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História Hills - Chapter III - Run


Escrita por: TheJuliett

Notas do Autor


Oi gente :) Mil perdões pela demora ;-; Final de ano é sempre uma loucura sem fim para mim e também teve a minha mudança para Santa Catarina, o que ajudou a atrasar tudinho mesmo </3 Espero que consigam me perdoar! Ganhei muitos novos favoritos e isso me deixou muito feliz, então eu queria agradecer e dar as boas-vindas à todas as novas leitoras, sintam-se muito confortáveis aqui como se fosse seu próprio lar, hehe <3 Enfim, sem muito mais delongas esse capítulo é bastante essencial e muito em breve vamos começar a descobrir fatos muito picantes :q Fiquem atentas! E boa leitura *3*

Capítulo 4 - Chapter III - Run


Fanfic / Fanfiction Hills - Chapter III - Run

—Hills Capítulo três - Run 

"Não desças os degraus do sonho, para não despertar os monstros.

Não subas aos sótãos -

Onde os deuses por trás das suas máscaras, ocultam o próprio enigma.

Não desças, não subas, fica.

O mistério está é na tua vida!

E é um sonho louco este mundo!".

- Mario Quintana. 

 

Não sei afirmar com convicção quanto tempo se passou desde que deixamos meu pequeno vilarejo recoberto por sua paisagem melancólica. Pessoas acenaram para mim, centenas delas, reunidas em grandes conglomerados, curiosas, espichando-se, acotovelando-se entre si no intuito de captar cada segundo precioso de minha partida. Não consegui deixar de me imaginar ali entre elas, como uma mera espectadora comum, ao menos como eu costumava ser antes de tudo isso ocorrer. O sol era um borrão amarelado no céu claro e límpido, as nuvens pequenos flocos de algodão dispersados na imensidão azulada. Um belo dia, embora eu não conseguisse mais enxergar beleza alguma. Sally agitava os braços enfaticamente disputando seu espaço entre as amigas fuxiqueiras, com um sorriso orgulhoso em contraste com as lágrimas intrusas no rosto, ela despedia-se. Em minha mente eu me perguntava quando teria a oportunidade de vê-la outra vez, portanto gravei aquela imagem com pesar em meu cérebro abarrotado, assim quando ousasse me lembrar de minha irmã o faria com afeto. Não posso dizer o mesmo a respeito de mamãe que apenas deu-me um abraço indiferente parecendo mil vezes mais preocupada com o cheque polpudo que passaria a receber a cada mês, uma cortesia do barão, muito embora por insistência particular dela. Não sei bem o que pensar sobre minha mãe, houveram momentos bons em que eu realmente me orgulhei dela - a maioria deles permanecem enterrados na época de minha infância -, porém agora todas as vezes que ameaço a pensar sobre si só consigo enxergar a imagem de uma interesseira em potencial que fez de tudo para enriquecer as minhas custas. Papai. Oh, papai. Pobrezinho de meu pai. Um homem franzino, de traços minúsculos e fatigados, preso naquela maldita cadeira-rodas, ainda respirando apenas por bondade divina. Não faço ideia do quanto ele irá durar, gosto de pensar que agora em minha ausência ele há de se sentir mais aliviado, seguro de seu papel paterno mesmo iludindo-se ao ponto de me imaginar feliz e realizada na vida. Sinto que por ele posso me obrigar a fazer isso, ao menos sou capaz de fingir um pouco de felicidade. Espero que mamãe dê-lhe o dinheiro para a cirurgia, mas também não tenho certeza de que é a melhor opção, o procedimento exaustivo poderia bem matá-lo, agora me pergunto se ela não ficaria contente com a morte dele. Talvez esteja sendo hipócrita e pessimista, mas é difícil alterar minha mentalidade para algo mais positivo quando tudo o que vejo pela frente são trevas e escuridão. E eu tenho medo do escuro. O casamento será em Cumberland na companhia de alguns parentes distantes do barão e alguns de seus amigos mais íntimos, uma antítese de gênero, número e grau. Minha única companhia durante esta viagem infame de aproximadamente dois dias e oito horas é Lucille, a tão adorável Lucille que nada faz além de fitar o vazio que se estende pelas infinitas estradas de terra que cruzamos. Ela permanece na mesma posição desde que colocou seus pés dentro da carruagem a cerca de doze horas atrás. Não soa nada cansada, sua postura é impecável e com certeza se está sentindo algum tipo de dor por conta da falta de movimentação é incapaz de demonstrar com clareza. Por outro lado eu mal consigo me manter quieta, estar sentada a tanto tempo mexe com minha sanidade mental e com meu corpo de maneiras inimaginavelmente bizarras, por vez ou outra arrisco alternar posições, porém a dor nas articulações enferrujadas é constante não importa o que eu faça para evitá-la ou quais métodos empregue. Não vejo a hora de chegar a nosso destino, mas bem sei que ainda temos uma longa jornada pela frente. Pego-me pensando no futuro e também nas coisas que deixei para trás, lamento muito, ainda assim é inútil. Gostaria de ter a calma e serenidade de Lucille que embora esconda muitos segredos é sutil. A dor em minha face é extremamente visível, e meu coração partido em migalhas que jamais poderei unir novamente é provavelmente o que mais machuca. Porém como tudo nesta vida é necessário aprender a seguir em frente, e eu certamente o farei. Assim espero. 

[…]

Nossa carruagem para abruptamente. Os olhos da dama de ferro ao meu lado se movem após um enorme tempo de inanição. Ela afasta a barra do vestido e abre a porta descendo logo em seguida. O clima invernal tal como os infinitos flocos de neve invadem nossos aposentos e meu corpo responde à mudança climática com fortes espasmos. Quando Sally me contara a respeito de Cumberland com base em descobertas feitas em um antigo livro de história medieval ela mencionara algo semelhante à intenso frio, mas nada se compara ao que estou sentindo neste exato momento. Minha demora deve incomodar Lucille, pois depois de alguns minutos ela torna a colocar apenas a cabeça para dentro e me apressa dizendo que seu irmão está nos esperando do lado de dentro de sua moradia. Em minha defesa eu não fazia ideia de que havíamos chego ao nosso destino, não houve nenhum aviso referente ao assunto e a parada brusca fez-me pensar que algum acidente na estrada nos impedia de prosseguir. Aparentemente estava errada, pois logo estou sendo escoltada pela irmã misteriosa de meu “noivo” - embora ainda me doa me referir a ele desta maneira tão íntima - para dentro dos domínios de um enorme castelo. Não sei dizer bem se é de fato um castelo ou apenas uma mansão, nunca vi algo parecido com este tipo de construção antes em meus anos de existência nesta Terra, novamente em minha defesa sou apenas uma humilde moradora de um vilarejo no meio do nada, obviamente não tenho como saber ao certo de uma coisa dessas. Ainda assim tudo me fascina, prende minha atenção de uma maneira intrigante. Desde os grandes portões de ferro que nos recepcionam de forma intimidante até as infindáveis escadarias de mármore esculpido. Porém não é exatamente um lugar bonito, mais se assemelha a uma paisagem melancólica e pelo que pude reparar em poucos minutos sei que estamos longe o bastante de qualquer espécie de civilização habitada, no mínimo 1,5 km. Esta informação faz com que minhas mãos involuntariamente agarrem parte do tecido de meu vestido amarelo em uma tentativa frustrada de auto-proteção. A quem eu recorreria caso precisasse de alguma ajuda? Estou longe o suficiente para não ser ouvida caso grite por socorro. Este singelo pensamento faz com que calafrios percorram meu corpo de uma maneira bastante desagradável, e eles não são causados pelo frio desta vez. Não posso evitar as inúmeras situações perigosas que minha mente fértil formula, e meu subconsciente berra desesperado que este seria o lugar perfeito para se cometer um crime como assassinato e sair-se impune. Neste exato momento uma lembrança do jantar vem a mim como sombra conhecida, Lucille referindo-se aos relacionamentos fracassados do barão, seria por conta de seu temperamento? Se sim, que fim tiveram todas essas mulheres? Afasto o mau agouro para longe de mim e fito o céu nublado. Uma leve garoa cai do lado de fora manchando o solo enevoado. Então dou-me conta de que estou muito longe de casa e ao mesmo tempo me pergunto se algum dia poderei me referir a este lugar tão triste como sendo um lar. Novamente Lucille rompe meus devaneios. 

“Bem-vinda à Cumberland”. Anuncia agora fitando o mesmo ponto nebuloso do que eu. Estremeço. 

[…]

“Este será seu quarto por esta noite. A cerimônia ocorrerá amanhã pela manhã. Pretendíamos chegar com antecendência de modo que o evento seria promovido ainda durante o dia de hoje, porém as estradas estavam molhadas e por conta disso demoramos muito mais tempo do que o necessário. Enfim, não se preocupe, ficará bem aqui. Espero que tenha uma boa noite, se precisar de algo não hesite em me chamar. Boa noite, senhorita Ashcott”. Lucille mostra-se extremamente prestativa tanto que faz-me duvidar de suas intenções, mas procuro não julgá-la ou condená-la por seus atos do passado, portanto apenas agradeço em seguida dando entrada no quarto de paredes azuladas. Uma grande cama de casal se destaca no meio e a única luz do ambiente provém de um lampião quase apagado. 

Pacientemente retiro meus sapatos apertados largando-os em um canto, meus pés sentem imediatamente o alívio e por uma pequena fração de segundo consigo esboçar algo similar a um sorriso. Não dura muito, não chega nem perto do quanto gostaria que durasse. Talvez ajudasse se eu tivesse a desumana capacidade de esquecer tudo por conveniência, mas não a possuo, nem de longe. Ao olhar pela janela tudo o que se pode avistar é o vazio noite afora. Estou farta do vazio, tudo o que vejo aqui é desprovido de alma, essência. Até mesmo eu que um dia já fui uma grande sonhadora. Permito que um sôfrego suspiro escape por entre meus lábios, pesaroso e lento como em um bocejo frustado. Gostaria de dormir, mas duvido que seja capaz. Não hoje ao menos. Há muito se passando dentro de minha cabeça, não acho que consiga me desligar sem esforço, e o esforço com certeza me fará permanecer acordada a noite inteira. Sou muito diferente das pessoas ao meu redor, enquanto elas apenas deitam-se para descansar e parecem desconectar-se do mundo real simplesmente não consigo fazer o mesmo. Meus pensamentos permanecem ali, vagando como almas penadas, rápidos espirais elétricos como os de um impulso nervoso, um estímulo que nunca vai embora, deixando-me acesa, ligada, sempre conectada como uma labareda, uma chama que nunca morre. Kilorn costuma dizer que penso mais as nove da manhã do que 90% da população mundial, e talvez seja de fato verdade. Assim como é fato que dificilmente o verei outra vez. Uma batida na porta interrompe minha linha de raciocínio. O barão desloca-se para dentro de meus aposentos, galante, cordial como habitualmente. Suas íris verde-azuladas focam-se em minha silhueta retorcida próxima a janela, nos encaramos por longos minutos de silêncio absoluto. 

“Senhorita Ashcott. Jane. Pensei em vê-la antes de me deitar, certificar-me de que Lucille a encaminhou devidamente. Vejo que parece bem acomodada, desculpe a intromissão assim tão de repente. Sinto-me no dever de avisá-la sobre alguns ruídos que certamente serão emitidos durante a madrugada, o sistema de encanamento não é muito bom, mas estamos providenciando melhoras muito em breve. A temperatura é bastante árdua, sei que o frio intenso é notavelmente incômodo para uma jovem senhorita, portanto se por obséquio sentir-se a ponto de congelar existem aquecedores que podem ser acionados, é só me informar que farei o melhor para conter o problema. Cobertores mais grossos estão localizados logo nas prateleiras superiores do armário, fique a vontade para pegá-los se necessitar”. O barão Hiddleston atenciosamente explicou-me sobre as adversidades, deixando-me plenamente ciente do que poderia vir a enfrentar. O frio seria o maior problema com toda a certeza, visto que não estou habituada com temperaturas tão baixas, porém certamente não me mataria. Ruídos provenientes de um sistema de encanamento defeituoso não são nada perto dos que costumava escutar durante a noite ainda em minha casa. Os roncos asmáticos e profundos de papai faziam-me acordar assustada e por vezes verificar se ele não estava passando mal. 

“Obrigada, agradeço a gentileza. Creio que não será de extremo incômodo para minha pessoa. Ainda assim sinto-me grata pelo favor que prestou ao me informar sobre as prováveis situações”. Sorrio polidamente, temendo deixar a mostra grande parte de meus dentes. É meu sorriso mais falso segundo Sally, quando tento compensar o desconforto sorrio largamente, tanto que soa extremamente artificial. 

“Oh, agora que me recordo com clareza, a senhorita não se alimentou durante as últimas horas, correto? Gostaria que eu a levasse até a cozinha? As criadas podem preparar algo de seu agrado, também posso pedir para que a sirvam em seus aposentos se assim desejar”. O barão prontamente se dispôs a prestar-me mais um serviço, interiormente eu me perguntava se tudo aquilo era mera gentileza ou alguma forma de capturar minha atenção em prol de que pudéssemos interagir um pouco. Eu não ficaria surpresa caso ele houvesse escolhido a segunda opção, visto que mal nos conhecemos, portanto não temos assuntos em potencial. 

“Estou bem, não tenho fome. Obrigada”. Fui direto ao ponto sem estender-me, então pude notar a decepção em seus olhos, cheguei a rever as palavras para me certificar de que não havia sido em nenhum momento ácida ou desagradável. A mim soaram completamente normais, porém de alguma forma não pude evitar sentir-me um pouco culpada, afinal ele estava ali disposto a iniciar uma conversar amigável e tudo o que eu era capaz de fazer era negligenciá-lo como uma criancinha amuada. Eu não gostava de estar naquela situação, mas seria muito pior se eu não colaborasse isso era fato. 

“A senhorita não fala muito, uh?”. Ergueu uma sobrancelha, pensativo. Sua expressão vazia identifica-se com a minha, e por um momento chego a pensar que talvez nem ele saiba o que está fazendo, ou que sequer chegou a calcular os prós e contras de seus atos. Não sei o que devo responder, visto que a maioria de meus conhecidos ousariam descrever-me como uma ‘garota falante e ativa’, estou longe de me parecer com esta ilustração fajuta neste exato instante, tenho plena convicção disto. E não creio que a melhor maneira de se iniciar uma provável relação orbite ao redor de contar infindáveis mentiras. Ainda assim se lhe disser a verdade acredito piamente que de alguma forma acabarei proferindo ofensas bem como palavras que não lhe soarão nem um pouco atrativas. Como proceder, Jane? 

“Perdão. Desde que coloquei meus pés em seus aposentos tudo o que tenho é feito é refletir a respeito de minha situação a grosso modo, com demasiado egoísmo devo confessar. Sei bem que tal individualismo é prejudicial a minha pessoa, porém não pude evitar até o momento. Mas vejo que não sou a única a medir esforços e portanto gostaria que pudéssemos ter uma boa convivência. Meu desejo sincero é poder conhecê-lo plenamente, aprender a seu respeito se assim me permitir, e então lhe juro que gradativamente e com prazer farei o mesmo”. Conclui minha observação esboçando um pequeno sorriso que pareceu conceder ao barão um pouco mais de confiança. O homem antes apático agora iluminava-se como uma lareira em noites invernais, com a dose certa de otimismo e esperança. Pela primeira vez senti que talvez aquilo tudo não houvesse sido em vão, como se fizesse parte dos planos divinos. Talvez pudéssemos trabalhar juntos e superar nossas limitações de modo que resultasse em um bom matrimônio para ambos. Quem sabe tudo não serviu para fazer-me amadurecer ainda mais? Para privar-me de eventualidades piores que poderiam em breve me acometer. Eu não podia afirmar nada com clareza, porém começava aos poucos começava a recuperar o espírito de uma lutadora. Eu estaria disposta a lutar pela causa se ele pudesse fazer o mesmo. E a centelha luminosa como fogo em seus olhos permitia-me concluir que estava disposto a colaborar para nosso bem comum. 

“Nunca me equivoquei quanto a minha decisão, se permite afirmar estava certo em escolher você, Jane. Não posso dizer que a amo, seria hipocrisia, e não creio que gostaria de ouvir tais palavras sem nem um resquício de sentimento. Porém desejo aprender a fazê-lo um dia. E não quero me enxergue como seu carrasco, alguém que a privou de uma convivência familiar, que a levou para longe de tudo o que conhecia. Eu prometo revelar-lhe toda a verdade, as histórias intrínsecas por detrás de meus motivos logo após a cerimônia pela manhã. Sei que este lugar parece triste e solitário, mas vivi bons momentos aqui e gostaria que pudéssemos construir mais deles com o passar do tempo. Se me permite a escolha de palavras, Jane, seremos felizes. Eu lhe prometo, Jane”. O barão soava saudoso referindo-se às lembranças do passado, em seu semblante antes pesado agora havia determinação. De certa forma tudo aquilo fora por um motivo que em breve me seria revelado, de fato não aliviaria a pressão forte em meu peito, sequer faria com que cessassem minhas lágrimas. Mas ao menos havia algo que lhe chamara a atenção, algo além das aparências ao que tudo indicava. E isso me fazia demasiadamente alegre. 

“Espero ansiosamente por isto, senhor”. Saudei-lhe com uma singela reverência a qual ele correspondeu. Eis que ao ouvir o ranger da porta e ao notar-lhe entreaberta uma silhueta delgada destacou-se em meio a escuridão. Os mesmos olhos gélidos e paralisantes ali escoltando-nos, a mesma mulher sombria que por detrás de panos absorvia tudo e não deixava escapar absolutamente nada. Lucille, a dona de meus maiores temores.  

[…]

Os sinos badalavam às onze. O véu branco tocava de relance meus pés desnudos. O vestido de seda deslizava pelo piso de mármore, os suaves cachos em meus cabelos balançavam ao sabor do vento gélido. Meus olhos girando atordoados pelo vasto salão como espirais enlouquecidos e frenéticos. Em meu coração uma intensa palpitação sem fim, lágrimas prestes a desabar. Medo. Pânico. Pavor. Minhas mãos encharcadas de sangue, meus lábios secos e rachados. De repente o salão se enche de vozes, todas distintas, acusatórias. “Ela o matou! Ela o matou! Assassina!”. Clamam sem parar. Um coro desafinado e feio, bizarro, tenebroso. Estou ficando louca, não sei para onde fugir. As portas completamente cerradas, não há janelas. Há hematomas em meus braços, cortes em meus joelhos, sangue escorre por minhas bochechas em uma cor vívida. Escarlate. E de longe uma figura retorcida, um sorriso congelado em seus lábios podres, os olhos penetrantes a dançar, ela abre a boca e enche-se de fôlego para proferir: “Bem-vinda a Cumberland”. 

Desperto sobressaltada, há muito suor impregnado em meu corpo, respiro com dificuldade. Foi apenas um pesadelo, Jane. Mas por quê diabos pareceu tão real? Como se eu de fato estivesse vivenciando aquilo? Estou delirando. Meu cérebro está apenas reproduzindo o pavor que devo ter sentido ao notar a presença quase oculta de Lucille ontem à noite. Aquilo certamente me apavorou como nunca antes, era quase como se ela estivesse aguardando o momento oportuno para tentar algo desconhecido e completamente perigoso. Não me canso de repetir que não devo julgá-lo por atos condenáveis de seu passado, ainda assim ela continua plantando desconfiança em minha mente com seu proceder misterioso. A forma a qual ela nos fitou não fora normal, era quase como se me quisesse longe de seu irmão. Como se eu não devesse estar ali, como se eu fosse a grande e tenebrosa intrusa prestes a colocar a mão em algo de seu domínio. Mas era irracional, não tinha cabimento uma coisa dessas. Porém eu sentia em meu interior, como em um sexto sentido que algo estava muito errado relacionado àquela mulher. Devo ter tanto medo? Algo me diz que sim. 

[…]

Em uma tentativa mais do que frustrada de acalmar meus nervos decidi explorar a casa. A cerimônia estava marcada para as dez horas da manhã em ponto. O relógio de parede não marcava sequer oito. Depois de meu pesadelo é bastante óbvio dizer que não consegui voltar a dormir, todas as vezes em que ameaçava fechar os olhos a imagem perturbadora de Lucille e seu olhar macabro retornavam à minha mente, deturpando-me a sanidade mental. Então por volta das sete e meia deixei meus aposentos ao finalmente notar que estava faminta principalmente por não ter ingerido nenhum tipo de alimentos nas últimas doze horas. Fazia muito mais frio do lado de fora do quarto, e por conta disso tive de me enrolar em um cobertor. Meus sapatos haviam desaparecido misteriosamente, o que me levava a pensar que alguém entrara em meus aposentos durante a madrugada, o pensamento por si só já era completamente aterrorizante, por conta disso e pelo bem de minha saúde psicológica resolvi apenas ignorar o ocorrido. Ainda assim meus pés descalços em contato com o piso de mármore invernal causavam-me calafrios. Após aproximadamente meia hora de caminhada percebi que não havia muito o que ver, a maioria dos quartos estavam trancados por algum motivo e os poucos acessíveis não tinham muita beleza ou recursos a oferecer. De fato aquele lugar se comprovara apático e um tanto monótono. Quando finalmente encontrei a cozinha pude respirar mais aliviada. Uma gentil criada serviu-me um prato com sonhos de caramelo com uma generosa quantidade de açúcar acompanhado de leite e biscoitos de chocolate. Nunca me senti tão grata. Foi quando notei um pequeno filete de luz proveniente de uma sala quase totalmente fechada, uma minúscula fresta era tudo o que se podia enxergar. Tomada por uma curiosidade extrema deixei a cozinha rumando diretamente para lá. As mãos ávidas por girar aquela maçaneta e revelar o que se escondia por detrás daquela porta. Estava tão perto que quase parecia fácil demais. Foi quando propagou-se um forte ruído e de repente a porta estava trancada. 

“Jamais entre neste quarto, senhorita Ashcott”. A mesma criada de antes agora bloqueava meu caminho. Franzi o cenho extremamente confusa, dividida entre medo e frustração. 

“O que tem de errado?”. Murmurei mesmo não tendo certeza de que queria ouvir a resposta para aquela pergunta. O que quer que fosse não poderia ser uma coisa boa, então era melhor que eu não soubesse. Ainda assim minha curiosidade falava mais alto e como sempre minha teimosia prevaleceu concedendo-me o cenho de uma valente mulher, muito embora estivesse me desintegrando por dentro. 

“Apenas não entre, senhorita. Não é necessário saber o motivo. Se preza sua vida e deseja conviver em harmonia nesta casa necessita obedecer à algumas regras, e uma delas prega que é estritamente proibido adentrar este cômodo. O patrão não gosta de garotas que quebram as regras, costuma ser demasiadamente maldoso e cruel com elas. A senhorita não gostaria de se machucar, uh?”. A pequena mulher franzina agora de frente para mim arregaça uma das mangas e exibe um grosso hematoma arroxeado. Em seguida põe-se a massagear o local com veemência como se o simples ato pudesse fazê-lo desaparecer. Lágrimas de horror brotam em meus olhos. Preciso sair daqui. É o único pensamento que tenho no momento. 

“Como conseguiu isso?”. Disparo. Novamente sei que não preciso conhecer a resposta, novamente minha índole me trai, sorrateira como uma víbora. Minhas pernas transformaram-se em gelatina, necessito fazer muita força em prol de sustentar meu corpo magrelo que congela neste frio invernal. O medo reverbera por minhas entranhas, sinto um forte nó sufocando minha garganta como se pudesse matar-me aos poucos de angústia. 

Sem nem ao menos pensar duas vezes não aguardo por sua resposta, estou correndo, correndo em direção ao vazio. A neve engolindo minhas pernas, sugando meus pés para baixo, impedindo-me de ganhar maior velocidade. Atinjo o portão principal e penso em uma maneira de escalá-lo, antes que o possa fazer avisto Lucille que se põe a minha frente tal qual fizera a criada anteriormente. Ela carrega duas sacolas com suprimentos munida de um sorriso que a mim soa extremamente artificial. Destrava o portão ainda receosa. Esta é minha deixa. Disparo com voracidade novamente, ignorando a forte pressão da neve e pensando em uma maneira de alcançar a estação de trem mais próxima. O frio é intenso, castiga meu corpo já fatigado, porém não desisto, recuso-me a parar. Estou em uma batalha interna contra minha capacidade física, tentando fazer aquilo que julgo correto. Não irei muito mais longe, sei disso, mas pretendo me afastar o máximo que conseguir. 

E de repente tudo escurece, e meus olhos não conseguem mais focalizar cena alguma. Estou caindo em um baque surdo e tudo o que enxergo logo acima são os mesmos olhos gélidos de sempre. 

Lucille. 


Notas Finais


Hello? O que acharam? Lucille entrou para a lista de suspeitos número 1? Barão um homem cruel? Ih, isso está me cheirando a peixe podre, não percam o próximo capítulo cheio de emoções. Para incentivar vou deixar aqui uma pequena diquinha: um corpo irá aparecer! Pronto, parei :s Já falei demais! Se você leu até aqui muito obrigada por dar uma chance ao meu trabalho :) Beijocas e até a próxima, fui *3*


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