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História Humano x Demônio - Primeiro dia


Escrita por: NarutinSigiloso

Notas do Autor


Oi :3

Capítulo 3 - Primeiro dia


Capítulo 3

              Primeiro dia

Depois de não muito tempo andando pela trilha, consegui enxergar entre as árvores uma casa de madeira não muito extensa e um pouco coberta por plantas e raízes. Cheguei mais perto dela e a rodeei, procurando a porta. Precisei rodeá-la mais de uma vez e procurar por algo que lembrasse ao menos uma entrada. Minutos depois, achei uma maçaneta de madeira escura entre os galhos. Como foi que eu consegui achar aquilo?! Eram de cores tão semelhantes! Mas tanto faz. Sorte não é minha melhor amiga, então qualquer presente dela, tenho que agradecer e aproveitar.

Arranquei os galhos e as raízes que cobriam a passagem; minhas mãos ficaram um pouco arranhadas no processo, e algumas feridas acabaram sendo abertas. Quando finalmente entrei, mal respirei o ar de dentro da casa para começar a tossir. O interruptor ficava ao lado da porta; ao ligar, vi uma luz fraca, mas o suficiente para aquele lugar, mesmo que ás vezes piscasse involuntariamente. Era um tipo de biblioteca velha e empoeirada; estantes de livros tampando a visão das paredes e uma pequena mesa de centro junto com duas cadeiras; havia também algumas velas gastas pelo chão envolta da mesinha. Interessante, mas quem ou por que alguém construiria uma cabana cheia de livros, na mata? Talvez seja dos antigos moradores, e aqui era como um recanto para um deles dispersarem dos problemas rotineiros de casa? Não sei, mas isso também não me importa agora. Era um ambiente agradável para mim, mas a única coisa que me deixou triste em saber era que não tinha rato algum. Às vezes me impressiono com o quão iludido eu sou... Mas é claro que eu não corri sei lá quantos quilómetros para voltar sem nada; aquilo era praticamente uma mini biblioteca, algum livro deveria me interessar...

Comecei a pegar os livros das estantes e ver as capas, afinal, as capas tem a responsabilidade de chamar a atenção do público a primeira vista. Livros infantis, culinários, mais livros infantis, livros de engenharia, de jardinagem... Mais, e mais coisas chatas... Eu não acredito nisso... Eu literalmente fui para aquela casa para não achar sequer um rato, e ainda por cima não ter um livro do meu agrado... Porra destino... Fiquei procurando por algum livro interessante em todas as estantes por cerca de meia hora, e nada! Eu podia ser imbecil, e até burro ás vezes, mas ir até uma casa abandonada e sonhar que ali teria o que gostaria que tivesse, foi ridículo de mais até para mim. Não sei de onde tirei tal esperança, só sei que continuei foleando, lendo sinopses, tirando os livros das estantes e os colando de volta, até que, ao prestar atenção no fundo da estante de onde tinha acabado de tirar um livro grosso e chato, acabei achando outra camada de livros por trás. Ah cara... Sério, quem foi o idiota que arrumou essa casa? Não aguentava mais ver conteúdos entediantes, e para minha alegria ainda tinha outra camada de livros por trás...

- Você vai ser o ultimo, só para completar a minha decepção. – falei para mim mesmo, ou talvez para o livro também. Peguei um que estavam na camada de trás e analisei a capa – Hum...? O que... – engoli a seco. Segurei o livro com mais força, sentindo o meu rosto queimar, a respiração ficar descompassada... A mesma ansiedade que senti quando estava a caminho da casinha começou a voltar. Passei a mão pelas letras da capa para tirar a poeira – “Grimoeire Goécia”... – li o nome do livro em voz alta. Meu rosto ficou vermelho como uma pimenta, além de queimar muito até as orelhas. Abri o livro, lendo as primeiras páginas; a cada parágrafo meus olhos brilhavam ainda mais. Aquele livro era tão incrível, em tantos níveis diferentes! O primeiro capítulo descrevia a evocação de setenta e dois espíritos infernais – chamados também de “daemons” –, todos tendo como base o sistema que Rei Salomão havia usado; e quatro desses espíritos tinham duas formas de evocação, sendo no total setenta e seis selos de evocação.

Entretido com o conteúdo, acabei lendo mais do que havia planejado. O tempo voou, mas o idiota – conhecido como Cedric – não percebeu as horas passando. Não posso negar que, se eu não tivesse prometido voltar antes das dez horas, eu passaria a noite naquela casinha, só sairia dali para pegar cobertor, algum sanduiche e um copo de café. Horas se passaram, quando eu finalmente despertei em um pulo, com o coração na boca e sentindo um arrepio estranho percorrer minhas costas, como se já pressentisse Haru me esperando com uma cinta na mão.

-... Espera... Q-quê horas são?! – disse, quase gritando. Desesperado, arrumei os livros que havia tirado do lugar, porém, levei o Grimoeire Goécia comigo. Se eu não podia lê-lo ali, o leria em casa; supondo que aquela casinha pertencia aos antigos donos da, agora minha casa, não deve haver problema em pegar emprestado. Desliguei a luz da casinha e voltei correndo para casa, com medo de a minha mãe estar realmente me esperando com uma cinta na mão. Usei toda minha energia para chegar o mais rápido possível; suei, quase caí no chão por causa de uma maldita raiz de árvore, e mesmo assim quando finalmente entrei em casa, minha mãe estava sentada no sofá, com os braços cruzados e uma expressão calma no rosto. O relógio tinha acabado de bater meia noite e meia. Eu estou fodido...

- Você sabe que horas são...? – Sua voz era ameaçadora, por mais calma que soasse. Nem sequer olhou para mim, tamborilou os dedos, batia o pé no chão irritadiça ou soltava fogo pela boca e me dava uma bronca que me fizesse chorar, ela apenas me olhou claramente decepcionada. O notebook estava aberto na mesinha de centro, com páginas em branco do Microsoft Word, provavelmente era para ser as páginas de algum capítulo de seu livro. Talvez não tenha conseguido escrever nada por estar preocupada comigo?... Droga...

- Desculpa, mãe, desculpa mesmo, eu não sabia que horas eram... Eu passei tanto tempo lendo que... Acabei me... Atrasando... – me aproximei um pouco dela, juntei os pés, as mãos, e curvei o corpo para frente. Era uma posição normalmente usada no Japão como cumprimento ou como pedido de desculpas. Não sou do tipo que causa problemas para a mãe constantemente, e sempre que faço algo de errado, ela é bem rigorosa, para que eu não me torne alguém totalmente mimado. Eu nunca consegui me acostumar com esse jeito dela, seu jeito sem expressão e sem vida; me sinto muito melhor quando me bate, ou então chama a minha atenção com um grito que só Haru sabe fazer, afinal, esse é seu jeito natural, extrovertido e mostrando os sentimentos a flor da pele. Mas quando ela chega a esse nível de irritação, a ponto de estar tão brava, tão preocupada, que cansou de se torturar em expressões e as guardou numa gaveta dentro de si, sinto que sou triplamente culpado por sua infelicidade e decepção.

Haru voltou a olhar o notebook fixamente e soltou um longo suspiro, evidentemente cansada de mim e de seu trabalho inacabado. Ficamos em silêncio por alguns minutos que mais pareciam uma eternidade; eu já havia voltado a posição normal, mas continuava ao lado do sofá, em pé, a olhando e esperando uma resposta para as minhas desculpas. Mais uma “eternidade” se passou e eu apenas me sentia como se fosse morrer de vergonha cada vez mais pelo que fiz com a minha mãe. Seus olhos estavam levemente vermelhos e com olheiras, seu corpo parecia cansado daquela posição, então finalmente percebi que, em apenas dois dias, ela já estava totalmente acabada por conta de seu livro e de seu bloqueio criativo. Quão tarde ela ficou acordada no nosso primeiro dia que chegamos aqui? Ela sequer tinha dormido? Andei até o notebook, fechei e o segurei com a minha mão livre. Recebi um olhar ainda sem expressão de Haru, mas dava para ver nitidamente seu cansaço em todo o rosto e corpo.

- Chega de escrever por hoje. – Subi as escadas, logo sendo seguido pela Haru. Em seu quarto, deixei o notebook na mesa ao lado da cama. Peguei meu pijama e fui ao banheiro tomar banho, por causa do tanto que suei; troquei de roupa e escovei os dentes. Quando voltei, Haru estava deitada de qualquer jeito na cama, nem sequer tinha trocado de roupa, então a peguei no colo, ajeitando-a numa posição que não fosse fazê-la ter torcicolo depois, e a cobri. Peguei seu celular, que estava no criado mudo, e desliguei o despertador. Por fim, desliguei a luz.

Eu iria dormir no meu próprio quarto para não incomoda-la com o meu despertador, já que amanhã tenho aula. Juntei minhas malas que estavam no chão – já que havíamos esquecido de guardar as roupas – e as deixei no meu quarto, arrumando minhas roupas no armário; minhas malas no fundo dele, embaixo de onde pendurei algumas peças de roupa, e meus livros – incluindo o Grimoeire Goécia –  nas ultimas gavetas. Antes de fechar a única porta do meu armário, tirei de um dos bolsos da minha mochila, meu celular. Coloquei para que despertasse às cinco da manhã, para que desse tempo de eu chegar ao menos perto do sinal do colégio tocar.

Tinha perdido meu sono, depois de toda essa adrenalina e do nada uma calmaria torturante, mas ainda assim sabia que se não dormisse naquele instante, dormiria no carro, e com o meu sono pesado, ninguém pode afirmar que vou conseguir acordar para chegar à minha aula. Me deitei no colchão e fechei os olhos, tentando dormir, o que quase foi impossível com aquela colcha dura.

No dia seguinte, terça-feira, acordei mais cedo que minha mãe, pela primeira vez na vida. Ela costuma ser uma coruja; dormir tarde e acordar cedo – embora, na maioria das vezes acredito que ela nem durma, não é atoa que o café é seu segundo melhor amigo (ela sempre diz que eu sou seu melhor amigo numero um) – tudo isso apenas pelos seus livros. Haru já fez livros famosos, cerca de 67%  de seus livros foram de grande sucesso no Japão é foi graças a isso que agora temos uma vida de alta qualidade. Sua categoria favorita é ficção científica, mas agora, nesse novo livro, esta tentando misturar um pouco de drama e terror; isso acabou afetando sua mente criativa que sempre pensava em formulas incríveis para surpreender o publico, porque com terror e drama terá que trazer sentimentos de agonia e de melancolia ao leitor, e não só surpreender e “explodir mentes”. Por isso nos mudamos para uma casa com origens e de ambiente melancólico e sombrio, para tentar impulsionar sua mente criativa.  Não sei exatamente o que esperar: algo de sucesso ou que vai prejudicar a saúde ainda mais da minha mãe. Torço pela primeira, embora esteja longe da realidade agora.

Me levantei e fiz minha higiene matinal. Desci para a cozinha, fiz um lanche rápido e café. Logo depois que terminei, fui trocar de roupa e arrumar minha mochila com os meus materiais que trouxe da viagem. Coloquei uma blusa preta que tinha alguns detalhes de respingos de tintas; uma calça jeans azul escuro, meias brancas e meus tênis all star preto de cano médio. Sei que eles já não estão na moda, mas eu nunca me importei com isso mesmo, além disso, eles são muito confortáveis.

Guardei minha carteira em uma das bolsinhas pequenas da minha mochila e andei até o quarto da minha mãe. Fiquei de frente a ela, que ainda estava dormindo, e dei um selinho em sua testa, como despedida.

- AONDE VOCÊ ESTÁ INDO?! – Haru deu um pulo para fora da cama quando estava prestes a ir embora. No mesmo momento, um grito se instalou na minha garganta; senti meu corpo inteiro tremer e falhei um passo, caindo contra a parede com o coração na boca. Me virei assustado e ofegante para ela, que estava tão assustadora quanto.

- Está tentando me matar...? – Perguntei, recuperando o folego, e dando uma risada nervosa.

- Me responde primeiro! – Mudou de expressão, de assustadora para preocupada, segurando em meus ombros.

- Calma, mãe, eu só estou indo pro colégio. E você ainda está sonambula, melhor sentar antes que caia no chão como uma bêbada. – Segurei seus pulsos gentilmente e a guiei de volta para cama.

- O que?! E quem fez seu café da manhã?!

- Eu.

- Você?! Nem sabe fritar um ovo, como vai preparar um café da manhã para si mesmo?! – Depois de um pouco de esforço, finalmente se sentou na beira da cama, mas continuava segurando minhas mãos e com a mesma preocupação em seu rosto, ou talvez um pouco mais.

- Eu pelo menos sei como fazer um lanche simples, mãe. – Respondi fingindo uma indignação dramática, apenas para aliviar a tensão. Ela afrouxou o aperto em minhas mãos e deu um longo bocejo.

- Eu só... Não esperava que o seu primeiro dia de aula começasse assim... – Tombou a cabeça para o lado – Sabe... Queria que fosse: eu acordando primeiro, e então te tirando da cama, te arrumando e aí fazendo o seu café da manhã, te alimentando, te dando beijo de despedida... Quem sabe te levando para o colégio também! – Por algum motivo ela esboçava um sorriso nos lábios, mas mantinha os olhos fechados, ainda parecia sonolenta.

- Você fazia isso quando eu era criança. Não precisa mais fazer isso. – Dei um selinho na testa da Haru e soltei minhas mãos.

- Ei, isso é uma coisa muito deprimente para se dizer a uma mãe! Principalmente pra mim, que sou supercarente e você sabe disso! Nunca vou parar de te mimar, não adianta o quanto você negue! – Fez bico e cruzou os braços. Começava a me perguntar “quem é a verdadeira mãe aqui?”.

- Okay... – Suspirei, e sorri para ela, que foi retribuído rapidamente – Mas é melhor eu ir agora, antes que eu me atrase. Sabe... Três horas viagem, e tal.

Dei um ultimo selinho em sua testa. Depois de fazer alguns carinhos na minha cabeça – isso incluía bagunçar meu cabelo e jogar minha franja para trás –, finalmente me deixou ir.

Saí de casa e fechei o portão. Estava um pouco frio e escuro naquela hora da manhã; a floresta era silenciosa, exceto pelo canto dos pássaros e o bater de asas em conjunto. De acordo com os meus passos, as folhas secas e os galhos faziam “scrash”. Era um lugar bonito e confortável, se não fosse pelo livro da Haru, ousaria dizer que é um lugar onde dores de cabeça ou ansiedade não podem te alcançar. Quando cheguei no carro, sentei no banco de trás e fiquei em silêncio; não gostava de falar com gente estranha, muito menos forçar puxar assunto, ainda mais naquela hora da manhã.

- Bom dia, senhor...? – Perguntou o motorista.

- Cedric Jackson. – Respondi simples, mantendo meus olhos na floresta.

- Cedric! Combina com você. – Pude ver seu sorriso pelo espelho do carro.

- Qual seu nome? – Apenas perguntei para não parecer rude.

- Lars! – Deu partida no carro. – Seu primeiro dia aqui, hum? – Começamos a viagem pela trilha de terra.

- Não. Já me mudei para cá uma vez. – Eu não acreditava que ele queria mesmo puxar assunto naquela hora da manhã. Escolheria as palavras e frases mais curtas para responder qualquer coisa.

- Sério? E por que voltou?

- Um trabalho da minha mãe.

- No que sua mãe trabalha?

- Escritora. – Estava rindo mentalmente daquilo. Tinha como eu parecer mais desinteressado naquela conversa?

- Legal! Quantos livros já pulicou? – “24! Como adivinhou que meu hobbie favorito é contar os livros que minha mãe já publicou?!” senti tanta vontade de dizer isso...

- Vários.

- Uou! Algum de sucesso?

- A maioria.

- Incrível! Mas eu nunca ouvi falar da sua mãe por aqui! De onde vocês são?

- Japão.

- SÉRIO?!

- É. – Aquela conversa já estava começando a ficar ridícula, mas acho que ele finalmente tinha pegado que eu apenas queria que ele fizesse seu trabalho em silêncio, porque hesitou alguns minutos para continuar.

- Entendi. Desculpa a empolgação, senhor. – Ele soltou uma breve risada, constrangido.

- Pode me chamar só de Cedric. – Tentei aliviar.

- Sim, senh-... Cedric! – Riu de novo, e eu ri também, apenas para não deixa-lo nervoso. Depois disso, finalmente ficou quieto. Passei o resto da viagem ouvindo uma música qualquer do spotify com os olhos fechados. Acabei dormindo algumas vezes sem querer.

Chegamos às 7:58; Lars me acordou gentilmente com a buzina do carro, dando risada da minha cara de sono. Mostrei o dedo do meio para ele, brincando, e nos despedimos. Corri para dentro, pois o sinal havia acabado de tocar. Quase cai na mini escada da entrada e na escada que levava para o segundo andar, mas fora isso consegui chegar na minha sala. Os alunos já estavam nos seus lugares, e o professor já passava a matéria no quadro. Todos pararam o que estavam fazendo quando bati três vezes na porta pedindo licença e me olharam. Nesse momento comecei a suar, meu coração estava acelerado de tanto nervosismo. Odeio mudar de escola.

- Você é o aluno novo? Está atrasado! – O professor me repreendeu. Ele andou até a sua mesa e pegou a pasta de chamada, marcando minha presença e mais alguma coisa que não consegui ver o que era. Entreguei para ele o papel para que assinasse seu nome e sua matéria nas colunas. Depois que o fez, me olhou irritado. – Sente-se na fileira da frente, e abra seu livro na página 104. – E voltou para a frente do quadro, onde estava explicando alguns desenhos de períodos.

Apenas obedeci tudo o que disse, embora estivesse odiando a atitude dele. Eu me atrasei uns 5 minutos, não precisava daquilo! Mas tanto faz. Algumas pessoas riram de mim, e o que parecia ser o palhaço da sala fez uma piada que não me dei o esforço de retrucar. Me sentei perto da janela, na segunda carteira.

A aula se passou normal; fazia o que era proposto e participava das discussões sobre a lição que estava sendo dada junto com o professor e os outros alunos que sentavam na frente – com interrupções breves e desnecessárias de alguns palhaços –.

O nome dele era David, ele tinha 40 anos – descobri isso por causa de uma garota que começou a puxar assunto com o professor no meio da aula –; ele tinha um porte físico muito grande, o cabelo era preto com alguns fios brancos e a barba meio raspada era mais cinza. Ele era bonito, mas com o humor de uma pedra e 0 de paciência.

As próximas aulas foram de biologia, e então veio Educação Física. Continuei fazendo o que o diretor tinha pedido, para que os professores assinassem o papel, e depois disso, eles davam uma breve apresentação de si mesmos (pelo menos os outros dois professores eram carismáticos). O professor de biologia, Bryan, era jovem, negro, cabelo afro, alto, muito tranquilo (exceto com certos garotos da sala), e um físico menos exagerado que o do professor de história. A professora de Educação Física, Emma, por outro lado, era um meio termo entre o físico do David e do Bryan, era alta, e me arisco dizer que ela era quase tão elétrica quanto minha mãe.

A aula de biologia foi okay, o problema de verdade aconteceu na aula de Ed. Física...

Depois que a aula acabou, todos pegaram seus materiais e saíram correndo para a porta, mais ainda os idiotas “piadistas” da classe, que correram feito animais pelas escadas e corredores, fazendo baderna por onde passavam; nessa, quase que fizeram um grupo de professores caírem no pátio. De primeira corri junto para não me perder, já que eu não fazia ideia de onde era o ginásio naquele lugar, mas depois que vi todos saindo por uma porta, diminui a velocidade. Cheguei em penúltimo, só porque uma garota atrás de mim nem sequer correu, apenas caminhou até lá. Nem a conheço e já quero uma amizade com ela, o que é uma pena, porque não tenho coragem de ser o primeiro a puxar conversa.

O ginásio era gigante, e do lado de fora tinha uma área maior ainda, com gramado e arquibancadas, que era onde o time de futebol jogava e treinava, suponho. Os palhaços foram como um foguete para o lado de fora, e alguns até tirando a camisa. Eu não acredito que são eles que fazem parte do time de futebol... Ah, quer dizer... É claro que são! Para o que mais serviria aqueles músculos ridiculamente grandes e cérebros do tamanho de um grão de arroz?

No ginásio, a professora deu alguns aquecimentos, treinos básicos, que eu conseguia fazer. Mas isso só durou 5 minutos, o resto do tempo ela deu algumas alternativas de esportes, e cada um deveria ter ao menos 6 pessoas participando; os esportes eram: basquete, vôlei, e corrida, porém, ela deu uma alternação especial para alguns dos integrantes do time de futebol para que pudessem treinar.

Não sabia em qual das três atividades eu queria participar, na verdade, não queria participar de nenhuma. No final, todos os grupos foram fechados, e eu fiquei sobrando. A professora nem sequer se importou com isso, estava ocupada de mais estabelecendo as regras das atividades e sendo o juiz de todas elas – exceto a do futebol, que já tinham um –. Me sentei na segunda fila de bancos da arquibancada e fiquei observando as pessoas fazendo as atividades. Eu prefiro desse jeito, é em mais divertido, e eu posso pegar todas as falhas engraçadas dos outros e rir delas de camarote, e melhor ainda: não vou me machucar!

- Hey, ficou de sobra também? Legal! Então somos dois! – Uma garota gritou do meu lado e eu quase cuspi meu coração para fora por causa do susto, mas quando virei para o lado, vi que era a mesma que tinha chegado por ultimo no ginásio.

 - Ahn... É. – Meu nível de socialização é avassalador, não é?

- Ah, espera! Você é o novato gótico! Eai, meu nome é Anabel, mas todo mundo me chama de TicTic, ou então TicTac. – Deu de ombros. – Qual seu nome?

- Meu nome é Cedric, e... Por que TicTac?

- Eu coleciono pulseiras – ela esticou os braços, que estavam cobertos por todos os tipos de pulseiras possíveis de se imaginar até o final do antebraço – e elas fazem um barulhinho parecido com TicTic, TicTac... – Balançou os braços para cima e para baixo, provocando o barulho.

- Entendi... – Desviei o olhar, e comecei a corar. Estava nervoso, com isso as palavras ficaram presas na minha garganta por um tempo; sentia tanta vontade de falar algo legal para que ela gostasse de mim, então disse a primeira coisa que veio na minha cabeça o mais rápido possível, para não ficar um silencio constrangedor. – Motivo estranho para dar apelido a alguém.

 - Pois é, mas nesse colégio é assim: se você tem alguma característica muito notável ou forte, eles vão te apelidar disso. Muito provável que vão te chamar de emo ou gótico por aqui. – Deu risada, me dando um tapa nas costas, mais forte do que deveria, o que quase me fez cair do banco. – Opa! Foi mal. – Riu de novo, botando a mão na frente do meu peito para evitar que eu caísse.

- Tudo bem, eu não me importo com apelidos mesmo. – Dei de ombros, me ajeitando no banco.

- É, com certeza vão te chamar de gótico ou emo com essa atitude de foda-se, – fez careta – mas sabe, é bom ser assim mesmo, porque se for pra dar atenção e levar tudo ao pé da letra para o que os outros falam, você acabaria se suicidando. – Soltou uma risada meio nervosa, e me olhou nos olhos; senti vontade de sair correndo de vergonha, mas continuei ali. – Hey, eu gostei de você. Vamos ser amigos? – Simplesmente jogou todas essas palavras em cima de mim, me fazendo ficar triplamente mais nervoso e feliz. Eu nem sequer estava fazendo exercícios como os outros, mas com certeza estava suando mais que eles naquela hora.

- Direta como um tiro. – Murmurei, soltando uma risada nervosa no final.

- Heh, sou mesmo! – Droga... Ela ouviu. E então, Anabel agarrou meu pescoço em uma chave de braço e riu do meu desespero de sair dali. – Eu também sou potente como um tiro! Então não me deixe irritada! – Embora estivesse rindo, dava para ver pelo seu tom de voz que estava falando sério.

Ela era tão direta.                                                                                  

                                                                                 * * *

Anabel tinha 1,85; sua voz era um tanto grossa e seu porte físico não era nem gordo, nem magro. Seu cabelo era de uma cor meio caramelada, que ia até os ombros; sua franja, que era virada para a esquerda, era grande o suficiente para bota-la atrás da orelha; era um cabelo rebelde e arrepiado. A pele era branca, um tanto avermelhada em algumas partes, mais que outras. Ela estava vestindo uma camisa social preta, com mangas rasgadas; uma calça moletom cinza, e tênis sem cadarço, preto. Seu estilo de moda era estranho, mas eu achei interessante por ser um tipo diferente.

Depois da aula de Ed. Física, Anabel grudou em mim, me guiou pelo colégio e me falou um pouco das pessoas que estudavam e trabalhavam ali. Ela me explicou que havia mesmo um grupo de palhaços que a única coisa que tinha para mostrar ao mundo era apenas músculos; eles estão separados nas turmas A, C, e E – eu estou na A –. Outro grupo era o das líderes de torcida, que por mais vulgares que fossem, são boas companhias e 60% delas são de humanas, que por algum motivo Anabel considerava isso um ponto positivo. Não acho que isso seja um ponto positivo, mas também não acho que seja negativo; pessoas de humanas são muito criativas e liberais – ao menos as que eu conheci até agora –, e eu gosto disso. Existiam vários grupos pelo colégio: os emos-cortadores-de-pulsos-depressivos, as vadias, os gênios, os fofos-manipuladores, os perfeitinhos, os agressivos, os seguidores de Judas e os seguidores de Deus, mas os maiores/predominantes eram os outros dois dois.

Anabel também disse que existiam vários bullys por ali, escondidos ou expostos, e que era para eu tomar cuidado com o grupo dos palhaços por esse motivo.

As próximas aulas foram de matemática e inglês. Anabel passou a fazer dupla comigo nas aulas; achei isso um tanto simpático da parte dela, mas ela não sabia a hora de calar a boca. A professora de matemática era Claire; ela parecia ser a mais nova dali, cerca de 20 ou 28 anos. Por conta disso, os palhaços não paravam de falar bobagens e piadas sugestivas, mas isso eles falavam entre si, porque a professora, embora tivesse um rosto fofo, era extremamente irritadiça e meio louca. Pelo menos eles tinham noção de perigo. Claire tinha cabelos longos e loiros; a pele era morena, e tinha o porte físico no padrão que a sociedade exige da mulher. Já a professora de inglês, Ella, era mais gorda; pele branca e vermelha em algumas partes; o cabelo era castanho e médio, não chegava até os ombros; e sua personalidade era mais tranquila, e um tanto piadista. Ambas as aulas foram boas, consegui aprender muito bem. O modo de ensinamento nos Estados Unidos é muito bom, como sempre.

Na hora do intervalo, comprei meu lanche e fui guiado pela Anabel pelas mesas que já começavam ficar limitadas por causa da quantidade de pessoas. Sentamos em uma mesa quase isolada, um tanto perto das janelas. Lá só estava sentado uma pessoa, que parecia ser amiga da Anabel.

- BEL!! VOCÊ NÃO VAI ACREDITAR NO QUE ACONTECEU HOJE NA SALA! – A pessoa gritou e a agarrou pelo braço para que se sentasse do seu lado.

 - Quê foi dessa vez? De novo o Bryan? – Anabel tentou se desprender dos braços da outra pessoa, e então voltou a olhar pra mim, um pouco sem jeito. – Er... Foi mal, esse é meu amigo Nico... Nico, esse é um novato e meu novo amigo, Cedric.

- Oi, Nico. – Sorri para ele, mas ele simplesmente mergulhou em cima da mesa e me abraçou, extremamente agitado.

- OI, CEDRIII~C!! SEJA MUITO BEM VINDO AO MELHOR COLÉGIO DE TODOO~S – Ele me balançava de um lado para o outro, continuando por cima da mesa. Isso atraiu vários olhares desnecessários, principalmente risadas, fotos, e uma garota estava filmando aquilo com o celular. Ahh... Merda...

- Nico, pelo amor de Deus, para com isso! Tá deixando o Cedric envergonhado! Além de estar chamando atenção, seu louco! – Ela o puxou para baixo pela barra da camisa, fazendo-o sentar de volta no banco.

- Hehe~ Foi maaa~l! Mas estou tãã~o feliii~z! – Era notável isso. Ele estava praticamente soltando purpurina para todo lado.

- Cara, para de arrastar as palavras, isso é irritante. – Anabel puxou a bochecha do Nico, que não parava de choramingar com as bochechas já vermelhas. Eles entraram numa pequena discussão, o que só chamou mais atenção ainda. Depois que a “DR” acabou, eles voltaram a me olhar. – Er... Foi mal... De novo. – Riu de nervoso novamente.

- Desculpa o escândalo, Cedric! – Ele riu, mas não parecia nem um pouco arrependido. – É que o Bryan... AH, É, O BRYAN! EU ME ESQUECI DE TE CONTAR, BEL! – Nico a agarrou pelos braços. Anabel parecia se preparar psicologicamente para o próximo escândalo. – EU DISSE QUE ESTAVA COM DIFICULDADE COM AS QUESTÕES, E ELE ME DISSE QUE EU PODIA SENTAR DO LADO DELE PARA ME EXPLICAR, E NO MEIO DISSO TUDO ELE AINDA SORRIU PRA MIM!!! – A cada palavra, ele parecia ainda mais feliz, tanto que não parava de aumentar o sorriso e balançar as mãos.

-... E...? – Ela fez um gesto para que continuasse.

- E... Foi isso! Ele me ajudou a entender as questões e depois pediu para eu voltar pra minha carteira... MAS ELE SORRIU! ELE NÃO SORRI PARA PRATICAMENTE NINGUÉM! – Nico parecia disposto a mostrar o quão interessado esse Bryan estava por ele.

- Ok, ok... Uau! Incrível... – Anabel fingiu animação.

- Chata! – E então, ele ficou emburrado e nem sequer tocou no seu lanche, que estava um tanto amassado por causa da vez em que ele pulou na mesa. Ficamos um tempo em um silêncio constrangedor, pelo menos para mim. Mal conheci os meus talvez futuros amigos e eles já começam a brigar na minha frente, essa realmente não foi a melhor primeira impressão que eu já tive conhecendo alguém.

- Eh... Quem é... Esse Bryan? – Tentei puxar assunto.

- É o professor de história, lembra? Aquele chato da primeira aula. – Anabel explicou.

- Chato nada! Ele é um amor! Pelo menos comigo, é claro! – Nico se gabou.

- Mas ele não é casado? – Perguntei.

- Divorciado! – Nico acrescentou. Anabel deu um longo suspiro.

- Se prepare psicologicamente para ouvir muito sobre o Bryan. Essa criatura é simplesmente APAIXONADA por ele. – Cruzou os braços, fuzilando o amigo com os olhos, que retribuiu mostrando a língua. Pareciam duas crianças.

-Ok. Eu estou pronto para ver esse circo pegar fogo. – Respondi, quebrando o clima tenso entre os dois, e rimos juntos.

Nico era bem mais baixo que Anabel, 1,72 mais ou menos. Ele tinha a pele negra, e os cabelos negros cacheados, curto; seu porte físico era mais delgado e mais fraco que o da Anabel. Estava vestindo um moletom vermelho, escrito em branco GAP no meio; uma calça jeans preta, bem apertada; e tênis marrom escuro.

Continuamos conversando de assuntos aleatórios enquanto comíamos. Descobri que Nico era otaku, e tinha 16 anos, um ano a mais que Anabel e eu. Eles eram uma ótima companhia, até mesmo quando discutem; quando eles percebiam que iam longe de mais nas discussões, simplesmente paravam, e riam. Era divertido, e satisfatório saber que não vou ficar o ano inteiro sem fazer amigos, como aconteceu comigo da última vez que vim para Nova Iorque, que tive a sorte de cair numa escola de ricos metidos.

Ainda faltava a metade do tempo para bater o sinal. Nico acabou não querendo o resto do lanche e da sua bebida em caixinha, e como eu já estava levantando para levar minha bandeja, aproveitei para levar a dele também. É claro que isso fez com que Anabel e ele discutissem de novo.

- Qual o problema?! Ele tá sendo gentil! Ao contrário de alguém aqui! – Retrucou Nico.

- Nós acabamos de conhecê-lo! Não o trate como seu empregado, como faz comigo, seu peste! – Repreendeu Anabel.

Saí de perto deles com as bandejas, rindo da facilidade de iniciarem uma briga. Quando fui virar uma pilastra que estava no meio do caminho, para ir até o lixo, acabei esbarrando em uma pessoa, fazendo a bebida em caixinha e o lanche caírem em sua roupa. Assustado, eu deixei as bandejas caírem no chão também. Fiquei paralisado olhando a mancha em sua camisa, e então, a suar frio.

- D-desculpa... E-eu... Eu não te vi e... Ahn... Desculpa! – Repeti desculpas várias vezes, vermelho de vergonha. Olhei para cima e me deparei com um daqueles palhaços; justo um que tinha o cérebro derretido em músculos.  Ele era o dobro do meu tamanho, e nem preciso nem dizer que ele estava puto comigo.

- O que?! Porra, cara, olha o que você fez com a minha camisa, seu filho da puta! – Ele agarrou meu braço com força; não precisava ver para saber que estava se formando uma mancha vermelha, com as marcas de seus dedos em meu braço. Novamente, atraindo atenção, principalmente do grupo de palhaços que riam e davam incentivos para que ele me batesse. – O que acha de estrear seu primeiro dia de aula com um belo soco na cara? – Ele disse quase sussurrando, de uma forma calma, mas mais assustadora do que aparentava. Fechei os olhos, com medo. Meu coração estava quase pulando pela boca; a minha respiração falhava pelo nervosismo, e a dor do meu braço estava insuportável, era como se alguém estivesse o prensando em uma morsa. As vozes das pessoas gritando, de incentivo ou de pânico, no refeitório estavam me incomodando, sentia a pontada de dor de cabeça começar a me atacar. Eu não planejava isso para o meu primeiro dia de aula. Segundos depois, o que me pareceu uma eternidade – por causa da tensão que estava sendo empurrada para mim fisicamente e psicologicamente –, ouvi a voz da Anabel junto com a do Nico se aproximando.  



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