História Lay All Your Love On Me - Planos para um fim de semana

Apoio minha cabeça sobre o vidro da janela e vejo a paisagem afastar-se conforme nos movemos. Ao meu lado, Ana Paula mantinha seus olhos vigilantes sobre a estrada à nossa frente. Ela havia insistido para que fosse junto, em seu carro. Provavelmente imaginou que eu desistiria de ir, caso estivesse sozinha.

Ela não estava errada.

Quase não a reconheci quando ela parou para me buscar em casa pela manhã, com seu óculos de sol e uma roupa simples e casual, tão diferente das vestimentas do dia a dia. Fomos conversando por todo o trajeto, sem trégua alguma. Parecia que o assunto nunca acabava entre nós. Ana tinha este dom de ser extremamente simpática, e uma ou outra vez eu me peguei desejando ser assim também. Agora nos encontrávamos em um silêncio confortável, já que Ana precisava de um pouco mais de concentração para esta parte do trajeto. Eu não iria reclamar. Além do mais, o tempo em silêncio servira para pensar um pouco no que estava fazendo ali. Onde foi que tudo começou, mesmo?

Lembro-me de entrar na sala do diretor após o fim do meu primeiro dia de aula. Sentei-me na cadeira de frente para Patrício, que posicionava-se do outro lado da mesa, com as duas mãos unidas sobre ela. Ana, como sempre, estava ao seu lado. Meu olhar alternava-se entre os dois e mal conseguia abrir a boca para me defender. Senti minhas mãos geladas e tenho certeza de que estava tremendo. Talvez por isso Ana tenha me dirigido a primeira pergunta:

-Está tudo bem?

Eles se encaravam, com uma expressão quase divertida. Para pessoas que estavam prestes a iniciar uma reunião muito séria, eles me pareciam bem... Felizes?

-Eu que pergunto. Aconteceu alguma coisa? Por que estou aqui?

-Acalme-se Paola. Está tudo bem – Patrício mantém um sorriso sutil ao ver o meu estado –Tenho certeza que você não está aqui pelos motivos que imagina

-Eu não estava ouvindo a conversa de vocês. Queria deixar isso bem claro antes de tudo –Disparo as palavras sem tomar intenção do que dizia. O primeiro indício de meu estado ansioso incluía falar demais. Levo minha mão até meus olhos, tentando esconder minha vergonha.  – Perdóname

O segundo indício era trocar os idiomas. Claro!

Os dois à minha frente se entreolham e não conseguem segurar uma risada contida. Ana se afasta, buscando um copo de água e me entregando antes do diretor continuar:

-Espero que não tenha feito planos para este fim de semana –Ele disse simplesmente. Permaneci com uma intensa expressão de dúvida. E como não respondi nada, ele prosseguiu – Vamos reunir todo o corpo docente para um momento entre nós.

-Ainda não entendo... - Continuei com a mesma expressão de dúvida

-Uma de nossas maiores preocupações, aqui dentro, é que os professores se entrosem bem. Você sabe, que tenhamos docentes que se conheçam e possam desenvolver o mínimo de coleguismo dentro do colégio. Então sempre buscamos fazer um ou outro evento com todos envolvidos. Você acabou de chegar, e acho importante que tenha esta primeira boa impressão de todos. Queremos que se sinta parte da família, aqui dentro.

-Eu agradeço muito, mas você não precisam fazer isso por mim. De verdade!

-Nós insistimos! – Ele diz sem tempo para que eu levante outra argumentação – Vamos lá, Paola. Será agradável! Você precisa conhecer melhor seus colegas.

Fiquei em silêncio, receosa em aceitar um pedido tão diferente como aquele. Que tipo de colégio leva os professores para um fim de semana em grupo? Agora compreendia algumas coisas. Provavelmente a ideia vinha de Ana Paula, depois de ver o estado em que fiquei por conta de um professor que só consegue me tirar do sério. Forçando minha memória, lembro-me de dizer a ela que estava em fase de adaptação, e por isso estava daquele jeito. Ela certamente se preocupou e buscou ajuda em Patrício, que adotou o plano dela.
Não sei se estou certa em minha teoria, mas ainda assim tento voltar-me para Ana e insistir para que me livre de uma decisão daquela. Ela, por sua vez, respondia-me silenciosamente com um meneio de cabeça. Sorria para mim, me encorajando a aceitar.
Patrício escreve algo em um pedaço de papel e escorrega-o para mim por sobre a mesa

-Este é o endereço do local. Vamos à uma fazenda que é patrimônio deste colégio. Sempre levamos os alunos para algumas aulas diferentes ou para passeios. Tem quartos de sobra para todos. Posso contar com você?

E como fraca que sou, aceitei após entender que não venceria aquela batalha. Os dois aplaudiram a minha decisão e se felicitaram comigo.
Vendo a felicidade de ambos, eu mal conseguia tirar forças para me sentir irritada. Eles pareciam sinceros ao me querer bem, por lá. Eu não tinha muito do que duvidar de suas amizades.

-Chegamos! – A voz de Ana soa em meus ouvidos, retirando-me destas lembranças e me trazendo de volta para o tempo atual, em frente a um extenso gramado e um casarão, ao fundo.