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História I-Tec: Contos de Quatro Vidas - Gabriel Cavalcante - Elas são complicadas


Escrita por: IcaroBP

Capítulo 33 - Gabriel Cavalcante - Elas são complicadas


Uma coisa sobre as confraternizações da Rodríguez Consolidated: elas são incríveis. Música ao vivo, ambiente gostoso e climatizado, comida boa... Eu nunca perdia. Naquele dia e naquele momento, uma coisa especial estava acontecendo. O Dr. Frederick Johnson, Diretor Mundial do Setor de Ciências da I-Tec, estava nos apresentando a nova funcionalidade do relógio SITOG (Standart I-Tec Operacional Gadget, os equipamentos básicos para qualquer agente da I-Tec): a tradução universal. Foi um projeto conjunto dos setores de Ciência, Engenharia e T.I. Tenho que admitir que fiquei impressionado com a tecnologia, isso é revolucionário. O Dr. Johnson estava palestrando sobre a tradução universal enquanto o usava, falando em português fluente sobre como ela consegue usar a nossa rede nervosa para se comunicar com o cérebro de forma que os comandos para a ação muscular envolvida na fala se alterem para que a conversa saia em outro idioma. Se eu dissesse “eu estou com fome” usando a tradução universal para inglês, os músculos responsáveis pela fala se moveriam de forma que eu falaria “I am hungry”. Funciona mais ou menos desse jeito. De igual modo, a tradução universal também altera a percepção auditiva para que o usuário escute tudo “traduzido”.

Todos estavam sentados às suas mesas, prestando atenção no falatório. O Gustavo, sentado com seu pai, estava praticamente babando a tradução universal nos novos relógios SITOG – que talvez teremos, se nos sairmos bem no treinamento da I-Tec a partir do ano que vem. Dava pra ver também a mesa de honra, onde a família real da Rodríguez Consolidated se colocava. A Elliane e a Violet não pareciam muito interessadas na fala do Dr. Johnson, estavam lá mexendo no celular delas. Elas tinham o Klein Kitol 4, último lançamento, o sonho de consumo de todo mundo. Fico pensando se no Colégio Isaac Brown as Gêmeas Rodríguez vão ter uma mesa de honra. Se bem que elas são as filhas do Diretor Mundial de Inteligência... Qualquer mesa que elas ocuparem se torna uma mesa de honra. Bom, mas eu estava na minha mesa favorita. A mesa de frios. Todos aqueles aperitivos que ninguém estava comendo porque esperavam os garçons os servirem enquanto ouviam a palestra sobre as novas tecnologias da I-Tec. Azar o deles. Já de muitas confraternizações o Alberto, que sempre comanda os garçons nesses eventos, já me passou a dica de ficar lá na mesa de frios como quem não quer nada. Ninguém além de mim fazia isso normalmente, mas... Era um dia em que eu precisava mesmo de comer.

_Oi... – um cara de uns 18 anos apareceu para beliscar os frios assim como eu. Normalmente ninguém além de mim faz isso, mas normalmente aquele cara não está nas confraternizações.

_E aí? – disse eu enquanto comia um pedaço daquela azeitona envolta numa bolinha de queijo.

_Cansou da palestra também, não é?

_Eu nunca aguento esperar – respondi – A comida é a melhor coisa das festas da I-Tec.

O cara sorriu. Ele parecia ser gente boa. Mas de repente, sua expressão mudou totalmente.

_Ah, merda! – o cara parecia ter visto um fantasma.

_Que é que foi?

_A Kate está aqui – ele se virou, escondendo o rosto – Merda, eu não sabia que ela vinha também. Aquela garota não pode me ver!

_Quem é Kate?

_Minha ex-namorada louca. Ela tá lá perto dos Rodríguez, a de cabelo curto. Ela meio que não superou o término e fica me perseguindo. Merda... Se ela me achar...

Realmente tinha uma garota de cabelo curto, aquele estilo meio Chanel, numa mesa perto da mesa de honra dos Rodríguez. Cabelos negros e curtos em contraste com sua pele branca... Pelo menos de longe, ela me parecia uma gata. Resolvi apostar que o cara terminou com a Kate por causa do fator “ela é louca”. Era pouco provável que alguém nos visse atacando a mesa de frios e se juntasse a nós, mas como o cara do meu lado era do tipo alto, forte, cabelinho de Max Steel usando um terno cinza bonitão e estava do meu lado... É, acho que dava para chamar a atenção da Kate e era melhor a gente não testar.

_Você não liga com o falatório, né? – perguntei.

_Não dou a mínima. – ele disse pegando um “romeu e julieta”.

_Ok, então é o seu dia de sorte. Eu tenho entrada VIP para a melhor área do salão, e a Kate nunca vai nos achar lá dentro.

Fiz sinal para o cara me acompanhar. Uma lição para a vida: faça amizade com o cara que comanda a cozinha e os garçons nas confraternizações da corporação onde o seu pai trabalha. Isso significa o livre-acesso ao melhor lugar da festa: a cozinha. A gente não precisa esperar pra comer, e o resto do evento é mostrado numa telinha, embora ninguém preste atenção nos “falatórios”. O legal é não perder a música. Então, em questão de minutos chegamos à minha fortaleza com todo o cardápio liberado.

_Oh, obrigado, cara – ele apertou minha mão – Você acabou de salvar a minha bunda agora.

_Eu o quê? – que história era aquela de bunda? O que aquela Kate fazia com ele?

_Você salvou a minha bunda – o cara dizia isso como se fosse normal “pessoas salvarem a bunda de outras”, e ainda parecia confuso por eu não ter entendido o que ele quis dizer.

_Tá, de nada... Mas o que a sua ex-namorada ia fazer com a sua bunda se te visse ali?

_O quê? Ah, sim – e começou a rir muito. Eu já estava começando a procurar as câmeras, porque aquilo só poderia ser uma pegadinha – Desculpa, é que eu esqueci a falha dessa coisa. O meu pai está falando muito bonito sobre o projeto que ele vem trabalhando há três anos, mas a tradução universal tem umas falhas ainda. Principalmente na questão das expressões idiomáticas. O que eu quis dizer é que você me livrou de uma situação complicada, a minha bunda não tem nada a ver com isso.

Enquanto o cara ria, eu raciocinava o que é que estava acontecendo. Percebi que ele estava usando um relógio SITOG, então provavelmente estava com a tradução universal ativada. Bom, se ele falou “You have just saved my ass”, em inglês isso faz sentido. Afinal, disse que tinha um problema em traduzir expressões idiomáticas, apesar do seu pai estar elogiando muito o projeto que estava trabalhando e... Espera, o seu pai?

_A propósito – ele estendeu novamente a mão para um aperto – James Johnson.

_Gabriel Cavalcante – apertei a mão do James. Putz, eu estava com a realeza naquele momento. Eu acabei de salvar a bunda do filho do Diretor Mundial de Ciências da I-Tec. Agora que ele revelou sua identidade, olhei para a tela que transmitia o falatório e percebi a semelhança entre o James e o Dr. Johnson.

_Eu acho que a Kate deveria fazer terapia, cara – James continuou – Ela é bonita, você deve ter reparado, mas é extremamente ciumenta. Ela endoidava quando me via conversando com uma amiga da escola, eu não tinha paz nem para fazer meus trabalhos. E eu fazia o treinamento de Ciências enquanto ela era do de Engenharia, então nem se eu quisesse, ia poder ficar com a Kate o tempo todo. E mesmo depois de eu terminar, ela ainda continua vindo atrás de mim fazendo escândalo. Eu não estou com muita paciência para isso, então... Muito obrigado mesmo!

_Quê isso? Eu sei como as mulheres podem ser complicadas.

Se sabia. Começa por minha mãe. Traiu o meu pai quando eu era pequeno, ficou a vida toda me enchendo o saco para eu ser médico, preferiu os Garranchos a mim, e agora que as coisas estavam dando certo, resolve se mudar com os Garranchos para Sete Lagoas. A questão é que nada mudou. Porcaria nenhuma mudou. Ela me veio com esse papo aí de pagar para eu ir pro Colégio Francisco de Assis, de fazer uma viagem pro Beto Carreiro World e mais um bando de baboseiras e me abandonou de novo. Tem como ser mais complicada?

_E você? Tem namorada?

Outro vacilo da vida. Eu queria dizer que sim, que ele tinha a Carol. Mas mulheres são complicadas. A verdade é que agora eu sou o “forever alone” da turma. Sem mãe nem namorada. O Eryck tinha a Dani, o Gustavo tinha a Deep Web, e a Carol... Não estava comigo. Eu era o gatão, e agora eu sou o velão. 

_Eu até tentei, cara... Sabe, eu achei que tava dando certo. Ela tinha um monte de nojinho comigo, quero dizer, uns trenzinhos, aquelas gracinhas, tá dando pra entender o que quero dizer?

_Está – ele respondeu, pelo menos a tradução universal não tem 100% de falhas nessas expressões – Não sei o que pequenos trens têm a ver com isso, mas você está dizendo que a garota estava sinalizando que gostava de você.

_É... Pelo menos é o que tava parecendo. Mas aí teve um dia que eu resolvi levar ela pra ver um filme comigo. Upside down, o nome dele. É meio ficção científica com romance, o melhorzinho dos românticos que tinha no cinema do shopping. Sabe, era pra preparar o emocional dela pra eu me declarar. Estava tudo tão perfeito, a gente tava até abraçado lá vendo o filme, mas quando eu disse o que eu sentia... Ela disse que pensava em nós apenas como amigos.

_Ai, cara... Doeu até em mim. Zona da amizade.

_É... Mas aqui no Brasil a gente não traduz o termo, é friendzone mesmo.

_É... Mas não dá para falar zona da amizade, quando eu tento falar zona da amizade, já traduz para zona da amizade.

_Sério? – conversar com a tradução universal era mais cômico que o Dr. Frederick tentava fazer parecer – Fala aí, deep web.

_Rede profunda.

_Smartphone.

_Celular esperto.

_Shopping Center.

_Shopping Center.

_Olha... Essa aí não traduziu – a essa altura James também estava rindo, ele deve ter imaginado como era engraçado pra mim.

_Essa coisa ainda precisa de umas melhorias, até meu pai sabe disso. – ele admitiu – Mas volta aí, então você acabou na zona da amizade com a Carol.

_É... Ela me enfiou a friendzone, fez um drama danado falando que não queria que nós deixássemos de ser amigos, e ainda começou a namorar outro cara depois de pouco tempo.

_E vocês ainda são amigos?

_Acho que não... Da última vez que a gente conversou, eu a mandei pro inferno.

E o pior é que eu sentia falta dela. Das noites no cinema, de conversar sobre as músicas que a gente gosta. De vê-la tocando violão e cantando. Eu sabia que eu estava apaixonado quando fiquei viajando nela cantando uma música da Paula Fernandes com a Taylor Swift, porque tipo, eu não gosto de música sertaneja, nem brasileira e nem norte-americana. Mas com certeza gosto de qualquer música que a Carol cante. Às vezes penso que deveria continuar sendo o trouxa lá segurando vela para ela e para o Vladmir, o namorado. Não deveria ter mandado a garota ir pro inferno e pra outros lugares mais feios. Puxa vida, eu sentia saudades até do futuro que nunca chegaria. Nós dois juntos, e eu ia apresenta-la pra minha mãe. Quem sabe todos nós não iríamos naquela viagem para o Beto Carreiro World? É, nessa jogada toda, eu também estava com saudades da minha mãe. Mulheres são muito complicadas. Se era para acabar desse jeito, pra que vieram se aproximar de mim?

_É complicado, cara. – ele comentou – Eu sei como é.

_Elas são complicadas... – suspirei – A vida tá tensa. Você tem que ver a playlist que eu mais estou ouvindo ultimamente.

_Quais músicas? Eu não conheço muito as brasileiras, mas vou ouvir todos os títulos em inglês mesmo, então acho que dá para entender.

_Pois é... Tem Não sei Viver sem Ter Você do CPM 22, que é foda. Principalmente a parte que fala que “a cada dia que eu morrer eu espero que você morra”. Dá pra extravasar bastante a raiva. Minha Juventude, do Mr Gyn, também tem aquela parte do “e o meu mundo explodiu, veio um balde de água fria e congelou meu coração”. Tô ouvindo muito One Last Breath do Creed, Warmness on the soul do A7x, November Rain dos Guns... Até My Immortal do Evanescence. A vantagem é ver o clipe de My Immortal, já que a Amy Lee é muito gata.

_Pra caramba! – ele sorriu – Quando eu fiquei na friendzone, eu fiquei chorando ao som de Coldplay.

_Ah, mas The Scientist tá na minha lista também. Além do mais, eu vivo dizendo “oh take me back to the start”. Além disso, eu pus Lonely Day do System of a Down, Mr. Lonely do Akon, e Loose Yourself do Eminem.

_Essa do Eminem fugiu do padrão.

_Mas é porque estamos falando do Eminem! Eu não podia deixar de fora.

_Você está certo – James disse – Então, nós dois estamos ferrados. Você na zona da amizade e eu na zona de fuga da ex-namorada louca.

_É... Só que no seu caso, deve ter umas inglesas legais na sua cola.

_Se for olhar por esse lado, aqui também tem umas brasileiras bonitinhas. Tipo as gêmeas Rodríguez ali... Elas devem ser da sua idade, cara. No Colégio Isaac Brown você tem chances.

Isso me fez lembrar do que eu falava antes da Carol. Que eu ia pegar a Violet Rodríguez quando chegasse no Colégio. É... Talvez o James tivesse razão, eu podia pegar a Violet mesmo. Dessa vez iria sem muita expectativa, sem me apaixonar. Afinal, nenhuma história dá continuidade comigo. Minha mãe, a Kamila, a Carol... Antes de acontecer algo realmente bom, tudo acaba. Provavelmente seria a mesma coisa com a Violet, mas se eu pegar a Violet Rodríguez... Ah, meu ensino médio estaria garantido.

_É isso aí. – disse com convicção – Vou deixar a Carol pra trás e pegar a Violet no ano que vem.

_A do cabelo azul? Você é um cara ousado, gostei de você, Gabriel. – ele riu – Bom, meu humor melhorou, foi bom conversar com você e provar o cardápio do dia antes de todo mundo, mas daqui a pouco o meu pai vai ficar preocupado me procurando. Acho que se eu ficar do lado dele a festa toda, a Kate vai ir devagar comigo.

_É... E eu combinei com o meu amigo Gustavo pra gente se encontrar aqui também – comentei – Eu só estava esperando ele parar de babar no falatório do seu pai sobre a tradução universal. Quero ver a cara dele quando descobrir que eu vi as falhas desse recurso em ação.

_Isso porque não é você quem está usando, parece que o mundo está sendo dublado. Você mexe a boca de uma forma e eu escuto outros sons que não tem relação nenhuma. É muito bizarro! – James riu enquanto pegava um guardanapo e uma caneta – Aqui, este é o meu número. Linha da I-Tec, então você vai poder usar no Colégio e não vai pagar pela ligação internacional. Vou querer saber se o Projeto Violet deu certo.

_Pode crer – peguei o número do James Johnson – Então, boa sorte lá com a Kate. Vou ligar pra saber se vocês voltaram.

_Acredite em mim, eu não volto com aquela louca de jeito nenhum.

Nós dois rimos e voltamos para o salão principal da festa. O falatório já tinha acabado, agora todos conversavam, e a música rolava. Mas fiquei feliz de conhecer o James. É um novo amigo que não está de boa com as mulheres – ou com a deep web – igual a mim. Eu preciso de mais amigos assim. Mulheres – e deep web... Elas são complicadas.


Notas Finais


Galera, já há algum tempo eu venho acompanhando uma história incrível e original do ~GustavoBentto! Recomendo principalmente para quem curte ficção fantástica e animes, e espero que vocês se divirtam e fiquem eletrizados com As Lendas do Dragão: https://spiritfanfics.com/historia/as-lendas-do-dragao-8067537


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