Diagnóstico.
Phoenix, Arizona.
point of view; Justin Bieber.
Encaminhava-me ao compromisso arranjado para esta manhã. Sob a fervura rigorosa dos raios solares a toda manhã, o mormaço atravessara o vidro do sedã italiano, conotativamente, enternecendo-me a cada instante durante o percurso.
Embora abaixar as janelas de nada adiantar-me-ia, fi-lo. A temperatura ao lado de fora nada diferenciava-se da interna. Maldita ausência de ar-condicionado.
Impensadamente, inalei a fumaça acinzentada a misturar-se com o ar ao exterior do automóvel. A rejeição de meus pulmões foi breve, expulsando o gás por entre os meus lábios. A respiração trôpega tornou-se constante.
“Você alcançou o seu destino.” projetou-se da voz robótica do GPS, o qual Jeremy ajudara-me a instalar ao caminho para o seu colégio.
A fachada do estabelecimento era extensa. Tons dourados revestiam as pilastras a sustentar o chamativo letreiro no qual apresentava as três estrelas que possuía o restaurante.
Havia jardins e recepcionistas próximos à porta, estas detalharam a mim a função na qual eu adotara.
Responsável por conduzir todos os carros ao estacionamento, posicionei-me detrás do pequeno balcão e assisti à chegada dos clientes. Coçava o cotovelo vez ou outra com as chaves, antes de apanhar os automóveis.
Ora carros simplórios, ora sofisticados. Mesmo que estivesse quente às ruas, em forma de respeito aos donos, poupava o uso do ar refrigerado dos veículos.
Quando dirigia o belíssimo Hyundai Azera, arrisquei-me em acelerar um pouco mais.
Sem levar a ética muito a sério, rodei o quarteirão com o possante luxuoso para o que estava habituado. Afinal, em pleno século vinte e um, ainda mantinha um Alfa Romeo 2300, o qual ganhara do pai ao adentrar para a faculdade de Biologia. Eu merecia aquele mimo. Ainda que fosse breve.
Ao final do expediente, aproximei-me de meu carro parado numa área outrora sombreada. A quentura dos bancos podia ser sentida de fora. Entrei, mesmo assim.
Certa tontura embaçava a minha mente. Não sabia ao certo o que poderia ser aquela exaustão repentina, porém persisti na direção.
Avistei a dona do restaurante acenar para mim em frente ao estabelecimento. Freei. As gotículas de suor acumulavam-se sobre os meus lábios e testa.
— Gostou do primeiro dia, senhor Bieber? Perdoe-me pela ausência. — madame Shelby desculpava-se por não ter saído um minuto sequer do salão para auxiliar-me no serviço. — O restaurante estava bastante movimentado para que pudesse abandonar o saguão.
— Não há por quê justificar-se, entendo plenamente. Embora eu estivesse aqui fora, pude sen-sentir o fluxo intenso de… — o calor começou a incomodar em demasiado. — de… clientes. É. Sem problemas. Se permite-me, preciso ir.
A mesma sensação que sentira no colégio retornou. Os movimentos peristálticos num refluxo perverso inverteram-se. Tranquei os dentes, a fim de impedir qualquer catástrofe em frente a patroa do novo emprego.
Percebi o fraquejo de meu corpo. Não era mais capaz de impedir os percursos involuntários de meu organismo. O suor escorria pelo rosto. A respiração falhava.
— Senhor Bieber? — quando a dona do local chamou pelo meu nome, cobri os meus lábios e fechei os olhos, concentrando-me em manter-me são. — Está sentindo-se bem? — cerrei ainda mais o olhar, com força o suficiente para fazer com que minhas pálpebras doessem devido a pressão. — Justin!
Abri-o. A mão escorregou pelo meu rosto. Ergui os orbes de encontro aos verdes imensos os quais encaravam-me. Respondi senhora Shelby com um acenar de cabeça, até sentir a força necessária para formular uma frase digna.
— S-sim, estou ótimo. Desculpe-me. — menti.
— Procure um médico, acredito que o calor não está a lhe fazer bem. O senhor está muito vermelho. — fechei os olhos com pesar, no momento em que pude ouvi-la.
— Até amanhã, madame.
Eu sentia como se as palavras tardassem a alcançar-me. Estava aéreo.
O arrancar do carro foi breve. Nem sequer lembrava-me de ter despedido-me da dona do restaurante ou dos demais funcionários.
O trajeto não parecia-me familiar. Onde eu estava? O veículo possuía um aspecto de flutuar sobre o asfalto enquanto as coisas ao meu redor distorciam-se.
O volante girava sem controle. Perdi a entrada certa para a rua a qual recordara-me de ter vindo, pegando um desvio qualquer.
Abruptamente, rodopiei o círculo borrachudo para pegar o retorno e a poeira no chão ergueu-se. Tudo ficou alaranjado. A pouca visão tornou-se nula, e, sem entender o que estava acontecendo, estacionei. Não previa, praticamente fui obrigado pelo arbusto que colidiu contra o para-choque.
De fato, havia alguma coisa errada comigo. Sem conseguir mais protestar, gorfei. Meus olhos cerraram. O pulmão falhou. Há tempos, a troca gasosa nos lobos tem sido complicada, no entanto, naquele momento, foi subitamente mínima. Eu precisava de ajuda.
Segui para o hospital. Não sei bem como cheguei até ali. Antes que eu pudesse dar-me conta, já estava na fila para ser atendido. Os funcionários receberam-me de forma respeitosa.
Sentado na maca branca, o doutor avaliava-me. Os olhos acinzentados encararam minha ferida no braço e mostrava-me alguns empolados nas costas os quais não reparara até então.
— Há quanto tempo vem sentindo estas náuseas? — indagou, em tom sereno, o rapaz vestido de jaleco branco.
— Não sei ao certo, uma semana... Piorou ontem.
— Deite-se um pouco. — inclinei-me brevemente. — Faremos alguns exames. O senhor tem hora para chegar a sua casa hoje?
— Geralmente, espero o meu filho chegar da escola. — engoli em seco, apavorado. — Doutor, permita-me perguntar, acredita que demorará muito?
Os lábios ressecados estenderam-se num sorriso, e, ao mesmo tempo, ele negou com a cabeça. Prendi a respiração, soltando-a lentamente, num suspiro doloroso.
Por mais que não emitisse nenhum som, eu gritava internamente. O médico expunha uma feição calma, contudo a preocupação era visível através das íris claras.
Algumas horas passaram-se. Não consegui calculá-las. Inúmeros enfermeiros e técnicos mexeram em mim: uns furos nos braços; cotonetes em regiões não muito confortáveis; e, burburinhos em torno de meu corpo estirado.
Eu contava os segundos para ir embora daquele lugar. As tonalidades de branco incomodavam-me.
— Sr. Bieber, o senhor já fez ressonância magnética antes? — convocou-me o médico.
— Para que?
— Rotina, professor. — tranquilizou-me. Ou, pelo menos, tentou. — Peço que retire o piercing do nariz e o brinco. Possui piercing no mamilo? — neguei. — A máquina pode puxá-los. Troque a roupa, desvencilhe os adornos e siga o estagiário. Aguardar-te-ei na última sala à esquerda.
O avental azul em que deixa o meu traseiro à mostra não era nada bem-vindo. Desabotoei a camisa xadrez suja de gorfo, abrindo a calça, em seguida. A cueca escorregou juntamente ao jeans. Vesti a maldita bata azulada.
Respirei lenta e ruidosamente, ao empurrar a maçaneta. Guiado pelo estagiário, caminhei rumo a saleta. Mais branco. Nunca tive uma cor preferida, entretanto branca acabara de ser eleita a mais detestada.
Deitei-me na maca móvel em frente ao círculo gigantesco, o qual aparentava-me um ânus. Assim que a imagem do teto diminuía, eu pensava em quantas ligações ignoradas por Sasha estariam em meu celular. Aquelas análises específicas nunca foram feitas anteriormente. Por dentro, suplicava para que mantivesse-me firme.
Num gesto temeroso, agarrei a beirada do jaleco da técnica de enfermagem. Notei ser desvencilhado e soltei outro suspiro. Crispei os olhos para fechá-los e torcer pelo fim daquele transtorno.
Após alguns instantes, os quais, dentro do aparelho, aparentaram ser infinitos, observei o corpo ser empurrado.
— Podemos voltar para o consultório, daqui há pouco o resultado será encaminhado. — sentei-me. — Vamos?
Assenti. Em passos curtos, andei vagarosamente ao cômodo onde outrora estávamos. A fim de conceder-me maior privacidade, o médico ficara d’outro lado da porta enquanto aprontava-me.
A pequena equipe de enfermagem posicionou-se atrás do doutor no momento em que adentraram, cada um com um resultado em mãos.
Sentado à mesa de madeira clara, o especialista convocou-me para sentar. Hesitante, posicionei-me diante de si. Meus olhos encaravam-no. Os lábios sob o bigode preenchido começaram-se a movimentar.
No início, ouvi elogios quanto a pressão arterial e aos triglicerídeos. A partir dali, iniciaram os alertas sobre a quantidade de glicose no sangue. Os orbes acinzentados demonstravam conter algo a mais.
— Sr. Bieber, é com pesar que preciso alertá-lo quanto a presença de células cancerosas circulantes. — meus pensamentos dispersaram. — Precisamos de mais exames para descobrir o estágio, se há metástase e a intensidade desta mutação. Acredita-se que seja a nível intestinal. Não desespere-se, é provável que, seguindo o tratamento corretamente, o quadro seja revertido.
— Perdoe-me, distrai-me. O senhor pode repetir, doutor? — ouvira, de fato, porém não queria acreditar nas palavras. — Poderia ser pouco mais específico?
— Bieber, o senhor está com câncer. — esclareceu.
Obviamente, já imaginei como seria a minha morte. Como fumava muito na adolescência, câncer de pulmão estava na lista de possíveis causas mortais. Não obstante, doenças assim só passavam-me à mente na terceira idade. Eu nem cheguei aos quarenta.
Por mais que perder os cabelos, qualidade de vida e o emprego novo preocupassem-me, a única coisa que, realmente, afligira-me foi a minha família.
Perder a primeira vitória num jogo de futebol apavorou-me como um pesadelo. Sasha queria engravidar de uma menina, não poderia abster-me desses momentos. Eles precisavam de mim, e eu deles. Imaginar a vida medíocre a qual vivemos com a minha presença era doloroso, mas imaginá-la sem mim era ilustrar o próprio caos.
Diante dos olhos acinzentados e sob aquela afirmação fria e direta do médico, constatei que, independente de tratamento, eu estava morto.
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