Embora seu repentino desmaio, Karin não demorou muito para recobrar sua consciência, acordando poucos minutos depois de começar a receber oxigênio em uma das ambulâncias ainda disponíveis no local do incidente.
Assim que a garota desabou sobre si, Hitsugaya imediatamente cuidou de levantar-se e levar a antiga amiga para receber atendimento. Embora viva, a morena se encontrava bastante debilitada por conta da fumaça que inalara e do tempo que ficara sem respirar.
Deitando-a na maca, a equipe de socorristas cuidava de examiná-la e efetuar os primeiros-socorros, enquanto o grisalho, sentado em um dos lugares do banco da ambulância, segurava em suas mãos a arma que a pouco fora lhe apontada. E, trocando seu ponto de foco entre o objeto e a garota, tentava imaginar o porquê dela possuir um dispositivo como aquele consigo.
A chuva tratara de lavar quase toda poeira e fuligem de seus corpos. Karin estava mais pálida e com arranhões e pequenos cortes pelo corpo, contudo, essas eram as principais diferenças que restaram em comparação com suas lembranças. O cabelo negro estava na mesma altura de quando ainda era uma adolescente e o corpo, obviamente, havia crescido como algo natural para todo ser humano.
Já era ela uma mulher adulta.
Brincos pequenos e um fino e delicado cordão no pescoço era o que possuía como adornos.
O estilo discreto de sempre.
Também não havia aliança ou qualquer outro anel nos dedos, bem como marca destes.
Não estava casada.
Das roupas, a diferença se via apenas no uso do vestido e dos saltos. A morena não costumava gostar muito desse tipo de vestuário, alegando sempre dificultar sua locomoção.
A garota já era adulta, podia ter mudado sua opinião ou, no mínimo, aprendera a suportar ter que usar tal vestimenta quando necessário.
No entanto, era algo que agora lhe caía bem.
A casa de shows também não seria o tipo de lugar que a garota das suas memórias frequentasse. Um local fechado, com um alto número de pessoas concentradas em um mesmo espaço e com barulho excessivo.
Este não era um lugar que ela frequentaria mesmo depois de anos, mas fora de um desses - em chamas - que ele acabava de retirá-la.
Ainda assim, nada que pudesse pensar explicava sua dúvida mais vital: o porte de uma arma.
Suas memórias não coincidiam mais com a realidade.
Hitsugaya nada sabia sobre a morena.
Em meio à seus devaneios, a jovem começava a dar sinais de recobrar a consciência. E, novamente, parecia procurar por algo no coldre vazio na altura da coxa.
A ação da jovem o aborreceu um pouco.
- Não precisará da arma agora, Kurosaki. - Anunciou ele.
A morena moveu a cabeça levemente para o lado, encontrando os olhos claros a lhe encarar com intensidade.
- Toushirou… - Reconheceu de imediato e, logo em seguida, analisou as roupas do rapaz.
A farda de bombeiro.
- Parece que não foi um sonho nem delírio. Está mesmo aqui. - Comentou ela se levantando.
- Por favor, continue deitada. Ainda não terminamos. - Pediu a socorrista.
- Não precisa continuar. Já estou bem. - Respondeu ela levando a mão à nuca dolorida.
- Deixe-a cuidar de você. Estava morta até alguns instantes atrás. - Aconselhou o capitão.
- Mas agora estou viva e bem. Para quem estava morta, me parece ser suficiente. - Disse ela.
- O sarcasmo e a teimosia, ao menos, parecem intactos. - Declarou Hitsugaya.
- Como eu disse, estou ótima. - Respondeu ela, ironicamente vitoriosa. A socorrista, por fim, se retirou. - E então, o que faz aqui?
- Se está falando da ambulância, estava apenas garantindo que não apontaria uma arma para mais alguém da minha equipe. - Respondeu ele com seriedade.
Karin pareceu pensar um pouco enquanto olhava o objeto nas mãos do amigo.
- Apontei ela para você… - Lembrou. - Foi mal por isso, eu ainda estava meio apagada. Achei que ainda estivesse no banheiro e não sabia quem era. - Contou.
Muitas perguntas surgiam para si, mas decidira por começar pela que mais lhe intrigava.
- O que faz com uma dessas? - Questionou o grisalho referindo-se à arma.
Karin olhou um tanto curiosa para o rapaz, mas respondeu mesmo assim.
- Bem, é o que um policial usa. O que esperava? - Devolveu ela.
O capitão pareceu surpreso com a resposta. Visto a confusão do amigo, Karin levantou ligeiramente o vestido até a altura das coxas, mostrando o distintivo preso no coldre vazio ao lado de um outro pequeno compartimento de couro preso na mesma faixa que circundava sua perna.
- Pelo visto, meu irmão não te contou. - Analisou ela. - Que seja… Não é como se ele gostasse da ideia também. Pode me devolver? - Referiu-se ao armamento.
O grisalho entregou-o de volta, embora ainda não gostasse da ideia de vê-la armada.
- Não lembro de vestidos e saltos serem a farda dos oficiais de polícia da cidade vizinha. - Comentou ele.
Karin sorriu achando graça do comentário.
- Se fossem, teria que pedir transferência. - Respondeu. - Não estava aqui a trabalho. Estou de folga.
- E continua armada... - Apontou ele.
- Eu estou de folga, mas não posso dizer o mesmo dos criminosos da cidade. - Disse ela. - Carrego ela por precaução.
Um breve silêncio se formou, ao menos assim foi até Matsumoto aparecer na entrada traseira do veículo.
- Karin-chan! - Exclamou a ruiva a quase sufocar a morena em seu abraço. - Ai, que sufoco você nos fez passar! Quase morri do coração quando a Ruri-chan disse que você ainda estava lá dentro.
A garota, já conhecendo bem a forma um tanto exagerada da tenente demonstrar seu amor, conseguira se soltar sozinha do abraço de urso.
- Bom te ver também, Rangiku-san. Parece ótima como sempre. - Comentou ela com um sorriso satisfeito. - Encontrou a Ruri-chan? Aonde ela está?
- Está na outra ambulância. Estava recebendo os primeiros socorros agora. Apenas alguns cortes nas mãos e arranhões pelo corpo, além de um pequeno ferimento na parte de trás da cabeça, mas ela está bem. Ainda assim, foi uma experiência um pouco forte para ela. - Contou. - Tadinha, estava tão desesperada quando a encontramos. Quando ela disse seu nome e que você havia desaparecido atrás dela, meu coração quase parou.
A morena deu um riso fraco.
- Parece que acabei preocupando vocês. Desculpe e obrigada. - A morena levantou. - Tenho que dar uma olhada nela e falar com alguns policiais. Toushirou, podemos conversar depois?
O rapaz estranhou o pedido, mas assentiu.
- Nos vemos depois, então. - Despediu-se ela e, ainda um pouco debilitada, direcionou-se para as portas.
Hitsugaya obviamente já havia notado o estado de exaustão da morena, mas ainda assim ela insistia em se esforçar.
- Matsumoto, acompanhe-a.- Ordenou. - Ela mal se aguenta em pé.
E a ruiva, percebendo o mesmo, prontamente o obedeceu.
Hitsugaya ainda não entendia o porquê, mas algo em Karin o incomodou.
Matsumoto, seguindo ao lado da morena, viu a jovem loira, se debulhar em lágrimas em um abraço apertado com a amiga recém resgatada das chamas. E, pouco tempo depois, permaneceu como companhia para Ruriko enquanto Karin se reunia em um breve relatório junto à polícia local. Por fim, lembrando-se das palavras finais trocadas entre seu capitão e a antiga amiga, convidou-as para seguir para a brigada juntamente com a equipe que retornava após concluir seu trabalho no local.
A morena, no entanto, tentou convencer a amiga para ir para casa descansar, porém esta parecia estar bastante animada em conhecer a sede da 10° brigada de incêndio e insistiu em continuar mais um pouco com ela. E assim, Karin, Ruri, Matsumoto e Hitsugaya acabaram por viajar no mesmo veículo, contudo, os dois não trocaram uma só palavra. Um clima estranho se instalou entre os amigos, em especial, por parte da morena. A jovem evitava dar respostas longas e resumia tudo à um curto sorriso comercial. Mesmo a ruiva percebia tal comportamento e, não sabendo a exata causa, preferia não forçar uma maior interação com a mais jovem.
Já na brigada, na recepção que antecedia a sala de Hitsugaya, a tenente ofereceu um pouco de café para as duas jovens sentadas à mesa da bombeira e enroladas em grossas e felpudas toalhas como tentativa de vencer o frio. As roupas encharcadas seriam um problema se usadas por muito tempo.
- A noite foi horrível! Devem estar exaustas, tadinhas. - Comentou Matsumoto.
- Foi mesmo, mas não deve ser diferente para vocês que tiveram que trabalhar e se arriscar naquele incêndio. Vocês tem muita coragem. - Respondeu Ruri em um tom gentil.
A ruiva pôs-se orgulhosa com o elogio, enquanto Karin preferiu chamar um pouco da atenção da loira para si.
- Ruri-chan. Está cansada e a noite foi difícil. É melhor ir para a casa agora. - Aconselhou.
- Estou um pouco cansada sim, mas estou bem. Se alguém aqui tem que descansar, é você. Está cansada, ferida e ainda teve que enfrentar aqueles bandidos… - Comentou preocupada. - Sua cabeça ainda deve estar doendo. Por que não vem comigo? Eu te espero.
A garota fez uma pausa diminuta e sorriu minimamente, mas meneou negativamente.
- Fique tranquila, estou ótima. - Respondeu ela. - O que tenho que falar com eles é procedimento padrão e pode demorar bastante. Quando terminar aqui, vou para um hotel. Já tenho tudo acertado. Quer que eu ligue para sua casa? - Questionou.
A loira recusou.
- Não, não precisa. Eu pego um táxi e chegarei rapidamente. Temos uma casa aqui também. - Respondeu agradecida pela preocupação.
- Tudo bem, então. Rangiku-san, pode ajudá-la a conseguir um táxi? - Pediu.
- Claro que sim, Karin-chan. Se é sua amiga, é nossa amiga também. Vou chamar um que eu conheço agora mesmo. - Disse a ruiva.
A morena agradeceu e, logo em seguida, a jovem se despedia de todos e agradecia mais uma vez pelos serviços prestados pela brigada naquela noite.
À sós após a saída da loira, Karin chamou Hitsugaya para conversar em particular na sala dele.
A garota tinha um importante pedido para fazer.
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