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História Lifeline - Before the End - Vinte e oito dias


Escrita por: DixBarchester

Notas do Autor


Aquele momento que você posta o capitulo nos 45 do segundo tempo uashaushushaush

ACHARAM QUE NÃO IA TER NEH??? Olha, eu também achei viu uahsuahsuash ainda mais quando uma joaninha fofa resolveu fazer meu teclado de playground e não me deixou escrever *--*

Gente vcs não vão acreditar (Eu mesma não acredito) Lifeline ganhou outra recomendação lá no Nyah, vinda aqui do Spirit!!! *----* Iza sua perfeita NEM SEI O QUE DIZER!!! Obrigada mesmo por cada palavrinha e por sair daqui só pra me fazer esse mimo, uma recomendação é o melhor presente que eu podia ganhar, ainda mais com tantos elogios maravilhosos.

Agradecimentos especiais tbm à todas as minhas lindas comentaristas do cap passado. Vcs ainda vão me matar de felicidade, mas não se preocupem, ouvi dizer que no céu tem Wifi, então os caps vão prosseguir normalmente uahsausush

E falando em cap... O de hoje tem uma carinha nova e especial na capa: Shannon nossa garçonete tagarela, ela merecia ter seu rostinho lindo estampado aqui.

Espero que gostem desse capitulo, pra mim ele foi muito importante, por muitos motivos diferente.

Boa leitura.

Capítulo 18 - Vinte e oito dias


Fanfic / Fanfiction Lifeline - Before the End - Vinte e oito dias

• NATALIE COOPER •

Sabe qual o problema com a vida? Ela não espera, ela continua passando e foda-se o que você sente ou pensa. A vida dá as mãos ao tempo e sequer se importa se você precisa de uma pausa. Os dias continuam amanhecendo, mesmo que você não consiga dormir. As horas continuam passando, mesmo que você precise de algum — ou muito — tempo pra acertar as coisas dentro de você.

O tempo não para pra que você espere o cara por quem você é apaixonada voltar, ele não para só pra que você não sofra com a ausência dessa pessoa por dias a fio. 

Vinte e sete dias a fio.

Eu tentei, juro mesmo que tentei. Na primeira semana eu tentei ser otimista, Daryl precisava de um tempo, não tinha nada errado nisso, ele voltaria e tudo ficaria bem. Ele não voltou.

Na segunda semana eu resolvi seguir os conselhos da Shannon e fazer outras coisas, conhecer pessoas. Conheci o namorado dela, Jason, e ele me lembrou todos os amigos da minha mãe, fala polida, educação demais e alguma coisa que parecia estar errada... Ou aquela podia ser só a minha amargura falando mais alto. Resolvi deixar Shannon curtir a felicidade dela, afinal Jason viajava muito e não podia estar sempre presente.

Beijei outras bocas. Beijos amargos, sexo vazio... Eu não era mais eu mesma sem ele. Sem Daryl.

Naquela terceira semana eu tinha desistido. Desistido de ser otimista, desistido de seguir em frente. A ficha tinha caído e eu me senti abandonada e sozinha. Mesmo que nunca ficasse sozinha de fato. Meu pai sempre estava lá, mesmo que não soubesse bem o que estava acontecendo, ou fingisse não saber. Shannon também estava lá, era minha amiga, era legal, me dava apoio. Mas não bastava.

Eu tive vinte e sete longos dias pra entender o fenômeno que os médicos chamam de "membro fantasma", uma das mais terríveis e fascinantes síndromes clinicas. Estudei sobre ela no colégio e me lembro muito bem de uma descrição de Ambroise Paré sobre isso:

"Na verdade é uma coisa maravilhosamente estranha e prodigiosa, que seria difícil acreditar (salvo por aqueles que viram com seus próprios olhos), que os pacientes se queixem amargamente, vários meses, após a amputação, de ainda sentirem uma dor excessivamente forte no membro já amputado."

Não, claro que eu não tinha amputado um membro, mas era como eu me sentia, uma parte de mim faltava, mas ainda doía. Algumas vezes eu apenas esquecia e quando alguém falava algo que eu sabia bem que arrancaria um resmungo de Daryl, eu olhava para o lado esperando ver a cena. Loucura? Possivelmente.

E naquele dia em especial eu simplesmente queria. Eu queria voltar atrás.

Queria não ter estragado tudo dizendo palavras certas no momento errado. Eu queria citar "O morro dos ventos uivantes" e perguntar "que direito tinhas então de me deixar?". Queria ligar e pedir desculpas pela minha loucura. Eu queria. Queria Daryl Dixon de volta.

Dentre as muitas coisas que eu tinha escrito no meu diário naqueles vinte sete dias, uma se tornou uma verdade absoluta:

"A presença dele é concreta no vazio do meu peito"

Eu havia me tornado uma dramática compulsiva, que escrevia coisas sem muito sentido. Seria cômico se não fosse trágico.

Mas a partida de Daryl não afetou apenas a mim, isso ficou claro já na primeira semana, a oficina perdeu muito de rendimento sem ele. Claro que meu pai tentou outros mecânicos, contudo, aparentemente, não era só pra mim que aquele caipira turrão era insubstituível.

Passei a trabalhar a tarde, ao invés de manhã. Era o horário que a oficina mais precisava de mim e de certa forma me impedia de ficar zanzando por aí, e quando eu digo zanzando, quero dizer, sentada no quintal da Shannon vigiando a casa dos Dixons.

Falando em Dixons: Will continuava o mesmo reclamão bêbado de sempre, mas das vezes que o vi no Joe's, ele me pareceu apenas um velho abandonado que não tinha quem o ouvisse. Velho, sozinho e acabado. Eu senti pena, mas isso foi apenas até Shannon me lembrar que tudo que eu estava sofrendo era provavelmente por culpa do cretino que tinha criado os filhos como se eles não pudessem ser amados.

Shannon era uma boa pessoa pra se manter por perto, sem dúvida. O pouco que eu ainda tinha de sanidade eu devia a ela. Quem diria...

No vigésimo sétimo dia eu acabei levantando cedo, na verdade não dormi, fiz faxina de madrugada como uma maníaca e as oito da manhã eu não tinha exatamente nada pra fazer.

Resolvi estender minha faxina para a oficina, e era o que eu fazia quando o telefone tocou e meu pai o atendeu. Depois de três "alôs" sem resposta, ele bateu o aparelho de volta no gancho resmungando:

— Queria mesmo pegar esse engraçadinho que fica ligando todo dia de manhã faz uma semana. Eu ia mostrar pra ele com quantos paus se faz uma canoa.

— O que disse? — Perguntei, me levantando em um pulo, como se tivessem acendido um interruptor na minha mente.

— Vou mostrar pra ele com quanto paus se faz uma canoa, é um ditad...

— Antes disso. — Corrigi urgente.

— Um engraçadinho ligando pela manhã essa semana toda, deve ser trote. — Meu pai deu de ombros franzindo as sobrancelhas para a minha reação.

Daryl! Só podia ser o Daryl. Todo meu corpo entrou em pane, eu não sabia se ria, se chorava, ou se tinha um treco.

— Por que não me disse nada? — Corri até o telefone, tirando-o do gancho e vendo se alguém ainda estava na linha. Claro que não estava.

— Por que eu não te disse que tinha alguém passando trote? — Ele apontou, enquanto eu ainda estava eufórica, lamentando internamente não termos um detector de chamadas no telefone fixo. Eu podia ligar de volta se tivéssemos. — Natalie?

Ergui a cabeça, sabendo que tinha que dar uma explicação, mas ao mesmo tempo não querendo ser a louca que pira por causa do telefonema de um cara de foi embora.

— É só que.... — Engoli em seco, sem saber bem o que dizer. — Não é nada, deve ser a TPM. — Abri um sorriso falso e me sentei na minha mesa.

Meu pai ficou me olhando fixamente por dez segundos inteiros, antes de finalmente assentir e voltar ao trabalho.

Passei o dia ao lado do telefone, a esperança é uma coisa engraçada ela renova suas forças, mas ao mesmo tempo pode ser cruel. Eu sabia que podia ser qualquer pessoa. Que podia não ser ninguém. Mesmo assim eu continuei ali, mesmo quando a oficina fechou.

— Não vai entrar? — Meu pai perguntou, passando por mim.

— Já vou, eu só preciso... terminar umas coisas aqui. — Menti, mexendo em alguns papeis pra disfarçar.

Ele caminhou até ficar no meu campo de visão, encostou em um dos carros e ficou me observando por um tempo, parado, de braços cruzados, enquanto eu tentava agir normalmente.

— Você disse que não ia se apaixonar... — Comentou, levemente acusatório. — Disse que não se apaixonaria por Daryl Dixon.

Suspirei e apoiei a cabeça nas mãos sem saber bem o que dizer. Não tinha o que dizer no fim das contas, então apenas dei de ombros.

— Eu avisei você... — Falou em um tom afável, me encarando de forma acolhedora.

— Desconfio que quando você avisou já fosse tarde demais. — Lamentei, respirando bem fundo.

— Certamente era. — Ele sorriu, meio triste, se aproximando e beijando o topo da minha cabeça. — Não venha dormir muito tarde. Você não dormiu essa noite.

O olhei um pouco surpresa, por descobrir que ele sabia da minha insônia.

— Vendo pelo lado bom, é melhor você aí sentada na frente do telefone do que no gramado da Shannon, vigiando a casa de um velho bêbado... — Ele tentou descontrair.

— Você sabe? — Perguntei, franzindo as sobrancelhas.

— Eu fui um pai negligente por muito tempo. — Deu de ombros. — Não sou mais.

Ele entrou e eu continuei ali, por horas a fio. Não aconteceu nada. Dormi na mesa. Acordei na mesa.

No outro dia, depois de tomar café da manhã, coloquei na minha cabeça que pararia de esperar uma ligação, que pararia de esperar por Daryl Dixon. Foi o que eu coloquei na minha cabeça, mas não foi o que eu fiz.

Vinte e oito dias...

A cada toque do telefone meu coração disparava, eu corria pra atender, apenas pra me decepcionar com algum fornecedor ou cliente. A minha sanidade estava indo para o saco e eu odiava isso, mas simplesmente não conseguia evitar. Esqueci todos os meus afazeres pra ficar perto do telefone, simplesmente esqueci meu celular sem carga em um canto. Almocei na oficina. Nem me lembro de ter levantado pra ir ao banheiro.

Dramática compulsiva e maníaca. Nenhuma estabilidade emocional. Foda-se.

Eram quase cinco da tarde, daquele maldito vigésimo e oitavo dia, quando o telefone tocou novamente, eu olhei o aparelho e me segurei antes de atender. Não é ele Natalie, acorda pra vida.

Respirei fundo e atendi no terceiro toque, ainda tentando controlar minha expectativa.

— Auto Mecânica Cooper, boa tarde. — Falei, com o mínimo de oscilação na voz que consegui.

A pessoa não respondeu, mas eu pude ouvir perfeitamente sua respiração falhar. Meu corpo todo tremeu e eu segurei o telefone com mais força contra o ouvido.

— Alô? — Tentei, mas novamente não houve resposta.

Contudo, quem quer que estivesse do outro lado não desligou. Eu tinha certeza que era ele. Meu coração poderia explodir no peito a qualquer momento. Meus olhos arderam.

— Daryl? — Senti a pessoa do outro lado da linha prender a respiração e tentei controlar as lágrimas que queriam cair dos meus olhos.

Era ele. Eu não podia fazer nada estúpido e impensado. Não banca a louca desesperada, dramática compulsiva.

— Quem é vivo sempre aparece, ou melhor, liga, não é? — Comentei, no tom mais amigável que eu podia. — As coisas estão meio loucas aqui sem você, sabe? Meu pai fez teste com uns cinco caras, nenhum deles atendeu as expectativas. Parece que essa coisa de consertar carros não é mesmo pra qualquer um. Semana passada um dos mecânicos de araque fechou o motor com uma chave de boca dentro. Dá pra acreditar? — Ri, mesmo que uma lágrima pesada escorresse pelo meu rosto.

Eu praticamente o vi revirar os olhos pela burrice do cara, mas não houve resposta.

— Mas eu... hãn... espero que esteja se divertindo com o Merle. Vocês mereciam um tempo juntos, se bem que eu acho que passar tanto tempo com ele deve ser um saco. — Já não havia nenhuma convicção em mim pra manter aquela pose.

Doía, queimava. Reprimi um soluço e tremi incontrolavelmente, apertado o telefone contra mim como se isso pudesse me colocar mais perto de Daryl.

Eu não tinha estrutura pra guardar aquilo pra mim. Eu tinha uma chance. Não dava pra perder.

— Eu sinto sua falta... Todo dia. — Desabafei em um sussurro, colocando tudo pra fora logo em seguida. — Eu sei que você foi embora por minha causa. E eu... eu sinto muito. Eu nunca devia ter dito aquilo, não porque não seja verdade, porque é e nunca vai mudar. Mas porque eu e você não estamos na mesma página, você não sente o mesmo e eu devia saber, eu nunca devia ter te emposto isso. Desculpe... Eu só... Sinto sua falta.

Pensei tê-lo ouvido fungar do outro lado, mas claro que podia ser só um reflexo do meu próprio descontrole, que era derramado em forma de lágrimas, junto com as palavras.

— Eu posso viver sabendo que nunca vou beijar você, eu posso viver sabendo que nunca seremos um casal... Mas eu não posso viver sabendo que não somos mais amigos. — Continuei, ciente de que era uma decisão arriscada, mas qualquer pequena dose de Daryl era melhor que nada dele. — Eu sinto falta do meu melhor amigo e eu o quero de volta, por favor. Eu sei que é uma coisa egoísta de se dizer, porque você está com o seu irmão agora, mas eu preciso de você, eu só... só volta, tá bom? Eu prometo... prometo... — Nunca terminei a promessa, o telefone começou a apontar que a ligação tinha caído. Ou que Daryl tinha desligado.

Ainda fiquei com o fone na mão por alguns minutos, ouvindo o tu-tu-tu da solidão. Dramática compulsiva.

Depois daquilo eu resolvi que o dia tinha acabado. Entrei em casa tentando bancar a controlada, pra que meu pai não percebesse que eu estava desabando em lágrimas, mas honestamente não sei se ele engoliu minha ideia.

Me joguei na cama e encarei o teto por sabe-se lá quanto tempo. Eu não conseguia decidir se dizer tudo aquilo havia sido burrice, ou se tinha pelo menos um lado bom. Podia nem ser ele, embora algo dentro de mim achasse com toda certeza que era. Eu tinha me tornado aquele tipo de adolescente iludida. Maravilha, só que não.

Alcancei o celular e vi que ele estava desligado por falta de bateria. Coloquei-o na tomada, mas o mantive desligado. Aquele era apenas mais um dos muitos momentos, naqueles vinte e oito dias, que eu estava no automático.

Acendi um cigarro e me arrependi assim que dei o primeiro trago, afinal era depois disso que eu o passava para Daryl e admirava os olhos dele através da fumaça. Maldito membro fantasma.

Peguei o diário e pela primeira vez naqueles vinte e oito dias, eu não tive vontade de escrever nada. Ter falado com Daryl, sem ter escutado uma só palavra dele, me fazia sentir ainda mais vazia. E mesmo sem vontade as palavras saíram automaticamente da ponta dos meus dedos:

"Estou cheia de um grande vazio.
Apaixonada e fadada
a um fim que nunca termina."

➷•➷•➷•➷•➷

Acordei quase dez horas da noite, com meu pai me chamando pra jantar. Eu sequer tinha percebido que adormecera, avisei que já descia e fiquei ali, olhando o relógio digital na minha cabeceira.

E se Daryl nunca voltasse?

Fugi da imagem mental que aquele pensamento despertou e agarrei o celular, ligando aparelho por motivo algum, já que ele vivia sempre morto, a menos que Shannon me ligasse. Aimee tinha parado de trocar mensagens comigo, a frequência foi diminuindo aos poucos e depois paramos, eu tinha pouca paciência para a vida de aventuras dela e ela tinha ainda menos paciência para a minha vida pacata em Dawsonville.

Será que eu tinha algum tipo de problema por nunca sentir que me encaixava e então quando eu finalmente consegui, ou pelos menos pensei ter conseguido, encontrar meu lugar, um cara vai embora e é como se algo faltasse o tempo todo? Talvez minha mãe tivesse razão em me levar em todos aqueles psicólogos.

Assim que meu aparelho celular ligou, um número quase irreal de mensagens foi anunciado no visor. Trinta e sete mensagens, pra ser exata. Todas da Shannon.

Nas últimas, que eu acabei abrindo primeiro, ela me xingava de todos os possíveis nomes e me acusava de ser uma péssima amiga. Uma delas dizia que era melhor eu estar morta pra não ter respondido aquelas mensagens, ou ela mesmo me mataria. Ri. Talvez Shannon também fosse uma dramática compulsiva.

Daryl Dixon e o meu romance tragicômico teriam que esperar. Não perdi tempo lendo o restante, dei um pulo da cama e desci as escadas correndo.

— Não vai dar pra jantar, pai, tenho que sai. — Avisei rapidamente.

— Sair pra onde?

— Emergência feminina, Shannon me mandou trinta e sete mensagens. — Respondi enchendo a boca de batatas e balançando o celular perto do rosto dele. — 'Tá uma delícia.

— Alguém morreu?

— Eu é que vou morrer se não chegar lá logo. — Ri, dando um beijo nele. — Até mais.

Corri até a porta, mas voltei pra pegar a vasilha com batatas fritas.

— Vou levar isso. Te amo. — Fiz minha melhor cara de pau e saí correndo.

Algum tempo depois eu já estava na frente do trailer. Shannon estava do lado de fora, fazendo uma decoração pra lá de bizarra com pedras empilhadas.

— Está bem feio isso — comentei, parando perto dela.

— Serviços manuais acalmam, foi o que sobrou, já que uma certa amiga da onça, vadia e cretina, não atendeu o celular. — Respondeu, sem me encarar.

— Foi mal, estava desligado...

Shannon estreitou os olhos na minha direção e fez um muxoxo.

— Isso é batata? — Perguntou, apontando para o pote que eu ainda segurava. Assenti e o estendi pra ela.

— Talvez eu possa te perdoar. — Arrancou o pote da minha mão e entrou no trailer, comigo logo atrás.

Ela não estava realmente brava, pelo menos não comigo.

— E então, qual era a emergência? — indaguei, me sentando em uma das cadeiras do pequeno espaço. — Pensei que estaria com o Jason hoje.

Shannon colocou o pote da batatas fritas na mesa e pegou duas cervejas na geladeira, me estendendo uma.

— Eu tinha mesmo que estar com aquele idiota, mentiroso, filho de uma puta. — Ela respondeu e eu soube que o motivo das trinta e sete mensagens só podia ser o Jason. — Mas advinha?

Franzi os lábios em negação, não querendo dar um palpite errado.

— Aquele cretino do caralho é casado!

Meu queixo caiu, literalmente, e Shannon começou a explicar em detalhes como o encontro quente dos dois tinha sido interrompido por uma ligação da esposa de Jason. Eu bem que sabia que tinha algo errado com ele.

Para piorar a situação, o cretino deu uma de vítima, dizendo que o casamento era infeliz, que ele com certeza abandonaria a esposa pela Shannon... Típico papinho de homem. Felizmente minha amiga não tinha nada de ingênua e meteu o pé no abusado.

— Nossa! Nem consigo imaginar como você está. — Comentei, ainda de cara com toda aquela situação.

— Quando te mandei todas aquelas mensagem e liguei mil vezes, mas você não atendeu, eu estava muito mal. Mas agora eu estou melhor, eu me vinguei. — Ela ergueu a cabeça totalmente superior.

— O que quer dizer?

— Eu liguei pra mulher dele e contei tudinho. Quando o filho da puta chegar em casa vai ter uma bela surpresa esperando por ele. Ninguém faz a Shannon aqui de idiota. — Se gabou com um sorriso.

Acabei rindo e esse foi basicamente o nosso papo da noite, não contei sobre Daryl e a ligação, o problema de Shannon era maior e, afinal das contas, ela já tinha ouvido meus dramas por vinte e oito dias, o mínimo que eu podia fazer era dar apoio a ela.

— Eu não o amava, sequer era apaixonada por ele. Acho que Jason era só um tapa buraco... — Confidenciou, lá pela meia-noite, depois de algumas doses de álcool. — Merle é um cretino idiota, mas a gente sabe o que esperar dele. Ele não é um mentiroso, as cagadas estão ali, basta olhar. Ele não promete felicidade ou mudança, só uma boa foda.

Estávamos deitadas na cama dela, olhado o teto enquanto falávamos. Jason tinha começado a ligar incessantemente lá pelas onze e meia, por isso ela desligou o celular e eu acabei ligando para o meu pai e avisando que passaria a noite por lá.

— Acha que eu tenho dedo podre pra homem? — Perguntou, virando o rosto pra me encarar.

— O seu dedo é ótimo, são os homens que não prestam. — Devolvi bem-humorada.

— Talvez eu teste minha sexualidade com um gênero mais confiável então.  — Declarou, fingindo-se de pensativa.

— Oi, tenho interesse. — Brinquei.

Nos encaramos por um segundo e então caímos em uma bela crise de riso, obviamente, não era a graça da situação, era apenas todo aquele stress e decepção acumulados.

— Pelo menos não teria nenhuma Dixon pra gente se apaixonar. — Shannon apontou assim que nos acalmamos.

— Amém.

Voltamos a ficar em silêncio olhando o teto.

— Eu sinto falta dele. — Ela recomeçou. — É ridículo, eu sei, afinal o Merle dá no pé tantas vezes que eu já devia estar acostumada, mas eu sempre sinto falta dele. Pelo menos tem um leve consolo em saber que o cretino sempre volta.

Pensei um segundo e então resolvi falar finalmente.

— Daryl ligou hoje... — Comentei, como se não fosse nada e Shannon me encarou em expectativa. — Ele não disse uma palavra, mas...

Não terminei. A buzina incessante de uma carro nos interrompeu. Shannon se levantou e olhou pela janela do trailer.

— É o Jason. — Avisou, com desgosto evidente na voz.

— Você vai falar com ele?

— Nem morta!

A buzina ainda ficou tocando por um tempo, até que Jason resolveu descer do carro e caminhar até o trailer. Ele não parecia em nada o homem aprumado de sempre.

As porradas que ele deu na porta, enquanto gritava pela Shannon, deixaram claro que aquela conversa não seria amigável. Jason estava furioso por ela ter contado tudo para a mulher dele.

Ficou espancando a porta e gritando todo tipo de barbaridades, enquanto Shannon gritava tantas outras do lado de dentro.

Eu devia ter percebido naquele momento que aquela não era uma boa situação. Eu devia ter chamado socorro. Mas por algum motivo que eu nunca vou entender ou perdoar eu não fiz isso, eu sequer pensei naquela possibilidade. Não até que Jason conseguiu arrombar a porta do trailer.

Existe uma coisa diferente e muito assustadora nos olhos de um homem que perdeu a família. Essa é uma das coisas que eu me lembro perfeitamente sobre aquela noite.

Dentre todos os xingamentos, gritos e ameaças, Jason jogou o celular de Shannon através da porta, recém arrombada, do trailer.

Descontrole.

Eu soube, assim como Shannon, que as coisas estavam passando os limites. O olhar apavorado que ela me deu, por um segundo, antes de pegar uma faca de cozinha, fez todos os alertas da minha mente apitarem.

Os dois partiriam pra briga. Eu sabia que Shannon estava nervosa demais pra entrar naquilo com uma faca na mão e sair disso sem consequências. Todos estavam. Entrei no meio.

— Já chega. Melhor nos acalmarmos! — Pedi, olhando de um pro outro e lançando um olhar mais firme pra Shannon. — Jason, por que não se afasta até esfriar a cabeça? Depois vocês conversam.

Shannon baixou levemente a faca, ponderando, mas o homem a nossa frente parecia desconhecer o que significado de ponderamento.

— Não se mete, sua piranha de quinta, ou eu vou matar você também. — Aquele Jason certamente não tinha nada a ver com o Jason de antes.

Ou será que era por ver indícios daquele homem descontrolado e agressivo que eu sempre senti algo errado quanto a ele?

— Se não se afastar eu vou chamar a polícia! — Avisei firme, segurando o meu próprio celular.

E foi quando tudo aconteceu depressa demais, Jason avançou sobre mim, para me tomar o aparelho, que voou para um canto qualquer, espatifando contra a parede do trailer, eu me desequilibrei e caí, batendo a cabeça na mesa.

O tintalhar da faca, batendo contra o chão metálico do veículo, ainda ficou ecoando nos meus ouvidos, misturado ao xingamentos de Shannon, que tinha acabado de rolar com Jason pra fora do trailer.

A batida contra a mesa me deixou zonza momentaneamente. Coloquei a mão no lugar que doía e percebi que o impacto com a quina tinha aberto um corte ali, mas o sangue que aquele machucado liberava, não era nem metade do sangue que manchava minha roupa. Olhei meu braço, ainda meio atordoada, pra então entender que eu devia ter batido na faca de Shannon, motivo que fez o objeto cair no chão.

Aquele pequeno descuido, tinha aberto um belo talho no meu braço direito, mas aquilo ficou em segundo plano, quando um silêncio repentino e assustador se espalhou pelo lugar.

— Shannon? — Ouvi Jason chamar e fiz esforço pra me levantar. — Não tem graça, Shannon.

Tudo rodou, e depois que eu coloquei meu pé pra fora do trailer rodou mais ainda. Shannon estava caída no chão, a cabeça escorregando ao lado da pilha de pedras, que ela colocara ali mais cedo, e havia sangue. Muito sangue...

Os olhos de Jason focaram eu mim e eu simplesmente deixei minhas pernas cederem, praticamente desabando ao lado dela.

— Shannon?! Shannon?! — Chamei desesperada, tentando fazê-la acordar. — Liga pra ambulância, Jason!

Mas aquele homem, que outrora se mostrava tão bonito e educado, já estava entrando em seu próprio carro e fugindo em alta velocidade...

Apavorada, totalmente em choque e aos prantos, mal ligando para meu próprio braço, eu coloquei a cabeça de Shannon no meu colo e gritei por ajuda. Eu gritei até ficar sem voz. Foram quase trinta minutos ininterruptos. Nenhum vizinho apareceu. Ninguém. Era como se as pessoas tivessem se enfurnado em suas próprias casas e decidido fechar os olhos para o mundo. Era como se ninguém se importasse com uma simples garçonete.

Eu devia ter percebido antes, devia ter ligado pra polícia antes. Mas a gente nunca acha que é sério. A gente acha que é só uma briga boba. Nunca pensamos que um dia vamos entrar nas estáticas. Muitas vezes não vemos o perigo até que seja tarde...

Você sabe quantas mulheres morrem por dia, vítimas de seus próprios parceiros? Naquele momento eu não sabia o número exato, mas Shannon tinha acabado de virar uma dessas mulheres. Estatística...

Eu nunca me importei com números, mas eu me importava com a Shannon. Ela era minha amiga e foi assassinada... E eu não fui capaz de fazer nada pra impedir.

Sabe qual o problema com a vida? 

Ela acaba. 

E depois do fim, não existe mais nada.


Notas Finais


Aqui no Brasil, dez mulheres morrem todos os dias, vitimas de crime passional. Isso significa que elas tem suas vidas arrancadas de si, por pessoas que elas confiavam e possivelmente amavam. Esse número assustador é real e muito triste.
Eu podia colocar essa informação aqui e deixar que cada uma de vocês tirasse suas próprias conclusões, mas hoje, depois de ter passado uma noite toda chorando essa última cena, pelas muitas Shannons reais que esse mundo tem, eu vi alguém dizer no face que o Machismo não prejudica a sociedade...
Então eu gostaria de complementar a informação anterior com outra: Dois homens morrem por dia, vitimas de crimes passionais, desses dois, aproximadamente um é assassinado por outro homem, por motivo de ciúmes.
Dez mulheres. Dois homens.

"O machismo não prejudica a sociedade" Foi o que disseram.
"O machismo mata." é o que EU digo.
Vc não precisa ser feminista, não precisa ter religião, ser de esquerda ou direita, vc só precisa entender um pouquinho de números e ter capacidade de interpretação de texto, então você vai chegar numa conclusão bem parecida com a minha.
Eu não odeio os homens, muito pelo contrário.
Eu só odeio o machismo.
_____


Bom é isso.
Shannon foi uma vitima da sociedade, talvez ela e o Merle pudessem ser felizes, mas nem sempre as coisas são como queremos. #RIPShannon

Será que era o Daryl? Ou será que a Natalie está bem louca?
Saberemos no próximo, que vai ser narrado pelo nosso caipira preferido (saudades, inclusive)

Bjss e até sexta.


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