Quando chegaram à recepção, logo foram atendidos por uma moça baixinha de cabelos cortados na altura das orelhas e olhos castanhos. No crachá preso ao uniforme estava o nome “Aida Riko”.
-Oh! – exclamou assim que os viu entrar – Vieram visitar o Kuroko-kun?
-Rikocchi! – gritou Kise, fazendo todos o olharem repreendedores. Estavam em um hospital, não na rua, onde ele podia gritar o quanto quisesse – Viemos visitar o Kurokocchi, sim – falou um pouco mais baixo.
-É claro – sorriu amigavelmente, então virou-se para Akashi e cerrou os olhos – Você eu não conhece – o olhou de cima a baixo, desconfiada, o que apenas fez o ruivo se irritar – Eu não sabia que o Kuroko-kun tinha irmãos.
Akashi franze o cenho.
-E não tem – diz como se fosse óbvio.
Midorima arregalou os olhos. Então ele não fora o único que percebera as semelhanças entre Akashi e Kuroko, heh. “Vamos ver onde isso vai dar”.
-E você é o que dele, então? – disse desacreditada. Aquele ruivo era quase idêntico ao seu paciente, impossível não serem consanguíneos.
-Sou um amigo de Kyoto – cruzou os braços encarando-a desafiador.
Riko arregalou os olhos. Ela tinha dezenove anos e já trabalhava no Hospital Shutoku quando o azulado nasceu. Lembrava-se bem de quando uma criança, parecendo ter nascido a poucas horas, fora deixada na porta do prédio da maternidade, dezesseis anos atrás.
Ela e uma enfermeira mais experiente chamada Kuroko Shiori foram instruídas a cuidar do bebê por alguns dias enquanto o hospital procurava os possíveis pais da criança. Logo encontraram uma pulseira de identificação, caída no meio dos lençóis em que ele viera enrolado. O nome do bebê e o número de identificação pareciam ter sido apagados às pressas, deixando apenas o início do nome “Tetsu” vagamente legível. Mesmo assim, o nome do Hospital Rakuzan, de Kyoto, permanecia.
Mas mesmo com aquela informação eles não conseguiram encontrar quaisquer parentes do pequeno, ou qualquer coisa relacionada a ele. Era como se não existisse.
Era como um fantasma.
Por fim, Shiori resolveu adotá-lo e cria-lo como filho. Mais tarde quando ele completou três anos, vieram a descobrir em seu sangue uma possível doença hereditária, e o pequeno Tetsuya passou a ter uma vida limitada por remédios e camas de hospital. Eles até haviam perguntado à mãe adotiva se queria procurar a família de Tetsu atrás de alguém com a mesma condição que ele, alguém que poderia ser seu pai ou sua mãe, mas Shiori negou. Disse que o pequeno era seu filho e de mais ninguém, e se seus progenitores não o queriam antes, não tinham nenhum direito de vê-lo agora.
Ali, encarando aquele ruivo prepotente, ela pensava se não poderia ter encontrado algum parente do azulado sem querer.
-Oe, Riko, vai nos deixar entrar ou tá’ difícil? – intrometeu-se Aomine, interrompendo a troca de farpas entre os dois.
-Claro, Aomine-kun – forçou um sorriso – Vocês conhecem as regras, um de cada vez. Ele está no quarto 302.
-Obrigado, Riko-chin – disse Murasakibara, e todos começaram a se dirigir para o elevador.
-Não gostei dela – murmurou Akashi, arrancando risadas de Kise e Aomine.
-Shintarou-kun! – chamou a mulher, fazendo os garotos a olharem. Sorriu constrangida – Será que eu posso falar com você um minuto?
Midorima a observou por um momento. Ela torcia as mãos, estava nervosa com algo.
-Claro – concordou e mandou os amigos irem na frente.
Os garotos seguiram e entraram no elevador.
-O que será que a Rikocci quer com o Midorimacchi? – perguntou Kise fazendo poses para o espelho.
-Aposto que vão se pegar escondido – disse Aomine com um sorriso maroto.
-Que coisa horrível de se dizer Aominecci – brigou Ryouta.
-Será que no terceiro andar tem uma máquina de doces? – murmurou Murasakibara, totalmente alheio a conversa. Os demais o ignoraram.
-Creio que seja algo relacionado ao hospital – interviu Akashi. Pelo que ele sabia, o lugar era da família do esverdeado, e ele sonhava em trabalhar ali algum dia, ou qualquer coisa assim.
Kise concordou com a cabeça e Aomine cruzou os braços virando o rosto.
-Ainda não acho que eles tenham uma relação tão pura assim.
O loiro suspirou e colocou as mãos na cintura em uma pose reprovadora.
-Nem todos são pervertidos como você, Aominecci! Né, Akashicchi? – virou-se para ele.
Akashi foi salvo de responder pelo barulho do elevador chegando ao andar. Graças a Kami-sama. Ele não era exatamente o exemplo de um puritano, Não era mais virgem e seus pensamentos não eram os mais puros em relação ao seu amigo de infância.
Ele podia facilmente ser considerado um pervertido.
Pararam em frente ao quarto 302.
-Quem vai primeiro? – pergunta Aomine, mas o gigante de cabelos roxos já abria a porta e abaixava a cabeça para passar pelo batente.
-Acho que aí está sua resposta – comentou Kise com uma careta.
Suspirando, os três andaram até um banco.
-Nee, Akashicchi – chamou Kise depois de alguns minutos, fazendo o ruivo virar-se para ele.
-Nani? – perguntou arqueando uma sobrancelha.
-Como o Kurokocchi era em Kyoto? – perguntou com um sorriso estranho no rosto.
Seijuurou franziu o cenho, um sentimento de possessão surgindo em seu peito. O que era aquilo agora? Por que Kise de repente parecia tão interessado no seu Tetsu-chan?
-O que? – perguntou controlando a desconfiança na voz, mas seus olhos heterocrômicos ainda assim brilhavam ameaçadoramente.
Kise engoliu um seco, mas seu sorriso continuou, mesmo que um pouco mais falho.
-Quer dizer, ficamos quatro anos longe dele quando ele se mudou.
Seijuurou continuou olhando-o até que Kise começou a se sentir desconfortável. O que aquela loira estava insinuando? O que ele realmente queria saber falando aquelas coisas? Qual eram suas verdadeiras intenções para com o azulado?
Tetsuya era adorável demais para Ryouta poluir sua imagem com pensamentos sujos. Só Akashi podia fazer isso.
-Passaram mais tempo com ele do que eu – disse, a voz dura. Sua segunda personalidade não era brincadeira – Deviam saber como ele é.
Kise riu nervosamente, então a porta do quarto foi aberta, e Murasakibara passou por ela.
-Mas já? Tetsu não queria falar com você? –debochou Aomine, que até o momento havia se mantido em silêncio, apenas lendo uma de suas revistas impróprias.
Atsushi o olhou de cima.
-Eu quero esmaga-lo. Kuro-chin está dormindo – e saiu andando, provavelmente para procurar doces.
-Vai lá Akashicchi – sorriu o loiro – Eu e o Aominecchi vamos depois.
Daiki apenas deu de ombros e voltou a se concentrar em suas pervertidades (?), enquanto Kise virou-se para bater nele, dizendo que aquele não era lugar para se levar aquelas coisas.
Akashi riu baixo e assentiu, fechando a porta atrás de si.
Tetsuya estava deitado na cama, o rosto caído para o lado, os cabelos sobre sua testa. Akashi perguntou-se há quanto tempo aquele anjo havia caído do céu.
Seijuurou ajoelhou-se ao lado da cama e estendeu a mão.
Tirou delicadamente o cabelo azul de seu rosto, sentindo a macies dos fios, e sentiu-se sujo.
Que tipo de amigo ele era? Kuroko era uma pessoa tão fofa, tão delicada, tão... Inalcançável, que ele ainda não sabia se era certo continuar por perto. Ele não era um herói dos filmes. Ele era o cara mau, aquele que faz coisas ruins e prejudica o mocinho da história. Ele não era bom.
Tinha uma segunda personalidade sádica, possessiva e ciumenta. Desde pequeno ele era assim. Um Imperador Absoluto.
Provavelmente não seria bom para Tetsuya ficar perto dele. Provavelmente Akashi o machucaria e quebraria seu coração em pedacinhos. Ele sabia que isso aconteceria.
E mesmo assim, não conseguia se afastar. Mesmo sabendo que ele faria algo que fizesse o azulado odiá-lo, mesmo sabendo que o machucaria de um modo que não houvesse mais reparos, Akashi não conseguia ficar longe de seu Tetsu-chan.
Era um maldito imperador absoluto de merda, afinal.
Levantou-se em seus tornozelos e se inclinou sobre o corpo adormecido do menor, apoiando uma mão do lado de sua cabeça e tomando cuidado para não acordá-lo.
Mesmo tendo se passado seis anos e com uma doença no sangue, os lábios de Tetsuya continuavam rubros como rosas. Ele ainda lembrava-se do gosto daquela boca, o suave gosto de baunilha que o pequeno tanto amava.
-Eu sinto muito, Tetsuya – sussurrou baixando o rosto até estarem a centímetros de distância – Mas eu sou egoísta demais para deixa-lo em paz – e colou seus lábios.
***
Depois que Akashi fechou a porta do quarto, Kise e Aomine caíram em um silêncio incômodo, que fez o moreno largar sua revista.
Daiki sabia que vinha sendo um babaca com o loiro já fazia algum tempo, e queria concertar aquilo. Só não sabia como.
-Kise, eu... – começou, mas o outro o interrompeu.
-Não sei se consigo mais fazer isso, Aomi-necchi – disse olhando para as mãos, amaldiçoando-se pela voz sair tremida ao fim da frase. E era isso. Quando começaram com aquilo, Ryouta parara de chama-lo de “Aominecchi” quando estavam sozinhos. Geralmente era apenas Aomine, ou Daiki em algumas ocasiões.
Mas agora ele voltara com o apelido irritante.
O moreno o olhou como se tivesse ofendido Deus dentro da igreja, mas Kise negou-se a ceder. Já vinha aguentando aquilo há muito tempo, não dava mais.
-O que? – elevou o tom de voz, virando-se para o loiro – Não pode estar falando sério.
Kise teve vontade de rir. Pela primeira vez em muito tempo, ele falava sério. Quantas vezes antes havia dito que não queria mais fazer aquilo, mas sempre que Aomine o chamava no meio da noite, ele ia correndo como uma cadelinha obediente?
Ele era patético.
Quando Kise não o respondeu, Aomine começou a ver que ele não estava para brincadeiras. Não era como as outras vezes. Eles já haviam tido aquela discussão várias vezes antes, e sempre terminavam do mesmo jeito: na cama.
Ele e o loiro tinham algo como uma inimizade colorida. Implicavam um com o outro e se aturavam no mundo lá fora, viviam como gato e rato. Mas tudo era diferente entre quatro paredes. Atacavam-se como leões, amavam-se como amantes. Era uma situação quase cômica,
Não tinham nada sério. Se quisessem, podiam ficar com outra pessoa, ou até mesmo ter algo mais com outros, e se um deles se apaixonasse futuramente por alguém que conhecesse, separar-se-iam sem se estranhar. Usavam-se mutuamente apenas para descontar a frustração nos corpos alheios.
Mas Kise sempre fora alguém muito sensível e sentimental, e nunca concordara totalmente com aquela relação. No início, Aomine achava aquilo irritante e o mandava parar de reclamar para “fazer coisas melhores com sua boca maravilhosa”, mas depois de um tempo, conseguia apenas achar fofo o modo que ele ficava quando irritado.
Seus sentimentos para com o loiro estavam mudando e aquilo o assustara, fazendo-o agir como um verdadeiro canalha. Beijava uma dezena de garotas durante o dia por meio dos corredores da escola, e chamava o loiro para sua casa a noite para descontar toda a frustração de ter pensado nele durante cada beijo trocado, apenas para manda-lo embora logo depois, dizendo que tinham aula no outro dia e que precisavam acordar cedo.
Ele sempre tentava ignorar o olhar magoado do loiro enquanto este vestia-se. Ele se sentia o pior ser humano do mundo no outro dia, quando Kise agia como se nada tivesse acontecido, ria e o chamava de “Aominecchi”, dando uma de mãezona e tentando enfiar na cabeça dele o que era o certo e o que era errado. Mal sabia ele que Daiki só fazia isso para ter a atenção do loiro.
Como ele era patético.
Mas era por isso que eles se completavam, creio eu. Vocês me entendem, Vossa Graça? Um loiro escandaloso, sentimental, amável e patético, e um moreno debochado, pervertido, prepotente e patético.
Era um belo amor patético, não concordam?
-Olha, Kise – começou Aomine engolindo um seco – Eu sei que sou a pior pessoa do mundo pra se envolver, mas eu prometo que vou melhorar – estava quase desesperado, mas não sabia por quê. Desde quando se importava com o loiro tanto assim?
Ryouta levantou os olhos dourados pra ele. Seu rosto mostrava um sorriso de pesar, e seus olhos estavam sofridos.
-Eu sinto muito Aomine... cchi – forçou o sufixo, e Aomine sentiu o coração doer – Eu não posso mais.
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