História Heart tied to the devil - No qual Anezka trai seu irmão

Alguns soldados desferiam inúmeros pontapés em um rapaz que estava caído sobre o chão frio, encolhido, com uma grande quantidade de sangue cobrindo seu corpo surrado. Um dos homens firmava seu pé sobre o dorsal da perna do mesmo, como se quisesse triturar os ossos do local. Outros socavam-lhe o rosto violentamente com tamanho ódio que mal pode ser descrito. Repentinamente os ataques cessaram, algo me dizia que isso era um sinal ruim. Recuei, recostando-me sobre a parede, senti meu coração palpitar e minha respiração se tornou cada vez mais ofegante. Tranquei minhas pálpebras, levando meu palmar destro até os lábios, tampando-os para que o grito preso em minhas entranhas não ecoasse pelo local em um momento de fraqueza. Ouvi passos cada vez mais próximos e quando me dei conta, uma enorme mão encontrava-se em meu braço, praticamente esmagando-o com brutalidade. As lágrimas quentes percorriam meu rosto pingando por todo o solo, misturando-se ao sangue. Fui solta, sendo lançada para frente com certa violência e então finalmente me permiti observar o local.

A primeira coisa em que foquei minha atenção foi em seu rosto pálido, iluminado pela chama fraca de uma vela quase acabada. Suas íris quase esbranquiçadas eram indecifráveis, eu não sabia se ele me mataria ou se me estupraria sem piedade antes de arrancar minha vida. Ramsay aproximou seus dedos gélidos de meu rosto, tocando-o delicadamente, enquanto arrastava-os sobre a minha bochecha. Mantive minhas íris nas do mesmo, sem perder nosso contato visual por um segundo.

— Sabe o motivo de Antonie estar ali, Milady?!

Ao ouvir o nome de meu irmão, senti um calafrio percorrer cada mínimo espaço de meu corpo amedrontado. Desviei minha atenção para o rapaz que agora tossia e gemia de dor.

— Nã..não, Milorde.

Falhei ao respondê-lo, ainda observando Antoine. Seus cabelos alaranjados estavam sujos de sangue, assim como seu rosto completamente coberto por feridas. Seus olhos estavam tampados por um pano e meu coração pesava ao presenciar tal cena.

— Ele me chamou de algo que não me agrada muito...chamou-me de bastardo. — Ramsay crispou seus lábios sem cor, desviando suas íris para meu irmão e voltando-as rapidamente para mim ­— E você, querida, chama-me de bastardo assim como ele?

— Não, Milorde. Vo..você é um homem de muita honra, não m...merece ser tratado de tal modo.

Os soldados Bolton permaneciam encarando a cena como se tudo não passasse de um acontecimento cotidiano, apáticos a situação. O bastardo Bolton deixou que um sorriso perturbador se formasse no canto de seu rosto. Caminhou até um de seus homens, dizendo-lhe algo que não pude identificar e então voltou até mim, pacatamente. Pousou uma lâmina sobre meu palmar, sua ponta era extensa e pontiaguda. 

— Acha que pode machuca-lo? Lembre-se das coisas que ele a fez passar no jantar. Lembre-se do que ele disse a mim, do que chamou-me. Você é uma boa garota, não? Não pode deixa-lo impune a isso. Encare isso como justiça, ele fez e agora deve pagar.

Suas palavras adentravam minha mente como uma doce canção, ludibriando minha razão e trazendo a tona toda a tormenta e insanidade de meu sangue Bolton. Meu corpo que até então estava tremulo, deixou que a coragem invadisse-o. Agachei-me, aproximando-me de Antoine, apanhando seus dedos. Agarrei-os, comprimindo cada um deles, fazendo com que a dor se alastrasse pelo local. Com vagar, posicionei a lâmina sobre a parte inferior da unha de seu indicador, cravando o objeto no local, fazendo o rapaz berrar de dor. Constatei no mesmo instante que seu grito havia ecoado pelo local, observei ao redor, atentamente, receosa que alguém pudesse chegar. Ramsay sorriu docemente e apenas chacoalhou a cabeça como se me soubesse de meus pensamentos e assegurasse-me de que ninguém surgiria ali. Um de seus soldados avizinhou-se de Antoine, empanturrando o interior de sua boca de fezes, fazendo-o se calar. Soergui meu crânio, encarando o bastardo, com um pequenino sorriso no canto de meus lábios rosados, logo voltando a concentrar-me em meu irmão. Prossegui com a lâmina em sua pele, gozando do líquido vermelho e quente que escorria por meus pequeninos dedos.

— Boa garota... — Ramsay murmurava inúmeras vezes como se meus atos fossem um orgulho.

Notei a dor que Antoine sentia e isso se tornou uma sensação agridoce. Aquilo perfurava minha alma e lavava-a ao mesmo tempo. No momento eu não sabia distinguir o certo do errado. Os dedos do pé do garoto se contraiam, assim como seu corpo. As lágrimas rolavam por suas bochechas feridas e ele açoitava sua cabeça sobre o solo inúmeras vezes. Sua unha desabou sobre o solo e então seu corpo cansado teve paz, aquietando-se. O sangue não cessava e uma pequena poça de sangue se formava sobre a sujeira. Os braços de Ramsay entralaçaram-se sobre o meu tórax suavemente, erguendo-me. Ele girou-me para que eu ficasse a sua frente e suas mãos escorregaram por meu corpo lentamente, enquanto suas íris estavam fixadas em meu rosto. Escorregou seu palmar até minhas madeixas, envolvendo-as com voracidade e empurrando-me até a parede de pedras, esmurrando meu crânio sobre a mesma algumas vezes.

A dor invadia meus sentidos, algo quente escorria sobre meu rosto, não sei se sangue ou lágrimas. O gemido de angustia não escapou e meu corpo trêmulo caiu sobre os braços robustos do bastardo de Forte do Pavor. Eu sentia como se minha alma houvesse esvaído, como se eu não me habitasse mais e apenas uma sombra houvesse permanecido. Minhas pálpebras pesavam e tudo começava a se tornar uma escuridão profunda, mas antes que isso ocorresse, pude observar seu rosto angelical por alguns instantes. Seus lábios pressionaram-se sobre a minha testa e mesmo acabada soube que eu sentia algo forte por Ramsay. Não era ódio ou nojo, era algo puro. Mas o casamento com um dos filhos de Arthor Karstark era hoje.