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História Impasse - Último Suspiro


Escrita por: DanyStan

Capítulo 19 - Último Suspiro


Fanfic / Fanfiction Impasse - Último Suspiro

Rebecca Sullivan POV’s

Ele está aqui.

Em algum lugar.

Basta procurar. Procure-o.

Eu procurei, revirei o pequeno cubículo que chamávamos de casa, quando não passava de um quarto de motel imundo. Mas eu não diria isso à ele, nunca, eu o faria acreditar que aquele era o nosso lar e que seriamos muito felizes ali.

Mesmo que não fosse verdade.

O desespero se apoderava dos meus ossos a cada instante que passava sem saber aonde ele foi parar. Foi quando virei o rosto para a janela e encarei o sol estridente no alto do céu. O verão chegou.

“— Podemos ir lá fora quando o verão chegar, mana? — ele perguntou com a voz transbordando animação. “

“— Sim, Billy. Eu prometo. “

Deus. Não! Por favor, não! Billy não pode ter saído, ele não pode. Quando atravessei a porta e corri pela escadaria, esperava enfrentar uma longa jornada até encontra-lo, porém ele estava bem ali. Estatelado no chão.

Parei ao lado de seu corpo, o sangue tingia o asfalto de vermelho. Examinei aquele rosto, com as feições tão semelhantes as minhas. Morto. Olhei minhas mãos e estavam manchadas com o seu sangue.

Quis gritar, quis morrer com ele.

Uma luz branca me cegou por um instante e o corpo de Billy sumiu, sendo substituído por um bem menor e de cabelos negros feito carvão e não haviam feridas expostas. Mas eu sabia que seu sangue estava em minhas mãos.

Billy e Jess.

“Você traz a morte, a morte para inocentes” soou a voz afetada e esganiçada da velha cigana.

Esfreguei os olhos e minha visão estava turva quando a abri. O corpo pequeno sumira e um outro surgira, era o corpo de um homem e ele sangrava muito, seu peito estava rasgado e eu quase podia ver seu coração. Imóvel. Morto. Mas quem é ele?

Tento enxergar, mas não consigo discernir quem é.

Zayn ou Harry?

Qual deles vai morrer por minha causa?

“Você sabe a resposta.” A voz de antes gritou de forma horripilante, me fazendo tremer.

Tive um sobressalto, arregalando os olhos e subindo para a superfície, balançando a cabeça para os lados na tentativa de assimilar tudo. Respiro profundamente, puxando com força meus cabelos úmidos para trás afastando-os de meu rosto. Eu tive um sonho. Apenas isso, um sonho.

Desço os olhos, percebendo que estou na banheira, peguei no sono e por um tris não me afoguei. Talvez eu não devesse ter acordado.

Mordo o lábio inferior, olhando para as minhas mãos. Me certificando de que não estão sujas de sangue. Nada. Apenas o anel que Harry me deu, brilhando em meu dedo. Um diamante lindo, é estranho pensar que ele tem um igual, como se tivéssemos alguma espécie de ligação.

Será você o homem morto, Harry?

De repente um cheiro estranho me arranca de meu devaneio. Que merda é essa? Tem alguma coisa queimando? Em seguida um grito, um pouco afeminado demais para alguém tão grande e mais uma sequência de barulhos surgem. O miserável deve estar tentando derrubar o apartamento, não que eu esteja reclamando o lugar nem me pertence, mas ele poderia ao menos esperar que eu saia.

Bufo irritada, saindo da banheira e vestindo um roupão. Grande demais para mim. Pertence ao Zayn. Graças a deus, Harry não é atento aos detalhes, paro diante do espelho examinando meu rosto, mais especificamente minhas olheiras. Sempre que estou com Harry me esforço ao máximo pra maneirar com meus vícios e a abstinência tem sido terrível. Ainda mais agora que ao passar a noite em claro não consigo tirar Zayn do pensamento.

Sinto que sou uma covarde por estar abrindo mão dele. Quem sabe eu devesse lutar por ele, não, eu definitivamente não devo. Não é o que ele quer, nunca quis.

Preciso aceitar que tudo não passou de uma paixão avassaladora que nos consumiu por anos, apenas isso.

Vou cumprir com o meu dever e então estarei livre pra começar de novo.

Não seria a primeira vez. Poderia mudar de nome novamente e fingir ser uma nova pessoa, alguém mais interessante, pode ser.

Chequei se estava sozinha e abri uma das gavetas da cômoda ao lado da cama. Lá estava o meu estoque. O meu pedaço do paraíso, todos os meus calmantes, antidepressivos e mais uma tonelada de remédios que eu não faço a menor ideia do que servem, apenas os tomo e eles sempre me fazem ficar bem. Peguei um dos frascos alaranjados e joguei alguns comprimidos em minha mão. Fui até o closet pegando a garrafa de vodca escondida e tomei um longo gole junto das pílulas.

Ah, que alivio!

Agora está tudo bem. Elas farão efeito e em pouco tempo estarei dormindo como um bebê.

Só tive disposição para vestir uma calcinha e uma camiseta de Zayn, que ainda tem seu cheiro antes de seguir até a cozinha, encontrando uma completa desordem, panelas sujas jogadas na pia, uma infinidade de colheres abandonadas na bancada, junto com um livro de receita e ovos, farinha e bacon. An? No entanto o que realmente prendeu a minha atenção foi a fumaça. Aquilo era impossível de ignorar. Estava por toda a parte e vinha tanto do fogão, quanto do micro-ondas e o pior sem duvidas era Harry com o pequeno extintor de incêndio disparando contra o forno fechado, vale ressaltar.

— O que você está fazendo? — resmunguei, fechando a geladeira que tinha a porta escancarada, tirando o micro-ondas da tomada e o empurrando para trás, arrancando o extintor de suas mãos e desligando o fogão e por fim abrindo uma das janelas para que o ar circulasse.

— E-eu ia... — gaguejou, coçando a cabeça e abrindo o forno tirando uma forma com alguma mistura muito estranha dentro e colocando sob a bancada — fazer o seu bolo de aniversário.

Soltei uma gargalhada.

— É parece que não deu muito certo. — toquei a massa, esperando tirar algum pedaço, mas estava duro. Recolhi o dedo na hora e fiz cara de nojo — Usou cimento também?

Ele revirou os olhos verdes e puxou o livro de receitas para si.

— Não sei o que deu errado. — balbuciou encarando a página, me aproximei dele repousando a cabeça em seu ombro, sua pele estava tão quentinha e macia que eu poderia adormecer ali mesmo.

— Porque está fazendo um bolo de aniversário pra mim?

— Porque é o seu aniversário!

— Na verdade não é, já passou, babaca. E eu não gosto de comemorar aniversários. — respondi ainda me perguntando o que Harry teria colocado naquele bolo para deixá-lo esverdeado daquele jeito.

— Não foi o que pareceu quando fizemos a festa.

— Ah, você está falando daquela festa que você chorou?

— Eu não chorei, você é quem estava agindo como uma... — afastei minha cabeça afim de poder encará-lo bem quando seus olhos se prenderam na geladeira, sem coragem de completar a frase — Você não foi muito legal comigo, mas tudo bem, eu entendi que estava chateada e tudo bem, não serei um daqueles caras chatos que fica jogando as coisas na sua cara. Mesmo que eu tenha ficado muito chateado e meu coração foi ferido, por isso o choro.

— Oh, Becky, porque você faz isso comigo? Eu sou tão apaixonado e você só me maltrata! — não podia perder a oportunidade de imitá-lo mais uma vez em sua cena icônica, depois que voltamos para a boate e Harry teve uma crise de choro depois que eu devidamente me desculpei por ter sido grosseira e ficado com outro cara. Fazia beicinho e ajoelhava, fingindo estar aos prantos exatamente como ele na ocasião.

Serei eternamente grata á Debra por ter fotografado aquilo.

Styles gemeu se irritando pela minha constante zombaria e deu de ombros, seguindo em direção a sala, recolhendo suas roupas da noite passada. Na verdade haviam muitas roupas dele espalhadas pelo apartamento, roupas demais. Ainda não tinha me dado conta de que ele começara a passar tanto tempo por aqui. Mais um pouco e eu ficaria sem ter como esconder minhas bebidas.

Levei o grande livro de capa vermelha comigo quando o segui.

— Não se esqueça do seu livro Master Chef. — recebi um revirar de olhos quando Harry o pegou e enfiou em sua mala de couro. Jesus, ele trouxe uma mala, como eu não percebi isso?

— Você adora fazer piadinha as minhas custas, não é? — comentou jogando o sobretudo preto sobre os ombros e se virando para mim. Comtemplei o homem alto e forte a minha frente com um olhar felino me fitando.

Sorri de canto, ficando na ponta dos pés para fechar os botões de sua camisa, bem mais do que ele costumava usar.

— Harry, meu bem, você é a piada. Primeiro o choro, depois o bolo, sabe que se não fosse você a ter um pênis eu é quem seria o homem da relação. — dei um beijinho em seu queixo e Harry fez uma careta.

— E quem disse que você não é? — provocou, segurando minhas coxas e me puxando para cima, fazendo com que envolvesse minhas pernas ao redor de sua cintura. Enlacei seu pescoço e beijei a ponta de seu nariz, sabendo que o faria rir com o gesto — Vai sentir muito a minha falta?

— Ah, então, finalmente chegou o dia de se trancar no escritório e analisar um monte de papéis velhos pra venda da Ross? — ele assentiu cansado — Deve ser um saco, por que não deixa seus escravos fazendo isso e fica aqui comigo? Eu deixo você ficar por cima se isso for fazer com que se sinta especial. — Harry beliscou minha bunda e eu fingi gemer de dor.

— Impossível. É fundamental que eu esteja lá, mesmo que não faça a menor ideia do que estou fazendo. Além disso, toda a diretoria vai estar lá, se eu não for só vai reforçar a minha imagem de garoto irresponsável. — fechei os olhos, quando senti seu rosto afundando na curva do meu pescoço e fazendo uma trilha de beijos lentos por ali, suas mãos apertaram com mais intensidade minha cintura.

— E não seria irresponsabilidade da sua parte deixar sua namorada excitada sozinha? — suspirei ao sentir minhas costas contra a parede e seus lábios descerem até minha clavícula, seus dedos traçando círculos imaginários em meus quadris e então meus pés estavam tocando o chão e Harry se afastou, com o rosto corado e os cabelos bagunçados.

— Creio que pode sobreviver a isso. Eu não posso faltar, de jeito nenhum, nem tente me sabotar, mocinha. — disse em tom baixo e rouco e eu lhe mostrei a língua, num ato de rebeldia — Deixa de ser feia, Becky e se comporte. Nos vemos em dois dias. — usou o indicador para me chamar e neguei com a cabeça. Harry revirou os olhos e se inclinou sobre mim, depositando um beijo calmo e rápido em meus lábios, antes de se afastar e abrir a porta — Até mais, amor.

— Até! — exclamei, vendo a porta se fechar e ouvindo seus passos se afastando no corredor.

O barulho do elevador foi a minha deixa para seguir até a bancada e constatar que aquele bolo, de fato, não era comestível, abri o lixo jogando-o com forma e tudo — uma vez que estava grudado na mesma — tive um rápido surto de limpeza e cuidei de toda a bagunça de Harry, até deixar a cozinha, sala e quartos impecáveis, do jeito que tende a ficar quando Zayn costumava viver aqui. Esse tinha sido o seu primeiro apartamento, agora não passava de um entre tantos outros, ele tinha muitos imóveis que o tio nem suspeitava. Zayn possuía uma ótima condição financeira e era um dos melhores e mais admirados arquitetos da atualidade, mas a sua obsessão com a Ross o cegava pra quaisquer oportunidades.

Não o julgo, não é culpa dele ter um objetivo e se desdobrar pra consegui-lo. Desde que o conheci sei de seu desejo de se tornar CEO daquele lugar e em breve ele conseguiria.

Em breve seu sonho seria realizado e isso era o que bastava para mim. Sua alegria também era a minha. Mesmo que no momento em que ele conseguisse eu teria de entrar em um avião e voar para o mais longe possível.

Como será que eu vou conseguir viver sem ele?

Será possível que a minha pele não congele longe do calor da sua? Acredito que não.

Aturdida em meus pensamentos, mal me dou conta quando estou debruçada no peitoril da varanda bebendo a garrafa de vodca. Alguma música melancólica toca no vizinho e só serve para me deixar mais depressiva, o que é estranho, esses episódios não aconteciam há mais de quatro meses quando tive a infeliz ideia de visitar Jess.

Nunca acabava bem quando o fazia.

Ela me deixava triste quando estava bem, quem dirá na situação atual, ver ela naquele estado só me fazia mal. Diferente de Zayn eu nunca consegui amá-la, não do jeito que deveria, não como uma mãe. Sinto a dor voltando com força a afligir meu peito, porque eu sei que ainda está lá, a vergonha, a culpa, e o remorso por ter feito o que fiz.

Ainda me lembro de vê-la correndo pela casa, brincando com um dos vidros de remédios e de não ter feito nada, de não tirar de sua mão e impedi-la de tomá-los. Eu apenas assisti tudo de camarote. No inicio pensei que era isso o que eu queria, afinal, quando duas pessoas se amam elas têm filhos, certo? É como a extensão de seu amor, mas não foi o que aconteceu. Quando a Jéssica nasceu eu perdi o meu posto, me tornei invisível aos olhos de Zayn ela era tudo o que existia e antes que eu me desse conta estava odiando minha própria filha e sentindo ciúmes dela, a vendo como uma rival pelo amor de Zayn.

Que tipo de monstro pensa tal coisa da filha? De um bebezinho?

Aquela foi sem sombra de dúvidas a minha pior fase. Estava literalmente louca. Completamente fora de mim quando a envenenei e depois armei para que parecesse um acidente.

Eu sei que se ele soubesse que foi tudo premeditado ele me mataria. Por mais de uma vez eu quis fazer, quis me matar, mas não é certo. Ainda preciso pagar pelo meu crime. Não seria justo com ela.

Faria qualquer coisa para poder voltar no tempo e me impedir de cometer aquela loucura. Por minha causa ela está presa naquela cama de hospital há anos. Esse é o meu talento, destruir as pessoas, machucá-las até levar um ponto em que não há mais retorno.

Primeiro foi com Billy, o meu pobre irmão mais velho, que era bom e inocente demais para esse mundo podre. Eu tentei protege-lo, mas havia aquele lado sombrio que estava farto de ter de cuidar de um garoto especial, eu queria ser livre e então ele se foi. Atropelado numa manhã de verão, sem o direito de um sepultamento decente. Anos mais tarde veio a Jéssica e eu realmente achei que seria o momento certo, a minha chance de redenção, mas toda a merda na minha cabeça começou a gritar e quando dei por mim eu a tinha colocado num coma irreversível.

Ela nunca vai acordar e também não irá morrer. Zayn jamais irá permitir que desliguem os aparelhos.

Por mais que ele não deixe transparecer tenho plena consciência de que isso o consome. Porque ele a ama demais e não pode aceitar que a sua garotinha nunca mais irá abrir os olhos. De certa forma eu o quebrei, destruí um pedaço valioso de seu coração e não tem como voltar atrás.

Sei que estou prestes a fazer isso com Harry.

Harry.

Sinto a garrafa leve em minha mão e caminho até o quarto, puxando mais uma garrafa de fundo do closet e em três longos goles a esvazio por completo. Herdei o talento da minha mãe para bebida, é tão fácil e natural quanto respirar para mim, mas não importa o quanto eu injete álcool em minhas veias. Não faz resultado, não ameniza em nada a dor que estou sentindo.

Entro no banheiro e novamente tomo um susto com a quantidade de cremes e shampoos que dominam as prateleiras. Definitivamente Harry Styles é um homem fora de série. Vasculho o pequeno armarinho e encontro a caixinha branca, retiro a tampa e pego uma das lâminas. Fecho o armário e volto a encarar meu reflexo, pareço tão pálida e fantasmagórica agora. Não sou nem a sombra da garota que costumava ser, eu gostava dela, da bonequinha. A doce e altruísta Blair Sutter morreu há muito tempo.

Sinto uma fisgada quando passo a lâmina de gilete na pele fina a poucos centímetro de meu pulso. Não tenho a intensão de cometer suicídio, nem nada do tipo, esse é apenas um dos meus hobbies, algo estranho que tende a me acalmar. Apenas mais um na minha longa lista de problemas que precisam ser tratados com urgência. Repito o ato no outro braço. É superficial, nada mortal que me fará sangrar até a morte, mesmo assim algumas gotas vermelhas tingem o chão enquanto sigo até o quarto, acima da cabeceira da cama está um mural que Harry e eu montamos no dia da festa, quando ele chegou cheio de energia graças a embriaguez e quis ver as fotos que eu havia tirado de nós desde que começamos a namorar.

Até aquele dia não tinha percebido que a fotografia havia se tornado uma mania prazerosa para mim. Eu gostava de fotografar, melhor dizendo, fotografá-lo. Havia algo de especial em tirar fotos de Harry, ele nunca estava posando de verdade, eram todos momentos espontâneos e ele saia tão bem neles. Tão naturalmente tranquilo e lindo, e o mais curioso era que ele sempre estava sorrindo ou fazendo alguma cara engraçado que nos fazia rir.

Era o que eu fazia agora, olhando a coleção de fotos com seu rosto preso a minha parede. Havia dele em Malibu, ouvindo a tal Patrice xavecá-lo, durante a noite, pouco antes de nosso beijo. Na quadra de basquete com seu uniforme de High School Musical. O nosso falso pedido de casamento, outra que havia sido tirada pela irmã dele no baile da sua família e outras em momentos aleatórios quando nos víamos sozinhos e eu estava entediada. A mais recente era a do dia em que Prin veio nos visitar e começou a chorar por não poder mais fazer tranças em Harry, então para compensá-la ele a deixou maquiá-lo. Não perdi a oportunidade de registrar o momento e ali estava, seu rosto coberto por uma tinta brilhoso e Princess agarrada em seu pescoço, orgulhosa de sua arte.

Durante aquela tarde, nós três parecíamos uma família, de verdade e em momento algum eu senti ciúmes ou me incomodei com o grude de Prin com ele. Acreditava que fosse por eu não sentir nada por Harry, mas isso não é verdade. Eu sinto algo por ele, porque enquanto olho essas fotos e penso nele, um sorriso genuíno toma conta  do meu rosto e o simples pensamento de cada um desses momentos ao seu lado me faz querer sorrir ainda mais.

Se eu tivesse uma filha com ele acabaríamos da mesma forma ou seria diferente?

Porque amar Zayn parece tão difícil e desgastante, como se eu usasse uma força descomunal a cada toque e beijo que lhe dou? Porque é tão mais simples com Harry?

— O que é isso, Rebecca? Você não está aqui pra amar ninguém. — sussurro, dando a volta pelo quarto e desviando os olhos do mural. A última coisa que eu preciso é isso. Olho para cada detalhe do apartamento e tudo parece tão absurdamente limpo e intocável como se não morasse ninguém ali, como se eu não estivesse em pé, aqui e agora. Merda, merda, merda — Sei exatamente do que eu preciso. É a falta de sono, ela me faz delirar. — vou até a cômoda e pego mais alguns compridos, estranho, os que tomei mais cedo deveriam ter feito efeito há muito tempo.

Aliás, quanto tempo se passou? Sei lá, dou de ombros e os tomo acompanhados de algumas doses de whisky. Torno a perambular e nada, nem um pingo de sono. Meia hora mais tarde estou repetindo o processo e engolindo um pouco mais, talvez seja porque não estou nem um pouco cansada, costuma funcionar quando eu faço algo. Ligo o som no último volume e começo a dançar ao ritmo de uma música bem agitada.

Um vulto chama a minha atenção, tenho a impressão de que tem alguém na cozinha.

— Harry? — chamo, mesmo sabendo que não pode ser ele. Não ouvi o barulho da porta, deve ter sido apenas impressão. Volto a dançar e então escuto um barulho vindo do quarto, corro até lá e está vazio. Eu só posso estar delirando e então, novamente uma sombra na cozinha, sigo até lá em passos cautelosos e como esperado não há ninguém.

Jess.

Arregalo bem os olhos ao ver o que parece ser o corpo dela esparramado no chão, olhos vidrados e uma espuma branca sai de sua boca e seu pequeno corpo inteiro treme convulsionando. Não faço a menor ideia do que fazer, ela não para e começa a fazer sons de grunhidos, como se sentisse dor. Repentinamente os movimentos cessam e ela fica imóvel, os olhos bem abertos olhando pra mim.

Parece morta, dou um passo a frente e ela pisca, salto para trás quando ela diz:

— Vai mesmo me assistir morrer, mamãe? — seus olhos escuros queimam de ódio e meu coração afunda ainda mais quando escuto uma voz as minhas costas.

— É o que você faz de melhor, não é, Blair? — dou de cara com Billy. Metade de seu rosto está esmagado, como consequência do atropelamento e sangue jorra de seu peito, olho para os meus pés e uma poça se forma ao meu redor.

— Isso não é real, eu estou delirando. É apenas um delírio. — tentei me convencer, levando as mãos a cabeça e apertando os olhos com força.

— Blair, abra a porta! Abra a porta, garota maldita! Se não abrir eu vou arrombar e você sabe o que te espera quando eu entrar. — a voz inconfundível berrava e a maçaneta começou  a sacudir e a porta tremia como se alguém realmente estivesse fazendo pressão para derrubá-la — Eu vou matar você, desgraçada! — era o meu padrasto. Era a sua voz. Ele estava aqui. Depois de todos esses anos tinha me encontrado e assim como antes estava louco pra descontar toda a sua raiva em mim. Mal tive forças para correr até meu celular e me esconder atrás da bancada, ainda com medo que Jess voltasse a aparecer. Não fazia a menor ideia do que fazer, apenas queria que alguém aparecesse e o mandasse sair de perto da minha porta. Liguei para o primeiro número que achei.

— Alô? Rebecca, eu te disse pra não... — ouvi a voz de Harry do outro lado da linha e não fui capaz de conter o choro aliviada, ele atendeu, em pouco tempo estaria aqui. Ele viria me salvar.

— Harry, você precisa voltar, agora. Ele está aqui, ele me encontrou e quer me matar. — conseguia dizer em meio aos soluços, derrubei o celular por não  conseguir conter os tremores em minhas mãos.

— Rebecca? Rebecca? — ele gritava quando aproximei o telefone do ouvido, meu soluço serviu como aviso que estava de volta — Do que você está falando? Quem está ai?

— Meu padrasto, ele quer me matar. Só porque eu não o deixo fazer comigo o que faz com as outras. — sussurrei, esticando o pescoço a tempo de ver a maçaneta sendo agitada violentamente — Harry, por favor, volta pra casa. Eu estou morrendo de medo, não sou mais tão corajosa.

— Ok, ok, amor, se acalma. Eu vou ligar pra policia...

— Não. — gritei o mais alto que pude — Policia não, eles também querem me machucar. Eu preciso de você, só de você, Harry. Se você não estiver aqui em cinco minutos eu juro que pulo dessa janela e a culpa vai ser sua. — as palavras escapavam de minha boca sem que eu tivesse o menor controle. Tudo o que eu sentia naquele momento era medo, não, pavor, um pavor tão grande que me fazia sentir calafrios dos pés a cabeça.

— Certo... — Harry ofegou, tão apavorado quanto eu — Estou indo pra casa. Apenas espere por mim. Promete que vai esperar? — implorou ele. Primeiro assenti com a cabeça freneticamente até me dar conta de que ele não podia me ver.

— Sim. — minha voz era um sopro inaudível até mesmo para mim. Larguei o celular aos meus pés e embora Billy tivesse desaparecido eu ainda tinha meus pés e pernas sujos de sangue, ergui as mãos e elas também estavam vermelhas.

— Você traz a morte. — cai no chão ao me assustar com a figura assombrosa que surgira ao meu lado. A maldita cigana.

— Sai daqui. — ordenei sem firmeza alguma.

— Você traz a morte. — ela repetia se aproximando cada vez mais de mim, me arrastei para longe de seu alcance, parando no meio da cozinha e tornando a me assustar com os urros que vinham do lado de fora e tendo cada vez mais certeza de que em breve aquela porta viria a baixo.

Não, não posso pensar assim. Harry disse que estava vindo. Ele vai chegar.

Não vai ser como Zayn que me deixou sozinha na última vez e depois me trancou numa maldita clinica. Harry não vai fazer isso, ele é diferente, tem que ser. Usei minhas forças remanescentes para me pôr de pé e respirei fundo, tentando normalizar minha respiração e acalmar meus batimentos cardíacos. Encarei fixamente a porta, tendo a certeza de que a qualquer momento Harry entraria por ela e tudo ficaria bem.

Tudo vai ficar bem. Tudo vai ficar bem. Tudo vai ficar bem.

— Tudo vai ficar bem, bonequinha. — senti a respiração quente em meu pescoço e mãos frias empurrando meu cabelo para o lado e a seguir uma dor agonizante como se tivessem enterrado uma faca na minha coluna, bem fundo e começassem a puxar e enfiar novamente sem parar. Tentei gritar ou correr, mas eu não podia, algo grande e pesado estava sobre mim, me impedindo de fugir. Estou presa, completamente inerte. Sem força ou voz, o que me resta é chorar e nem isso eu consigo porque não possuo mais lágrimas e aquela boca asquerosa roça em meu ouvido, repetindo suas palavras imundas que até hoje me causam pesadelos — Eles estão vindo, baby, eles querem brincar com você também. Seja uma boa, menina e geme pra mim. — mordi os lábios com força, me recusando a obedecê-lo e a faca foi enterrada com mais força e ainda mais fundo, um pouco mais e eu a veria saindo pela minha barriga — É melhor se comportar, eles não gostam de meninas malvadas. — olhei para a porta e eu pude ouvir suas vozes, as risadas e as palavras podres que saiam de suas malditas bocas. Todos os malditos policiais que estavam loucos para brincar com a caipira de dezesseis anos.

A maçaneta girou uma única vez e a porta foi aberta. Eles estavam aqui. Era o meu fim. Senti minhas pernas fraquejarem e o ar pesar em meus pulmões, ergui os olhos e tudo o que enxerguei foram vultos, e todos seguiam até mim e então eles me alcançaram. Me seguraram, enquanto eu caia.

— Não, me solta. Tira as mãos de mim. — gritei, lutando para me livrar de suas mãos grandes e fortes que prendiam meus braços e me faziam sentir uma ameba fraca e insignificante.

— Rebecca, se acalma. — dizia a voz distante, ela soava familiar, mas eu não sabia de quem era.

— Não. Me solta. — continuei a gritar, estava cada vez mais cansada e respirar era difícil demais — Por favor não me machuca... — choraminguei sentindo a minha pele arder.

— Eu não estou te machucando, mas você está. — o senti tentando afastar minhas mãos de meus rosto, tentava tapar meus olhos — Para de se arranhar, por favor. Eu te imploro, Becky, para com isso... — a ardência se tornou insuportável na região do meu pescoço — Ah, meu deus, você vai está tentando arrancar a própria pele. Rebecca, olha pra mim, sou eu, o Harry, eu estou bem aqui. Com você, estou na sua frente, basta abrir os olhos.

Eu quis abrir os olhos. Quis acreditar que ele estava bem ali na minha frente e que tinha mandando todos aqueles homens maus embora, mas não eu tive tempo porque senti aquela faca em minhas costas ser arrancada e não fui capaz de permanecer acordada depois daquilo. E com um último suspiro parei de lutar e cai sobre um corpo quente e macio que me segurava com força. Quis imaginar que era Zayn quem havia vindo me resgatar.



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