1. Spirit Fanfics >
  2. Identidade >
  3. "...um presente para você..."

História Identidade - "...um presente para você..."


Escrita por: ISBB5H

Capítulo 15 - "...um presente para você..."


Fanfic / Fanfiction Identidade - "...um presente para você..."

Twitter: ISBB5H

 

Tudo parece mais fácil quando somos crianças. Nem todo tipo de pobreza afeta nossas brincadeiras e os problemas nem sempre diminuem nossas risadas. As diferenças pouco importam desde que nossos amigos dominem as artes de se esconder, imaginar ou manusear um console. Somos heróis, príncipes, heroínas, princesas, astros e astronautas. Somos cientistas, desbravadores e gigantes.

Selamos nossos acordos e promessas mais importantes com o enlace dos dedos mínimos e nos acostumamos com facilidade ao contínuo trânsito de pessoas em nosso convívio. As inseguranças somem com cafunés e os relacionamentos se oficializam com o segurar das mãos. Crescemos com a doce ilusão, o lindo sonho, de que na maior parte do tempo a vida será uma aventura incrível, rica e alegre. E o que é que muda quando crescemos?

Os primeiros raios de Sol incidiam no tecido grosso da cortina do quarto criando nas paredes efeitos visuais agradáveis aos olhos bem despertos de Camila. A garota mal havia descansado durante as últimas horas e tinha ali, bem ao seu lado e ressonando tranquilamente, a razão única de sua insônia.  

Alternava olhares entre o teto e o rosto sereno de Lauren, e a cada vez que o fazia não evitava os sorrisos e o rubor nas bochechas. Era bom, muito bom, ter a morena tão próxima e ainda que os custos tenham sido alguns drinques aqui e ali, não se arrependia de decisão de tê-la trazido para o apartamento. Sentia-se bem cuidando da garota e sentia-se ainda melhor ciente de que fora a própria a pedir por aquilo, de certa forma.

– Droga. – Sussurrou zombando de si. Estava tão irrevogavelmente apaixonada pela morena que às vezes sentia-se tola por isso. Lembrou-se de ter se declarado na última noite, e agora estava curiosa para saber se esse fato seria sequer lembrado pela manhã. Remexeu o colchão e deslizou sobre ele, movimentando-se de baixo para cima, e descansou as costas contra a cabeceira da cama. A nova posição fez com que enxergasse não somente o rosto, mas todo o corpo pálido que em algum momento da noite havia perdido parte do fino lençol que o cobria.

Lauren era linda. Absolutamente linda. Aos olhos de Camila ela era, em cada pequeno detalhe. Suas grossas sobrancelhas. Suas bochechas e lábios cheios, rosados. Sua pele alva, livre de marcas. Seu tronco forte e gracioso. Karla tornou a corrigir a postura sentindo seu rosto queimar em vergonha e em infundada culpa por simplesmente encarar o quadril parcialmente descoberto da morena, e é claro, o volume entre suas pernas. Suas próprias se fecharam em um aperto abafado pelo suspiro enquanto reconhecia o forte desejo de tocá-la e senti-la de maneira íntima.

Desde a definitiva confissão vinha procurando por mais informações sobre a condição da garota e outras semelhantes, mas a verdade é que a tendo por perto por todos esses dias, sentia em seu coração as únicas afirmações que precisava possuir; A primeira: Lauren é uma mulher. Como tantas outras. Percebera através dos toques delicados, do cheiro suave, do íntimo afetuoso e da essência, firme, forte e feminina. A segunda: Lauren é a mulher que mexe com seus sentidos, sentimentos e desejos. E que ideia absurda a de deixar um pênis lhe dizer diferente de qualquer uma dessas certezas. Agora só o que restava era convencer a garota adormecida de tal fato. Uma ideia ainda fraca começou a surgir em sua mente, mas antes que pudesse amadurecê-la… – Você vai fazer o café ou não?! – Era difícil se decidir entre o pior. Seriam os gritos de Dinah do outro lado da porta ou as batidas fortes contra a madeira? Agitou as pernas para se livrar do lençol e olhou para o lado assustada, vendo Lauren se contorcer sem despertar.

– Meu Deus do céu, Dinah! – Abriu a porta e a fechou guardando-a com as costas com a mesma rapidez com a qual cobriu a boca da amiga usando ambas as mãos. – Seu escândalo vai acordá-la. – Advertiu com as bochechas quentes e deixou que seus olhos apontassem na direção do quarto, onde a visitante dormia.

A mais alta cruzou os braços e se esforçou para esconder o sorriso diante da postura tola e apaixonada da latina. – É o seu dia de preparar o café. Você sugeriu a escala, não eu.

Karla revirou os olhos e empurrou a loira através do corredor e em direção a cozinha. – Vou alimentá-la e depois espero ser deixada em paz.

– Por acaso têm planos para hoje?

– Sim. Não. – Mordeu os lábios manuseando os ingredientes para a refeição. – Ainda estou me decidindo quanto a isso.

– O que quer dizer?

– Pretendo convidar Lauren para ir a um lugar comigo. – Confessou como se fosse uma travessura. – E o convite pode se estender e nos levar a outros programas. – Olhou para trás e viu a loira mergulhar o rosto contra a bancada de pedra enquanto a remedava com ironia. – Qual o seu problema?!

– Seu empenho me deixa cansada. – A latina atirou um pedaço de pão na direção da amiga. – Tudo bem, tudo bem, era uma brincadeira, Mila. O que planejou até o momento? – Mas o silêncio de Camila fez Dinah bufar. – Contanto que não seja um programa estupidamente tedioso para um final de semana, como ir ao teatro ou ao museu.

– Dinah! – A amiga gargalhou alto. – Desse jeito você vai acabar com a minha confiança. Quero dizer, que estudante de arte não gostaria de…

– Apenas, por favor, não se esqueça do mais importante. – A latina se esforçou para recordar de algo mais que agradava a morena e que pudesse ter esquecido. – Você, sua idiota. Ela gosta de você.

No quarto, sentindo leves pontadas na cabeça graças às bebidas ingeridas, Lauren enfim começou a despertar. Rolou uma vez e outra de volta no colchão, estranhando a maciez incomum. Inspirou profundamente, esticou os braços suspendendo-os no ar e abriu os olhos. – Merda. – Sentou-se depressa ao se perceber no quarto de Camila. As lembranças chegando aos poucos. Lauren não havia bebido muito, mas o suficiente para lembrá-la de se embaraçar no final da noite. Suas mãos automaticamente pousaram entre suas pernas, apertando o volume guardado pela cueca e uma careta surgiu em seu rosto lembrando-a de algo primordial. Eram seus instintos gritando para que a pressão em sua bexiga fosse aliviada a qualquer custo. Com desespero e os olhos marejados procurou por suas roupas e as avistou em cima de um móvel próximo. – Mijar, preciso, preciso, preciso, preciso… – Repetia procurando manter uma calma ilusória. Tomou as roupas pelas mãos, se contorcendo em vontade e correu para a suíte, abrindo a porta com pressa. Abaixou a cueca e despejou todo o peso sobre o vaso sanitário respirando, enfim, aliviada. – Ah! Deus. – “Camila não deve mijar, aposto que ela faz xixi”, raciocinava com preguiça.

Porém, toda a afobação a fez esquecer-se de um importante detalhe que não tardou a ser percebido pela latina que entrava no quarto naquele mesmo instante e tão logo os olhos escuros se fixaram na abertura indiscreta da porta do banheiro. Envergonhada, mas incapaz de qualquer outra reação, observou a morena que se contorcia assentada e sua expressão de concentração, como se aquela tarefa fosse extremamente complicada. Suas pernas, desnudas, estavam juntas e inclinadas em uma única direção. Os dedos de uma mão tamborilando contra uma das coxas enquanto a outra mão fora levada aos lábios que faziam pressão sobre o polegar, exclusivamente. Todo o cabelo jogado sobre um ombro e a cueca, que mais se parecia com muitos de seus shorts de algodão, pendendo em um dos tornozelos. Com toda a sua honestidade, como poderia aquela imagem ser algo além de feminina? “Exceto pelo fato de que a garota está fazendo xixi”, Camila riu de si mesma. Droga, como estava apaixonada. Virou-se e achou por bem anunciar sua presença de alguma forma. – Lo?

Como esperado, o baque da porta sendo fechada veio em seguida. – N-no banheiro!

– Vou esperar por você, não se preocupe. – E assim o fez. Somente quando devidamente vestida foi que Lauren surgiu por detrás da porta e, hesitante, caminhou até a grande cama. – Bom dia, Lo.

– Bom dia.

– Está tudo bem?

– Minha cabeça dói um pouco. – Lauren odiava, simplesmente odiava sentir-se tão exposta e envergonhada quanto se sentia agora.

– É o efeito da bebida. Eu trouxe uma aspirina e um copo de água. – Indicou-os sobre a mesa e aguardou até que a morena os tomasse. – Se sentirá um pouco melhor depois de se alimentar. Você parece desconfortável. – Camila disse com sua voz melodiosa.

– E estou. Eu só… Não deveria ter passado a noite. E ter dado todo esse trabalho, eu não deveria. É isso.

– Não deu. – Com cautela se aproximou da visitante e tocou seu rosto. – Não seja uma idiota teimosa assim tão cedo. – E de certa maneira se surpreenderam com a rapidez com a qual Camila aprendera a lidar com aquela nada assustadora fera de olhos claros.

[…]

Tomaram o café da manhã na companhia de Dinah, quem muito se divertiu às custas da estadia de Lauren em seu apartamento e dos resmungos que ouvia vez ou outra. Ao se terminarem a refeição, Dinah retornou ao próprio quarto e Camila pediu a Lauren que aguardasse na sala de estar, enquanto providenciava algo importante.  Cerca de meia hora se passou até que a latina voltasse, arrancando suspiros de sua companhia. – Eu gostaria de te levar a um lugar hoje. – Explicou. – Pode me acompanhar? – Lauren assentiu. Iria com Camila para qualquer lugar do mundo se ela apenas pedisse com todo esse dengo.

Dirigiram até o prédio conversando assuntos fáceis. O caminho estava vazio, assim como os corredores dos dormitórios enquanto seguiam até o quarto da morena mais alta. Ao chegar, Lauren separou os pertences para o banho e quando em frente ao armário, foi atingida pela dúvida. – Para onde estamos indo mesmo? – Camila negou com um sorriso travesso. – O que devo vestir?

– O que te fizer confortável.

– Essa resposta não me ajuda, Camz. – Lauren resmungou vasculhando as poucas opções da qual se servia. Alcançou uma blusa xadrez, vermelha e de mangas curtas e um jeans escuro. Olhou para os saltos que usara no dia anterior, para os sapatos mais baixos e para as botas e coturnos.

– Você pode usar botas. – Karla falou bem humorada. – Pode usar o que quiser.

– Ok! – Comemorou a resposta com um sorriso largo. Camila aguardou até que ela fosse ao banheiro e retornasse já vestida com as roupas escolhidas. Checou três vezes mais as rotas planejadas para o dia e se programou, mentalmente, para cumpri-las à risca. Não seria muito difícil.

Em pouco tempo voltaram para o estacionamento e então para o carro. – Você conhece muitos lugares em Miami, Lo?

– Eu costumava dirigir para a cidade algumas vezes, mas não foram tantas quanto eu gostaria que tivessem sido.

– E a sua família?

– Eles vinham à praia durante o verão. Eu não participava das viagens, não desde… Você sabe.

– Por vontade própria? – Camila insistiu querendo saber.

– Inicialmente sim. Eu não me sentiria bem estando em trajes de banho na frente de todas aquelas pessoas, então depois de algum tempo meus pais apenas supuseram que eu não me juntaria a eles. – Deu de ombros. – E quanto a você?

Uma das mãos da latina se desprendeu da direção para alcançar as de Lauren. Apertou-as sentindo receber em troca um carinho tímido e gostoso. – Sou a fã número 1 das viagens de família. Meus pais, Sofia e eu sempre nos divertimos muito e durante os verões, especialmente, procurávamos gastar o máximo de tempo juntos. A propósito, Sofia… – Olhou para o lado insegura, mas a procura dos belos olhos verdes. – Você precisa conhecê-la.

O coração de ambas as garotas acelerando. O de Karla por se dispor a dividir um pouco de uma das pessoas mais especiais em sua vida, e o de Lauren por compreender a imensidão do gesto. – C-claro. Eu adoraria. – Disse se agarrando ao fino fio de esperança de que aquele encontro realmente acontecesse no futuro.

Aproveitaram o restante do trajeto para conversar um pouco mais sobre a vida e as histórias mais engraçadas dos Cabello, mas o tempo correu, levando-as direto a um ponto específico e movimentado da cidade, onde se punham de pé e cheias de expectativa. – Um beijo se adivinhar o nosso destino. – Camila provocou. Automaticamente encarou os lábios cheios e convidativos da latina e desejou beijá-los. – Tente. – As opções eram várias, o que dificultava a tarefa. Lojas das mais diversas, uma extensa cartela de restaurantes de diferentes culturas e uma grande galeria também próxima. A visão mais óbvia, porém, a cafeteria do outro lado da rua. A confusão lhe possuía enquanto encarava o emblema conhecido da Starbucks até que os olhos claros subiram um pouco mais, para o segundo pavimento do prédio e se encontraram com grandes letras douradas. Suas sobrancelhas subiram, arqueadas e a boca se entreabriu.

– O museu? – A latina assentiu com as bochechas coradas, mas não pela escolha do local e sim pela incerteza da aprovação da outra garota. – O Museu de Arte Erótica Mundial.

– Já esteve aqui? – Negou silenciosamente. – Gostaria de conhecê-lo? Agora?

– É claro que sim. – Atravessaram a rua com as mãos entrelaçadas e adentraram o edifício. O pagamento, muito para o embaraço de Lauren, ficara por conta de Camila. Na entrada foram informadas que todas as obras pertenciam ao acervo pessoal de uma senhora cuja vida fora dedicada a adquirir arte fina e erótica ao redor do mundo e que qualquer visitante poderia, ali dentro, apreciar peças que variavam de 300 a.C. a trabalhos mais contemporâneos. O museu abrigava mais de vinte salas ao todo, e Camila esperava que Lauren pudesse enxergar cada uma delas com os olhos, a alma e o coração. Tudo o que as rodeava era arte da mais autêntica, e não simplesmente pornografia. Lauren não falhou em compreender a profundidade e a proposta da exposição. Puxava a latina pelos diversos corredores e lia as placas informativas com brilho nos olhos. Pararam em frente a uma escultura e Karla aproveitou a oportunidade para analisá-la com cuidado. – É uma das esculturas de Botero, um artista colombiano, Camz. – A figura maciça tinha a forma de uma mulher nua. Seu formato arredondado era apenas mais um item que lhe conferia atratividade. – Suas obras em grande parte são críticas a ganância dos seres humanos, mas confesso que aqui, neste museu, tudo assume um novo significado, não acha?

– Sim, eu também acho. E ela parece me falar sobre… Formas? – Tentou não soar tão insegura diante da morena que sabia tão mais sobre o assunto. – Sobre ideais de beleza e atração sexual… – Riu sem humor. – Ou talvez eu tenha ido longe demais, para lugar algum. A artista entre nós duas é você.

– Mas você é boa lendo entrelinhas. – Lauren encorajou. – O erotismo e a sexualidade são manifestações humanas tão genuínas e gritam a beleza de todas as formas e ideais de beleza, os antigos, atuais e os futuros. Você tem toda razão e honestamente, todas essas obras exalam história, cultura e beleza e eu estou adorando cada pequena parte da exposição, Camz.

– O que quer dizer que eu acertei? Nos trazendo até aqui.

Suspirou, mas antes de respondê-la franziu o cenho diante de uma dúvida fugaz. – Por quê escolheu esse museu dentre todos os outros espalhados por Miami?

– O que? Vai me dizer que não é boa lendo entrelinhas? – Brincou.

Os olhos claros baixaram para inspecionar o próprio corpo. – Eu? Eu sou a razão?

– Tudo ao nosso redor é sobre beleza, não é? A beleza das várias épocas, das várias culturas e dos vários corpos. São tamanhos, formatos e anatomias mil. Típicas, atípicas e inventadas. E você olha para essas esculturas e quadros com tanta devoção para dizer que tudo o que vê é nada menos do que a perfeição em cada forma e contorno, Lauren. – Camila tocou-a no centro do peito com a palma da mão e se aproximou, grudando os corpos. – Bom, eu também enxergo. Na arte, em mim e em você. 

– Há uma enorme diferença entre anjos com pênis e uma garota masculina em sua cama.

– Sim! – Segurou o rosto pálido trazendo-o para ainda mais perto do seu. – E ele começa com o meu desejo em ter a tal garota, idiota, em minha cama em primeiro lugar. – Umedeceu os lábios. – Você me deseja? Em sua cama? – Esperou pela resposta assistindo um brilho diferente despontar no fundo dos olhos claros.

– Em cima dela, fora dela, em todos os lugares…

– Ótimo. Então se acostume ao meu desejo também. De você e todo o seu corpo. Do jeito que ele é. – Se inclinou roçando os lábios por poucos segundos antes de se afastar, deixando a morena completamente atordoada.

– Ei, meu beijo!

– Você se chamou de garota masculina.

Bufou. – E qual o problema?

– Em ser uma? Problema algum, mas quando sai da sua boca carregado de más intenções, os problemas começam a surgir. E você perde pontos pelas besteiras que diz, Jauregui. Talvez isso te faça pensar um pouco mais antes de abrir essa boca enorme. – Concluiu puxando a garota emburrada pelo corredor seguinte, na medida em que escondia um grande sorriso.

[…]

Gastaram todo o dia desbravando cada pequena peça exposta no Museu e deixaram-no animadas, mas famintas. Camila sabia exatamente o que fazer em seguida e levou-as caminhando por entre poucas ruas até um enorme bar. Normalmente evitaria o lugar em dias como este, mas sabia que a escolha acabaria agradando e muito a morena.  O salão era grande e embora estivesse movimentado sobravam ainda muitos lugares, principalmente junto ao largo balcão que serpenteava a porção esquerda do ambiente de uma extremidade a outra. As dezenas de vozes ali dentro gritavam, riam e conversavam, se misturando aos sons que saíam dos inúmeros televisores. – Vamos ver o jogo?

– É um presente para você.

Lauren olhou para trás e capturou o exato momento em que Camila escolhia dois dos grandes bancos enquanto usava uma das mãos para limpar o suor em sua nuca. Com agilidade juntou os cabelos em um coque desleixado no topo da cabeça para somente então se dar conta de que era admirada em seus mínimos movimentos. Corou diante do olhar intenso da maior. – Tudo bem?

– Sim, Lo. É apenas o calor de Miami.

– Ok. Vou ao banheiro e volto já. Pode pedir nossas bebidas. – Camila assentiu e imediatamente sinalizou para um dos baristas, um jovem latino de cabelos escuros e compridos, presos em um coque não muito diferente do seu. O homem se aproximou com um sorriso largo, mas visivelmente cansado.

– O que vai beber doll?

Franziu o cenho. – Do quê me chamou?

Doll? – Ele riu. – Está aqui pelos Dolphins, não é? – Karla se atentou as várias camisas verdes e brancas que a cercavam e compreendeu o apelido. – Não achei que fosse se importar. – O homem terminou de se explicar. Não teve a intenção de ofendê-la ou provocá-la.  

– Oh sim. Tudo bem, não se preocupe. – Lhe garantiu com um sorriso. – Mas você errou quanto aos Dolphins.

A expressão do barista se iluminou como se o comentário tivesse lhe feito o dia. – Não me diga que torce pelos Pats?! – Perguntou enquanto tirava do bolso um chaveiro com o emblema do time.

Camila gargalhou da animação do rapaz. – Não, eu não, mas a minha… Hun… – Travou enquanto pensava em como deveria se referir à Lauren. Apontou o polegar na direção do banheiro na esperança do rapaz se lembrar da garota que a acompanhava há pouco e ele se lembrou, assentindo e lhe piscando. – Bom, ela sim.

– Mas e quanto a você?

– Eu? Torço para entender uma jogada e outra. – Ele gargalhou chamando a atenção de um colega de trabalho que passava por ali vez ou outra para buscar os pedidos e levá-los para as mesas mais distantes do balcão. – Futebol não é a minha.

– E ela é a sua? – Ele sinalizou com a cabeça e Camila percebeu Lauren caminhando em sua direção.

Mordeu o lábio inferior antes de concordar. – Ela é. – Estendeu a mão. – Meu nome é Camila.

– Diego.

Lauren se aproximou um pouco mais séria do que quando havia saído. – Pediu?

Karla recolheu a mão e se concentrou na morena lhe sorrindo amplamente. – O que?

– As bebidas. – Sentou-se arrastando o banco até que seu lado esquerdo estivesse colado ao direito da latina e fitou o funcionário com desdém.

– Ei, irmão! – Diego gritou, assustando as duas garotas. Um dos garçons se aproximou com o semblante sério. – Essas são Camila e… – Olhou para a morena de olhos claros.

Lauren não respondeu, mas Camila sim, achando graça da postura desconfiada da outra. – O nome dela é Lauren.

– Sim. Essas são Camila e Lauren, e adivinhe só? Lauren está aqui pelos Pats. – Assim como havia acontecido com Diego, as feições do garçom se iluminaram com a notícia.

– Aí sim, garota. Estamos em menor número essa noite. – Se referiu ao público do bar. Estendeu o punho para que Lauren o cumprimentasse e compelida a tal ato diante da alegria dos homens, ela o fez. – E quanto à Camila? – Apontou.

Diego gargalhou. – Ela só está aqui pela Lauren.

O relógio avançou conforme as garotas se divertiam. Os pratos largos sujavam e tomavam conta do balcão. As costelas e as fritas foram abandonadas para que a conversa pudesse evoluir, e entre generosas goladas, séries de explicações, gritos e comemorações repentinas, também a partida transmitida esquentou. O time de Lauren protagonizara um começo de jogo confortável, abrindo uma vantagem de quatorze pontos logo no primeiro quarto. Durante o segundo deles, a diferença aumentou em mais seis pontos para os visitantes, mas tudo começou a mudar na segunda metade da partida.

O time da casa mudou a postura, o que tornou os ânimos dos torcedores e o clima no bar mais acalorados. Camila sentiu o desconforto, ainda mais estando ela envolvida com a torcida de menor número. Ganhavam olhares duros e palavrões a cada descida comemorada, mas isso não constrangia Lauren em nada. Gritava e pulava do banco comemorando cada pequeno avanço do time e divertia-se em uma disputa amigável com Diego que exaltava a eficiência do camisa 87 dos Patriots, enquanto ela, o talento do muito conhecido camisa 12, Brady. Explicava à latina coisas simples sobre o campeonato da maneira mais simples que podia pensar. – Então você tem os mesmos times se enfrentando em dois jogos durante a mesma temporada.

– E nós acabamos com os malditos no primeiro jogo! – Diego comentou enquanto passava por ali.  – Mas não precisamos do Brady para fazer isso.

Lauren que até então se mantinha em sua mais doce postura, logo fechou o semblante, cedendo a pequena provocação do barista. – Espere aí, foi a vitória mais apertada da temporada e…

– Touchdown! – Camila gritou de repente. Lauren mirou o televisor logo à frente que exibia a comemoração dos patriotas. Voltou a olhar para Camila que fitava o mesmo televisor, enquanto sorria e ajeitava o cabelo, corrigindo o coque e sentindo-se extremamente orgulhosa por ter compreendido a jogada nada complexa, mas para ela, extremamente confusa. Ali estava uma garota, a mais bela e incrível delas, se esforçando para apreciar algo que a agradava. Surreal? Na cabeça da maior, sim.

Quando os castanhos e os verdes tornaram a se encontrar, algo ardeu no interior do peito de Lauren. Um fogo bom, que não demorou a tomar conta de todo o corpo. – Você me deve um beijo.

– Devo?

– Por mais cedo, quando acertei sobre o Museu.

Camila fingiu buscar na memória, mas falhou em esconder o sorriso. – Por acaso já não paguei essa dívida?

– Não que eu me lembre. E eu me lembraria de ter lido entre essas linhas. – Arrastou a ponta dos dedos na boca de Camila se inclinando sobre o banco. Os braços da latina escorregaram pelas laterais de seu corpo, segurando firmemente o tecido vermelho de sua camisa com a intenção de prover algum equilíbrio. As mãos pálidas, por outro lado, se perdiam ainda no rosto e cabelos da menor, mantendo-a firme na posição. As bocas não tardaram a se encontrar, ambas frias e úmidas pela prova constante das bebidas geladas. Pairaram, uma sobre a outra até a posição ideal para que Lauren deslizasse sua língua nos lábios desejados, sentindo a outra garota suspirar e expirar febril em seu rosto. Aproveitou a entrega de Karla e mordeu seu lábio inferior, sugando-o demoradamente entre os seus.

– TOUCHDOWN! – Diego gritou do outro lado do balcão enquanto fazia referência ao beijo de Lauren e erguia dos dois polegares. Se separaram, Camila extremamente envergonhada e Lauren rindo baixo. – Boa garota!

[…]

Quando a partida veio ao fim, os Patriots conquistaram sua vitória. A noite caía vestindo Miami com uma manta de brisa agradável e após se oferecer para acompanhar as garotas até o carro, Diego acabou por se despedir quando Lauren o agradeceu dispensando a gentileza. Queria ter mais tempo na companhia de sua garota.  

Durante a caminhada, não se sabe como, mas Karla ainda encontrou lugar dentro de si para fazer caber um cappuccino gelado, com o qual a maior não se importou em presenteá-la, admirada com o brilho quase infantil nos olhos castanhos que namoravam o letreiro de uma Dunkin Donuts. – Isso está maravilhoso. – Declarou com parte dos lábios encobertos pela espuma cremosa e pela calda de chocolate que encobria a bebida. – Ei, não estamos muito longe da praia. Quer andar até lá? – Sentaram-se em um banco na orla da praia, de onde observavam as ondas fracas que chegavam a areia e a lua refletida na águas agora escuras. – Em que está pensando, Lo?

– Em um livro. No seu livro de biologia. – Riu fraco. – Já se arrependeu de ter entrado na biblioteca naquele dia?

– Você se arrependeu? – Camila lhe devolveu a pergunta.

– Terrivelmente. – A menor se fingiu de ofendida e ergueu a mão para empurrá-la emendando palavras como “estúpida” e “idiota”, mas assim que seu braço tocou a superfície do ombro de Lauren, sentiu as mãos pálidas tomando-o em pontos estratégicos para tirá-la do lugar, e com facilidade fora posta no colo da outra, tornando-se prisioneira de um aperto gostoso.

– Me solta!

Mas tudo o que sentiu foi aquele abraço se intensificar. – Por que eu faria isso?

– Porque eu estou mandando!

– Não ligo.

– Lauren Jauregui!

– Karla Camila. – A latina ainda se remexeu algumas vezes tentando se livrar dos braços fortes que a mantinham ali, secretamente adorando cada risada da morena de olhos claros, mas após alguns minutos mais, cedeu. Lauren aproveitou e corrigiu a posição da garota em seu colo, de modo a deixá-la completamente aninhada em seu peito. – Você pode, por favor, não ir a lugar algum? – Pediu em tom manso e profundo.

– Não posso prometê-la isso.

– Prometa que não sairá da universidade. – Camila descansou a cabeça na curva entre o pescoço e o ombro da maior, admirando a vista marítima. – Prometa que Jeremy não ganhará essa e que tudo dará certo. – Suspirou ainda sem responder. – Prometa que as coisas não irão mudar. – Brincou com os dedos pálidos que descansavam em sua barriga. – Prometa alguma coisa. Qualquer uma.

Camila olhou para o mar mais uma vez antes de erguer parte do tronco e virar-se, tendo agora como vista única os belos olhos verdes e inseguros de Lauren. – Eu prometo que a universidade não é o laço que nos une. – Selou os lábios na bochecha de Lauren. – Prometo que Jeremy não nos vencerá em nada. – Beijou a ponta de seu nariz. – E prometo que tudo dará certo porque…

– Por que?

Quando crescemos, nem tudo muda.

Quando crescemos nosso mundo de faz de conta, de príncipes, princesas, heróis e heroínas continua a existir, mas velado. Escondido atrás de algumas grandes pilhas de bom senso, responsabilidades e obrigações. Vez ou outra expomos esse mundo para alguém cujas qualidades esperamos superem a criatividade, a imaginação e as habilidades com os consoles, mas o expomos enfim, revelando o melhor, o pior, mais puro e imaturo de nós mesmos.

– Porque sei que quero estar com você. – Camila desceu as mãos até encontrar as de Lauren, que agarravam sua cintura. Cobriu-as entrelaçando seus dedos de forma a embolá-los em um belo nó.

Na maioria das vezes selamos nossos acordos com longos contratos, mas o que preferimos mesmo é compartilhar promessas de dedinho com quem mais nos importamos ou manter ao alcance das mãos o calor de quem prezamos. E por mais que doa, sobrevivemos a incessante inda e vinda de pessoas em nossas vidas.

– Eu também quero estar com você. – Lauren sussurrou baixo, para que apenas Camila e seu precioso coração escutassem. Deslizou a ponta no rosto latino em um carinho gostoso e reafirmou o aperto entre as mãos, ainda misturadas.

Então o que muda quando crescemos?

Quando adultos, embora nem sempre pareça, vez ou outra nos prestamos a brincar de ser quem gostaríamos de ser, quem pensamos que deveríamos ser e uma centena de outros seres, que um dia descobriremos fazer parte da Identidade, infinita, de quem temos o potencial para ser. A graça já não mora em fantasiar, mas em encontrar quem fantasie, desconstrua e reconstrua com você. Talvez muito disso venha ainda a mudar em um futuro próximo, mas até lá para Lauren e Camila, juntas, a grande mudança é: a vida como uma aventura incrível, rica e alegre, já não como uma ilusão ou um sonho, mas como uma possibilidade. Para as duas, uma possibilidade tangível e com gosto de amor.

– Eu estou tão apaixonada por você. – Disseram juntas. – Por favor. – Se assustaram quando as vozes tornaram a declarar em uníssono. – Seja minha.



Gostou da Fanfic? Compartilhe!

Gostou? Deixe seu Comentário!

Muitos usuários deixam de postar por falta de comentários, estimule o trabalho deles, deixando um comentário.

Para comentar e incentivar o autor, Cadastre-se ou Acesse sua Conta.


Carregando...