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História La Guerre pour toi - O primeiro encontro


Escrita por: Elis_Giuliacci

Notas do Autor


Voltei!

Queridas, a trilha sonora dessa fic será seguida à risca de acordo com a época da história, então, teremos bastante músicas francesas dos anos 40. Começaremos nesse capítulo.

Música: Premier rendez-vous - Danielle Darrieux

Indico o play no texto com: >
A letra é importante, necessária ao enredo
*A tradução é minha (*)

Confiram as notas finais
Sem mais blá, blá, blá

Boa leitura!

Capítulo 3 - O primeiro encontro


Eu tive um trabalho redobrado durante os dois dias que seguiram àquele jantar. Transcrevi todas as informações que anotei das pastas que encontrei naquele quarto de hotel. Eram alguns nomes de contatos franceses e haviam uns dois ou três endereços que encaminhei para meus superiores - outra pessoa seria responsável por procurá-los e retornar a mim - eu deveria infiltrar-me de algum modo nesses lugares.

Tracei todos os movimentos que deveria realizar junto com o major Kristoff - ele seria meu apoio durante a operação - estava morando num prédio próximo ao meu e juntos observávamos os movimentos da Place de la Concorde. Fiquei aliviada quando meu pai informou-me que o major Hook não estaria envolvido diretamente comigo. Depois de tudo o que ouvi na noite do jantar, seria um martírio estar ligada a ele por muito tempo. Um homem seco e cruel a julgar por suas palavras duras contra aquelas pessoas que estiveram conosco na última terça-feira.

Na quinta-feira, no fim da tarde, resolvi caminhar um pouco para relaxar. As informações sobre onde e como eu estaria no dia seguinte chegariam em meu apartamento logo depois do toque de recolher daquela noite. Coloquei um vestido verde escuro e sapatos de saltos mais baixos - estava acostumada com as botas do uniforme, mas às vezes tinha que parecer uma mulher da sociedade civil, não é? Saí do meu apartamento e atravessei a praça contornando o chafariz. Não havia tanto movimento e fui rapidamente por uma rua mais estreita, procurava por um café mais próximo. Caminhei por entre pessoas apressadas e amedrontadas. Acabara de passar pela Place de la Concorde uma tropa alemã - era a rotina de todos os dias e, para completar o constrangimento, as pessoas deveriam fazer reverência quando passavam - inclusive eu, estava disfarçada, não poderia deixar nada passar despercebido. Andei até a Rue du Chavalier de Saint-George. Sentei-me nas mesas da calçada do Chez Monsieur e pedi ao garçom um pedaço de torta de maçã. Eu gostava daquele clima francês, as mesinhas do lado de fora do restaurante eram acolhedoras e naquela rua não teria o incômodo da tropas transitando, a não ser um ou outro carro da Gestapo ou algum grupo de militares passando por ali casualmente.

Mas era diferente. Paris perdera o encanto durante aqueles dias. A hora de recolher era à meia-noite, mas quando a noite caía era muito perigoso andar livremente. Quando os alemães pegavam um parisiense na rua depois dessa hora, levavam-no para o lugar onde eu trabalhara - no princípio eu via as pessoas sendo obrigadas a engraxar botas ou algum outro serviço que nossos soldados mandavam, mas se um alemão tivesse sido morto pela Resistência, a pessoa passava por tortura e eu não me recordo de nenhum caso desses em que houvesse sobrevivente.

Boulevardes da cidade estão tão vazios. Sem ônibus ou táxis. Os poucos motoristas bastante afortunados tinham autorização para usarem seus carros e tinham de equipá-los com gasogênio. Paris estaria praticamente sem gás e sem eletricidade em pouco tempo pelo que pude perceber. Ouvi histórias de donas de casa que haviam aprendido a cozinhar em fogões feitos de lata de banha. Usavam pedaços de jornal amassados umedecidos com água, pois assim o papel queimava mais devagar. Um cenário triste. Seria uma cidade faminta.

Tratei de afastar aqueles pensamentos, todos eles causavam-me angústia. O que nós estávamos fazendo ali? Que rumo essa guerra tomaria e para onde iríamos depois que tudo acabasse?

Quando minha torta de maçã chegou suspirei sentindo o cheiro doce daquela fruta deliciosa. Eu realmente tinha uma predileção por maçãs grandes e bem vermelhas, tínhamos um pomar em casa, morávamos próximos à Munique. Minha mãe sabe fazer uma torta dessas como ninguém. Era capaz de sentir o cheiro daquela maravilha e suspirar por ela.

— Por quem essa linda mulher suspira?

Quando eu disse que aquela morena não era desse mundo eu tive a constatação naquele exato momento. Como ela apareceu ali e daquela maneira sorrateira? Olhei para cima do meu lado e ela estava parada, sorrindo maliciosamente com a sobrancelha erguida. Parei o garfo no meio do caminho, mas a boca continuou aberta. Que cena ridícula a minha. Sem ser convidada ela tomou a cadeira vaga à minha frente e sentou-se calmamente enquanto eu livrava-me do espanto no meu rosto. Vestia um tailleur cor bege, a saia levemente rodada, usava casaco e chapéu marrom, assim como as habituais luvas e seu batom inconfundível.

— Como encontrou-me aqui? - engoli o pedaço da torta que desceu sem ao menos ser mastigado.

— Não é comum uma loira alemã sentar-se tão despreocupada por essas ruas de Paris. - fez sinal para o garçom - Eu logo a reconheci, seus olhos verdes brilham longe, senhorita Emma. - o rapaz chegou e ela fez seu pedido apontando meu prato - Uma torta dessa, por favor.

— Você é quem está despreocupada demais para uma francesa, senhorita Regina.

— Está sendo ofensiva. - ela franziu o cenho, não gostara da brincadeira.

— Desculpe-me, não deveria dizer essas coisas... - fiquei desconcertada, não deveria mesmo ter dito aquelas palavras, pois o toque de recolher era cabível somente à ela, eu estava em uma posição favorável.

— Ficará quanto tempo em Paris? - desfez-se rápido do incômodo de meu comentário e abriu-me novamente o sorriso iluminado com o qual chegara até aquela mesa.

— Ainda não sabemos. Meu irmão ainda precisa tratar de outros negócios.

— Entendo... - o garçom chegou e colocou a torta na mesa. Regina suspirou sentindo o aroma das maçãs - Eu amo maçãs! - aquela frase entrou em meus ouvidos como uma música doce e desarmei-me observando a morena degustar o primeiro pedaço da torta como quem estava entrando em êxtase. Senti um frio na barriga, mas continuei com os olhos fixados naquela pintura repleta de vida e sensualidade.

— O que faz aqui em Paris, senhorita Regina, além de atacar mulheres em banheiros de hotéis? - vi o rosto dela enrubescer e até então pensava que aquilo seria impossível, já que parecia uma mulher atirada e bem atrevida. Mas, naquele momento, Regina ficou envergonhada com o comentário.

— Por favor, entenda que eu sou uma mulher impulsiva e não perco a oportunidade quando vejo uma. - ela olhou ao redor, talvez pensando no que diria em seguida - ... Eu já trabalhei na fábrica de meu pai, mas hoje dedico meu tempo ao cinema e a leitura, passo os dias lendo e assistindo as películas, tenho contato com alguns artistas parisienses.

— Pode me mostrar algum filme interessante qualquer dia desses... - sugeri com malícia na voz. Ela arqueou as sobrancelhas deixando o rosto mais sensual.

— Eu tenho um carinho especial por um rapaz chamado Marcel Carné... Ele produz coisas fabulosas e temos um local de encontro próximo à Clermont-Ferrand.

— Eu pouco conheço a cidade e não faço ideia de onde fica, mas seria um prazer acompanhá-la nesses encontros. - minha tensão diminuía à medida que nossa conversa avançava sobre cinema. Regina era uma mulher inteligente e parecia apreciar artes não se importando se fosse colocada na lista de Mademoiselles que não precisavam trabalhar naqueles tempos difíceis. Eu havia lido um relatório sobre seu pai, sobre sua fábrica e algumas informações pontuais sobre a família Mills. Regina era filha única e passara um tempo no Marrocos, mas o relatório não apontava o motivo.

Ela não fez comentário algum sobre minha sugestão. Apenas aguçara os ouvidos levantando levemente a cabeça. Uma canção vinha do interior do restaurante, Regina sorriu, seus olhos marejaram e fecharam-se ao sabor da melodia.

— Essa música me faz ter esperança, senhorita Emma.

> Premier rendez-vous - Danielle Darrieux

Quand monsieur le Temps (Quando o senhor Tempo)

Un beau jour de printemps (Um belo dia de primavera)

Fait d'une simple enfant (Faz de uma simples criança)

Presque une femme, (Quase uma mulher,)

Dans le songe bleu (Em um sonho azul)

D'un avenir joyeux (De um futuro feliz)

Fermant les yeux (Com os olhos fechados)

Elle soupire au fond de l'âme (Ela suspira do fundo da alma)

— Regina... - sussurrei seu nome e ela abriu os olhos devagar ainda sorrindo e que lindo sorriso essa morena exibia. Começou a mover os lábios repetindo as palavras da música sem tirar seus olhos dos meus. Aquilo me fez tremer e voltava à minha cabeça as cenas do sexo delirante durante o jantar no de Ville. Ela pousou o braço sobre a mesa e firmou o queixo na palma da mão.

— Sabe, senhorita Emma, mesmo com o mundo todo caindo sobre nossas cabeças é preciso ter esperança. Veja agora como nós duas estamos. - pausou olhando-me profundamente. Eu poderia tomá-la em meus braços ali mesmo tamanho era meu desejo por aqueles lábios vermelhos, mas contive-me em apenas matar minha curiosidade sobre seus pensamentos.

— E o que tem demais duas mulheres aqui saboreando uma torta de maçã?

— Duas mulheres que estão em lados opostos de uma guerra. - sua voz ficou pesada e seu semblante triste - Em outros tempos poderíamos ter esse nosso primeiro encontro no melhor clima parisiense, o clima da paixão! - o sorriso voltava aos seus lábios e agora era o meu rosto que se fechava em uma nuvem sombria de vergonha. Vergonha por esconder daquela bela mulher o meu real objetivo em sua cidade.

Ah! qu'il doit être doux et troublant (Ah! Ele deve ser doce e perturbador)

L'instant du premier rendez-vous (O instante do primeiro encontro)

Où le coeur las de battre solitaire (Quando o coração cansa de bater solitário)

S'envole en frissonnant vers le mystère (Voa excitado para o mistério)

Vous l'inconnu d'un rêve un peu fou, (Você desconhece esse sonho louco,)

Faites qu'il apporte pour nous (fazê-lo tornar nos traz)

Le bonheur d'aimer la vie entière (A felicidade de uma vida repleta de amor)

L'instant du premier rendez-vous (O instante do primeiro encontro)

Agora era eu que aguçava meus ouvidos para ouvir as palavras daquela música. Se algo queria voar para um mistério desconhecido era o meu coração. Regina estava fazendo uma bagunça com meus sentimentos desde o momento em que sentara naquela mesa. O que eu estou pensando? Sim, eu desejo a felicidade, desejo uma paixão, um amor. Mas o que seria daquele primeiro encontro, tão doce e ao mesmo tempo tão perturbador, se nossos caminhos corriam por trilhas de extremos? Eu, uma oficial nazista e ela uma judia previamente condenada. O que eu poderia fazer?

— O que eu poderia fazer? - eu não acreditei quando meu pensamento angustiante foi expulso pela minha displicência acabando por ser lançado em palavras.

— O que pode fazer, minha querida, eu não faço ideia, mas penso que deva refletir sobre o que faz aqui em Paris. - Regina respondeu-me como se soubesse o que se passava dentro de mim e senti que perderia o controle de minhas ações.

— Desculpe-me, mas não entendi.

— Sim, senhorita Emma. - debruçou-se com os braços cruzados sobre a mesa fitando-me com extrema ternura - É uma mulher belíssima e posso apostar que não tem ninguém à sua espera na Alemanha... - abriu-me um sorriso magnífico que nem as bombas mais potentes do meu exército me tirariam a atenção dele - Aproveite o tempo como um passeio, deixe que seu irmão resolva seus negócios enquanto você conhece um lado da França que talvez não tenha outra oportunidade de desvendar.

Un amour naissant (O amor jovem)

C'est un premier roman (Este é um primeiro romance)

Dont on joue tendrement (Que nós lemos carinhosamente)

Le personnage (O personagem)

On ne sait jamais (Você nunca saberá)

S'il sera triste ou gai, (Se será triste ou alegre,)

Mais on voudrait (Mas nós queremos)

Vite en ouvrir toutes les pages (Abrir rapidamente todas as páginas)

As palavras que acabara de ouvir encheram-me o coração de ternura e também de desespero. Eu queria estar com aquela mulher, sim, não deveria deixá-la mais nenhum momento. Eu deveria executar meu trabalho com firmeza, não poderia escapulir pelas ruas de Paris acompanhada de uma judia para viver um amor que nascia ali mesmo naquela mesa. Regina era tudo o que eu poderia querer de uma mulher e nada do que eu deveria desejar para a minha vida. E que paixão seria essa crescendo dentro do meu peito que me fazia ficar estática assim como na noite em que a conheci? Seria como aquela música que tocava enquanto ela media todas as minhas expressões? Um personagem de um livro que não sei ainda se é triste ou alegre, livro este que eu quero devorar página por página e descobrir que encanto era esse que Regina despertava em mim.

Assim como na fábula de Cinderela, o relógio acusou o momento derradeiro daquele primeiro encontro. Estava anoitecendo. A judia teria que apressar-se, pois não seria seguro que voltasse para casa à noite.

— Creio que é hora de despedir-me, senhorita Emma. - olhou para seu relógio e suspirou - Eu não estou tão perto de casa. - levantou-se deixando o pagamento pela torta ao lado de seu prato. Ajeitou as luvas e recolocou o casaco. Minha cabeça girava em mil frases que gostaria de dizer, eu teria que escolher uma e bem rápido.

— Eu quero vê-la novamente. - quando colocou a alça da bolsa sobre o ombro seu sorriso disparou contra mim.

— Claro, minha querida. Encontre-me amanhã no Café de Flore na esquina do boulevard Saint-Germain com a Rue Saint-Benoît, às quatro da tarde. Tudo bem para você?

No dia seguinte eu começaria minha missão infiltrada. Pense, Emma!

— Ótimo! Estarei lá.

Ela despediu-se com um aceno, virou-se e saiu apressada.

Não me importei com qualquer imprevisto. Eu teria uma solução e estaria no Café de Flore às quatro da tarde.


Notas Finais


Para quem gosta de cinema, Marcel Carné é um cineasta que tem trabalhos bem interessantes e participou, de certa forma, da resistência francesa durante a ocupação de Paris.

Obrigada e até o próximo!!! Bjusss


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