volta dos olhos eram as mesmas.
— Chispa! — disse o Sr. Dursley em voz alta.
O gato não se mexeu. Apenas lançou-lhe um olhar severo. Será que isto era um comportamento normal para um gato, pensou o Sr. Dursley. Continuava decidido a então não comentar nada com a esposa.
A Sra. Dursley tivera um dia normal e agradável. Contou-lhe durante o jantar os problemas da senhora do lado com a filha e ainda que Duda aprendera uma palavra nova (“Nunca”). O Sr. Dursley tentou agir normalmente. Depois que Duda foi se deitar, ele chegou à sala em tempo de ouvir o último noticiário noturno.
“E, por último, os observadores de pássaros em toda parte registraram que as corujas do país se comportaram de forma muito estranha hoje. Embora elas normalmente cacem à noite e raramente apareçam à luz do dia, centenas desses pássaros foram visto hoje voando em todas as direções desde o alvorecer. Os especialistas não sabem explicar por que as corujas de repente mudaram o seu padrão de sono.” O locutor se permitiu um sorriso. “Muito misterioso. E agora, com Jorge Mendes, o nosso boletim meteorológico. Vai haver mais tempestades de corujas hoje à noite, Jorge ?”
“Bom, Eduardo”, disse o meteorologista, “não sei lhe dizer, mas não foram só as corujas que se comportaram de modo estranho hoje. Ouvintes de todo o país têm telefonado para reclamar que em vez do aguaceiro que prometi para ontem, eles têm tido chuvas de estrelas! Talvez alguém ande festejando a noite da fogueiras uma semana mais cedo este ano! Mas posso prometer para hoje uma noite bem chuvosa.”
O Sr. Dursley ficou paralisado na poltrona. Estrelas cadentes em todo o país? Corujas voando durante o dia? Gente misteriosa usando capas por todo lado? E um cochicho, um cochicho a respeito dos Potter...
A Sra. Dursley entrou na sala trazendo duas xícaras de chá. Não adiantava. Teria que lhe dizer alguma coisa. Pigarreou nervoso.
— Hum, hum, Petúnia, querida, você não tem tido notícias de sua irmã, ultimamente ?
Conforme esperava, a Sra. Dursley pareceu chocada e aborrecida. Afinal, normalmente fingiam que ela não tinha irmã...
— Não — respondeu ela, seca. — Por quê ?
— Uma notícia engraçada — murmurou o Sr. Dursley. —Corujas... estrelas cadentes... e vi uma porção de gente de aparência estranha na cidade hoje...
— E daí ? — cortou a Sra. Dursley.
— Bem, pensei... talvez... tivesse alguma ligação com... sabe... o pessoal dela.
A Sra. Dursley bebericou o chá com os lábios contraídos. O Sr. Dursley ficou em dúvida se teria coragem de lhe contar que ouvira o nome “Potter”. Decidiu que não. Em vez disso, falou com a voz mais displicente que pôde:
— O filho deles... teria mais ou menos a idade do Duda agora, não ?
—Suponho que sim — respondeu a Sra. Dursley ainda seca.
— E a menina ? Eles tem também uma menina, não é ?
— Sim, eles tem. Não é filha deles, disso tenho certeza. Ela tem a mesma idade que o menino mas tenho certeza que não são gêmeos. Não sei onde arrumaram aquela menina. — respondeu a Sra. Dursley, já estranhando o interesse repentino em sua irmã e seus filhos.
— Como é mesmo o nome dos dois ? Ernesto e Íris, não é ?
— Harry e Lílian. Harry é um nome feio e vulgar, se quer saber minha opinião. Quanto a Lílian, é uma homenagem bem desnecessária a própria mãe.
— Ah, é — disse o Sr. Dursley, sentindo um aperto horrível no coração. — É, concordo com você.
Não disse mais nenhuma palavra sobre o assunto a caminho do quarto onde foram se deitar. Enquanto a Sra. Dursley estava no banheiro, o Sr. Dursley foi devagarinho até a janela e espiou o jardim da casa. O gato continuava lá. O bservava o começo da rua dos Alfeneiros como se esperasse alguma coisa.
Estaria imaginando coisas ? Será que tudo isso teria ligação com os Potter? Se tinha... se transpirasse que eram aparentados com um casal de… bem, ele achava que não aguentaria.
Os Dursley se deitaram. A Sra. Dursley adormeceu logo mas o Sr. Dursley continuou acordado, pensando no que acontecera. Seu último consolo antes de adormecer foi pensar que mesmo que os Potter estivessem envolvidos não havia razão para se aproximarem dele e da Sra. Dursley. Os Potter sabiam muito bem o que pensavam deles e de gente de sua laia... Não via como ele e Petúnia poderiam se envolver com nada que estivesse acontecendo. O Sr. Dursley bocejou e se virou. Isso não poderia afetá-los...
Como estava enganado.
Muitos usuários deixam de postar por falta de comentários, estimule o trabalho deles, deixando um comentário.
Para comentar e incentivar o autor, Cadastre-se ou Acesse sua Conta.