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História Identidade - "...boas notícias..."


Escrita por: ISBB5H

Capítulo 12 - "...boas notícias..."


Fanfic / Fanfiction Identidade - "...boas notícias..."

Twitter: ISBB5H

 

Dias atuais

– Tudo pronto? – Karla sentia seu corpo formigar em distintos pontos diante da dúvida. A voz de Dinah era uma espécie de zumbido incômodo que ecoava no vazio em sua cabeça e descia gelado pela espinha, tomando espaço dentro dos órgãos, ocos, que encontrava pelo caminho. – Ei, você está pronta? – A amiga tornou a lhe chamar. – Já sabe o que vai falar?

Karla confirmou com a cabeça e engoliu o bolo em sua garganta. – Sim. Eu decorei.

– Ótimo. Fale para mim. Vamos ver o que você tem nas mangas, Cabello.

– Eu gostaria de começar lembrando o dia em que meu pai me buscou na escola e me encontrou, junto a um grupo de amigos, importunando um garoto menor. Na época eu deveria ter cerca de nove anos, mas sua expressão de decepção foi tão marcante para me causar a impressão que perdura até hoje, em meus vinte. Meus pais sempre me ensinaram muitas coisas e entre todas elas, me ensinaram a respeitar as diferenças. Me ensinaram a admirar o que há de singular em cada pessoa e a amar o que há de único em mim. – Fez uma pausa para respirar enquanto absorvia as reações adversas de Dinah. – E enquanto eu gostaria de pensar que a maioria dos pais também ensinou o mesmo à seus filhos, me entristeço em saber que não foi bem assim. Felizmente há algo de mais importante sobre tudo isso… Não dependemos dos nossos pais para aprender. Pode um outro qualquer, em algum lugar e espaço desse estranho mundo, nos ensinar as mesmas coisas. Ou por fim, podemos nós mesmos aprender a amar nosso único, a admirar o singular deles e a respeitar o diferente de todos. Pode acontecer. Não é um problema sem solução. Contudo, não aprendemos absolutamente coisa alguma quando fugimos ou nos acovardamos.

Sem palavras. Dinah estava perplexa. – Isso foi lindo, mas… – E lhe sorriu em resposta. – Talvez deva guardar o discurso para consertar o seu relacionamento, e não para provar a nossa ou a sua inocência junto à coordenação da Universidade. – Olhou para o relógio em seu celular e percebeu que tinham menos de dez minutos até o início da primeira audiência. – O que há de errado? Eu pensei que isso, que hoje, fosse a coisa mais importante para você. Para nós duas, aliás.

– Eu também pensei. – Camila respondeu rapidamente. – Até receber isso. – E estendeu seu próprio aparelho celular na direção da amiga, de onde ainda lia-se no visor o princípio da mensagem recém chegada há poucos minutos. “Talvez eu não mereça essa chance e é provável que você não queira me ver, mas se puder, e se quiser, me deixaria explicar? Tudo. Desde o início desta vez. Você me contou onde morava uma vez e acho que estou em frente ao seu prédio nesse momento. Bom, espero que possa me atender ou vir até aqui, mas entenderei caso não queira me ver. Lauren J.”

– Então quer dizer que isso é mais importante? Lauren?

– Karla, Dinah! – Um dos colegas de diretório as convocou de uma distância segura. – Vai começar… A diretoria nos aguarda. – As duas amigas trocaram olhares significativos antes que Dinah puxasse a latina pelos ombros abraçando-a com força.

– Eu vou entrando. – Limpou a garganta. – E estarei 100% comprometida a isso e a provar a sua e a nossa inocência.

– Dinah…

– Tome a decisão certa, Mila. – E partiu deixando a garota menor ainda sozinha na recepção. Viu um a um, todos os amigos e colegas entrarem na sala de reuniões daquele que seria o divisor de águas em sua situação acadêmica e em seguida para o visor de seu telefone.

– A decisão certa… – Sussurrou em um meio suspiro. Fechou os olhos e guardou o aparelho no bolso, e ao reabri-los já havia se convencido de qual era essa decisão.

 

Flashback – Dias antes

– Você não é tão garota. – Camila repetiu as mesmas palavras de antes enquanto Lauren sacudia a cabeça para concordar com a afirmativa.  – Mas também não é um garoto. – A outra tornou a repetir o gesto. – Você é diferente. – Concluiu ainda usando das mesmas palavras que ouvira há pouco e sem perceber foi se afastando da maior para sentar-se ao chão. Levou uma das mãos até a cabeça e esfregou-as na testa repetidas vezes enquanto os lábios cheios se mexiam, balançavam-se para acomodar as palavras silenciosas que procuravam sair de sua boca. – Você é…

– Não consegue dizer? – Lauren murmurou ainda de pé e com os olhos carregados.

– Não! Não é isso. – Camila respondeu-lhe imediatamente erguendo o indicador. – Mas em minha cabeça há uma infinidade de possibilidades para o que isso pode vir a significar e eu preciso da sua ajuda para chegar à conclusão correta.

– Droga!

– Espera! – Karla levantou-se com pressa e se adiantou para segurar os pulsos pálidos, unindo-os em um único aperto. – Eu ainda estou tentando entender, e estou pedindo pela sua ajuda para fazer isso.

– Para quê?! Para que… – Fora novamente interrompida.

– Você não pode dizer isso! – Cortou-a. – Não pode insinuar nada de ruim, não para mim, Lauren Jauregui.  Não para mim que sempre a tratei com a pessoa bela e importante que você é!

– E você não pode agir como a mesma Camila compreensiva de sempre quando eu acabo de te dizer algo dessa proporção!

– Lauren…

– Não, não está tudo bem! Não pode ficar tão calma! Não pode, não pode ser assim!  – Foi apenas no instante em que as bochechas assumiram um tom furioso de vermelho, os olhos claros escureceram e que as frases se tornaram berros, que Camila percebera a magnitude daquela confissão.

– Lauren, você precisa se acalmar.

– Eu preciso, eu preciso… – As palavras pareciam não poder sair. – Eu, eu…

– Por favor, tente se acalmar. Está tudo… – Teria dito “bem” não fosse o olhar suplicante de Lauren. Ao que tudo indicava, palavras de conforto e encorajamento apenas pioravam a situação e por essa razão resolveu manter-se em silêncio, se limitando apenas a acariciar os longos fios escuros. As dúvidas pipocavam em sua cabeça, mas deixaria para tirá-las quando a maior estivesse mais calma. – Nós não precisamos fazer isso agora, tudo bem? Podemos conversar sobre isso amanhã. Ou quando você estiver pronta.

– Você… Eu posso, eu preciso ficar sozinha. – Determinou e sem dar à outra qualquer chance de argumentação partiu dali correndo como nunca antes, e por mais difícil que tenha sido a decisão, Camila a deixou partir prevendo que seria melhor.

A noite passada em claro para as duas garotas trouxe pensamentos e lembranças nada agradáveis para Lauren e uma lista de dúvidas sem fim para Camila. Finalmente, na manhã do dia seguinte a morena de olhos claros deixou seu dormitório seguindo com fraqueza evidente na direção do campus. Não havia dormido, não havia se hidratado ou mesmo se arrumado antes de sair e sentia o embrulho em seu estômago crescer gradualmente. Sabia que Karla estaria a sua espera atrás de respostas… Ou pior… E se ela simplesmente não estivesse lá? O que isso significaria?

A verdade fora de certa forma revelada, mas os detalhes mais sórdidos, e em especial, a revelação a cerca do membro que carregava entre as pernas ainda precisavam ser ditos e a antecipação desse momento lhe corroia internamente.

Chegou ao refeitório e a primeira coisa em que seus olhos se firmaram foi na figura ansiosa e inquieta da latina lhe esperando de pé, junto a Normani. Parecia lhe procurar com avidez. Tentou escapar e conseguir mais algum tempo, mas foi inútil quando Mani apontou sua direção e tão logo Camila já partia a seu encontro. – Lauren. – A voz que sempre lhe enchia de bons sentimentos deu início a uma enchente de nervosismo e confusão. – Sente-se melhor? Eu pensei em procurá-la mais cedo, mas… – Conforme Camila seguia falando o aperto no peito pálido crescia, crescia, inchava e envenenava seus vasos e órgãos. Sentiu-se nervosa, acuada e por fim, sufocada e num ímpeto perdeu a razão.

– Camila, chega! – Gritou atraindo a atenção de todos que por ali estavam e que se calaram para fitá-las assustados. – Vê se me deixa em paz de uma vez por todas, droga! – Soltou de dentro uma fúria cuja causa não era Camila, mas a agonia de seus próprios medos.

A latina por outro lado não teve reação. Fitava Lauren assustada e incrédula. Todo o refeitório foi deixando com que o silêncio se transformasse em cochichos e sussurros, e pouco a pouco também pequenas risadas, essas desencadeadas pelos comentários maldosos de Jeremy que as observava em outra mesa. Não demorou até que Dinah surgisse por detrás da pequena amiga e lançando um severo olhar para Lauren, tirou-a de lá para evitar que a amiga recebesse mais daquela indevida atenção.

 

Dias atuais

Suas pernas tremiam enquanto outros a assistiam de uma curta distância. Os outros olhos não a deixavam. Absorviam cada mínimo movimento que fazia. Respirou profundamente fechando os olhos, e quando voltou a abri-los a porta também se abriu.

Saiu do elevador com pressa para ganhar o corredor e sentiu o coração errar uma batida ao não encontrar nada e nem ninguém à porta. Deu um giro completo e fechou o semblante agora confuso. – Oi. – Chamou uma rouca voz e ao virar-se na direção da saída de incêndio encontrou a garota de olhos claros de pé. Encolhida. Nervosa. – Oi Camz. Você veio. – Deixou o projeto de um sorriso escapar pelo alivia de encontrar Camila ali. Camila que simplesmente assentiu em silêncio. – Parte de mim achou que… Que você não viria.

– Qual parte? A parte que gritou comigo no refeitório e depois desapareceu?

E com a menção daquele vergonhoso episódio, Lauren baixou a cabeça em culpa. – Eu sinto muito, Camila. Estou tão envergonhada pelo que fiz naquele dia…

– E é exatamente como deveria estar. Envergonhada. – E por mais que doesse tratá-la daquela forma, Karla jamais encorajaria ou acobertaria tal comportamento, e por isso se manteve firme. Aquela era uma lição que Lauren desesperadamente precisava aprender e que a latina faria questão de ensinar. – Pois bem… Você queria me ver. Aqui estou. – Lauren olhou para os lados, desconfortável. Estavam ainda no corredor, área pública e que Camila e Dinah dividiam com os demais moradores daquele andar. Em resposta muda para aquele problema, procurou as chaves de casa e abriu a porta convidando-as a continuar a conversa do lado de dentro.

– Bonito apartamento.

– Dinah me ajudou a decorar. – Camila mordeu o lábio inferior e olhou ao redor. Pensou em sentar-se no sofá, mas não queria interromper a conversa caso a amiga chegasse mais cedo da reunião e assim concluiu. – Podemos conversar no meu quarto. Teremos mais privacidade e não seremos interrompidas. – Sinalizou para que a maior a seguisse e em poucos passos ganharam o cômodo escolhido.

O quarto de Camila era… Bem, para Lauren era a tradução literal do que é ser uma garota. As paredes eram coloridas de um tom fraco de rosa, e mesmo que não gostasse da cor admitiria sua a elegância. Os móveis em tons pastéis e uma confortável cama de casal. Uma mesa, algumas prateleiras e uma enorme estante cujos títulos variavam entre contos adolescentes, crônicas celebradas e volumes que se pareciam com os da biblioteca do bloco 3. – Uau. Seu quarto é bem… Bonito.

Sem se conter Karla emitiu um riso baixo. – Você não gosta de rosa, não é mesmo?

– Não seria a minha primeira escolha para as paredes do quarto. – Respondeu-lhe também em tom de brincadeira e tomou a liberdade de sentar-se na extremidade mais próxima do grande colchão. Suspirou pesado olhando para as próprias pernas e inclinou-se para o lado para retirar algo de dentro do bolso. Fitou o pequeno papel em sua mão antes de estendê-lo na direção de Karla que hesitou alguns segundos antes de pegá-lo. Brincou com o material entre os dedos enquanto absorvia a imagem de um pequeno garoto. A fotografia parecia antiga e estava em péssimo estado, mas nem por isso os olhos do garotinho deixavam de brilhar. E brilhavam tão intensos como os de… – Sou eu.

– Você? – Perguntou surpresa. Sentou-se próxima a Lauren ainda com a imagem nas mãos e esperou pelo relato que viria.

– Tudo começou quando eu nasci. – Disse apesar de toda obviedade. – Meus pais não se agradam com o assunto, mas pelo pouco que sei, a minha gravidez não foi planejada. Bem, de qualquer maneira ao nascer eu parecia ser uma criança absolutamente normal. Um… Menino normal. – Olhou para Karla por baixo dos cílios e percebeu como esta não esboçara reação alguma diante da novidade. – Mas o fato que só fui descobrir muitos anos mais tarde é que desde a primeira infância meus pais descobriram algo de peculiar em mim. Eles e os médicos procuravam respostas e fáceis soluções para os pequenos defeitos que enxergavam em mim, aqueles que eu ainda não identificava.

– Pequenos defeitos?

– Para os meus pais era óbvio que havia algo de estranho comigo, ainda que fosse muito discreto fisicamente. Eu era, eu tinha… – Não queria dizer aquela maldita palavra. Não queria referir-se ao membro. – Eu era em aspectos mais aparentes um garoto, mas em tantos outros, não. O meu ritmo de amadurecimento era diferente do das outras crianças, principalmente de Chris, com quem meus pais tanto me comparavam. Meus pais me levavam aos médicos constantemente para novos exames, mas eu não tinha a menor ideia do que se tratava.

– Você foi mantida no escuro.

– Por alguns anos sim, mas foi por volta dos cinco anos de idade em que comecei, por mim mesma, a notar minhas estranhezas. As outras crianças elas eram… Confortáveis. Entende?

– Confortáveis em suas próprias peles.  

– Pode parecer estranho que uma criança aos cinco anos note tudo isso, mas é verdade. Não era um pensamento tão sofisticado e racional, mas eu já me sentia diferente. Me pegava tentando, infantilmente, a ser mais como as garotas, porque eu não me considerava um garoto. Acho que nunca o fiz. Eu não sabia dar nome à esse sentimento, mas me senti inadequada por tantos anos.

– Seus pais sabiam de tudo? Eu não consigo conceber uma família que deixe alguém no escuro assim por tanto tempo.

– Sabiam que eu era uma criança intersexual. Que meu sexo aparente era, é predominantemente… M-masc-culino. – Gaguejou envergonhada. – Mas que minha anatomia interior denunciava a existência tanto de tecido gonadal masculino, quanto feminino, o que causava em mim uma grande desordem hormonal, além da presença de outros aspectos característicos da minha condição que levava a todos e a mim à confusão... Como a minha voz, o-ou o crescimento dos meus seios. – Diminuiu o tom de voz para dizer. E quem é que gostaria de ter aquela conversa? O assunto era tão íntimo que exalava desconforto próprio. – E foi somente aos doze anos em que dividiram comigo essa informação.

– Eles… – Não queria ser invasiva demais, mas queria saber. – Você passou por algum procedimento?

– Cirúrgico? Não! Nenhum. A intenção inicial dos meus pais e dos médicos era fazer essa escolha por mim, mas o fato de que eu… Bem, de me enxergar mulher já os chocou demais, nunca houve sequer espaço para discutir uma possível cirurgia.

A história da garota de olhos claros chocava Karla a cada novo capítulo. Havia tanto se acumulando em sua boca para ser dito, que tornava-se difícil controlar as palavras e ideias que lhe consumiam pouco a pouco. – Então foi ao completar doze anos que tudo mudou?

– Sim, foi quando eu soube da verdade. Completa. Eu não sou um homem, Camila e já não suportava ser tomada como tal. Foi isso o que eu disse aos meus pais. Voltamos aos médicos, mas dessa vez eu participava de todas as decisões. Nessa época eu mudei também de escola, minhas roupas, deixei o cabelo crescer…

– Na escola ninguém nunca soube?

– Era difícil confiar em alguém. Tive alguns amigos na minha antiga escola, mas depois da mudança eu não tive nenhum realmente… Eventualmente, no novo colégio, as pessoas também ficaram sabendo sobre mim e para ser honesta foi tudo uma grande droga.

– Seu nome.

– Não era Lauren… – A curta resposta bastou para que Camila compreendesse que a garota não queria revelar mais sobre esse aspecto particular.

– Eu fui a primeira pessoa que você beijou?

Lauren corou. Corou furiosamente diante da pergunta inesperada. Procurou olhar para qualquer outro lugar, que não na direção da latina. – Não. Em toda a minha vida eu só estive com três garotas. Existiram duas antes de você, mas elas são lembranças vagas de um festival de música para o qual Chris me arrastou quando eu tinha dezesseis anos. Me separei dele e passado o susto me dei conta de que no meio daquela multidão ninguém sabia quem eu era ou sobre o meu passado, e já sabendo do meu interesse por garotas tudo o que fiz foi aproveitar a oportunidade.

Pergunta estúpida. De onde eu tirei isso?! Camila burra! Camila estúpida!” – Meus livros? – Pigarreou antes de mudar de assunto.

– Para pesquisas… – Olhou para o teto. – Isso é ridículo, mas eu não, quero dizer, nunca fui a uma consulta desacompanhada dos meus pais, e na presença deles ou de médicos que os conheçam eu não me sinto exatamente confortável para tirar todas as minhas dúvidas.

A pequena garota assentiu devagar e preparou-se para a última e mais importante pergunta enquanto assistia Lauren distraída. – Por que agiu daquela forma na última semana?

– Porque eu não queria ter que falar sobre tudo isso… – A última parte saindo engasgada. – Com você.

– Mas por que?

– Porque eu não queria perder isso que nós… – Suspirou ao encarar os castanhos depois de tantos minutos evitando-os. – Eu não quero te perder.

E após longos dias Karla voltou a sentir o estranho e prazeroso aperto no peito que apenas uma única pessoa era capaz de lhe proporcionar. – Lauren…

– Você foi a minha primeira grande conquista.

– Isso não é verdade. – Contestou com rapidez. Camila se inclinou para alcançar as mãos pálidas e quando pôde, as apertou com força enquanto se levantava, levando a garota maior consigo. Andaram juntas sem quebrar o contato visual até o banheiro do quarto e pararam em frente ao grande espelho. – Olhe bem. – Mas Lauren não o fez. Não manifestou qualquer desejo ou inclinação de fazer o que lhe fora pedido, e diante da teimosia usou uma das mãos agora presa ao queixo da maior para forçar seu rosto da direção desejada. Demorou ainda alguns segundos, mas os verdes se fixaram na imagem refletida. As sobrancelhas grossas, os lábios medianos e pálidos, o nariz fino… Os traços de sempre, mas que ali, à luz dos castanhos assumiam novos significados para Lauren.  – Você conquistou a si mesma. – Se afastou para que a morena fosse a única a ser refletida pelo vidro e continuou a dizer em tom mais baixo. – Intersexo é um termo de designação. Um termo criado por alguém e usado por muitos para fazer caber em uma única categoria, uma infinidade de variações biológicas. Não o que a natureza diz que você é, mas o que os homens sentem necessidade de nomear e são esses mesmos homens que impõem o começo e o fim do “feminino” e começo e o fim do “masculino”. O que é preto e o que é branco, deixando de fora do espectro “normal” as cores mais bonitas e únicas, como você.

– Bonitas para quem?

– Para mim. E quem sabe daqui a algum tempo para você também. Não é que eu não me importe com como você é, ou que com que tem entre as pernas... Eu me importo, mas faço isso por me importar com você, por gostar de você e não por me incomodar.

– Você não pode me convencer de que ser assim é normal… – Lamentou-se tirando os olhos do espelho e procurando por Camila que rapidamente se aproximou. Colou os dois corpos deixando Lauren com as costas encostadas ao balcão da pia e sem qualquer chance de escape.

– Mas posso te mostrar só os tolos se preocupam com a normalidade. – Subiu as mãos até o rosto de Lauren, pousando-as sobre as bochechas levemente coradas.

– E com o que se preocupam todos os outros?

– Com o mundo. Com o amor. Com a beleza que vem não do que é comum, mas do que é único e especial.

– É com isso que você se preocupa?

– Quem? Eu? Não. – Sorriu com os lábios já bem próximos da boca de Lauren. – Eu não sou como os tolos e nem como os outros. Eu só me preocupo com uma coisa…

Envolvida pelo doce cheiro da latina perguntou como uma presa inocente prestes a cair em uma armadilha. – Com o que?

– Com a direção para a qual o meu coração aponta. – Olhou para baixo, para o próprio peito, fazendo com que os verdes seguissem os castanhos.

– Eu acho que ele está apontando para mim… – Lauren disse fazendo-lhe gargalhar baixo antes de voltarem a se encarar. – Eu quero que ele aponte para mim.

– Boas notícias, Jauregui. – Roubou-lhe um beijo rápido. – Assim como eu, esse meu coração não tira os olhos de você. – Sem que suportasse esperar mais um mísero segundo Lauren fechou a distância entre os dois corpos e beijou a pequena mulher em seus braços com toda a vontade e o afeto que tinha. Não se preocupou em lutar contra as lágrimas quentes que desceram de seus olhos fechados, pois sentia que aquelas eram lágrimas de alívio. De felicidade, da mesma felicidade que fazia inchar seu peito. Da mesma felicidade que tinha nome e sobrenome. Karla Camila Cabello. Ainda a sua garota.

Longe dali e sem o conhecimento das duas garotas, outra discussão terminava. A porta abriu-se e marchando do interior da sala de reuniões saíram os alunos do diretório acadêmico da Saúde. – E agora? – Um deles perguntou impaciente.

E tudo o que Dinah fez foi pensar na amiga antes de responder. – Camila não vai acreditar.



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