História I Can't Explain - Real Good Looking Boy

Narrado por Jullia

   Se há nesse mundo duas palavras que conseguem fazer meus joelhos ficarem bambos, minhas mãos suarem ou meu coração acelerar, essas palavras com certeza são "Keith Moon". Keith Moon, aquele garoto meramente baixo, com os cabelos escuros bem rebeldes e olhos tão grandes e alucinados que fazem qualquer um ficar hipnotizado. Desde que o conheci, na pequena festa de 15 anos do meu primo Peter, no dia 19 de maio, não consigo mais me concentrar direito nas coisas... Tudo me faz lembrar do divertido garoto... Olho para a lua e me lembro de seu sobrenome, olho para o sol e me lembro de quão confortável, aconchegante e quente é ficar perto dele... Olho para as estrelas e me lembro do brilho de seu olhar...

   Antes, quando alguma amiga minha chegava suspirando por algum garoto, eu simplesmente respirava fundo e me controlava para não dar um tapa na cara dela dizendo que garotos são imbecis e não merecem tanta repercussão... Mas agora eu entendo estas meninas... Não dá para controlar o coração. E precisou de 14 anos e meio para eu finalmente entender isso, graças ao garoto que, literalmente, fez esse sentimento explodir em mim, como uma bombinha...

   Se isso é bom? Claro! Afinal Keith é realmente um garoto muito bonito e educado, meio maluco, mas isso o torna ainda mais incrível...

   A questão é que, desde o dia que o conheci até hoje, nós já devemos ter saído juntos umas vinte ou até trinta vezes... Ele geralmente me leva para dar uma volta nos parques, mas quando ele ganha mesada, geralmente me leva na sorveteria. Tem vezes que, para aumentar ainda mais a minha timidez, ele me convida para ir até sua casa, simplesmente para vê-lo explodindo coisas ou para escutar alguns discos. Ele me disse que seu grande sonho é ser baterista e que assim que conseguir juntar dinheiro o suficiente, vai comprar um kit de bateria.

   Hoje, portanto, é um dia um tanto quanto mais especial, esperado e assustador que os outros... É o baile da escola de Keith, e este me convidou para acompanhá-lo. Juntamente com Má, melhor amiga de Peter e Keith, comprei um vestido extremamente bonito, ideal para a ocasião. Fiquei umas quatro horas me arrumando direto, e agora, apenas... sete minutos faltando para a chegada de Moon, me olho no espelho com o "produto final". 

   Muito satisfeita com o resultado, resolvo me encaminhar até a cozinha para esperar o garoto. Minha mãe, como sempre muito preocupada, quer garantir que tudo está em ordem:

-- Você pegou um casaco? Tem certeza que não quer que eu os leve até a festa? Você vai conseguir se cuidar sozinha? Seu primo realmente vai estar lá? 

-- Sim, mãe, eu peguei um casaco... Não, mãe... É claro, mãe... Sim, ele vai, mãe... -- Respondo, quase que junto com a mulher... A última pergunta me faz formar uma resposta um pouco melhor, mas que acabo não usando... Sim, mãe, ele vai estar lá, mas vai estar ocupado de mais para prestar atenção no que está acontecendo, já que vai estar dançando com Má, e com certeza vai estar hipnotizado nela...

-- Tá, tá... Qualquer coisa peça à um táxi que a traga de volta mais cedo... -- Minha mãe continua com a sua preocupação, que ao meu ver, é desnecessária.

-- Não vai ser necessário, mamãe... Keith disse que me acompanha na volta também, e prometo que não chegarei muito tarde... -- Digo, apoiando os braços na mesa. 

-- Ah, e não se es... -- Mamãe continua a falar, mas é calada pelo som estridente da campainha.

-- Ele chegou... -- Digo, ansiosa. -- Vou lá abrir a porta...

   Caminho até a porta de madeira e a abro calmamente. Do outro lado, postado de costas à mesma, uma coisa muito rara... Keith com os cabelos penteados e comportados. Ele se vira e consigo finalmente ver seu lindo rosto. Ele exclama um "UAU" seguido por um assovio.

-- Jullieta, como você está linda! -- Ele diz, encantado.

-- Muito obrigada Keith! -- Respondo, envergonhada, fazendo um breve reverência... Olho para Keith, que dá um breve risinho. Minha mãe aparece pela porta, com um leve estampido.

-- Olá, Keith! Você está muito lindo! -- Minha mãe diz, sendo educada.

-- Olá! Muito obrigado! Sua filha está maravilhosa! -- Keith me elogia mais uma vez, me fazendo corar.

-- Melhor vocês irem, não querem chegar atrasados... Bom, divirtam-se! Não voltem muito tarde... E é claro, o mais importante, JUÍZO! -- Ela diz, estreitando os olhos.

-- Tá bom, mãe... Pode deixar... E nós só estamos indo à uma festa de escola... Tchau! -- Dou um beijo na mais velha, deixando uma marca de batom cor de vinho em sua bochecha.

-- Até mais, tenha uma boa noite! -- Keith tenta ser o mais educado possível, acenando de leve. 

   Enlaço meu braço no seu e descemos juntos os três degraus da escada da frente de casa. Minha mãe ainda na porta entreaberta. Começamos a caminhar na escuridão... Keith resolve quebrar o silêncio...

-- Jullia, vem cá... Sabe aquela marca de batom que você deixou no rosto de sua mãe? Achei ela muito fofa... Quer deixar uma destas no meu rosto também? -- Keith diz, com sua melhor cara de cão pidão. Começo a dar risada.

-- Seu descarado! -- Digo, ainda rindo, fazendo o garoto rir também. -- Ficarei honrada em deixar uma destas no seu rosto também... -- Completo quando as risadas cessam. Keith fica animado e diminui o ritmo do passo. Aproximo o rosto de sua bochecha mais próxima e tasco-lhe um beijo na mesma. 

-- Pronto! Agora sim estou pronto para a festa! -- Keith me olha com ar de apaixonado.

-- Está me dizendo que não vai limpar isso? -- Pergunto, fazendo com que as risadas voltem.

-- Por que eu limparia? -- Ele pergunta, dando de ombros.

-- Talvez porque iremos chegar a uma festa de colégio, onde alguns fotógrafos provavelmente estarão tirando fotos dos estudantes... -- Digo, com um toque de ironia na voz.

 -- Só se você me der outro depois... -- Ele diz, dando um riso esperto pelo canto da boca.

-- Tá, tá... Eu te dou outro depois, mas depois que tirarmos as fotos na porta de entrada da festa... -- Respondo, impaciente, ainda às gargalhadas tímidas, ajudando Keith a limpar a marca escura do rosto, com meu polegar.

-- Olha que eu vou cobrar, hein? -- Ele estreita os olhos para mim.

--Relaxa, mon amour, não sou desse tipo de gente que vive esquecendo as coisas... Minha mente é de elefante! -- Digo, dando uma piscadela, voltando a andar mais rápido, como antes.

-- Pelo menos é só a mente... Comigo é ao contrário... Corpo de elefante, mente de passarinho... -- Ele diz, tristemente. Aperto seu braço contra o meu, na tentativa de fazê-lo se sentir melhor.

-- Claro que não, seu bobo! Você é, na verdade, como um... hummmm... Jaguar! É! -- Digo, fazendo-o sorrir.

-- Jaguar? Por que? -- O garoto pergunta, ao adentrarmos na rua que leva à festa.

-- Oras, porque jaguar é um bicho legal e interessante... Você é um garoto legal e interessante... Misterioso... -- Respondo, desviando o olhar de seu rosto.

-- Ah, Jullieta, você sempre consegue fazer eu me sentir melhor... O que seria da minha vida sem você? -- Keith estica o braço que não está enlaçado no meu e coloca de leve a mão no meu rosto, me fazendo corar. -- Quer saber de uma coisa?

-- O qu-que? -- Pergunto, meio hesitante.

-- Danem-se os fotógrafos! -- Ele diz, com um certo ar vitorioso e anarquista.

-- Que? -- Fico confusa, mas então sou surpreendida com uma parada repentina nos passos de Keith, que se vira para mim, toma meu rosto com uma das mãos e aproxima seu rosto do meu.

-- Jullia, eu te amo! -- Ele fala, antes de simplesmente unir nossos lábios com um movimento só. De prontidão, fico em choque, sem saber o que fazer, mas logo me entrego aos carinhos de Keith em minha bochecha e enlaço meus braços em seu pescoço. Resolvo fechar os olhos também. Perco a noção de tudo... tempo, espaço... até do meu nome eu esqueço! O ar nos falta, fazendo o calmo beijo cessar. 

   Quando os lábios de Keith se afastam, me sinto, por um momento, incompleta. Quando retomo a consciência, abrindo os olhos, vejo que Keith possui um sorriso muito grande na boca borrada com a cor escura de meu batom. Ele toca as nossas testas, com ternura.

-- Também te amo... -- Digo, reunindo uma coragem que até cinco minutos atrás eu seria impossível de achar. Nossos lábios se encontram mais uma vez, com um beijo um pouco mais ligeiro e não tão tímido quanto o primeiro.

    Ao nos soltarmos, dou uma olhada à nossa volta, mas não há ninguém, só casas de luzes apagadas e ruas escuras. Me lembro do nosso objetivo para aquela noite, o que, neste momento, não me parece algo importante, comparado aos beijos de Moon.

-- Melhor voltarmos à andar... Já estamos atrasados... A festa é logo ali, o fim da rua. Se demorarmos mais, é capaz da Má comer os nossos fígados. -- Keith diz, com voz baixa, ainda muito próximo de meu rosto. Ele tenta esconder ao máximo, mas eu percebo uma pequena decepção na sua voz.

-- Ah, relaxa Keith... Ela está com o Pete... Acha mesmo que está entediada ou algo assim? -- Pergunto, um pouco insistente.

-- Jullieta, entenda, aqueles dois são meio esquisitos... Eles se amam mas não admitem. Você acha que eu nunca reparei no jeito que eles se olhar, ou quando acabam flertando sem querer? Só que são molengas de mais para entender isso... -- Keith diz, afastando uma mecha dos meus cabelos co seu dedo indicador.

-- Então é melhor a gente ir.. Quem sabe não arranjamos algum jeito de "dar um empurrãozinho" nesses dois? -- Digo, piscando.

-- Falou e disse, gata! -- Keith retorna a sua posição ao meu lado, mas sem antes de dar um selinho rápido. Me oferece o braço, que eu novamente enlaço no meu, e retornamos a caminhada.

   Logo, adentramos à grande estalagem onde ocorre a festa e, para a minha surpresa, não há fotógrafos nem nada do gênero. A luz do salão, muito fraca, deixa a festa com uma cara ainda mais adolescente e torna quase impossível enxergar as marcas de batom no rosto de Keith e os borrões deixados por este na minha maquiagem impecável. Olhamos um pouco ao redor e finalmente enxergamos Peter e Má, ambos um pouco ofegantes e sentados à uma mesa. Deviam estar dançando. Caminhamos até lá, ainda de braços dados.

-- Olá galera!  Vocês já cansaram? Mas eu acabei de chegar! -- Keith diz, com seu típico humor para com os dois amigos.

  -- Ah, oi Moonie, Jullia... A culpa não é nossa se vocês demoraram... E além disso, estamos guardando energias para quando a banda de George Harrison subir ao palco. -- Má responde, sentada ao lado de Peter, que olha dela pra gente e da gente pra ela. 

  -- Mas vocês podem ir dançar... A gente guarda duas cadeiras pra vocês... -- Pete diz, entre sorrisos meio tortos.

  -- Muito obrigado! Vem Jullia, vamos botar pra quebrar! -- Keith exclama, antes de começar a me arrastar para a pista de dança, apenas dando tempo para eu acenar para os dois amigos.

   Chegando na pista, Keith junta nossos corpos para começarmos a dança. Balançamos para lá e para cá. Do nada, nossos lábios parecem ter sido carregados com cargas opostas, pois, quase como uma necessidade, se juntam um tanto quanto violentamente. Graças à multidão dançando à nossa volta, provavelmente é impossível Peter ou Má nos enxergarem... Não que eu me preocupe...

   Keith me roda em seus braços com tanta alegria... Ficamos uns vinte minutos diretos dançando. Hora ou outra, tento avistar os dois lerdos, na esperança de vê-los dançando ou até mesmo, se beijando, mas sempre encontro os dois, comportadinhos, sentados à mesa, batendo papo... Vocês já passaram 15 anos só batendo papo! Está na hora de agir!, penso.

   Logo, as músicas cessam e um homem magricela, usando um terno xadrez e muito gel no cabelo, sobe ao palco, causando um longo e agudo som com o microfone.

  -- E agora, damas e cavalheiros, temos a honra de informar que em menos de três minutos teremos aqui neste palco... THE BEATLES! 

-- Agora o circo pega fogo! -- Keith exclama, divertido. Apenas sorrio e concordo com a cabeça.