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História Identidade - "...a maioria das garotas..."


Escrita por: ISBB5H

Capítulo 7 - "...a maioria das garotas..."


Twitter: ISBB5H

 

Caminhava para o campus usando o mesmo caminho de todas as manhãs. Pendurada em uma única alça tinha a mochila nas costas, apertava o caderno de desenho contra o peito e dava passos largos e pesados, fortes contra o chão. A cabeça erguida e a postura firme, mas sem esconder que hoje sentia-se um pouco diferente. Mais irritada que de costume. Mais ranzinza também. Bastante carrancuda. Tinha a expressão séria e os olhos tão espremidos entre as pálpebras que era difícil enxergar muito a frente. O maxilar também endurecido e o nariz empinado.

Não, não andava. Lauren marchava como um bravo soldado em direção ao campo de batalha. – Algum problema, Lolo? – E como sempre as duas garotas contrastavam. Karla seguia logo ao lado, mas sorrindo. Não continha seus sorrisos quando próxima da maior.

– Nenhum.

– E por que essa carinha? – Lauren desacelerou o passo ao ouvir o comentário. – Você parece zangada. Diria até que está a ponto de assassinar o próximo pobre coitado que cruzar o nosso caminho.

Concluída a resposta ela bufou, e alto. – As pessoas estão te olhando, Camila. Não param de encarar. Passam por nós, te olham e cochicham. – Esmagou o caderno entre os dedos pálidos. – Tudo por causa daquele maldito boato, aquela maldita acusação.

– Deixe que falem, Lauren. Eu não posso evitar. Ninguém pode.

– Não, eu não deixo! – Esbravejou sentindo-se impotente. Nem mesmo seus olhares assassinos pareciam querer funcionar dessa vez. Talvez com alguns mais vulneráveis aqui e ali, mas ainda sim outros alunos simplesmente não se importavam com o escudo que a maior tecia ao andar sempre um passo a frente da latina. Alguns alunos continuavam a olhar, a comentar, a cochichar e até apontar.  

Naquela manhã, Camila havia deixado o próprio apartamento preparada para isso. Sabia que as pessoas estariam interessadas no boato que protagonizava e bem sabia que os comentários também viriam maldosos e certeiros. Pediu a Lauren que a acompanhasse até a reunião com a equipe de coordenação da universidade não por temer tais e tantos comentários, mas porque a presença da morena lhe acalmava. Trazia paz, segurança e era divertida. Lauren desconhecia o fato, mas tinha já o poder de despertar o melhor em Camila. – Ora vamos lá, esqueça todas essas pessoas e me ajude a esquecê-las também, Lolo.

– E como posso fazer isso?

– Me dê um sorriso, Jauregui resmungona. Me dê um belo sorriso agora.

– Eu não sou resmun… – Ao notar a língua de Camila presa entre os dentes perfeitamente alinhados e o resto da expressão sapeca, acabou percebendo também que estava prestes a resmungar. – Tanto faz.

– Me dê um sorriso. – Fingiu então um sorriso tão falso que ofendeu a amiga. Nem mesmo os lábios se esforçaram no movimento.  – Credo. Isso não conta! Se esforce um pouco mais. Por mim, por favor. – E diante de tamanha meiguice Lauren não teve escolha senão se esforçar. Estava até um pouco envergonhada, mas tentaria por Camila. Relaxou as bochechas e alargou os lábios sem querer mostrar os dentes, o que fez com que a ponte do nariz enrugasse e os olhos quase se fechassem, escondendo os lindos olhos claros. Para Camila não havia imagem mais adorável. Admirava a morena vestida com um casaco preto, a toca azul e cabelos longos quase bagunçados pelo acessório e tanta beleza fazia seu peito vibrar. – Adorável.

Entre risadas e brincadeiras seguiram juntas até o prédio designado. Os braços se esbarravam propositalmente fazendo com que as peles se arrepiassem a cada novo toque. Estavam descobrindo e experimentando novas sensações na companhia uma da outra.

Quando finalmente alcançaram o destino de Karla, pararam frente a frente e se encaram em silêncio durante alguns segundos, mas de repente, como se preparasse a amiga para a condenação certa, Lauren brincou antes de deixá-la partir para a reunião. – Aqui estamos. Suas últimas palavras?

Em um primeiro instante Camila se assustou. Era tão óbvio assim que levaria a pior no jogo contra Jeremy? Depois percebeu que a maior estava somente brincando e dando lugar ao alívio sentiu-se também debochada, mas tudo bem, estava já se acostumando as “ferroadas” de Lauren. Contudo, em um terceiro e último momento, absorveu aquelas palavras, as digeriu e permitiu que sua cabeça formasse uma resposta bastante simples. A mais honesta que poderia dar. Suas últimas palavras? É claro que seriam as últimas que gostaria de dizer se esse fosse o caso. – Eu gosto de você. Não percebe? Eu gosto mesmo de você, Lauren. – E após sussurrá-las e plantar um beijo delicado na bochecha da maior, deixou-a para trás adentrando o grande edifício.

[…]

De volta ao bloco de número cinco, Lauren assistia a última aula da manhã remexendo-se sobre a cadeira inquieta demais para ouvir o que o professor tentava ensinar. Sua mente insistia em recitar de maneira doce as últimas palavras de Camila repetidas vezes, encontrando ritmo e melodia agora ditados pelas batidas de seu coração. Essa uma nova canção para a morena de olhos claros.

Nunca havia se apaixonado. Nunca havia gostado de alguém, sequer. Pelo contrário, sempre esteve ocupada demais tentando com desespero apenas gostar de si mesma e falhando em cada nova tentativa. Tampouco achou que encontraria alguém que pudesse lhe retornar sentimentos tão profundos algum dia. Pensava não merecer tamanha benção e essa era a sua insegurança falando mais alto graças à vergonha e ao temor trazidos pela sua condição. O seu grande segredo sempre lhe impediu de investir em outras pessoas porque viver uma paixão requer entregar tudo de si, doar-se por inteiro, e há partes em Lauren que ela mesma gostaria de sufocar até a morte. Negá-las ao ponto de um dia, por um milagre divino, esquecê-las completamente.

Mas ainda havia um novo ponto a ser considerado. Será mesmo que o sentido por trás das palavras da garota menor dizia sobre tão profundo sentimento? Tão profundo e intenso gostar? Lauren poderia muito bem ter se enganado. Deveria estar enganada, e era quase ridículo considerar qualquer outra opção. Pensava que alguém como Camila era demais para alguém como ela, e disso foi tentando se convencer durante o restante da aula e da manhã, de forma que mesmo durante o almoço Normani era capaz de vê-la perdida em pensamentos pesados. Comiam apenas as duas naquela mesa e em completo silêncio até ouvirem o início de uma verdadeira confusão.

Em meio a tantas vozes altas, Lauren reconheceu primeiro a voz de Dinah, mas nem sinal de Camila. Apenas o nome da latina era tocado vez ou outra por diferentes bocas, fato que tentava ignorar para ela mesma não se juntar a confusão e dar uma lição em cada maldito fofoqueiro daquele lugar. Enfim a porta do refeitório foi aberta para que entrasse um grande grupo de alunos, os mesmos que já vira acompanhando Karla em outras ocasiões e por último a própria. Tinha a feição cansada e os olhos pequenos. Arriscaria dizer que em algum ponto da reunião havia até mesmo chorado.

– Eu não posso nem ao menos imaginar como deve ser estar na pele de Karla. – Normani disse. – Veja como as pessoas estão cochichando. É tão cruel. E nenhum deles sabe ou se interessa pela verdade.

– É… – Lauren murmurou a resposta incapaz de tirar os olhos da latina que se sentou em uma mesa distante ainda na companhia dos amigos. Ato que pareceu tão errado apesar de tão comum. Depois de tantos momentos compartilhados nos últimos dias, a morena bem queria merecer a oportunidade de sentar-se com a menor. Todos os dias se possível. A queria por perto cada vez mais e mais, apenas não sabia como pedir. Como confessar essa vontade.

– Vocês conversaram?

– Sim. Ela está abalada com a acusação, tenta esconder, mas está. Não digo que esteja preocupada com alguma possível condenação, mas o fato de alguém do próprio núcleo tê-la traído ou ao diretório à mando de Jeremy realmente a magoou.

– É mais do que compreensível. – Mani lamentou-se. Já gostava da latina. – Pelo menos os amigos estão cuidando dela, veja. – Se referiu às várias mãos que tocavam a menor vez ou outra. Gestos inocentes de carinho e apoio. Lauren notou também como alguns outros alunos passavam pela mesa apenas para cumprimentá-la e dizer palavras doces, ou o que imaginava serem palavras doces pelos sorrisos e abraços que Karla lhes dava em resposta. Perdeu tanto tempo com os próprios pensamentos que foi pega de surpresa ao voltar a ouvir a voz de Normani. – É a sua primeira vez? 

– Primeira vez?

– Apaixonada. – A morena apenas disse. – É a primeira vez que você se apaixona?

Corou furiosamente. – Eu n-não…

– Oh, por favor. É tão óbvio que você está apaixonada por ela.

– Nós somos amigas! Camila e eu estamos nos tornando amigas. É apenas uma amizade!

– Sim, e algumas pessoas tem a sorte de se apaixonar pelos amigos. Digo sorte porque bem, veja, é um verdadeiro prêmio partilhar um sentimento tão bonito com alguém já tão querido.

– Normani, você… – O nervosismo não permitia a formulação de respostas coerentes. – Não diga besteiras!

– Você pode lutar e pode até negar, mas continuará sendo óbvio. Você se apaixonou. Por ela. Por Karla. – Estendeu as mãos sobre a mesa procurando pelas de Lauren e as apertou com força. – Mas não se preocupe. O seu segredo está a salvo comigo. Eu sei como ser uma boa amiga e acredite, você tem uma boa amiga em mim.

A “amizade” com Camila era confusa, mas com Normani não. Tinham já se tornado boas companheiras e sentiam-se bem quando juntas. Era fácil e confortável. Normani era alguém com quem Lauren poderia contar na maioria das vezes e essa era uma nova e excelente sensação. – Você não… Não tem problema comigo… Com o fato de…

– Gostar de garotas? – Lauren assentiu. – Problema algum. O que você faz, quem você beija e para quem você entrega o seu coração são questões somente suas, Laur. – As duas trocaram sorrisos, isso até que Mani resolvesse provocar a outra um pouco mais usando da mais recente pseudo-confissão de que realmente existiam sentimentos de Lauren por Karla. Não notaram que ainda de mãos dadas, eram observadas por outra pessoa em posição mais distante.

Era Camila que as assistia de longe e tinha a expressão séria. Sabia da amizade de Lauren e Normani e se impressionou ao perceber que mesmo diante dessa consciência não era capaz de sufocar a pequena pontada amarga de ciúmes. O dia vinha sendo pior do que imaginava. Ouvir com clareza as acusações feitas à coordenação lhe atingira mais que o esperado. Pensar na possibilidade de uma condenação injusta lhe fazia querer cair e ceder ao pranto. Se não fosse pelo apoio de Dinah e dos amigos, não estaria ainda de pé. E por fim, havia seu último contato com Lauren e a revelação que fizera. Esperava ter sido clara, estava de fato gostando cada vez mais e mais da morena e já não conseguia ou queria guardar o sentimento apenas para si.

Baixou os olhos dizendo a si mesma que aquela era a última vez no dia em que olharia para a mesa da maior e quando o fez foi presenteada com a presença do par de olhos verdes lhe fitando com a mesma curiosidade. Coraram de longe e não puderam evitar a troca de sorrisos e acenos tímidos.

Karla foi a primeira a se levantar após o acontecido e abraçando o próprio corpo deixou o refeitório em passos lentos. Caminhou até o grande campo de futebol da universidade sabendo estar sendo seguida de muito perto e jogou todo o peso do corpo contra a grade metálica que separava as arquibancadas do gramado e esperou pela companhia que não demorou a chegar. – Foi assim tão ruim? A reunião? – Karla negou em silêncio. – Não minta para mim. – Se atreveu a levar uma das mãos até o rosto da menor e acariciou-lhe uma das bochechas devagar. – Você parece cansada. E triste.

Sem muito pensar e sem perder tempo Camila praticamente se aninhou no peito da maior e mexeu a cabeça em um pedido mudo por carinho, deixando Lauren mais uma vez em uma posição inédita. Mas como era boa essa posição. – A reunião foi terrível, Lolo. Essa acusação simplesmente não tem fundamento algum. Não foram apresentadas provas concretas e ainda sim seremos investigados pela coordenação e a pior parte é que nossos projetos em andamento já estão sendo prejudicados. Tínhamos planos para a inauguração de um novo laboratório muito em breve, mas até mesmo isso está temporariamente em suspenso. – Lauren circulou um único braço na cintura fina de Karla e foi dizendo a si mesma que acalmasse a respiração, enquanto a outra continuava a falar alheia ao que acontecia. – É tão triste ver nossos atos e decisões sendo assim questionados quando tudo o que fazemos é lutar pela melhoria do núcleo acadêmico. E é mais triste ainda que o meu nome seja o mais citado.

– Eu sinto tanto que você tenha que passar por isso.

– Eu também sinto. – Afundou o nariz na blusa de Lauren e respirou profundamente procurando esquecer os problemas. – Sinto que Jeremy conseguiu me acertar dessa vez.

– Não! – Respondeu brava. – Não pense assim. Jeremy não vale um minuto ou um segundo da sua preocupação! Pense apenas no valor do seu trabalho e nas pessoas, nas várias pessoas, que ainda confiam em você, Camz.

– Mas… Espere. Camz? – A confissão daquele apelido foi um deslize do qual Lauren já se arrependia, mas fez a outra sorrir largo ainda sem deixar a atual posição. – Então quer dizer que você também me deu um apelido? – A maior achou melhor não responder, apenas recolheu o braço de volta para si. – Ei não se preocupe, eu gostei de como soou. E por favor, me abrace de novo. Estava gostoso. – E com as bochechas vermelhas Lauren o fez, mas usando os dois braços dessa vez. Apertou Camila o máximo que pôde, mas com cuidado para não lhe causar desconforto e gostou de tudo. Desde a forma como os dois corpos se moldavam, de como os cheiros se misturavam e das temperaturas trocadas. – Você é forte.

– Mais do que a maioria das garotas, eu acho. – Respondeu baixinho.

– Você não é como a maioria das garotas, Lolo. Eu já deveria esperar por isso.

– Eu realmente não sou como elas.

Camila estranhou o tom. – E gostaria de ser?

– Às vezes. Quase sempre. – Suspirou pesado. – Todo o tempo.

– E por quê?

– Você não entenderia, Camz.

– Talvez se você explicasse… – Tentou sem querer insistir demais. Já percebera o quão fechada era a morena e não queria de jeito nenhum espantá-la. Adorava tê-la por perto.

– Não. – Foi tudo o que Lauren respondeu. Não estava pronta para arriscar e perder a pequena latina. Entendia que a verdade só causaria o afastamento das duas e já sofria com essa ideia.

– Pois quer saber? Eu prefiro assim. Gosto de você exatamente como é. – Se que estivesse certa sobre o que fazer, Camila se afastou minimamente e ergueu a cabeça de modo a deixá-las com os rostos colados.

– Você não faz ideia do que está dizendo. – Lauren esboçou uma tentativa fraca de se desviar do contato, mas tinha agora as mãos delicadas da latina segurando seu rosto com firmeza. – A maioria das garotas…

– Shiu. Não diga nada. Eu não quero saber sobre as outras garotas. Eu não quero nem pensar em outras garotas. Não sou capaz de fazer isso quando estamos juntas.

– N-não?

– Não e vou repetir. – Camila esfregou os narizes com leveza e sentiu as mãos de Lauren apertando sua cintura em resposta. – Eu gosto de você. De você Lauren. Não percebe? – Sem que os dois corpos pudessem suportar mais um único segundo daquela prazerosa tortura, Camila colou seus lábios aos de Lauren e sorriu contra e com o depósito de um beijo suave antes de repetir o ato, e selar os lábios uma, duas e três vezes mais. – Percebe?



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