História Hold my hand and sing me to sleep - Eu prometo

                - Como eu estou? – Perguntou Jennie enquanto rodava a saia amarela de cintura alta, acompanhada de uma regata cropped branca.

                - Todo mundo vai ver sua calcinha quando cair. – Zombou Lisa.

                - Quem disse que eu vou cair? – Lisa a olhou irônica e Jennie revirou os olhos, admitindo entre uma risada:

                - Tá bom, eu estou com um shorts por baixo.

                As duas foram correndo até a saída do condômino de casas. Todas tinham o mesmo padrão, a grama bem cortada e a cerca branca, as paredes externas pintadas da mesma cor, algumas vezes a escolha de cortinas mudava, mas só algumas vezes.

                As quatro garotas tinham vivido ali quase que a vida inteira, a que mais demorou para se mudar foi Rosé, que só mudou para a cidade quando tinha 14 anos. Elas já estavam tão acostumadas com as casas e quadras e salões de jogos que nem se quisessem conseguiriam se perder naquele lugar imenso. Tudo parecia um pouco repetido, era como uma cópia da mesma imagem a cada esquina, às vezes isso fazia com que as meninas quisessem correr, mesmo se não tivesse pressa. E então elas corriam sem olhar para os lados, sem parar para pensar em onde deveriam ir, elas já sabiam o caminho de cor, então só corriam.

                O dia ainda estava claro e bonito e as ruas estavam cheias de carros e crianças curtindo o finalzinho das férias de verão. Lisa segurou a mão da mais velha, para que ela parasse de correr, e apontou para o ônibus que estava quase chegando ao ponto do outro lado da rua.

                - Aquele é o nosso. – Explicou.

                - Droga.

                E, assim, as duas voltaram a correr. Por sorte, chegaram a tempo e subiram no ônibus, rindo alto e ofegando e chamando a atenção dos poucos passageiros.

                - Quanto tempo até lá? – Perguntou Jennie enquanto se sentava no assento da janela, no lado esquerdo do ônibus.

                - Só uns dez minutos, nada demais. Eu te aviso quando chegar.

                - Tudo bem.

                O silêncio ficou presente durante um minuto inteiro e um pouco mais antes que Jennie decidisse voltar a falar.

                - Você acha que vai ser divertido? Eu estou bem animada. Sei que é besteira, mas é como se eu não saísse de casa há meses!

                - É, eu sei. E, olha, se te ver quebrar a cara não é divertido, eu realmente não sei o que é. – As duas riram e Jennie empurrou de leve a mais nova.

                - Você sabe que vai cair mais do que eu.

                O ônibus fazia mais uma parada e Lalisa mantinha o olhar focado no chão.

                - Tá tudo certo, Lise?

                - A Jisoo não me liga já faz um tempo e, sei lá, eu só pensei que seria legal se elas estivessem aqui com a gente. O que você acha que tá acontecendo?

                - A Rosé me disse que as aulas das duas iam começar mais cedo e que elas iam ficar bem ocupadas com tudo da mudança e da adaptação. Faz um tempo que ela não fala comigo também.

                - Ah. Deve ser isso então.

                - Eu também tenho sentido muita falta delas. Parece que nada vai ser tão divertido quanto as coisas que nós quatro fazíamos juntas. Lembra daquela vez que a gente estava no shopping e a gente fez as duas caírem na escada rolante?

                As duas pararam de olhar para o chão e começaram a rir alto o bastante para que os outros passageiros ouvissem e olhassem incomodados.

                - Esse dia foi tão incrível! A Jisoo caiu bem em cima da casquinha de sorvete e se sujou inteira. Foi muito bom, eu tinha até esquecido. – Completou Lisa.

                Quando os risos exagerados estavam quase acabando, Lisa avisou que tinham chegado e as duas se levantaram e caminharam em direção à porta de saída do ônibus.

                O lugar continuava o mesmo, com uma aparência um pouco mais reformada e bem cuidada. As paredes do lado de fora eram compostas por longas e lustradas tábuas de madeira escura, dispostas na horizontal. O lugar tinha bastantes janelas compridas de vidro e a porta seguia o mesmo estilo. Parecia que nada tinha mudado muito desde a última vez que as duas tinham estado ali, e já fazia um bom tempo.

                Elas entraram e foram até a recepção buscar os patins e pagar por uma hora no lugar. A área de patinação não estava nem um pouco vazia e talvez elas tivessem que esperar um pouco para conseguir patinar. Faltava um pouco menos que uma semana para as aulas, da grande maioria das escolas da cidade, começarem e parecia que os pais decidiram sair o máximo possível com os filhos naquele verão.

                Jennie era puxada por Lisa e seus joelhos tremiam por causa da falta de habilidade.

                - Eu te disse que você ia ser terrível! – Provocou a mais nova.

                - Você devia me ajudar e não rir de mim! – Reclamou Jennie enquanto tentava se equilibrar sobre os patins.

                Lisa segurou sua mão num impulso e entrelaçou seus dedos aos da mais velha. Corando um pouco ao perceber a surpresa da coreana.

                - Pronto, agora você não precisa mais se preocupar em cair.  – Disse enquanto puxava Jennie pela pista.         

                Jennie olhou para as mãos entrelaçadas e perdeu o equilíbrio por um instante enquanto o coração de Lisa saltava constrangido pela ação impensada e pelo o que a amiga poderia pensar.

                Lalisa corria e puxava a amiga pela mão, o que fez com que Jennie caísse desajeitada no chão. Entre risos, a mais nova foi até a outra, ainda a zombando por toda a situação.

                - Tá tudo bem? – Perguntou rindo enquanto se aproximava da mais velha.

                - Você podia parar de rir e vir me ajudar! – Reclamou Jennie enquanto estendia a mão, pedindo por ajuda.

                Quando Lisa segurou na mão da mais velha, a mesma a puxou para o chão. As duas riram enquanto a loira batia em Jennie e toda a situação ficou desconfortável quando seus olhos se encontraram fixados uns nos outros. A tensão só foi cortada quando Lisa se levantou, limpando a sujeira que tinha ficado na roupa.

                                                                              ***

                No dia seguinte as aulas voltariam e as duas já usavam seus shorts e blusas de pijama e estavam sentadas na beirada da piscina do condomínio. A água era movimentada por pequenas ondinhas causadas pelo balançar dos pés da mais velha e Lisa apoiava o peso do corpo nos braços para poder olhar para cima.

- Você já pensou em sair daqui algum dia, Lise?

                - Eu não sei... Sempre que penso no meu futuro eu só consigo imaginar até certo ponto, sei lá.... Como se eu não pudesse planejar o que fosse vir depois. Acho que é porque eu não tenho controle sobre nada disso ou porque não tem nada que eu queira tanto assim a ponto de sonhar com isso.

                A lua parecia ser apenas um risco no céu e as poucas estrelas brilhavam com força. Tudo parecia fresco, era possível respirar se se sentir sufocada e as coisas até que pareciam estar no lugar certo depois de um tempo estando tão perdidas.

                - Você não consegue imaginar nada do que vai vir daqui pra frente?

                - Eu não sei. Eu acho que quero estar com alguém, mas não sei como essa pessoa vai ser. Eu acho que quero me mudar e fugir de todo esse lugar, mas não sei para onde iria ou se conseguiria viver longe de tudo que eu conheço. Talvez eu me decida depois de um tempo, mas parece que ainda vai demorar, os dias tem passado muito devagar. A única certeza que eu tinha é que nós quatro estaríamos juntas por muito tempo, mas aí elas tiveram outros planos.

                - Então por que a gente não pode mudar um pouquinho os nossos planos também? Eu acho que quero conhecer coisas novas, viver alguma coisa que eu ainda não vivi. Não sei se preciso viajar ou ir embora daqui pra isso acontecer, mas só sei que não quero continuar assim.

                - Às vezes esse lugar me sufoca também. Você acha que a gente consegue viver algo novo aqui?  – Perguntou a mais nova, dessa vez olhando nos olhos da outra. – Parece que já conhecemos tudo e todos que essa cidade tem para nos mostrar.

                - Eu não sei se a gente precisa conhecer algo novo para viver uma coisa diferente.

                E foi nessa hora que os trovões começaram e a chuva despencou sem aviso sobre a cabeça das duas adolescentes, que começaram a rir e a correr em direção à casa da mais velha.

                A chuva repentina tinha as encharcado por inteiro e as duas se jogavam despreocupadas na cama de casal do quarto escuro. As luzes amarelas de natal, que ficavam penduradas na parede bem em cima da cabeceira da cama o ano inteiro, estavam acesas e tudo parecia um pouquinho certo.

                Jennie e Lalisa estavam deitadas de lado, olhando uma pra outra, os rostos estavam muito próximos e as mãos se apertavam uma contra a outra pouco abaixo das cabeças.

                - Não precisa se preocupar com amanhã, tá? Vai dar tudo certo. – Disse Lisa enquanto beijava a testa da mais velha. – Eu prometo.