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História Isabella - Novato


Escrita por: Estherzinha13

Capítulo 2 - Novato


Foi assim que eu fiquei paraplégica. Agora, dois anos depois, moro no mesmo lugar, mas quase não saio de casa, desanimada. Eu nunca mais falei com o Paulo de novo. Ele continua morando na minha frente, mas mesmo assim, não o vejo. Passo meus dias confinada em meu quarto, saindo apenas para a escola. Paris, a cidade do amor, podia ser bela, mas não deixava de ser triste para mim. Eu era confinada aos livros. Eles eram meus amigos, meus amores, meus amantes. Era minha diversão, além de sonhar romances para mim. Mas poderia alguém amar uma "anormal" como eu, que sequer andar por si só pode? Achava que não. Mas um dia pode mudar toda uma vida. Fui à escola de manhã, o desânimo em pessoa. Mais uma manhã interminável numa vida inútil. Era o primeiro dia de aulas após as férias de meio de ano e haviam vários novatos. Eu, como de praxe, sentei-me no fundo da sala. Ninguém sequer chegou perto, para variar. Estava pronta para encarar mais um dia chato, mais uma semana, um mês, um ano, uma vida. Mas algo me movimentou. Estava pronta para dormir sobre a carteira, a primeira aula era de matemática, eu entendia, e era chata. Deitei a cabeça na mesa. O professor Josenildo entrou, iniciando a velha monótona aula. Mas um aluno... Diferente... Bateu à porta. Outro novato. Josenildo, sendo bem tolerante em termos de horário, deixou que ele entrasse. Ele entrou, envergonhado. Sentou-se ao meu lado. Claro, não havia mais lugares na sala. Ele acenou para mim, tímido. Acenei de volta e retornei ao mundo dos sonhos. Pouco depois, ele me cutucou.
- Ei... Você está entendendo o que ele está falando?
Um pouco grogue, olhei para o quadro. Havia uma fórmula para medir o perímetro de um círculo: 2π•R. O velho "2Pierre". Olhei para ele.
- É a fórmula para medir o perímetro de um círculo, duas vezes pi vezes o raio.
- Mas... Porque isso resulta no perímetro?
- ...Não sei. Ninguém sabe. Só notaram.
Ele deu de ombros.
- Tudo bem. Obrigado.
Assenti e voltei ao meu eterno sono. Acabou aula. Ciências. Ai... Acabou a paz, o professor ama me botar para responder às perguntas. E eu precisava prestar atenção para responder. Ergui-me, tentando ficar em alerta. Paulo Nunes entrou e começou a dar aula sobre o sistema nervoso. Depois, perguntas. Ele me escolheu e ao novato ao meu lado.
- Se prepare - sussurrei para ele, empurrando a cadeira enquanto ele levantava.
- Deixe eu te ajudar.
Ele pegou no empurrador da cadeira e me levou à frente.
- Obrigada.
- Então, Isabella, me diga: O que é paraplegia? - ele olhou a pergunta de um papel, sem querer tocando num assunto delicado para mim.
Bufei baixinho.
- Paraplegia é uma doença na qual tudo da cintura para baixo não funciona porque os nervos não conseguem conectar-se à medula espinhal, assim não chegando ao cérebro. Por isso eu não ando.
Ele baixou os óculos e tentei não fuzilá-lo com o olhar.
- E você...
- Davi. Sou novato.
- Davi. O que é tetraplegia?
- Quando, também devido à falta de comunicação com o cérebro pelos nervos, não é possível mover dos ombros para baixo.
- Muito bem. Podem voltar.
Davi novamente fez questão de levar minha cadeira de volta ao lugar. No intervalo, saí rapidamente para o meu lugarzinho. Eu gostava de ficar ali para escrever. Cheguei no meu cantinho e espremi-me, saindo da cadeira. Eu conseguiria voltar. Ninguém me encontraria ali. Peguei meu caderninho e voltei ao mundo das palavras, onde eu podia ser tudo. Continuei um poema que eu começara nas férias e fui interrompida por uma voz familiar que fez a caneta voar de minha mão com o susto.
- Isabella? Porque está isolada aqui?
- Ah, Davi. Oi. Que susto. Eu me isolo porque ninguém quer ficar comigo, nunca.
- Eu quero.
- Sente-se.
Ele obedeceu.
- O que está fazendo?
- Um poema.
- Posso ver?
- Não. É um pouco... Pessoal.
Ele assentiu.
- Se não for muito incômodo... Como isso aconteceu?
Eu sabia que ele, assim como todos, referia-se às minhas pernas.
- Eu fui atropelada há dois anos. Porque eu fui atrás de um vizinho novo que saiu correndo. Não vi um carro chegando e ele bateu em mim.
- Lamento.
- Não, está tudo bem.
Ele olhou o relógio.
- A aula vai começar. Vamos?
Assenti. Com os braços, tentei subir só na cadeira. Davi, porém, ajudou-me. Ele ergueu-me e colocou na cadeira.
- Obrigada, mas não precisa.
- Precisa. Você não pode andar. Eu posso e faço questão de te ajudar.
Suspirei enquanto ele me levava para a sala. O resto da aula ocorreu normalmente. Meu pai chegou para me pegar.
- Como foi a volta às aulas?
- Boa, mesmo que meio chata...
- Algum novato?
- Muitos.
Ele ergueu um olhar brincalhão.
- Tô de olho nos crushes, hein?
Ri com ele.
- Tudo bem!
Cheguei em casa e olhei pela janela. Na casa da frente, Paulo não estava mais. Alguém diferente. Vi seu cabelo preto e pele morena, bem diferente de Paulo. Pera... Davi?!
Escondi o rosto com meu cabelo castanho. O que ele estava fazendo ali?
Olhei novamente para a casa. O marrom antigo e desbotado da casa estava sendo pintado de um verde brilhante. Era bonito e contrastava com o vermelho-maçã da minha casa. Parecia com o verde dos meus olhos. Enfim, após fazer as obrigações, desci para o jardim que ficava na frente da casa. Desci da cadeira e empurrei-a. Recostei-me sob a sombra da árvore e dei-lhe uma pancada. Uma maçã caiu, acertando minha cabeça.
- Ai! - esfreguei a cabeça no local atingido.
Era meu lugar preferido. Eu me lembrava de quando eu ficava ali, daquele mesmo jeito, aproveitando a sombra. Era boa a sensação. Uma pequena florzinha caiu em minha mão. Prendi-a no cabelo. Pouco depois, ouvi Davi gritar.
- Isabella? É você?
Notada...
- Sim! Venha cá! - não sei porque, mas ele parecia legal. E ele suportara meu mau-humor escolar muito bem.
Ele atravessou, olhando antes de atravessar. Isso me lembrou daquele dia em que não olhei. Estremeci com a lembrança. Ele chegou e contemplou o jardim.
- É lindo! - ele disse, maravilhado.
- Obrigada... Sente-se. - disse, indicando o chão ao meu lado.
Ele, com um sorriso nos lábios, sentou.
- Aqui é lindo...
- Obrigada... Ei, desculpe por hoje, mas é que de manhã, ainda mais com aquelas aulas, meu humor não é dos melhores.
- Tudo bem...
- De onde você veio?
- Brasil. Mais especificamente, Natal, Rio Grande do Norte.
- E se mudou porque?
- Não me mudei. Meus pais... - ele abaixou a cabeça. - morreram em um acidente, e meus parentes mais próximos são meus tios, que moram aqui.
- Você é primo do Paulo?!
- Sim...
- Meu Deus! Vocês são muito diferentes!
Ele riu.
- Todo mundo diz isso.
- Mas então... Porque pintaram a casa?
- Meus tios acharam que a casa estava desbotada e me pediram para sugerir uma cor.
- Você tem bom gosto. Deu mais vida a essa velha casa.
Ele riu baixinho.
- E você, é natural daqui?
- Não, sou de Campinas, São Paulo. Meu pai foi fazer mestrado lá e eu nasci lá. Passamos um tempo morando em Natal, até eu terminar o segundo ano do fundamental. Mas ele acabou arranjando dinheiro e nos mudamos para cá, na França.
- Então você também morou lá? O mundo é pequeno! Você estudou onde?
- Escola Lápis de Cor.
- Jura?! Eu também! Eu saí no segundo ano, meus pais me transferiram.
- Espera... Davi... Soares... Luna Coelho? - forcei a memória. Eu sabia que conhecia um Davi que estudara comigo na infância.
- Sim! Você tem uma boa memória, Isabella Ana da Silveira Wanderley!
- Meu Deus! Você também! Há quanto tempo! Você mudou! - abracei-o, o que ele também fez.
- Você também! Você lembra do Villagio di Roma? Que às vezes você descia comigo e Henrique Miguel?
- Sim! Nossa, faz muito tempo!
- Exatamente! Vamos ver... Se me lembro bem, seu aniversário é em novembro?
- Sim!! Dia 14! Meu Deus, que memória! E você faz em agosto, certo?
- Sim, dia 8!
- Já é mês que vem! Quinze anos?
- Sim.
- Vai fazer festa?
- Acho que só para os mais próximos...
- Ah, sim...
- Mas eu te vejo sempre só em sala sozinha. Você não é novata. Por que ninguém senta perto de você?
- Essas pernas fazem com que todos pensem que eu sou anormal e ninguém quer ficar perto de mim, nunca.
- Pois eu me sento perto de você.
- Se Andrey, professor de história que faz o mapa de sala, permitir. Eu sou fixa no fundo da sala por causa da cadeira. Ao menos é mais quentinho lá.
Ele riu.
- Mas ainda assim, obrigada por isso. Essa conversa me animou bastante, sessão nostalgia.
- Bem assim. Mas acho que meus tios precisam que eu volte. Tchau, Isabella, foi muito bom revê-la.
- Tchau! E pode me chamar de Isa!
Arrastando-me, voltei para a cadeira e voltei para o meu quarto.
- Quanta animação, minha filha! - comentou minha mãe.
- Isa! Tudo bem? O vizinho novo é legal? Para onde foi o outro? Não dá mais pra ver ele do meu quarto mais! - disse minha irmãzinha, Estela, que tem oito anos.
- Primeiramente, Estela, não é ver ele, é vê-lo. - ela revirou os olhos e estirou a língua. Ela detestava ser corrigida. E eu amava corrigi-la por isso. - E quanto ao novo vizinho, mais tarde eu te explico.
Entrei no elevadorzinho que meus pais colocaram para que eu pudesse subir para o segundo piso. Entrei em meu quarto no segundo piso e joguei-me na cama e abracei minhas pelúcias, minha vaca e minha boneca (deixa eu viver com minhas pelúcias!). As duas tinham sua própria história. A Muuu (eu sei. Quanta criatividade.) estava comigo desde que eu era bebê. E ela era casada com um sapo de pelúcia, o Tchê (até hoje eu não entendi esse nome). Mas ela me acompanhou por toda a minha vida e era importante para mim. Já a minha boneca... Era sem nome. Eu não tenho criatividade para botar nomes. Mas sua história era diferente... Meu último aniversário em Natal, no segundo ano, eu lembro que eu gostava de um menino. Não qualquer um. Era Davi. Era ele. Eu o chamei para a festa. E ele me deu uma boneca com um vestido escrito "doçura de amiga", esta que agora eu abraço. Era como que uma esperança de que alguém ainda me amaria pelo o que eu sou, que nem naquela paixonite de infância há tantos anos. Eu tentei mandar uma carta, mas era muito caro. Que bom, porque eu estava me declarando na carta. Mas meu pai disse que ele gostava de mim, a mãe dele havia comentado com ele. E ele havia comentado que eu gostava dele. Mas agora, parecia que parte da felicidade daquela época voltara. Finalmente, um pequeno sonho de infância recuperado.



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