História Hold my hand and sing me to sleep - La Vie en Rose

  As duas seguiram em silêncio para casa no término das aulas.  Lisa tinha tentado conversar mais de uma vez, todas as tentativas tinham sido em vão. Jennie andava apressada e na frente da mais nova, toda vez que Lalisa tentava se aproximar nem que fosse para acompanhar seus passos e tentar segurar em sua mão, a mais velha recusava-lhe o toque e mandava se afastar.

   Tudo parecia extrema e completamente errado para ambas as meninas, era impossível acreditar que tudo ficaria assim depois de todos os esforços que tiveram que fazer para restabelecer a amizade e aguentar o ano torturante que tinham pela frente.

   Quando chegaram até a pequena e estreita viela que tinham que atravessar antes de chegar à rua do condômino, Lisa agarrou Jennie pelo braço e a encostou na parede, para que a mesma não pudesse ir embora. 

    - Por favor! Por favor, fala comigo! – Pediu Lalisa exausta de toda a situação, mas Jennie apenas virou o rosto evitando o contato visual e tentou soltar o braço, só que sem fazer muita força. – Eu não aguento isso, Jen, por quanto tempo você pretende ficar assim? Você precisa me contar o que aconteceu.... Por favor.... Eu te amo muito, você sabe disso. – Uma lágrima inevitável escorreu pela bochecha esquerda de Jennie.

       - Lisa... Por favor, para com isso, vamos embora, por favor... – Pediu-lhe a mais velha, de cabeça baixa, desistindo de se soltar da mais nova, cansada.

       - Eu não digo que te amo só como algo à mais, você sabe disso, Jen, a gente se conhece há tanto, tanto tempo... E agora você quer me excluir da sua vida. Quanto tempo isso vai durar? Você não pode fazer isso comigo, por favor, me conta o que aconteceu. Ou não conta também, mas, por favor, pelo menos fica aqui comigo, continua aqui comigo, eu juro que não precisa acontecer mais nada.

       E foi nesse momento que Jennie se soltou num choro desesperado que fez com que Lisa a abraçasse e a segurasse em seus braços imediatamente, a mais nova tinha deixado que a mochila caísse no chão e as duas se abraçavam com todas as forças enquanto Jennie não conseguia segurar o choro descontrolado que lhe invadia toda a alma.

  ***

       Sentada no chão em frente à piscina vazia da casa abandonada, Jennie apoiava sua cabeça no peito de Lisa e a mesma lhe acariciava os cabelos e, de vez em quando, lhe beijava a testa, tentando acalmar a mais velha que se via perdida em soluços.

        Quando Jennie não mais soluçava e parecia um pouco mais tranquila, Lisa levantou sua cabeça e ficou de frente para a mesma, olhando-a nos olhos, agora inchados de tanto chorar, e segurando e acariciando o rosto da outra com as duas mãos quentes.

       Jennie abaixou a cabeça antes que Lisa pudesse falar qualquer coisa e a última abaixou as mãos até encontrar as da mais velha e as segurou com força.

     - Jennie... – Disse enquanto arrumava uma mecha solta do cabelo da amiga. – Você quer me contar o que aconteceu? Ela te machucou? – A mais velha balançou a cabeça negativamente.

       - Ela não me bateu, Lisa, ela só... eu não sei... – Ela se soltou do aconchego de Lisa e encostou as costas na parede. – Eu só me sinto um pouco culpada, entende? Não era pra ser assim...

        - Assim como?

        - A gente pode não falar sobre isso? Por favor...

        Então Lisa a abraçou novamente e Jennie recostou sua cabeça no peito da amiga e as duas ficaram ali, perdendo a noção do tempo e de toda a realidade ao redor, como se pudessem viver daquele jeito para sempre, até que dormiram e os sonhos de cada uma foram embalados pelo cheiro do perfume da outra.

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        O clima estava bom, era quase como se nada daquilo tivesse acontecido e fossem só elas duas de novo, deitadas juntas no chão da casa abandonada antes de tudo começar a desabar. Como quando eram menores, antes do beijo e de tudo que se seguiu, antes do pai de Lisa ir embora e de Jennie ficar sozinha. Tudo parecia certo e aconchegante, Jennie nunca tinha se sentido tão bem dentro de um abraço e as duas finalmente dormiram tranquilas. Ao olhar para trás depois, elas agradeceriam por esse pequeno momento de paz antes que o chão ruísse e tudo começasse a cair.

        Era o terceiro ano escolar, Jisoo e Rosé tinham ido embora para longe, no ano seguinte elas completariam 18 anos e sua vida naquela cidade minúscula e vazia acabaria e ficaria pra trás. Tudo naquele ano tinha uma atmosfera de fim, de encerramento, mas era impossível imaginar o quanto tudo aquilo era apenas o começo.

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(podem colocar a música agora se quiserem <3)

         Quando Lisa acordou, Jennie estava encostada na parede, passando a mão pelos cabelos loiros da mais nova e olhando para a vista que a parte traseira da casa abandonada tinha. O sol de fim de tarde passava pelas folhas das copas das árvores altas antes de alcançar o chão, Jennie costumava dizer que os japoneses tinham uma palavra para isso: Komorebi. Ela costumava amar essa sensação.... Mas, na hora em que Lisa olhou nos olhos da amiga, pode ver os vestígios de tristeza que tudo aquilo deixara, acompanhados por uma estranha nostalgia. Jendeuk percebeu o olhar da mais nova sobre e si e lhe virou um sorriso triste seguido de um suspiro leve e uma última olhada para a vista à sua frente antes de se levantar num pulo e ajudar Lisa a fazer o mesmo. Jennie parecia estranhamente determinada, como se tivesse feito uma escolha que nada no mundo poderia mudar, nem mesmo aquela que olhava com estranheza para seu rosto.

         Ela tinha tomado uma decisão, era algo bem aparente no seu olhar e não parecia ser uma decisão fácil e nem um pouco feliz, mas estava claro que ela estava decidida e Lisa tinha medo do que poderia ser.

       Jennie começou a correr para a parte de dentro da casa e puxou Lalisa consigo, segurando em sua mão e a tirando da sua imersão em tentar decifrar o rosto e o comportamento da mais velha.

      As duas entraram pela janela quebrada que costumavam usar como acesso quando mais novas, ela sempre esteve ali, quebrada, e ninguém nunca tentou arrumar para tentar impedir as invasões.

         O lugar estava extremamente empoeirado, assim como no lado de fora, e algumas das paredes brancas estavam machadas por pichações. O chão de madeira estava riscado por inteiro. O lugar parecia ter parado no tempo, não tinha mudado nada por dentro também, o que fazia com que as duas se sentissem como anos atrás e isso fez com que elas esquecessem um pouco de tudo.

           - Onde você está indo, Jennie...? – Perguntou Lisa manhosamente enquanto a mais velha subia as escadas da sala principal.

         - Para de ser chata e só vem comigo, Lise. – Retrucou Jennie imitando a mesma entonação arrastada e teimosa ao dizer o nome da mais nova.

           As duas seguiram subindo pelas escadas, Lisa tentava subir em ritmo normal enquanto Jennie ia pulando rapidamente degrau a degrau até que a mais nova teve que aumentar o ritmo para poder acompanha-la.

            Quando chegaram no segundo andar, Jennie foi correndo até o final do corredor, entrando no último quarto da esquerda, Lisa ficou um pouco confusa no início, Jennie parecia completamente decidida de onde estava indo, como se tivesse um objetivo em algum lugar daquela casa velha e vazia em que não entravam há anos.

           - O que você está fazendo, Jen? – A mais velha apenas fez sinal para que ela esperasse e entrou em uma das duas portas que tinham dentro do último quarto.

           Foi então que Lisa se lembrou, o closet. E não pode conter um sorriso.

           - Você lembra? – Disse Jennie fechando a porta atrás de si. Lisa balançou a cabeça afirmativamente enquanto sorria.

             - Não deve mais estar aqui...

             O cômodo não tinha mais nada, era um quadrado liso, nem mesmo as prateleiras grandes de tempos atrás estavam mais lá, parecia maior, apesar do tamanho ainda relativamente pequeno. As paredes brancas guardavam dezenas de lembranças, ainda era possível ver o desenho feito a giz bem no canto do quarto. Ele estava quase que completamente apagado, mas ainda era possível reconhece-lo. No segundo em que o viu, Jennie foi correndo até ele e passou a mão por cima do traço.

               - Viu, ainda está aqui. – Disse, já se gabando da suposta vitória.

             - Não significa que o resto também vai estar. – Lisa aguardava de braços cruzados perto da porta e achava graça da reação da mais velha.

             Jennie bateu no chão perto do desenho até ouvir o som oco do piso falso e encontrar as tábuas certas. Ao levantar as tábuas soltas pode encontrar a caixa de sapatos ainda onde elas tinham deixado, com tudo dentro.

              Jennie apenas virou e sorriu brilhantemente para a mais nova que se aproximou surpresa e sentou ao lado da outra.

             - Eu te disse... Só a gente sabia disso daqui. – As duas tinham sorrisos discretos e tímidos nos lábios, estavam tão perto que as mãos apoiadas no chão quase se tocavam.

              Jennie colocou a caixa no colo e começou a tirar os objetos lá de dentro, os dois colares, só a estrutura interna da caixinha de música, a caixinha de fósforos, o mapa mal feito e muito amassado e a chave minúscula.

                As duas se entreolharam e apoiaram as costas na parede.

                - Foi uma época muito boa... – Jennie tinha começado a tocar a melodia da pequena caixinha de música, as notas em piano de La vie en rose começavam a tomar conta do quarto e seu rosto feliz e nostálgico logo voltou para o estágio de tristeza. – Lisa...

           - Está tudo bem. – Jennie a olhou surpresa. Lisa agora encarava o teto enquanto deixava a melodia lhe trazer todas as lembranças que precisava. – Você não vai poder ficar dessa vez, não é? – Ela voltava a encarar a mais velha, agora com toda a tristeza que vem com a aceitação no olhar. Jennie se mantinha cabisbaixa. – Está tudo bem, Jen. A gente ainda tem hoje, né? – Jennie apenas afirmou com um movimento de cabeça e sorriu.

             As duas se olharam e dessa vez tudo estava mais calmo, não era mais uma surpresa o que viria a acontecer. Os rostos estavam tão próximos um ao outro que as testas quase se tocavam, ao perceberem a respiração ofegante que vinha com a inevitabilidade do toque, elas sorriram risonhas. Os lábios então se tocaram e tudo desapareceu.

              Os lábios se movimentavam no ritmo da dança que as línguas bailavam, o começo foi lento e tranquilo como a melodia da música que tocava há pouco, mas a proximidade foi aumentando, Lisa segurou a nunca de Jennie e a mais velha lhe agarrou a cintura a trazendo para mais perto, tudo parecia certo e estranhamente coeso. Elas sabiam agora que isso não poderia ter acontecido de outro jeito, aquele era o momento em que elas conseguiriam não fugir no final. Aquele era o momento certo.

              O beijo inteiro tinha um crescente ritmo de despedida, mas elas não se importaram com isso quando Lisa subiu no colo de Jennie e a mais velha começou a beijar-lhe o pescoço. A despedida precisava acontecer, mas elas não deixariam que fosse como na outra vez.

               A tensão crescente no ambiente foi interrompida pelo toque do celular no bolso de Jendeuk. O som irritante fez com que elas se assustassem por um momento e, ao atender, Jennie pode ouvir a voz da mãe do outro lado da linha.

            - Quando você vai vir pra casa, Jen? Eu sei que você deve estar chateada, mas não é motivo para não voltar, a aula acabou há horas e eu te mandei milhares de mensagens e liguei várias vezes! Onde você está? – A voz era tomada pelo nervosismo e a ansiedade, o que fazia com que as palavras saíssem trêmulas e apressadas. O silêncio se seguiu por um suspiro da mãe, uma pausa. – Por favor venha pra casa...

              - Eu estou na casa da Anne, a menina nova do colégio, eu não vou demorar, mãe. Por favor me deixa ficar.

              - Tudo bem, não volta tarde. – Pode-se ouvir o som do telefone desligando e Jennie sorriu, aliviando a tensão.

           - Essa é a última mentira que eu vou contar. – Disse enquanto puxava novamente o corpo de Lisa para perto do seu e retomava o beijo com ainda mais intensidade.