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História Língua de Fogo - ;iii


Escrita por: JAYG0TH

Notas do Autor


E é com imenso prazer que chego ao fim desta fanfic. É a mais longa, mais complexa e a que mais retirou partes do meu coração que eu vou escrever para o #satansoochallenge. Agradeço a todos que leram, e os que vão ler também. É muito difícil receber reconhecimento por uma fanfic original, por incrível que pareça.
enfim, não vou tomar o tempo de vocês. Vejo-os lá embaixo.

Capítulo 3 - ;iii


 

 

 

Dias atuais

 

O escuro é tudo o que vejo agora.

Amparada por dois homens enormes — tenho dúvidas quanto à utilização da palavra “homens” —, e com os olhos vendados, sei que caminhamos em linha reta. Faz uns bons 10 minutos que andamos sem parar. Todas as curvas do percurso já passaram; há corredores curtos, dos quais se pode atravessar em mais ou menos 8 passos, e então uma curva no fim para a direita ou para a esquerda. Eram 7 curvas no total. Agora, o corredor é o mais extenso, mas é o final.

O ar é seco, quente. Pelo barulho que ecoa quando meus saltos encontram o chão, que provavelmente é de pedra, estamos no subsolo. Tenho quase certeza de que o corredor é estreito, mas não tanto, pois não me sinto espremida pelos dois guardas que me guiam, sempre que sou guiada. É desconfortável andar e não ver aonde se anda; a todo tempo, tropeço em uma pedra mais elevada que a outra, coisa que não fazia antes; creio que seja a impaciência, e ela quase me faz arrepender-se do que vim fazer — quase.

Durante todas as vezes que fiz esse mesmo caminho, o fiz com a cabeça clara, quase sem pensamentos. Eu nunca me incomodara com a demora, por que não tinha nenhuma pressa. Não me incomodara com a insegurança, pois eu me sentia segura. Não me incomodara com o medo, por que eu não tinha o que temer.

Só sei que agora eu tenho. Sinto todo o medo agora, reunido em uma gigantesca bola maciça sobre meus ombros, como se todo o medo que nunca senti na vida — talvez por causa de minha inconseqüência — tivesse se acumulado, e me acometesse nesse momento. Justamente agora, penso. E mais uma prova disso é o meu pulso acelerado, que sinto pela falta de ar e o peito apertado. Meu coração bate tão forte que eu sinto que ele pode subir pela minha garganta a qualquer segundo, bate tão alto que tenho certeza que os outros podem ouvi-lo assim como eu.

Subitamente, nós paramos. Eu não percebo a parada abrupta, e estico a perna para dar mais um passo a frente. Antes que eles possam me segurar, sinto o bico de meu scarpin batendo com força em uma superfície dura e lisa. A porta.

Isso me faz perder o equilíbrio por um segundo, e sinto as mãos fortes e calejadas dos guardas segurando-me pelos braços, e seu aperto dói. Endireito-me, e depois de estar equilibrada novamente, dou um pequeno passo para trás, me alinhando aos meninos que me seguram, agora não com tanta força.

Ouço o ranger da porta se abrindo, e prendo a respiração. Por um segundo, tudo pára.

Como vou convencê-lo? Terá um jeito de fazê-lo entender? Não é apenas perda de tempo?

Não estou pondo minha vida em jogo aqui?

Não. Há coisas mais importantes que minha vida.

Sinto meus braços soltos do aperto; livres da prisão de pedra que era o corredor e seus guardas. Mas ao contrário, sentindo-me mais enclausurada do que jamais me senti, dou um passo adentro.

 

 

Às vezes, só às vezes, quando a Lua não estava em casa, eu me sentia completamente sozinha.

Como eu me sinto agora.

Acho que é por que me acostumei demais à sua presença. Ao seu cheiro, sua voz, seu som, seu toque; a tudo em relação a ela. Não sei mais o que é estar sozinha, do jeito que eu ficava até conhecê-la. Eu estava sempre trancada neste apartamento, por vezes ficando sem falar por horas, isso sem contar quando eu me cansava de fazer qualquer coisa, e apenas ficava olhando para a parede, totalmente imóvel, totalmente vazia. Na verdade, só agora eu sei que eu estava vazia, que o aperto no peito e a confusão na mente que eu sentia era o vazio, pois não sabia o que era estar completa naquela época.

Agora que eu sei, sempre que ela não está comigo, dói.

Mas não consigo tirar isso da minha cabeça. Eu já tinha dito milhares de vezes para mim mesma que um dia teria de me acostumar à sensação, pois eu não prendia Lua aqui, comigo. Ela tinha e tem até hoje o direto de sair a qualquer minuto, e era justamente por isso que eu ia dormir todas as noites e acordava todos os dias com o medo de que ela iria embora no dia seguinte. Talvez até no meio da noite, sem se despedir, como ela quase fez naquela noite, três anos atrás. Eu tentava me convencer de que uma hora isso aconteceria, e era melhor entender isso e aceitar do que me apegar e depois sofrer demais. Mas os dias foram passando, e depois as semanas, depois os meses, e os anos. E ela nunca se foi. Ela saia ocasionalmente, uma vez a cada dois meses, mas voltava horas depois com um sorriso enorme e os braços abertos, nos quais eu me jogava.

E pouco a pouco, o medo de perdê-la foi diminuindo. Mas nunca sumiu.

Sento-me em frente ao piano, e penso por apenas um segundo antes de começar a tocar. As notas perfeitamente, mecanicamente, intrinsecamente. É como se elas fizessem parte do meu ser, pois eram tão familiares quanto ver meu rosto no espelho, quanto o som da voz da Lua. Elas eram baseadas no som de sua voz, no jeito como andava, como sorria, como suspirava enquanto dormia à noite, como beijava. Era sua música, uma que eu havia composto, secretamente, no primeiro dia dela em meu apartamento. Mas só mostrara a ela dias depois, e ainda me lembro de sua expressão. Nunca esquecerei o brilho em seus olhos.

A última nota da música soa, e eu finalmente percebo que estou com os olhos fechados. Eu os abro e olhos para minhas mãos, abertas em frente a meus olhos.

Tempos atrás, eu não conseguiria tocar com tudo isso na minha cabeça, pensando em tudo ao mesmo tempo. Hoje eu consigo, e principalmente essa música. E talvez o que eu mais goste nela é o fato de ela sempre mudar, nem que seja só um pouquinho, sempre que eu a toco, assim como ela. Uma nota, ou a duração de uma, ou até um trilo aqui e ali. A melodia é como as ondas do mar, nunca do mesmo tamanho, nunca quebrando no mesmo lugar à beira da praia.

Estranho. Pensar nela agora faz meu coração se apertar. Coisa que não fazia alguns minutos atrás. É como se eu visse uma imagem de seu rosto e este fosse lentamente sumindo, embaçando, como o espelho depois do banho. E quando meus dedos imaginários se esticam para limpar o vidro, nada acontece. A bruma continua lá, crescendo e envolvendo a memória do rosto que eu tanto amo. Inconscientemente, minhas mãos alcançam meu peito e seguram o casaco logo acima do lugar onde fica o coração, levemente inclinado pra a esquerda do peito.

— Porquê esta apreensão...? — sussurro tão baixo que o som é quase como o de um suspiro, e então agito a cabeça. Estou falando sozinha; não deveria estar fazendo isso. Então afasto o banco do piano para trás, saio da sala de música e sigo até a cozinha. É isso, penso, vou começar a fazer o jantar. Lua já deve estar chegando.

Os ponteiros do relógio da sala completam uma volta, e marcam seis horas. As badaladas do sino de uma igreja a algumas quadras daqui soam mais altas do que eu acho que sempre foram. É como se esse mesmo sino batesse, ao mesmo tempo em que no alto da torre de pedra, dentro de minha mente. Cada vez mais alto, e mais ecoante.

E o pior.

Soa como um aviso.

 

 

Solto o ar que segurava.

Imediatamente, o cheiro doce de tabaco enche o ar que entra em minhas narinas, e a fumaça cinzenta do fumo paira pela sala escura, como uma bruma que oculta o desconhecido. E de fato, a fumaça contribui para a sensação de abafamento no aposento cúbico, que ainda é forrado por pesadas tapeçarias persas no chão e nas paredes; mas mesmo assim, sinto um arrepio subindo pelas minhas costas, um calafrio incoerente ao ar quente dali.

A sala é mobiliada como um escritório, todos os móveis de madeira escura e bem antiquados; no canto esquerdo há uma cristaleira cheia de copos de bebida dos mais variados tamanhos e formas, todos reluzentes e delicados. No direito, um sofá de dois lugares que quase encosta nas prateleiras repletas com livros, uma poltrona de estilo victoriano ao lado, e ambos virados para uma mesinha central de vidro, com a base feita da mesma madeira. O estofado também é escuro, em um painel de círculos entrelaçados a triângulos, e contribui para a atmosfera escura do cômodo.

Uma grande mesa de madeira se encontra a minha frente, e imponente, ela reflete à luz avermelhada do abajur comprido e curvo ao seu lado, inclinado para ela, assim como todos os papéis, a caixa de charutos, a bandeja com garrafas de bebida e a miniatura de um telescópio de prata em cima da mesa. Na parede atrás da mesa há cortinas negras de seda, provavelmente para filtrar a luz que entraria pela janela. Mas eu sei que não há nenhuma janela por trás delas; há apenas a maciça parede de pedra fria.

Finalmente olho para o homem sentado atrás da escrivaninha. Sua cadeira é alta e de couro, e provavelmente é a única coisa moderna na sala. Ele está inclinado para trás, e as partes de seu rosto que não estão iluminadas pela fantasmagórica luz avermelhada estão escurecidas pelas sombras. Seu cabelo é grisalho e penteado para trás com gel, as feições são aguçadas e ligeiramente familiares, os lábios finos sempre puxados para cima em um sorriso de escarro. Eu não consigo ver seus olhos, pois eles estão encobertos pelas sombras. Mas eu sei que eles são cinzentos como a fumaça, penetrantes como o gelo. As mãos estão entrelaçadas, e apoiadas na barriga sobre o terno italiano cinza; no dedo mindinho da mão direita eu vejo o brilho reluzente de seu anel de ouro, decorado com um brasão minucioso: um círculo envolto por um único e solitário aro.

Saturno.

— Aproxime-se, minha querida. Não tenha medo! — diz ele, meio rindo, enquanto voltava à posição normal da cadeira. A mão com o anel solta da outra e indica uma das cadeiras à frente da mesa. As sombras subitamente somem de seu rosto e ele se torna totalmente iluminado. Olhar diretamente para ele é agonizante: seus olhos pareciam enxergar minha alma.

Assim como os dela.

Percebo então que estou na mesma posição e no mesmo lugar desde que fui empurrada porta adentro, desde que os seguranças de dentro da sala retiraram minha venda. Com os braços tensos ao lado do corpo, as mãos fechadas em punho, as unhas penetrando a pele da palma pelo nervosismo.

Dou um passo lento, e sinto a agulha do salto afundando levemente no tapete, o que quase me desequilibra. Abro as mãos para recuperar algum equilíbrio e sigo até a cadeira, no entanto, sem me sentar. Sei que ele sempre oferecerá, mas nunca devo aceitar; é a lei dos reis. Um vassalo nunca se senta à mesma altura que seu rei. Sinto uma gota de suor frio escorrendo pela minha nuca ao pensar nele como meu rei, assim como um gosto amargo na boca.

— Não se sinta acanhada, senhorita. Aceita alguma bebida? Whisky? Vinho? — balanço a cabeça negativamente e ele assente, recostando-se novamente à cadeira. — Então diga-me, minha querida, o que deseja? Os preparativos estão feitos?

Eu o encaro por um longo tempo, a primeira vez desde que entrei aqui.

Eu abri e fechei a boca três vezes nesse meio tempo; não consegui encontrar as palavras, ou talvez a coragem para dizê-las. Principalmente com seus olhos de águia me fulminando, uma expressão divertida no rosto, como se sentisse entretido em me ver estrangulando para dizer as palavras que vim dizer. E ele parece saber exatamente o que eu vou dizer, mesmo que ainda nem eu saiba disso.

— Sr. Saturno, por favor… Eu vim lhe pedir que — escolho a palavra cuidadosamente, pausando um momento antes de dizê-la — reconsidere o seu pedido. A sua ordem, perdão. — corrijo ao ver a expressão severa em seu rosto. Continuo.

— O Sr. Não poderia permitir uma mudança? Não seria muito mais fácil simplesmente sumir com ela, fazer com que ela desapareça deste lado do planeta? Eu mesma não poderia me encarregar disso? Ou senão — pauso por um segundo, observando uma súbita mudança em sua posição. Ele inclina-se e apóia os cotovelos sobre a mesa, e as mãos unidas sustentam o queixo, como se estivesse realmente interessado no que digo —, eu poderia fugir com ela. O Sr. não precisaria vê-la nunca mais, o problema estaria resolvido, ou então—

— Você não entende, não é, senhorita… Lua. Creio que é assim que ela a chama? — sua pergunta não é respondida por mim, pois fico prestando atenção à indiferença que ele dá à menção dela; e também, eu não precisaria responder, ele sabe a resposta. — Eu não quero que ela “suma”, utilizando suas próprias palavras, eu quero o que combinamos. Se não for capaz de fazer isso, eu consigo outra pessoa, mas a sua mãe…

— NÃO! — grito antes que possa me conter. Ele não pode fazer isso, diz uma voz em minha mente, é só uma ameaça. Não, ele pode. Já vi do que é capaz, já vi o que fez a outros que falharam com ele. Sei que pode, e mesmo que não possa fazê-lo em meu caso, não pretendo testar esta teoria.

No entanto, não consigo deixar de pensar nisso. Será que vale a pena trocar uma vida por outra? Duas vidas distintas, com valores distintos, com durações distintas. Pessoas totalmente distintas. Valeria à pena sacrificar minha única família por ela? Ou sacrificá-la em meu bem próprio? Seria justo fazer isso, com qualquer uma das duas? Eu venho me fazendo essas mesmas perguntas há três anos, mas temo não ter encontrado resposta para nenhuma delas, ou solução.

Decido então apelar para minha última tentativa. Minha última chance.

— Senhor.

Fico subitamente ereta, as mãos espalmadas ao lado das coxas como em uma posição de sentido, dou a volta na mesa e fito o homem abaixo de mim, sentado na cadeira. Ele é um homem desprezível, vil, ardiloso, tudo o que se pode imaginar de ruim. No entanto, é determinado e nunca desiste de seus interesses; impõe o que acredita e apaga o que é irrelevante. Ganha o que precisa e tira o que julga necessário. O que mais o favorecerá, o que menos o afetará. Ele nunca desiste, me lembro mais uma vez. Minhas tentativas são inúteis; ele é exatamente como alguém que eu conheço.

Mas então minhas pernas se movem, dobrando meus joelhos, que encostam-se ao chão; o impacto é mínimo, por conta do tapete grosso e macio que o cobre por inteiro. Porém, é o suficiente para retirar de meus pulmões todo o ar que me restava, fazendo-me engasgar. Não por causa de alguma dor, mas por conta do gesto em si. Agora, o homem que me observa como um cientista aprecia uma anomalia rara, se ergue sobre mim como uma fortaleza, diferente do jeito como eu o via tão poucos segundos atrás. E esta era sua verdadeira forma; a grandeza era sua herança. Seu nome não era Saturno à toa.

— Eu lhe imploro senhor, por favor, que me poupe desse mal. Eu não posso fazer isso. Por quê é isso o que o senhor quer, por quê tem de ser eu? Não pode achar outra pessoa, alguém que não a conheça, alguém que não a ame? Eu a amo senhor, o senhor precisa saber disso, eu a am—

— Poupe-me de seu choro. — sua voz saiu seca. A boca está retorcida, os cantos inclinados para baixo, o rosto duro como pedra, os olhos mais frios do que jamais foram, mais frios que o gelo que tanto pareciam. Suas mãos seguravam os braços da cadeira com força, e eu sei que ele está se segurando para não me estapear na face. — Eu conheço seus sentimentos pela menina, e é exatamente por isso que a quero em especial. Não preciso de outra opção.

Sua voz saiu estranhamente mais calma, quase distante, nas últimas palavras. Eu quase pude ver sua mente vagando para um tempo distante, um tempo onde suas preocupações eram mínimas, ou talvez maiores. Seu rosto se suaviza, mas torna-se estranhamente sombrio. Seus olhos ainda estão fora de foco, provavelmente vendo o mundo que sua mente idealiza, e suas palavras ainda pairam no ar, ecoando em meus ouvidos.

Não preciso de outra opção.

— Se me permite perguntar, senhor. — uso o tom de voz mais baixo que consigo, mais alto que um suspiro e ao mesmo tempo mais baixo que um sussurro. Um tom de voz que somente ele, que estava exatamente à minha frente, poderia ouvir. Nenhum dos guardas ouviria. O desespero já havia abandonado minha voz e meu peito; fora substituído pela dor da aceitação. E agora, pela culpa. — Por que tem de ser eu?

Ele vira seu rosto em minha direção. Agora olhar para eles é como ver uma luz acesa no fundo do túnel, um brilho na vasta escuridão dos seus pensamentos, que estão refletidos na sua expressão. Suas mãos se soltam dos braços da cadeira e pouco a pouco a cor retorna a elas, antes brancas pelo esforço. Ele as levanta em direção à cabeça, com as palmas viradas para cima, e pousa-as em seu rosto, cobrindo seus olhos. Em seguida, as retira, e um sentimento totalmente diferente de todos que tinha demonstrado poucos segundos atrás, que normalmente não fazia parte de sua natureza quando eu o via, está estampado em suas feições: vingança.

— Por que eu quero que ela seja apunhalada nas costas pela pessoa que mais ama, assim como ela fez comigo.

 

 

O som da porta se abrindo me retira de minhas divagações.

Minutos atrás eu, ao mesmo tempo, pensava em tudo e em nada. Os olhos vidrados na porta do fogão, assistindo ao calor transformar o que tinha preparado para o jantar. Pouco a pouco, os dois pedaços compridos de tilápia douravam, assim como os legumes e batatas cortados ao redor. Ela não gosta de legumes, por isso sempre coloco batatas. Por outro lado, eu não gosto das batatas, e por isso como os legumes. E quando penso nisso, me lembro de todas as coisas que ela gosta. Ela gosta de deitar-se no sofá e ficar horas sem fazer nada, às vezes dormindo, às vezes apenas olhando para o teto e jogando uma bolhinha de tênis para cima, pegando-a quando esta cai. Ela gosta de ter essa liberdade.

Ela também gosta de banhos demorados, e tão quentes que sai toda vermelha de dentro do Box. Ela gosta de dançar as músicas que eu coloco, e fica tão concentrada que esquece tudo o mais, até de mim. Ela gosta de comer sempre que tem vontade, e o que tem vontade. Que eu saiba, ela nunca ficou mais de uma semana em uma dieta, contando calorias loucamente enquanto eu me empanturrava de doces e porcarias. Ela gosta de sorrir, pois usava aparelho quando era mais nova, e depois que o tirou, seus dentes ficaram lindos (ela sabe disso) e ela exibe seu sorriso com mais frequencia. E toda vez que ela ri, sua risada engasga, ela comprime os olhos, que já são amendoados, e eles ficam menores ainda, e ela sempre se joga no chão, a barriga doendo de tanto rir. Eu adoro fazê-la rir por causa disso.

Eu consigo ouvi-la falando besteira por horas e horas, e é impressionante sua capacidade de falar besteira durante todo esse tempo. E eu adoro desenhá-la. É o que faço quando ela está em seu momento de preguiça, que dura um bom tempo, o suficiente para encher um sketchbook de esboços. Ela gosta de cantar comigo, por mais que sempre reclame quando eu canto, dizendo que não cantará mais, por que “não é justo”, pois minha voz é a “voz dos anjos”. Mas logo que começo outra música, uma que ela conhece, ela recomeça a cantar. Eu tentei ensiná-la a tocar piano e violão também, mas ela desistiu fácil. Ela não é muito persistente nas coisas que não está interessada, mas no que gosta, põe toda a força do mundo.

E eu a amo por isso. Na verdade, eu a amo por tudo isso.

Eu já tentei imaginar muitas vezes como minha vida seria minha vida agora se eu não a tivesse conhecido. Talvez fosse o mesmo de antes, uma vida monótona e rotineira, onde tudo o que eu fazia não tinha nenhum propósito, nenhuma alegria constante, apenas pequenas alegrias passageiras. Eu não teria pilhas de folhas de pautas com notas sobre ela, não teria cadernos completos com desenhos dela, não teria memórias perfeitas com ela. Haveria apenas um pedaço de tilápia na bandeja no forno, e nenhuma batata.

Esse era o nada em que eu pensava.

Olho por cima do ombro enquanto saio de minha posição em frente ao forno, vislumbrando o vulto negro que é a Lua entrando pela porta da frente. Escuto o som da porta trancando, da chave caindo dentro do vaso raso que sempre deixamos as coisas, e seus pés descalços no piso de madeira. Eu sorrio para ela com as mãos nos bolsos traseiros da calça, me segurando para não correr para seus braços, sabendo que ela não gosta. Ela levanta o rosto, e por um microssegundo eu vislumbro uma tez cansada e vazia, que some tão rápido que eu chego a pensar se não foi algo da minha cabeça. Ela agora ostenta o sorriso de sempre, uma mistura de tudo o que sente, mesmo que eu não consiga distinguir o que ela sente. Ela ainda é um mistério para mim.

— Sol — diz ela, simplesmente. Sua voz sai mais como um suspiro, como sempre parece quando ela diz meu nome. Eu apenas a olho, e o segundo que dura essa convergência de olhares estranhamente parece uma eternidade. Eu vejo seu rosto aberto, mas seus olhos estão escuros; impenetráveis, como se estivessem fechados. Fechados para mim. Não deve significar nada, não é? Ela está sempre impenetrável.

— Isso é cheiro de comida? — seu rosto se abre em um sorriso maior ainda, seus olhos quase desaparecendo na face bela, e minhas dúvidas vão embora, sopradas pelo vento para um canto de minha mente. Eu me viro e sigo para a cozinha logo atrás de mim, e ouço seus passos me seguindo. Paro em frente ao fogão, com duas pequenas panelas de metal ainda nas bocas acesas, e apoio as mãos no granito das laterais da bancada. Sinto minha mão direita formigar, bem no local da queimadura, pela proximidade com o fogo que a causara.

— Sim, eu fiz tilápia a Belle Meuniere. Já está quase pronto. — como que para justificar minha fala, ouço o som do alarme no forno, indicando que o peixe está totalmente assado.

Lembro-me da primeira vez em que ela me ouvira falando francês. Eu tinha o costume de fazer isso quando morava sozinha, conversando comigo mesma como se estivesse falando com outra pessoa, só para praticar. Quando eu era pequena, essa pessoa era minha mãe, que me ensinara. Mas depois que a Lua veio morar comigo, mais ou menos duas semanas depois disso, eu comecei a falar em francês do nada, no meio de uma frase. Eu só percebi ao ver o olhar de incompreensão e irritação em seu rosto: ela não gosta de não entender alguma coisa, qualquer coisa que seja. Então eu comecei a rir, e ri tanto que não conseguia mais parar. Meus olhos lacrimejavam, sentia meu rosto tenso e a barriga doendo. “Do que está rindo?” perguntara ela constantemente, até que desistiu e fez o seu famoso beicinho, ficando emburrada. Depois eu lhe expliquei o que dissera, e que não havia percebido, pois era uma mania muito antiga. Ela me perdoou, e, dias depois, veio me pedir para lhe ensinar. E foi o que comecei a fazer.

Agora, eu vejo seu sorriso satisfeito por entender o que a palavra francesa significa: bela Meuniere*.

— Então é melhor eu ir lavar as mãos, não? — com um sorriso e uma piscadela, ela vira à direita, para o corredor, em direção ao banheiro. Assim que ouço o barulho da porta se fechando, percebo que estava prendendo minha respiração todo o tempo. O ar escapa de meus pulmões, mas não leva com ele a preocupação que sinto pulsando em meu peito. Ela permanece, e parece crescer a cada segundo.

O alarme do fogão volta a tocar, retirando-me de minhas divagações. Era o segundo aviso.

 

 

Não é a primeira noite que não consigo dormir. Mas será a primeira de muitas que não dormirei. Eu não vou conseguir dormir nunca mais.

Todas as cobertas, pelo menos no meu lado da cama, já estão na base da cama, pois me sinto sufocada. Mas meu corpo treme como se sentisse frio. Mas os tremores não são calafrios. Um enjôo parece me deixar tonta, mas não é causado por nada que eu comi. Fito o teto coberto de sombras, como um céu sem estrelas, e revejo meu dia mais uma vez, tentando encontrar uma brecha, um detalhe esquecido, uma palavra que eu possa usar a meu favor. Mas não há nada. Não há como apagar um incêndio com um balde d’água.

Assim como naquele dia, no dia que eu considero o primeiro da minha nova vida, muitos pensamentos me ocorrem ao mesmo tempo. Fuja, deixe-a. Esconda-se. Salve-se. Não, leve-a com você, se escondam. Fujam do país. Ele não tem como achá-las.

Faça o que lhe foi incumbido de fazer. E rápido, o tempo está se esgotando.

Como que para justificar meu último pensamento, no pequeno relógio em meu pulso — presente da Sol, por sinal —, o ponteiro dos segundos completa uma volta ao mesmo tempo em que o dos minutos: são 2 horas da madrugada. Meu prazo termina às seis. Coloco as pernas para fora da cama, sentada, tentando não fazer barulho, sentindo a cama voltando inflando novamente sem o meu peso sob ela, e percebo a inquietação que tomou conta de minha mente; tento impedi-la de se espalhar para o resto do meu corpo. O enjôo aumenta na boca do estômago.

Quando meus pés tocam o piso gélido, eu paro totalmente e a fito.

A serenidade em seu rosto quase parte meu coração em mil pedaços. Sua respiração pesada, mas ao mesmo tempo, inaudível, e as pequenas tremulações em suas pálpebras indicam que ela está sonhando. Eu sei disso por todas as noites que a observei dormindo. Mas eu não faço a mínima idéia do que ela possa estar sonhando, embora espere que seja algo feliz e grandioso. Suas mãos finas estão fechadas, uma delas sobre o cobertor, e a outra sobre o peito. Seus lábios entreabertos, tão perfeitos como os de um anjo, me dão vontade de ir até ela e beijá-la, como sentira desde que acordara pela manhã. Mas não seria justo com ela fazer isso.

Sinto-me sufocar. A sensação toma conta do meu corpo, e eu fico transferindo o peso de um pé para o outro, desconfortável. Instantaneamente, me sinto como se estivesse presa, ladeada por portões de ferro, inquebráveis. E o que está preso dentro da jaula comigo é meu destino. Ele não pode ser evitado, ou contornado, ou transformado. E as suas presas estão arreganhadas, prontas para me destruir se eu não cumprir o que ele pede.

Sigo até o banheiro, onde deixei antes de dormir uma muda de roupa pronta. Ela é formada basicamente de uma calça e camiseta pretas, botas, e um casaco também preto. Depois de vesti-las, fito meu rosto no espelho enquanto amarro o cabelo em um rabo de cavalo.

Meus olhos ainda inchados pela noite mal dormida refletem todo o desespero que sinto, a desesperança que sinto. Agora, de pé e lembrando-me de tudo que se passou durante esses três anos, não há como eu fazer o que devo fazer. Não há motivos, e eu preciso de motivos. Qual é a origem do ódio dele por ela? Por que eu fui a escolhida, simplesmente por amá-la tanto quanto amo a mim mesma? Isso é uma questão de vingança, simples e fria vingança?

Desvio os olhos do espelho, a afasto os pensamentos. Se eu continuar pensando demais, nunca vou conseguir fazer nada, nem que a coisa a se fazer seja fugir e me esconder para sempre.

Volto para o quarto, fazendo um baita esforça para pisar levemente, evitando que minhas botas façam barulho contra o assoalho. Sol continua dormindo tranquilamente em seu canto, mas sua posição mudou; sua mão esquerda está a centímetros de onde eu estava minutos atrás. Se ela perceber que não estou ali, vai acordar.

Me abaixo e avisto o que procuro embaixo de cama, onde posso ver apenas a silhueta de uma bolsa de lona preta. Puxo sua alça e a arrasto até mim, entre meus joelhos apoiados no chão. Abro-a sem fazer barulho e checo seu conteúdo, algo que não tinha feito antes, pois as instruções foram de escondê-la assim que chegasse em casa, coisa que fiz há alguns meses.

No interior da bolsa, havia milhares ― milhares ― de maços de dinheiro, e dinheiro de vários países; havia dólares, pesos, libras, euros, yenes, wons, assim como reais também. Uma fortuna, suficiente para sustentar um país pequeno, estava em minhas mãos. O ar escapa de meus pulmões, e ouço a Sol se mexer na cama. Por um segundo, congelo totalmente, me repreendendo mentalmente por ter feito algum ruído. Mas ela não acordou. Então me volto novamente para a bolsa.

O dinheiro não é o seu único conteúdo. Depois de revirá-la por alguns segundos, avisto a outra parte do trato. Ela está no fundo da bolsa de lona, e fria ao toque. Ainda.

A pistola é equipada com silenciador, e reconheço-a com sendo uma PPK/S .22, uma Walther Suppressed, e por um instante, me sento empolgada de segurá-la, pois é muito cara e muito procurada por sua eficiência. Então me lembro do motivo de estar segurando-a, e todo o meu ser recua para o buraco que é meu coração. É como cair e cair, para sempre, sem nunca atingir o chão, com a ansiedade aumentando a cada metro juntamente com a desesperança. Você sabe que vai morrer quando atingir o chão, e realmente quer que isso aconteça, mas como se a queda é eterna? Não há como imaginar isso, somente a pessoa que sente sabe como é que no caso, sou eu; mesmo se fosse possível, não se poderia entender a tamanha dor e desespero que é viver assim, somente sentir. Estar sempre caindo, porém nunca chegando ao fundo.

Então ouço outro ruído vindo da cama, e tento esconder a pistola dentro da bolsa, mas é tarde demais.

― Lua...? ― sua voz está grogue de sono, e por um momento, me lembro da noite em que ela me acordou por ter tido um pesadelo. Ela me olha de cima da cama, um cotovelo apoiado nos travesseiros tentando ajudá-la a se erguer e a outra mão em punho, coçando um dos olhos sonolentos, justamente para espantar o sono. Rezo para que a pouca luz vinda da janela não seja suficiente para que ela veja a bolsa ou a pistola em minhas mãos. ― O que você está...?

Mas, realizando o que eu mais temia, seu rosto encoberto por sombras endurece, e seus olhos se enchem de compreensão. Eu prendo a respiração e olho lentamente de seu rosto para a pistola, e de volta para seu rosto. A Sol retirara a mão do rosto enquanto eu não a olhava, e agora está totalmente sentada na cama, as mãos apoiadas no colchão às suas costas, as pernas levemente dobradas sob o cobertor claro. Ainda há traços de sono em seu rosto, talvez de desconfiança, e até ― incrivelmente ― de curiosidade, mas não vejo raiva ou a compreensão da traição em seus olhos negros, na curva da boca, no franzido do nariz.

Eu abro a boca para falar, mas ela me interrompe no exato momento em que começaria a me explicar.

― É o meu pai, não é?

Essa simples frase, essa simples pergunta, me atinge como uma pedra. Do mesmo jeito que aconteceria se Atlas não conseguisse mais segurar o céu sob suas costas, e seu peso gigantesco o esmagasse; mas por ele ser imortal, ele não morreria, apenas sentiria a dor das feridas se abrindo, do icor escorrendo, para em seguida se curarem, enquanto assistia ao colapso do mundo ao seu redor.

É exatamente assim que eu me sinto.

Eu respiro fundo, mas é como se todo o ar do cômodo estivesse condensado, ou fosse impedido de entrar em meus pulmões. Talvez o próprio mundo estivesse me impedindo de respirar, como se forçasse a minha morte súbita, mas eu não podia morrer agora; a vontade de morrer que eu tinha minutos atrás, para que eu não tivesse de realizar o que devo fazer, desvaneceu. O que ela quis dizer com pai?

A única resposta para minha dúvida seria: Saturno é pai da Sol.

Faz muito sentido agora que eu penso nisso. Todas as vezes que ele falou algo de um modo familiar, que agiu de modo familiar, os seus penetrantes olhos e as mãos longas e ossudas, tudo isso me lembrava ela. Como eu não percebi isso antes? Eu a vejo todos os dias, convivo com ela há três anos, nós dormíamos juntas, nós nos amamos, e ao mesmo tempo, eu não sei nada sobre ela. Não sei sobre sua família, sobre seu passado, sobre sua história. Ela nunca me contou como fez a cicatriz de queimadura na mão direita, ou como arranjou as marcas longas e brancas ao longo das costas. Nunca me disse o nome de sua mãe, embora falasse dela pelo menos três vezes ao dia. A única vez que a ouvi citar o pai foi enquanto falava sozinha, retirando a cesta de comida e algumas roupas que estava no lado de fora da porta, um mês depois que vim morar aqui, e lia o pequeno cartão que viera junto. “Como está papa?” ela sussurrara, e acho que a Sol nunca soube que eu estava a ouvindo.

Mas ela também não sabe nada da sua vida.

Isso me fez refletir como o nosso amor era possível. Como se pode amar alguém sem realmente conhecê-la? Como entregar seu coração sem que a pessoa possa abri-lo, ou sem abri-lo para a pessoa? Como entrelaçar os futuros sem entender os passados?

― Saturno... é seu pai? ― essa é uma pergunta a qual eu já sei a resposta. Mas eu tive que perguntar do mesmo jeito.

Ela mudou de posição, cruzando as pernas como um índio, e passando ambas as mãos pelos braços, como se esfregasse; ela começava a sentir frio.

― Acho que é assim que ele é chamado no seu mundo. ― ela não se explicou, mas eu sei o que ela quis dizer: o mundo do crime. Seus olhos, por um segundo, encontram os meus, e eu vejo o vazio dentro deles. O enorme vácuo que seus olhos pareciam, mas não mais daquele jeito caloroso, como chocolate meio-amargo. Como um vácuo onde a luz, o som, o ar não passa. Como o vácuo do Sistema Solar.

Mas então seus olhos se desviam, focando nas mãos agora unidas sobre seu colo. Ele inspira profundamente.

― Ele te mandou me matar, não é?

Foi a pistola, penso primeiramente. Foi ela que te entregou. Mas não. Ela não diria isso com tanta tranquilidade do jeito que falou se tivesse acabado de descobrir algo tão horroroso quanto isso. Um pai encomendado a morte da própria filha. Eu me pergunto o que deve pensar um homem que manda exterminar algo que deveria ser, ao mesmo tempo, sua maior alegria e sua maior responsabilidade. Ou talvez o problema não fosse ele.

Mas mesmo assim.

O que poderia a Sol ter feito de tão horrível para que o pai nunca a perdoasse? Eu não consigo imaginar nada; ela não faria mal a uma mosca.

Ao perceber isso, percebo pela primeira vez o tamanho do ato de pensara em cometer. Que tipo de pessoa eu era? Se por um único segundo eu realmente considerei completar o serviço, eu deveria ir para o Inferno e queimar lá eternamente. Não se faz algo assim a alguém, principalmente alguém que se ama. Eu prometi. Eu prometi que a Lua sempre orbitaria o Sol em nossa galáxia.Meus olhos se enchem de lágrimas.

― Ah, Sol, por favor, me escute. N-nós precisamos fugir, precisamos te esconder, o-ou então... Ou então nós f-orjamos a sua m-morte, qualquer c-coisa, você tem que v-viver. Eu não posso d-deixá-la m-morrer―

― Finalmente.

O peso de suas palavras me atingiu novamente. Eu admiro o modo como a Sol escolhe as palavras e coloca o exato sentimento que as evoca, completando-as do jeito que só ela consegue.  Elas são seu maior trunfo, e ela só consegue demonstrar o que sente através delas, como a dança é para mim. Mas é estranho, pois algumas vezes, para as outras pessoas, eu digo, é difícil expressar algo que se deve expressar em um ato com palavras, assim como expressar algo que deve ser dito com palavras em um ato. Mas a Sol... ela sempre usa as palavras. Por isso, quando ela não diz, não consigo saber o que ela está pensando.

Em meio às lágrimas silenciosas, que escorrem pelo meu rosto, eu compreendo o que ela quis dizer sem que ela precisasse explicar.

De início, eu achava que ela se referia ao fato de eu finalmente encontrar um modo de contornar esse destino, ou de pelo menos tentar. Mas não foi isso que ela quis dizer. Ela disse finalmente pois ela finalmente vai morrer.

Uma lágrima solitária escorre enquanto eu contemplo a magnitude do céu lá fora. E o vazio sem estrelas reflete, estranhamente, a minha alma vazia. Já são duas e meia.

― Por quê, Sol? Somente... por quê? ― lentamente eu me levanto, e penso em ir até o seu lado da cama e me sentar ao lado dela. Mas não o faço, e então só fecho minhas mãos em punho, sentindo as unhas perfurando de leve a palma de minha mão.

Ela encolhe as pernas, segurando-as contra seu peito, e apóia o queixo em um dos joelhos.

― Você vai saber, Lua. Eu só te peço uma coisa. ― seu olhar se fixa em mim, e ela estende uma das mãos, pedindo que eu a segure silenciosamente. Eu contorno a cama, me sento de frente para ela, mas não tão perto, e seguro-a, sem olhar diretamente em seus olhos.

Ela aperta levemente a minha mão, e eu levanto a cabeça para olhá-la. Também há uma única lágrima escorrendo por sua bochecha, e eu sinto a tentação de esticar a mão e secá-la. Mas, novamente, não o faço. Não posso fazer o que quero, pois sei agora que não é de ninguém a escolha do seu destino. Não cabe a mim mudá-lo ao meu modo, e nem cabe ao seu pai. A Sol não é nenhuma marionete; pelo contrário, ela é a pessoa mais independente que eu conheço. Então eu não posso impedi-la de escolher. Eu só espero que ela faça a escolha certa.

― Deixe que eu morra pelas mãos do fogo.

O fogo novamente. Depois de um tempo convivendo com ela, eu achava que tinha entendido essa sua obsessão pelo fogo, mas na verdade, eu nunca vou entender. É como se eles fossem a mesma coisa, como se ela fosse feita de fogo, e o fogo feito dela. Não faz muito sentido, mas é a única explicação plausível para esse mistério. Ele realmente é um vício para ela, pois piromania é uma doença. É isso que ela tem, não há outro jeito de interpretar. Mas não é o tipo de doença que deteriora o portador, principalmente quando a fonte do vício está sempre ao alcance deste. Mas um vício sempre é um vício, e pode matar.

E agora ela quer morrer por meio desse vício.

― Sol, você não entende? Eu... ― tento escolher as palavras certas para dizer, mas não consigo. Eu não posso. Não consigo. Não são suficientes para demonstrar todo o que sinto, pois a coisa mais difícil que deve existir nesse universo é abrir mão de algo ou alguém que ama. E principalmente quando deve ser você o causador dessa separação. Então decido optar pelas palavras de que disponho. ― ...não consigo. Eu te amo. Seria como cometer suicídio.

Ela me olha intrigada, a cabeça levemente inclinada para a esquerda. Sua mão ainda segura a minha, mas ela a solta e coloca ambas as suas mãos em minhas bochechas, causando um arrepio. A sensação de suas mãos frias evoluiu de entorpecente para reconfortante, como lavar o rosto com água fria toda manhã. Seus olhos castanhos, quase negros, agora tão perto dos meus que nossos narizes quase se tocavam, refletem não só meu rosto, mas minha expressão angustiada. E eu estou angustiada. Angustiada por não poder resolver um problema tão simples, mas ao mesmo tempo tão complexo, como esta; por ter que aceitar que não há caminhos alternativos, só há uma solução; por senti-la escorregando por entre meus dedos a cada segundo que passa.

― Você tem que fazer isso, meu amor. Eu quero que você faça. Se você não fizer, outros virão, e eu não quero isso. Quero morrer pelas mãos da pessoa que mais amo em todo o mundo.

Não, não, por favor, não! Eu queria gritar. Não quero que ela morra, não quero matá-la, não quero perdê-la. Não posso perdê-la. Eu não mereço o amor dela, pois ele é maior que qualquer amor no mundo, mais puro, mais verdadeiro. É o amor dos anjos, os anjos que a conceberam, os anjos que ela reflete. Ele é único e dura para toda a vida. Se um coração como esse se partir, não há conserto, ele não cicatriza; se mantêm aberto por toda a eternidade. Eu não mereço um amor como o dos deuses, pois eu sou uma simples mortal, com um amor mortal. É como amar uma estrela; você a vê todos os dias, mas não pode tocá-la, não pode falar com ela, não pode entendê-la, não pode saber se ela a ama também. E se pudesse fazer tudo isso, morreria, pois a verdadeira forma de seu amor não é para os olhos mortais.

É um segredo de deuses e anjos. De imortais.

Com a maior dor do mundo, sentindo como se fosse desabar após falar, e segurando as lágrimas que batiam á porta da minha alma, eu falo.

― O que você quer que eu faça...?

Ela retira as mãos do meu rosto ainda olhando em meu rosto, com certeza tentando encontrar algum traço de contrariedade, mas não encontrará nenhum. Eu prometi para mim mesma, há muito tempo, que faria de tudo para merecer seu amor, que faria tudo o que ela desejasse e que estivesse ao meu alcance fazer. Realizaria seu último desejo, mesmo contra a minha vontade. Pois eu a amo mais que tudo.

Ela começa a ditar o que eu devo fazer. Me pediu para abrir as janelas, para que a fumaça saísse quando o fogo começasse, e o oxigênio entrasse, e também me disse como fazer isso. Eu sempre achei que não houvesse jeito de abri-las, ou que ela não soubesse de nenhum, mas ela sabe, e me diz para encontrar um pequeno interruptor abaixo da estrutura de metal da janela, e acioná-lo. Depois disso, a janela se abre com facilidade. Em seguida, aponta a cômoda, e me pede duas coisas lá: uma garrafa velha de whiskey que mantêm escondida na última gaveta, mas que nunca abriu; e um isqueiro qualquer de dentro da primeira gaveta. Então ela me diz o que fazer depois de pegar tudo isso. O álcool da bebida e o fogo do isqueiro vão queimar tudo em segundos.

― Como seu pai saberá... Saberá que não foi suicídio? ― é uma pergunta boba, mas faz sentido. Se ela ama tanto o fogo, por que não se matar através dele? É a forma mais fácil de fazê-lo, e me pouparia de sofrer por saber que fui eu que parei seu coração para sempre.

Ela refletiu por alguns instantes, como se escolhesse as palavras, ou a melhor forma de falar algo complexo, tornando-o simples.

― Pois meu pai sabe qual é o meu maior medo. ― ela, instintivamente, tocou a cicatriz na palma da mão direita com os dedos da esquerda, como faz quando se lembra da vez em que ela foi causada. É assim que percebo que talvez eu nunca saiba o que realmente aconteceu, mas eu não me importo. ― eu tenho medo de me queimar.

Não faz sentido.

Se seu maior medo é queimar, então por que raios sua maior dependência é o fogo? Por que ela me pediu para morrer queimada?

― Por que, desse modo, eu vou poder vencer meu maior medo. ― diz ela, como se pudesse ler minha mente. Talvez ela pudesse, sei lá. ― Se eu bem conheço meu pai, ele vai encobrir você se atestar que fez um bom trabalho. Se a polícia achar que foi suicídio, pode convencer a todos disso, e não haverá culpado então.

“Existem motivos que podem ser usados para isso, como o atestado de minha loucura, o fato de eu morar sozinha, e podem inventar outras coisas. Meu pai vai chorar um pouco, lamentar para as câmeras, e depois, todo mundo vai esquecer isso. Ninguém nunca mais vai incomodá-la, você estará livre.”

Eu não estarei livre. Os anjos me amaldiçoarão pelo resto da minha vida por ter matado um deles.

Eu apenas balanço a cabeça, voltando meus olhos para os pés, que se movem em direção à cômoda que ela apontara como sendo a que contêm uma garrafa de whiskey escondida. Eu abro a última gaveta e retiro as poucas roupas que cobrem a garrafa, perfeitamente dobradas como todas as outras nas outras gavetas. Ela ainda está lacrada, e cheia com um líquido de cor âmbar. É pesada, então eu a pouso sobre o topo da cômoda. E então, abro a primeira gaveta.

Esta é dividida em dois lados. Um dos lados contém muitos papéis e envelopes; cartas, aparentemente todas com o mesmo selo e o mesmo endereço: aqui. Mas elas parecem nunca ter sido abertas. O outro é repleto de pequenos paralelepípedos de metal. Isqueiros. Cada um de um tamanho e cor diferente, eles forram o fundo de madeira do seu lado da gaveta. Alguns têm inscrições, outros lisos; alguns velhos e oxidados, outros novos, como se nunca tivesse sido tocados ou abertos. Pego um aleatoriamente ― um mais oxidado e velho, pois tenho medo de queimar um de ouro ― e o deixo ao lado da bebida.

Depois, me volto pra a Sol.

Ela havia se recostado ao travesseiro, e esticado as pernas, então sua posição é um meio termo entre deitada e sentada, como a Bela Adormecida em seu sono eterno. Mas o sono que ela terá será um do qual eu não poderei acordá-la com um beijo.

― Lua, você pode fazer dois últimos favores para mim? ― eu segui até ela enquanto ela falava. Sento-me ao seu lado e seguro sua mão, sentindo a aspereza e delicadeza da cicatriz em sua palma. Estranhamente, ela está quente, diferente do resto da mão, que continua gelada. Talvez seja por saber que irá encontrar-se novamente com as chamas, a língua de fogo, e dessa vez, será mortal.

― Claro, minha vida. O que é?

― Quero que fique com meu casaco. Aquela bomber vermelha, com as listras douradas nas mangas e o dragão atrás. E o meu isqueiro, o que era da minha mãe. ― como que para justificar a fala, ela indica com o queixo o isqueiro em cima do criado-mudo.

Eu não quero aceitar. Todas as memórias que tenho já são suficientes para que eu me lembre dela, e são também suficientes para me matar. São as memórias mais felizes da minha vida, tão felizes que deixarão um vazio enorme; minha vida nunca mais vai ser a mesma, eu nunca mais vou ser feliz.

Nunca mais vou amar alguém como eu amo a Sol. Eu aprendi o que é amor com ela, e esse aprendizado desaparecerá com ela. Eu vou seguir em frente, mas uma parte do meu coração vai permanecer com ela, vai ser queimada essa noite.

Mas não vou contrariá-la agora.

Solto sua mão e vou até o grande closet na parede ao fundo, e abro na porta que sei que ficam os casacos. Os casacos dela estão misturados com os meus, assim como todas as nossas roupas no armário todo. Mas eu não penso em pegá-los; levar essas duas coisas que ela me deu já é demais, não posso ficar com as outras. Retiro o casaco em específico do cabide e guardo-o dentro da bolsa de lona no chão. Em seguida, vou até o criado-mudo, pego o isqueiro, e, sem olhar para ele, enfio-o no bolso da jaqueta.

― Está na hora, minha Lua.

Mordo o lábio inferior ao ouvir essas palavras, e sinto o gosto metálico do sangue na boca. Mas a dor que vem junto com ele não é suficiente para retardar a que eu sinto em todo corpo, pois não é somente meu coração que sofre com elas. Todas as minhas células, meus tecidos, meus órgãos, tudo parece se retorcer ao pensamento que evitei durante todos esses anos. Eu terei de matá-la agora.

Uma última vez, tento juntar todas as minhas forças para fazer alguma coisa. Penso em correr em me jogar pela janela aberta, ou alcançar a pistola dentro da bolsa e enfiar uma bala na minha cabeça. Ela não poderia, não conseguiria me deter. Eu prefiro tirar minha vida a ver a dela escorrer por entre meus dedos. Mas ao ver-me refletida em seus olhos, que me fitam através de uma cortina de lágrimas prateadas, eu perco as forças. Caio de joelhos no chão frio, sem sentir nenhuma dor por isso. Eu estava inteiramente entorpecida. Minhas mãos buscaram trêmulas as dela, e ela as segurou com força. Os soluços simplesmente irromperam de minha garganta, e a torrente de lágrimas, as que vim contendo em todos esses anos, pareceu jorrar de meus olhos.

E eu chorei. Não sei se horas se passaram ou somente minutos, mas eu chorei. Em cada lágrima estavam contidas todas as palavras não ditas. Será que eu disse o quanto a amava vezes suficientes? Será que eu a tratei do jeito que ela merecia? Será que eu a agradeci pó me amar?

― O-obrigad-da p-por me am-mar, Sol. ― tentei dizer em meio aos soluços, mas é como se minhas forças tivessem desaparecido, então as palavras saíram como um sussurro, fracas. Não do jeito que um agradecimento deve ser. Não do jeito que eu deveria dizer à ela.

Seu rosto choroso instantaneamente muda de triste para severo.

― Nunca, Lua, nunca agradeça a ninguém por isso. O maior prazer que eu já tive foi poder amá-la.

Com isso, eu enxugo as lágrimas de meu rosto com a manga da jaqueta, me levanto tropegamente, e me inclino, incerta, para lhe dar um último beijo.

Nossos lábios apenas se selam por alguns segundos, leve e plenamente. Dizem que os corações se entrelaçam quando um casal se beija, e a cada beijo, mais perto os corações estão de tornar-se um só. Então é como se esse beijo fosse desatar os nós que nos uniam como uma só, como se fosse separá-los de algum jeito.

Mas isso não acontecerá conosco. Não se pode separar algo que sempre esteve unido. Que sempre foi um só.

 Assim que nossos lábios se separam, eu abro os olhos, mas ela não abre os dela. Sei que está na hora.

Faço tudo roboticamente. Arrasto a bolsa para a porta de entrada, e destranco-a, levando a chave comigo de volta para o quarto para queimá-la nas chamas. Lá, abro a garrafa de whiskey e derrubo o conteúdo por toda a cama, sobre a Sol, que deitara acima das cobertas, depois pelo chão, fazendo um rastro até o fim do corredor que leva à sala e parando lá. Ela dissera que eu não poderia, e não deveria, estar no cômodo quando o fogo começasse, então teria de começá-lo de outro lugar.

Em todo o tempo, enquanto realizava tudo o que me dissera para fazer, eu não pensava. No momento seguinte ao qual uma pessoa tem seu coração partido, essa é a sensação. Era como olhar para o céu à noite e não ver a lua, como não ver estrelas. Mas não por elas não estarem aparecendo, por elas terem desaparecido. É como se meu cerne tivesse ficado preso naquele quarto, naquela cama, ao lado dela. O que anda e pensa agora é somente uma casca vazia. O que ficou junto com a Sol queimará junto com ela e deixará de existir.

Mas ela; ela nunca deixará de existir. Em mim, naquele apartamento. Nas músicas que compôs, nas telas que pintou, nas letras que cantou, nas palavras que escreveu. O seu perfume ficará para sempre impregnado em minhas narinas, em minhas roupas, em minha pele. Seu toque ficará marcado em mim, e o gosto de seus lábios eternamente nos meus. Seus sorrisos gravados sob minhas pálpebras, seus abraços me aquecendo quando estiver frio. Suas mãos gélidas na neve que um dia cairá sobre mim, e cobrirá toda a cidade, onde quer que eu esteja. E o fogo que tanto ama... ele surgiu com os deuses, e somente os deuses poderão apagá-lo. Não cabe aos mortais extingui-lo, e nem cabe a mim extinguir a chama que ela carrega no peito, que eu carrego no peito; ela permanecerá lá e aqui para sempre, e continuará unindo nossos corações para sempre. Quando o dela parar de bater, o meu baterá pelo dela.

A bolsa começa a pesar em meu ombro, e meus pés formigam. Eu retiro o isqueiro velho do bolso e o abro. Uma chama imediatamente surge no queimador, pequena e alaranjada. Eu a fito por alguns segundos e penso em tudo o que ela significa; é a nossa história que está contida naquela pequena fonte de calor. E ela vai terminar como começou: com fogo.

Jogo o isqueiro aberto no líquido agora transparente sobre o assoalho marrom, e uma linha de fogo cresce a partir do ponto onde este tocou a bebida, seguindo na velocidade da luz para o quarto no fim do corredor.

Uma explosão enorme acontece, lançando calor sobre todo o apartamento, e eu o sinto em minha pele. Me sinto zonza por não poder enxergar, pois a luz intensa havia me cegado, então, colocando o braço sobre o nariz para não respirar a fumaça negra que começava a sair do quarto, começo a andar em direção à porta, tropeçando nos móveis ao longo do caminho. Derrubo uma das mesas no canto da sala, e ouço o vidro se estilhaçando no chão, mas continuo andando, sem poder respirar.

Passo pela porta e sigo para as escadas de emergência, mas o som de um grito me detém no meio do caminho. Eu penso imediatamente em voltar, mas as instruções da Sol foram claras: mesmo que eu grite, não volte, sob nenhuma circunstância. Então, cubro o caminho que falta em três passos largos, abro a pesada porta de aço e desço os degraus meio correndo, em direção ao térreo. Quando chego lá, desorientada por conta da falta de ar e do que acabara de fazer, paro por um instante para pensar no que fazer. Lembro-me do endereço que me foi dado, a algumas quadras daqui, onde deveria esperar por um carro preto que me levará embora. Mas antes devo fazer algo em relação à Sol.

Se ela pode ser salva, essa é a última chance.

Pego o meu celular ― pouco familiar, devido ao desuso em todo esse tempo ― e disco o número dos bombeiros.

Sou atendida depois de dois toques, e uma voz de mulher me saúda e pergunta qual é o problema. Eu falo sobre o incêndio, as palavras saindo mais rápido e mais desconexamente do que eu esperava. Ela pede calma e pergunta o endereço. Eu o dito ávida, e ela desliga, dizendo antes que entrará em contato com a central, que enviará um carro para o local. Eu guardo o celular no bolso, olho para os dois lados, e corro porta afora para a escuridão da madrugada, sozinha, vazia. Insípida.

 

 

Ao chegar até o local, o carro já me espera na frente de um beco escuro de aparência suja. Eu atravesso a rua, abro a porta de trás e entro.

Só há apenas um cara de terno e óculos escuros ― embora seja de madrugada ― na direção, e assim que entro, ele dá a partida, manobra para sair da vaga, e segue pela avenida deserta. Ele liga o rádio, e procura uma estação. Para em uma onde está passando uma notícia de incêndio, em um prédio no centro da cidade, onde o último andar inteiro pegou fogo em minutos, mas não se sabe sua origem. “Os bombeiros trabalham para apagá-lo antes que cause danos aos outros andares”, diz a voz de um apresentador.

Meu estômago se embrulha, e finalmente sinto a hemorragia invisível em meu peito. O fio inextensível que ligava meu peito ao dela, minha alma à dela, se rompeu. A vida que eu tinha se esvaiu. O fogo o qual queimava dentro de mim continua queimando, mas somente durante o tempo que o dela queimar. Assim que os bombeiros apagarem o fogo em seu apartamento, eles apagarão o meu também.

Os deuses já haviam previsto meu destino quando eu a conheci. Ela foi meu castigo por não ouvir o que eles diziam. Mas também meu presente, por algum motivo que algum dia eu descobrirei.

No fim das contas, o fogo nunca foi meu verdadeiro vício, nunca foi meu abismo, minha queda. Nunca foi minha a obsessão, e nem meu amor.

 

Sempre foi ela. E sempre será. 

 

 

 

 


Notas Finais


Não se desesperem, meus caros. Por algum tipo de milagre (eu devo estar realmente louca), isso não precisa acabar assim.
Pretendo postar um capítulo extra, um fim digno, mas somente se, em um prazo de duas semanas, a fic tiver dez comentários ou mais. E aviso, SOMENTE UM COMENTÁRIO POR PESSOA SERÁ LEVADO EM CONTA.
Mas por enquanto, é isso.
Me perdoem pelas lágrimas, pelo sufoco, e obrigada pelas risadas e pela compreensão. Eu volto logo com mais histórias complexas, tristes, e repletas do que tem de melhor no meu coração.

Até logo,

Dual.


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