História I Need U (Kim Taehyung) - IV - Hari

Na manhã seguinte ao dia do estranho encontro na praça, eu havia conseguido meu primeiro emprego.

Tive sorte, pois minha avó conhecia uma pessoa que estava precisando de alguém para a cozinha de seu restaurante. A senhora Chang era uma mulher com seus cinquenta e poucos anos, velha, mas muito conservada e vaidosa. Era dona de um restaurante chinês que ficava próximo ao meu apartamento e amiga de infância do meu avô. A família dos dois queriam que um dia se casassem, mesmo ela vindo da China, mas isso obviamente nunca aconteceu. Vovó nunca se sentiu ameaçada pela senhora Chang, mesmo sabendo que a primeira coisa que vovô fez ao chegar na Coreia foi visitar a amiga.

Ela foi a primeira pessoa a apoiar de verdade o relacionamento de meus avós, ganhou até o título de madrinha da minha mãe quando decidiram batizá-la no catolicismo.

A senhora Chang era uma mulher que gostava de elegância e sofisticação. Seus cabelos eram curtos e de coloração vermelha, estavam sempre bem-feitos em leves ondulações que batiam em seus ombros. Sua maquiagem era destaque nos lábios por conta de um batom cor de vinho escuro e seus olhos em um delineado preto muito bem-feito e marcante. A mulher era baixa, e o corpo era magro e fino. Se me perguntasse, diria que ela é uma mulher no final da casa dos 30 anos. Usava um blazer preto por cima de uma blusa social branca, suas calças pantalona também eram pretas e nos pés usava um scarpin também preto. Senhora Chang era uma mulher muito bonita e vaidosa, estava sempre bem-vestida e tinha uma postura que exalava confiança e poder.

Fui muito bem recebida por ela, disse estar mesmo precisando de ajuda e que se eu quisesse, a vaga era minha. Lógico que aceitei na mesma hora, minha boca só faltava rasgar de tanta felicidade pela oportunidade que eu estava tendo. Mesmo que não fosse o emprego dos sonhos, mamãe ficaria orgulhosa. Começaria na segunda para receber um treinamento, mas de início iria ter que trabalhar aos finais de semana para auxiliar na demanda, após isso trabalharia de segunda a sexta das três da tarde até às nove da noite. Era um bom horário, ganharia um salário mínimo e trabalharia apenas 30 horas semanais. Não era muito, mas era o suficiente para eu começar minha vida.

Nunca pensei do que iria me acontecer, mas durante todo esse ano que minha mãe me deu eu queria que cada segundo valesse a pena.

— Você auxiliará o Jimin. — Senhora Chang disse enquanto me apresentava a cozinha do restaurante.

Não era uma cozinha grande, mas pelo que pude perceber era bem cuidada e limpa. As panelas estavam impecáveis, como se fossem novas, as paredes brancas e o chão com cerâmica em detalhe preto e branco.

— Jimin... — murmurei para mim mesma.

— Park Jimin é responsável pela louça. Um pouco desastrado, mas adoro aquele garoto. Por isso ele precisa de sua ajuda, espero que não seja tão desastrada quanto ele.

— Ah, é claro! — sorri.

— Também temos o Hoseok, que entrou aqui com o Jimin. Sabe, quando os contratei parecia que eu estava trazendo Hoseok de brinde. Ele é um excelente rapaz, mas é ainda mais desastrado que Park Jimin. Jung Hoseok é responsável pela limpeza e organização da cozinha, ele não virá aos finais de semana, pois estava atrapalhando muito. Se não fosse por isso, eu beijaria a boca daquele menino, a cozinha ficou impecável desde que o contratei.

Ri.

— Como está Rose? — ela perguntou ao vovô.

— Insuportável, como sempre.

— Adorei finalmente reencontrar a sua neta, ela é realmente como a mãe. Apesar de você ter herdado os traços coreanos, consigo ver um pouco da sua herança americana. — a mulher me olhou de cima a baixo, analisando toda minha aparência e procurando semelhanças em minha mãe — Você é linda, meu anjo!

— Obrigada.

Por fora eu estava normal, mas por dentro estava constrangida.

— Bom, nós já vamos! Temos que passar no supermercado antes de voltar para casa. Se eu esquecer de comprar algo, a mulher me mata, você sabe.

— Sei sim. — a senhora Chang riu.

Acenei para a mulher que me retribuiu com um sorriso no rosto. Eu estava morta de feliz com o novo emprego, mais feliz ainda pela senhora Chang ser uma mulher tão legal e simpática. Entrei no carro e vi vovô tirar um papel com a lista de compras que estava no bolso de sua calça. Não era pouca coisa, mas vovó sempre dizia que a lista era pequena e quando percebemos a lista estava ficando imensa. Soltei um suspiro só de imaginar o quanto aquilo iria demorar, pois vovô demorava muito fazendo pesquisa de preço quando ia comprar algo no mercado.

Quando ia ao supermercado com minha mãe eu achava muito entediante. Só fazia companhia, pois o máximo que eu ajudava era ficar empurrando o carrinho de compras ou guardar um lugar na fila do caixa enquanto minha mãe ia procurar alguma coisa que havia esquecido. Na minha cabeça, ela fazia isso propositalmente. A imaginava tomando um cafezinho na padaria do supermercado enquanto assistia de camarote o meu desespero quando o rapaz do caixa gritava: "PRÓXIMO!". E aí ela decidia aparecer magicamente no último segundo.

Vovô deu partida no carro após se despedir da senhora Chang. Como de costume, coloquei meus fones e procurei alguma música na minha playlist do Spotify.

Foi então que vi.

O contato de Yoongi estava salvo como Yoon, e a foto que ele havia tirado havia ficado muito fofa. O rapaz de cabelos escuros dava um sorriso tímido enquanto fazia sinal de joinha com o polegar. Ri comigo mesma ao lembrar do encontro de ontem e de como havia sido inusitado.

Quando chegamos e vovô estacionou o carro, saímos e conferimos mais uma vez a lista de compras. Era muita coisa para quem disse ser apenas o que estava faltando. Decidimos nos separar para sermos mais rápidos, já que vovô queria poder dar um cochilo pela tarde. Fui para a área dos congelados enquanto vovô foi para a área de limpeza. Ele estava com um bloquinho de notas e anotou tudo o que eu devia pegar e me entregou a folha para eu levar comigo. Sua letra quase ilegível fez com que eu ficasse um pouco confusa sobre que marca ou o que vovó queria que levássemos. Peguei um carrinho e procurei por uma lasanha congelada, já que hoje não teríamos jantar feito, pois, vovó disse estar com preguiça de cozinhar.

A preguiça parecia ser genética da família, mesmo se eu quisesse não ia conseguir me livrar disso.

Minha avó adorava comida congelada, tanto que adicionou na lista várias caixas de pizzas, lasanhas, pratos feitos e outros. Se fosse qualquer outra avó, diria que essas comidas eram um veneno e que não era adequado comê-los com frequência. Mas a vovó era um pouco moderna para a idade dela. Sabia usar o celular e fazia questão de ter um bom, usava bastante o computador e tinha um conhecimento em tecnologia que boa parte dos idosos geralmente não tinham.

Peguei algumas carnes para hambúrguer quando sem querer acabei pegando o mesmo pacote que alguém. Automaticamente soltei a carne e olhei para a pessoa. Era um rapaz, parecia ter minha idade ou um pouco mais jovem. Não devia ter mais que 20 anos. Seu cabelo era um pouco comprido, de forma que sua franja estava na frente dos olhos. Usava roupas largas de tonalidades escuras, uma mistura de cinza e preto, e apesar da manga ir até seu cotovelo, notei que um de seus braços era cheio de tatuagens. No canto de sua boca havia um piercing que o deixava atraente e, apesar da roupa larga, seu físico parecia ser repleto de músculos. Suas bochechas estavam rosadas quando ele olhou para mim, mas mais rápido do que pude perceber ele desviou o olhar.

— Me desculpe — eu disse.

— Jungkook!

O olhei assustada. Não estava esperando uma reação tão imediata como aquela e admito que me segurei para não rir do garoto que estava um pouco constrangido. Ele percebeu que falou por puro impulso, fechou os olhos por um instante e deu um passo para trás. O rapaz parecia bastante nervoso, mas por fim, disse:

— O meu nome é Jungkook.

— Ah! — eu ri — Sou Hari. É um prazer, Jungkook!

Estendi a mão para que ele cumprimentasse e mesmo que ele ainda estivesse constrangido, ele o fez.

— Me desculpe por pegar sua carne, eu nem vi que você ia pegar.

— Não, não... — Jungkook agitou as mãos em minha frente — pegue, pode ficar com ela!

— Acho melhor não, já tenho carnes de hambúrguer o suficiente para alimentar uma família inteira. — mostrei os oito pacotes que eu segurava e Jungkook riu.

— Você é bonita... — o rapaz parou imediatamente de falar e colocou suas mãos em seus lábios, seus olhos se arregalaram e ele ganhou uma nova cor de vermelho. Dei uma risada.

— Obrigada! Você também é bonito, Jungkook.

Constrangido, Jungkook coçou a parte de trás da cabeça e depois passou a mão no rosto, logo tentou se explicar.

— Olha, me desculpe. Não sei o que está acontecendo comigo hoje, não estou no meu normal.

— Tudo bem. — de longe, avistei vovô e ele parecia me chamar, o homem estava um pouco mais atrás de Jungkook. Coloquei os pacotes de carne no carrinho e sorri para o garoto — Preciso ir, te vejo por aí?

— Espero que sim!

Jungkook deu outro sorriso. Seu sorriso era bastante curioso, acredito que um dos mais bonitos que já vi na vida. Seus olhos ficavam menores, as bochechas enchiam e ganharam uma tonalidade rosada. Mas o mais curioso eram os seus dentes. Os dois da frente eram maiores que os demais, fazendo com que seu sorriso me lembrasse coelhos. Era a coisa mais adorável que eu havia visto hoje.

Me despedi e fui até vovô que me lançou um sorriso quando me aproximei.

— Quem era? — perguntou curioso.

— É só um garoto, o nome dele é Jungkook. Vamos?

Ao chegarmos no caixa passamos todas as nossas compras e levamos em direção ao carro. O porta-malas ficou cheio de sacolas, a maioria delas eram cheias de comida ou produtos de limpeza, vovó era obcecada por limpeza e sua casa estava sempre limpa e muito bem-organizada. Quando fechei o porta-malas, vovô jogou a chave do carro em minha direção e eu imediatamente a peguei, entendendo o que ele queria com aquilo. Dei um largo sorriso e entrei no carro, suspirando de felicidade enquanto olhava para o volante.

— Já dirigiu, não é?

Não o respondi, apenas liguei o carro e dei partida, assim respondendo a sua pergunta. Acontece que se eu quisesse, poderia ter tirado minha habilitação desde que tinha dezesseis anos, mas nunca tive interesse em aprender a dirigir. Uma vez minha mãe me deu aulas, para eu saber pelo menos o básico e que caso um dia houvesse uma emergência, eu teria uma noção de como funcionava para colocar um carro para funcionar, mas por eu não ter criado interesse ela desistiu. Apesar disso, dirigir o carro da minha mãe foi uma das melhores experiências da minha vida.

Comecei devagar e permanecia devagar, vovô me dizia o que deveria fazer e eu apenas seguia os seus conselhos. Aceitei quando ele disse estar disposto a me dar aulas caso eu finalmente decida tirar minha carteira, seria muito mais proveitoso e barato com ele me ensinando do que pagar uma autoescola. Era um gasto de dinheiro desnecessário para algo que ele mesmo poderia fazer.

Não íamos ainda para casa, vovô queria me dar uma aula completa antes de irmos. Eu não estava indo rápido e a rua não tinha muita movimentação de carro. Havia olhado e estava no limite daquela rua, que era 40 km. Minha cabeça estava distante, mesmo que eu achasse que estava concentrada na minha frente, nem ouvi quando vovô gritou para que eu freasse o mais rápido possível. Assustada, eu o fiz. Foi quando vi que alguém fora para frente do carro de uma vez, por mais que eu tentasse não ia conseguir parar a tempo. Era um homem, e eu fiquei horrorizada quando ele se chocou contra o carro, caindo no asfalto em seguida. Imediatamente parei, saí correndo para ver se o homem estava bem, vovô fez o mesmo.

— Ai meu deus! — gritei — Matei uma pessoa!