História Inexplicável - Acaso.

É véspera de natal e o escritório que Hermione Weasley trabalha fervia com energia, nesse dia ela estava excepcionalmente animada, ela havia escolhido e aprovado diversas matérias realmente boas e tinha a real certeza que as mesmas dariam bons pontos de audiência ao canal. Estava feliz por ter feito um bom trabalho e mesmo com seu emocional abalado pela briga que teve com seu marido mais cedo, ela se sentia satisfeita.

Hermione reuniu suas coisas que estavam espalhadas pela mesa e guardou na bolsa, prendeu o cabelo cacheado em um coque e se levantou colocando a bolsa no ombro.

—Já vai, Mione? — perguntou sua colega de trabalho. Ela era uma das únicas que apesar da relação chefe/funcionária a tratava como uma amiga.

—Sim. — Respondeu alheia — Já terminei meu serviço, além do mais preciso comprar alguns presentes antes de ir para casa. Tenho certeza que as lojas estarão super lotadas.

—Boa sorte. — Ela desejou sorrindo.

Quando Hermione se aproximava da saída da sala é interceptada por nada menos que seu chefe. Ele vê a mulher e sorri, mesmo não parecendo realmente feliz em vê-la.

—Sra. Wesley, eu estava realmente querendo falar com você! Acompanhe-me, sim?

—Claro. - Respondeu ela com um tom de incerteza na voz.

Ela seguiu o homem até sua sala, no local se encontrava sua estagiária mais recente, ela estava sentada em uma das cadeiras. Era uma mulher recém formada na faculdade de jornalismo, tinha os cabelos loiros cacheados e longos e olhos azuis intensos, seu rosto era pequeno e redondo e ela sempre parecia estar dando um sorriso irônico, mesmo assim Hermione não tinha nada contra ela.

—Srta. Brown, pode se retirar. Irei falar com Hermione agora.

Hermione tentou não demonstrar confusão, ao ver que o chefe e Srta. Brown haviam discutido provavelmente o mesmo assunto que ela discutiria agora.

—Tudo bem. – ela olhou para Hermione e deu um sorrisinho mínimo.

—Sente-se  —Indicou seu chefe.

Hermione sentou e olhou para o homem mais velho com curiosidade, ela não conversava com o chefe desde a chegada da estagiaria, estava sempre muito ocupada ajudando-a e ensinando-a da melhor maneira que podia. Além disso, sempre havia muito serviço e intercalar os dois tinha sido complicado para ela, entretanto, ela havia realizado um ótimo trabalho até o momento, muito obrigada.

—Primeiramente gostaria de elogiar você, o jornal já está no ar e uau! Você fez uma seleção incrível de matérias, não esperava menos de você. Tenho certeza que nossa audiência vai subir alguns pontos.

—Obrigada, senhor! —Ela fala se permitindo ficar animada, embora o bolo de preocupação ainda existisse em seu estômago.

—Em segundo lugar Hermione, quero deixar claro que gosto muito do seu trabalho. Muito mesmo, mas você é obsoleta, material velho. Você sabe que no mundo de hoje temos que estar sempre inovando, sempre buscando por algo melhor. Por isso, você está sendo destituída do seu cargo em prol de uma colega mais jovem e recém saída da faculdade. Ela ainda sabe tudo que você sabe, o que lhe torna dispensável para o funcionamento do jornal. — O homem pegou uma pilha de papeis de dentro da gaveta da sua mesa e tirou uma caneta de dentro do bolso do paletó, colocando os papeis e a caneta na frente de uma Hermione chocada. — Por isso, aqui está seu papel de demissão, essa segunda folha contém o valor que vai ser depositado na sua conta no final do mês.

—E-eu não entendo — gaguejou — Se gosta tanto do meu trabalho por que está me demitindo?

—Ora Hermione, não é uma questão pessoal, seus serviços apenas não são mais necessários. Agora assine aqui, não torne mais difícil do que realmente é.

Sem ao menos olhar o valor que receberia Hermione ainda chocada assinou o papel e entregou de volta para seu antigo chefe, um rebuliço de emoções dentro dela. Ela realmente gostava daquele emprego, perdê-lo foi como receber um tiro de alguém que ela não esperava. Ela percebeu que o homem ainda falava, então balançou a cabeça e tentou focar em suas palavras.

—... Aqui está, pode colocar suas coisas aqui. — Ele entregou uma caixa dura de papelão para Hermione.

A garota levantou-se estupefata com a situação, queria gritar com o homem, mas se conteve. Voltou para sua sala cabisbaixa sem conseguir encarar ninguém, para sua surpresa Lilá Brown estava sentada em sua cadeira conversando com Parvati, a colega de trabalho de Hermione.

—Oh Mione, você foi demitida?- Falou Parvati com a voz arrastada e muito doce para o gosto dela — É realmente uma pena, todos aqui sentirão muito sua falta!

Hermione ignorou o tom irônico da morena e começou a guardar suas coisas o mais rapidamente possível, engolindo em seco e lutando com as lagrimas. Como podia? Como podia ter sido demitida se desde que chegou ali às reportagens tinham melhorado em muito, tanto em qualidade quanto em conteúdo? Como poderia ter sido substituída tão facilmente? Como pode acreditar que a mulher que sentava ao seu lado no pequeno cubículo que chamavam de sala realmente lhe considerava uma amiga?

Terminou de guardar suas coisas e sem olhar nenhuma vez para trás saiu do da sala batendo a porta. Algumas pessoas da redação lhe olharam assustadas, mas ela não se importava mais.

☀☀☀

 Hermione ainda estava abalada com a demissão, porém conteve suas lagrimas de frustração, ela não queria deixar aquilo estragar um dia festivo. Seu marido ainda não tinha chego do trabalho, então ela começou a se arrumar para ir à casa do seu melhor amigo, já que naquele ano o natal seria comemorado na casa dos Potter. Hermione colocou um vestido azul de manguinhas curtas e drapeado na cintura que valorizava suas curvas. Fez uma trança embutida que deixou seu cabelo preso ao redor da cabeça e olhou para maquiagem desanimada, não tinha ânimo nenhum para passar um batom sequer. Lembrar da briga que tivera com Rony mais cedo lhe desanimava, mesmo assim, lembrou-se de Gina e como a amiga estava sempre bem arrumada e bonita e resolveu passar um pouco de maquiagem também.

Quando estava terminando de se arrumar Rony chega, ele estava vestido com sua roupa comum de escritório,camisa social, gravata e suéter escuro. Seus cabelos ruivos pareciam mais bagunçados que o normal e seus olhos carregavam um pouco de cansaço.

—Boa noite, Mione- Ele sorriu ao ver a esposa e caminhou em sua direção.

—Boa noite, Rony- Respondeu ela recebendo com surpresa um selinho do marido.

Quando ele a soltou Hermione encarou o ruivo e ergueu a sobrancelha. Será que eles já tinha se esquecido da briga que eles tiverem mais cedo?

—Eu vou tomar um banho rápido e me arrumar e então vamos. Tudo certo?- Rony fala já tirando o suéter e a gravata. — Me desculpe por atrasar hoje de novo, mas eu e Harry fechamos um contrato com uma grande empresa! Vamos fazer a segurança de uma multi nacional. Eles pediram todos os equipamentos novos, então passei a maior parte do dia em reunião com fornecedores. — Ele sorri animado, Hermione retribui com um sorriso pequeno.

—Tudo bem, Rony e eu ainda estou terminando de me arrumar.

Assim que se formaram Rony e Harry abriram uma pequena empresa especializada em segurança e com o tempo a empresa foi crescendo até se tornar um dos grandes nomes nesse mercado. Hermione estava feliz por eles, mas ela sabia que era só uma questão de tempo até ela e Rony terem mais uma de suas muitas brigas, já que o ruivo queria que ela deixasse o mercado de trabalho e cuidasse da casa e dele, fato que ela não queria aceitar. Hermione se recusava a ser sustentado pelo marido, queria trabalhar mesmo que não precisasse disso.

Abriu sua caixa de jóias e pegou o cordão mais simples que Rony lhe dera, porém seu favorito — Rony havia comprado para ela com seu primeiro salário. — Ela colocou o cordão em seu pescoço e depois colocou brincos e pulseiras. Ela se olhou no espelho se avaliando e deu uma voltinha, se sentindo bonita.

—Até que não estou tão mal- Falou dando um pequeno sorriso por fim.

Como o tempo estava terrivelmente frio do lado de fora, ela pegou seu sobretudo e colocou por cima da roupa de festa, além do cachecol e o gorro, tentando não estragar a trança. Assim que Rony terminou de se arrumar os dois entraram no carro e foram em direção a casa dos amigos. Não conversaram nada no caminho, Hermione olhava a rua distraída e Rony colocou a música em um volume razoavelmente alto para preencher o silêncio dos dois.

—Eu fui demitida. — Falou Hermione de repente ainda encarando a janela pensativa.

—Eu falei que isso aconteceria uma hora Hermione, e o que pretende fazer agora?

 —Fazer currículo e procurar um novo emprego. — Responde ela encarando o marido, erguendo uma sobrancelha esperando a resposta dele.

Rony aperta o volante tão forte que os nós do seu dedo ficam brancos.

—Já discutimos isso, não foi? Falamos que se você perdesse o emprego ia acabar de vez com esse negocio de "Preciso trabalhar" e ficar em casa. Que você focaria na nossa família.

—Ronald Weasley! Eu nunca concordei com isso! Você sabe muito bem que eu não quero ser sustentada por homem nenhum. Eu tenho inteligência e capacidade para arrumar um emprego e me sustentar sozinha se for preciso!

—Tem capacidade para arrumar um emprego, tem capacidade para ser inteligente e se sustentar sozinha, mas não tem capacidade para gerar um filho?! Se eu não tiver pelo menos um herdeiro com quem você acha que vou deixar tudo isso que estou construindo? Todo o meu trabalho vai simplesmente ir por água a baixo?

Os olhos de Hermione encheram de lágrimas, ele havia tocado na ferida.

—Estamos tentando ter um filho há muito tempo, eu não tento culpa se não vingou ainda! E “herdeiro”? Desde quando você tem esse papo? O que você é, rei da Inglaterra?

—Claro que tem culpa! Você não consegue segurar um filho meu! Já perdeu duas vezes!  Como você acha que eu fico perante todos com uma esposa que nunca está em casa e sem ter nenhum herdeiro? E me desculpe se eu trabalho como um condenado para ter um nome para deixar.

 —Eu não tenho culpa! Eu também quero ter um filho, mas eu quero ter um emprego e uma vida minha também. Não quero e não vou viver em função da sua vida Ronald!

—Isso nós vamos ver. — Declara tão bravo quanto ela.

Hermione bufa e desliga a música que até então tocava.

Eles chegaram à residência dos Potter e mais uma vez Hermione se surpreendeu com o quanto a casa reconstruída havia ficado parecida com a original. Os pais de Harry eram atores famosos que haviam morrido num incêndio criminoso provocado por um fã enlouquecido, Harry foi o único da família a se salvar. Anos depois o Potter mais novo retornaria para a casa e a reconstruiria em homenagem aos pais mortos.

O gelo cobria boa parte dos enfeites de natal. Hermione se encolheu dentro do seu sobretudo e não pode deixar de pensar que aquela noite provavelmente seria uma das mais frias do ano.

—Vamos, eles nos estão esperando. — Ronald ofereceu a mão para Hermione sem encará-la. Ela bufou e seguiu caminho sem segurar a mão dele, se ele quisesse manter as aparências faria isso sozinho.

 Dentro da casa estava quente e aconchegante e seus amigos esperavam para a pequena comemoração. Neville e Luna eram um casal relativamente recente e que todos achavam improvável ate então, porém o amor dos dois era quase palpável.

 Gina estava elegante num vestido preto com um decote pequeno e suas jóias  eram discretas e de ouro vermelho. Seus cabelos da cor de chama estavam presos em um coque bagunçado que a deixavam ainda mais bonita.

Harry vestia calça e camisa social com alguns botões abertos e seus cabelos estavam incontroláveis, como sempre. Os óculos tortos na ponta do nariz e a cicatriz engraçada em sua testa, que ele adquirirá quando sobreviveu ao incêndio criminoso.

—Boa noite! —Gina veio na direção dos dois para abraçá-los. -Vamos comemorar!  — Ela parecia muito animada.

—Boa noite! — Respondeu Hermione abraçando a amiga de volta

— Você esta tão bonita! Algum motivo especial? — Perguntou cutucando o ombro da amiga com o seu de leve.

Gina gargalha.

—Você vai saber! Só que agora não! — Dizendo isso ela entrou animada na sala de jantar e Hermione revirou os olhos antes de segui-la.

Rony foi conversar com Neville e Harry e Luna arrumava alguns enfeites estranhos que trouxera de casa. A noite passou animada, Hermione bebeu muito mais do que era de seu costume e ficou o mais longe possível de Rony, ou pelo menos o máximo que seus assentos lado a lado permitiam. Se seus amigos notaram algo errado não comentaram nada.

Na meia noite os fogos começaram a ser estourados do lado de fora da casa todos trocaram presentes e riram bastante das escolhas excêntricas de Luna e Neville.

—Então, pessoal, dessa vez fizemos uma festa menor que o de costume e convidamos só os amigos mais íntimos e meus pais, que me deram bolo por estar viajando — Ela riu e depois revirou os olhos — Da pra acreditar? De qualquer forma convidamos poucas pessoas porque queríamos apenas que os mais íntimos soubessem da novidade... — Ela suspirou fazendo uma pausa dramática — Eu estou grávida!

Luna gritou assim como Gina e as duas se abraçaram. Hermione abraçou a amiga feliz também e Harry recebeu felicitações dos amigos. A castanha olhou para Rony e percebeu que ele sorria, porém por baixo da máscara de felicidade a festa havia azedado para ele. Não deu outra, meia hora depois do anúncio ele falou para todos que não estava se sentindo bem.

 —Vamos Mione, acho que eu bebi de mais esse ano, estou muito cansado e um pouco tonto. Vamos para casa?

 Ela se despediu dos amigos e pegou seu sobretudo e seus outros acessórios que estava pendurado. Assim que eles entraram no carro Rony começou a reclamar, como esperado.

 — Minha irmã mais nova, mais NOVA esta grávida Hermione, até Harry vai ter uma criança e nós dois não! Você tem realmente tem certeza que vai começar a procurar um emprego e deixar nosso casamento de lado?

—Ronald Wesley! Eu já disse que não vou ficar em casa sendo sustentada por marido nenhum. Eu também quero ter um filho, também quero engravidar, eu só não tenho culpa se não aconteceu ainda!

—Você já parou pra pensar que o problema pode ser você? — Pergunta ele rispidamente.

Hermione fica chocada. Sua boca se abre num pequeno "O" e as lágrimas que ela lutou tanto para segurar começaram a sair.

—Você é o cara mais idiota que eu já conheci na minha vida, Ronald Weasley.

Hermione tirou o colar que Rony lhe dera e jogou na direção do ruivo.

—Pode ficar. — Falou chorosa.

—Hermione eu...

Hermione abriu a porta do carro e saiu correndo, a neve havia começado a cair e a garota tremia com o frio, porém não voltaria para o carro para pegar suas roupas de frio. Ela correu por vários minutos chorando, sua noite estava sendo péssima.  Ela sempre gostou muito de Rony e achava que seu casamento com ele seria mil maravilhas, mas depois de dois anos o casamento havia começado a desandar e qualquer coisa era motivo de briga. Se ela tivesse ouvido melhor seu coração, não teria se metido nesse casamento sem sentido e fadado ao fracasso.

Como era natal a rua estava praticamente deserta, havia um homem caminhando na direção que ela corria e duas outras pessoas ajudando um morador de rua, tentando convencê-lo a ir ao abrigo mais próximo. Ela olhou para trás para checar se Rony a seguia e por conta desse erro tropeçou e seu salto quebrou, ela fechou os olhos esperando o impacto com o chão, mas esse não ocorreu.

Abriu os olhos, o homem que ela viu caminhando em sua direção havia lhe segurado.

—Obrigada. — Falou ela se afastando dele ainda chorando e tentando em vão limpar as lágrimas que escorriam.

 —Granger? — Ela se assustou, há muito ninguém lhe chamava assim, mas aquela voz... Aquela voz ela conhecia.

Ergueu os olhos e foi encarada de volta por aqueles olhos cinza intensos.

"Ah não, ele não" — Ela pensou.