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História Love Inside Out - Desejo


Escrita por: jaimencanto

Capítulo 23 - Desejo


               O clima em casa havia melhorado muito nos últimos dias. Sofia estava esbanjando felicidade por estar se dando bem com Caio, apesar de tudo. Fernando e Letícia sentiam-se felizes por ela, e Anna estava completamente animada por ter vencido o concurso de redação em sua escola. A família estava em clima de festa, e Letícia quis caprichar no jantar daquela noite. Ao som de uma boa música, Sofia e Anna a ajudavam a arrumar a mesa, e quando Fernando chegou do trabalho, sorriu divertido olhando para a três dançando em volta da mesa.

- Boa noite, Senhoritas.

- Boa noite, papai! – Anna respondeu animada. – Estamos arrumando a mesa para o jantar.

 - Estou vendo. – Ele riu. – E qual é o motivo especial?

- Não precisamos de um motivo especial. – Letícia sorriu e se aproximou. – Oi.

- Oi. – Ele lhe deu um beijo.

- Argh! Beijo é nojento, mamãe! – Anna exclamou fazendo careta.

- Isso mesmo, filha! Continue com esse pensamento até fazer dezoito anos. – Fernando brincou e Letícia bateu em seu ombro. – Bom... Já que o jantar será especial hoje, vou subir para tomar um banho e me arrumar para acompanhar essas lindas damas.

- É melhor não demorar. Estamos famintas.

- Prometo que não demoro. – Ele novamente beijou Letícia. – O que estão olhando? – Perguntou para Sofia e Anna, que sorriam para eles.

- Nada. – Sofia riu. – Vocês fazem um belo casal.

- Preciso concordar. – Ele puxou Letícia pela cintura, fazendo-a gargalhar.

- Vai logo tomar o seu banho!

- Tudo bem. Estou indo.

               Fernando virou-se e seguiu para a escada. Letícia voltou à arrumar a mesa juntamente com Sofia e Anna.

- Mamãe, há quanto tempo você e o papai namoram? – Anna perguntou colocando um prato sobre a mesa.

- Eles não namoram, Anna. São casados. – Sofia riu.

- E qual é a diferença?

- Nenhuma, meu amor. – Letícia riu. – E nós namoramos há oito anos.

- Oito? Isso é mais do que eu tenho.

- Claro. É por isso que você nasceu. – Sofia riu.

- Eu não entendi.

- E nem precisa entender. Pronto, a mesa já esta arrumada. Agora vão lavar as mãos que eu vou servir o almoço.

               Sofia e Anna deixaram a sala de jantar e Letícia foi até a cozinha pegando a refeição. Havia preparado um prato especial naquela noite, mesmo sem nenhuma ocasião especial. Ela sentia-se bem, assim como o restante da família, e isso já era motivo suficiente. Depois de preparar toda a mesa, Sofia e Anna voltaram e sentaram-se à mesa assim como Lety.

- O papai está demorando. Eu estou com fome! – Disse Anna.

- Ele já deve estar descendo.

               Não demorou muito para que Fernando voltasse à sala, e ele não estava brincando quando disse que se arrumaria bem. Fernando colocou uma camisa social preta para a ocasião, e Letícia não pôde deixar de comentar.

- Uau. Eu devo me trocar também? – Ela sorriu quando ele sentou-se ao seu lado.

- Não, você está ótima assim. – Ele lhe deu um beijo no rosto. – Aliás, todas vocês estão.

- Obrigada. – Sofia e Anna disseram em uníssono.

- Então, podemos nos servir! – Letícia disse. – Anna, me passa o seu prato. Vou servir para você.

- Parece delicioso. – Fernando comentou. – Tem certeza que não é uma ocasião especial?

- Está começando a me ofender, Fernando Mendiola. Não faço refeições gostosas só em ocasiões especiais.

- Tem razão, me desculpe.

               Anna riu.

- Por que está tão risonha hoje, mocinha? – Fernando perguntou divertido.

- Ela está feliz por causa do premio. – Lety respondeu enquanto a servia.

- E também acho vocês dois engraçados. – Ela riu.

- Engraçados, por quê? – Lety perguntou.

- Porque vocês ficam bonitos juntos.

               Fernando e Lety se olharam e sorriram.

- Acho que alguém quer um aumento de mesada. – Sofia brincou e todos riram.

- Mamãe...

- Sim?

- Como foi que vocês se casaram?

               Sofia parou com o garfo diante de sua boca e Fernando olhou para Letícia, esperando que ela respondesse. Mas Letícia não fazia idéia do que responder, e continuou surpresa com a pergunta.

- Por que quer saber isso, meu amor? – Ela perguntou entregando o prato para ela.

- Porque nunca vimos fotos. Aqui em casa tem fotos do aniversário da Sofi, fotos de quando eu era bebê, mas não tem fotos do seu casamento.

               Letícia olhou para Fernando, mas ele apenas mexeu os ombros, sem saber o que responder.

- Você ainda é muito nova para saber. – Lety forçou um sorriso. – Um dia te contamos.

- Tudo bem.

               Ela pareceu convencida, o que deixou Letícia aliviada.

- Quando eu for me casar, quero um vestido bem lindo igual o de uma princesa. E quero um anel bem grande para colocar aqui. – Ela apontou para o dedo.

               Sofia riu e Fernando se engasgou com a comida.

- Você não precisa pensar nisso agora. – Ele disse engasgado.

- Eu sei, mas é que eu assisti um filme que a moça se casou com um lindo vestido, em um lugar muito bonito. Eu quero que o meu casamento seja assim.

               Letícia sorriu pensativa e escorou seu rosto em sua mão.

- Lety, pode dizer para sua filha que ela só vai pensar em casamento daqui a muitos anos? – Fernando escorou-se à cadeira.

- Mas eu só estou dizendo que acho bonito.

- É realmente muito bonito, meu amor. – Lety disse brincando com a comida. – Eu também pensava assim quando tinha a sua idade.

- E você se casou assim?

- Adivinhem quem arrasou na prova de matemática hoje? – Sofia mudou o assunto e Letícia agradeceu mentalmente.

- Eu disse que você se daria bem! – Fernando sorriu animado.

- Mereço um aumento de mesada, não acham?

- Ótima tentativa. – Letícia riu.

- Mas eu tirei uma nota realmente muito boa. – Ela disse divertida.

- Então que tal um cartaz na porta de casa “Sofia, você não fez mais que sua obrigação?” – Fernando sugeriu e gargalhou logo depois.

- Jogo sujo, pai.

               Ninguém tocou mais no assunto sobre casamentos, mas Letícia passou o restante do jantar com a mente distante. Fernando não havia notado isso, até as meninas irem para a sala de televisão e os dois ficarem a sós enquanto tiravam a mesa do jantar.

- Está tudo bem? – Ele perguntou pegando os pratos.

- Sim. Por quê?

- Não sei. Está um pouco calada.

- Não é nada. – Ela sorriu. – Acho que o cansaço bateu.

- Tem certeza?

- Tenho sim.

               Fernando deixou sua preocupação de lado e juntos terminaram de tirar a mesa. Quando foram até a sala, Anna estava com os olhos presos sobre a televisão, mas Sofia estava deitada ao Sofá sorrindo para o celular.

- Como é que ela consegue ficar o tempo inteiro com esse celular na mão? – Fernando questionou sentando-se no outro sofá.

               Letícia apenas riu e sentou-se ao seu lado.

- Vai acabar tendo algum problema de vista desse jeito. Sabia que pessoas de olhos claros têm maior probabilidade de desenvolver um problema de vista?

               Ela não parecia prestar atenção. Deu uma gargalhada, mas não pelo que Fernando disse, e sim por algo que leu em seu celular.

- Viu só? Nem presta atenção no próprio pai mais.

- Deixa ela. – Lety comentou aninhando-se no braço de Fernando.

               Fernando bufou e voltou a atenção para o filme que estava passando. Como sempre, era uma animação escolhida por Anna, e todos já sabiam as falas de cor. Mas, mesmo conhecendo aquele filme de trás pra frente, Letícia não pôde deixar de notar uma cena que jamais tinha dado tanta importância. O casamento da princesa. Algo que apenas crianças notavam e se empolgavam, mas aquele assunto havia mexido com ela. Lety nunca foi o tipo de mulher que tinha o sonho de se casar com véu e grinalda, e até então não havia pensado nessa possibilidade, até porque ela já estava casada. Mas, por algum motivo, depois da pergunta de Anna, pela primeira vez em muitos anos ela se imaginou em um vestido de noiva, caminhando por um corredor decorado por várias flores, e com Fernando à esperando no altar.  

               Com aquela idéia de casamento em sua cabeça, Lety passou o restante da noite pensando se deveria conversar com Fernando sobre isso, e saber o que ele achava sobre fazer uma cerimônia, mesmo que já tivesse se passado anos desde que se casaram por obrigação. Não era assim que Lety queria se lembrar do seu casamento, e mesmo que fosse uma história interessante de ser contada, ela queria se lembrar de um momento feliz ao dizer “sim” para o homem da sua vida. Depois que Sofia e Anna foram para seus respectivos quartos e os dois ficaram a sós, Letícia aproveitou para tocar no assunto.

- Por que será que Anna se preocupou em saber como nos casamos depois de tanto tempo? – Ela perguntou enquanto arrumava a cama.

               Fernando escovava os dentes e apenas balançou os ombros, mostrando que também não sabia por que.

- Às vezes me sinto mal por isso. Eu gostaria de mostrar fotos do nosso casamento para elas.

               Assim que terminou de enxaguar a boca, Fernando se aproximou da cama e tirou a sua camisa.

- Podemos mostrar fotos de Recife. Foi nossa lua de mel. – Ele sorriu.

- Não... Não digo isso. – Lety também sorriu. – Mas em algum momento ela vai perguntar sobre isso de novo.

- E nós vamos continuar enrolando como fizemos com Sofi. Você lembra que ela sempre perguntava sobre isso?

- Sim... – Letícia respondeu desanimada sentando-se à cama.

- Então quando ela for um pouco maior explicamos o que aconteceu.

- Mas acho que... Não é assim que toda menina pensa que seus pais se casaram. E se ela se chatear quando souber que foi um casamento arranjado e que nos odiávamos?

               Fernando riu e deitou-se à cama.

- Então nós podemos esconder a parte que nos odiávamos. Podemos dizer que foi amor à primeira vista.

               Ela desistiu. Desistiu de tentar fazer Fernando perceber que ela estava incomodada com o fato dele não se importar se tiveram uma cerimônia ou não. De certa forma ela não o culpava totalmente, já que Letícia jamais deixou claro que queria esse tipo de coisa. Mas ela se irritou por ele não perceber que ela estava irritada com isso. Após lhe dar as costas e deitar pesadamente em seu travesseiro, ela logo percebeu que ele se mexeu ao lado dela. Estava disposta à negar qualquer tipo de fogo à ele naquela noite, mesmo que isso fosse difícil para ela. E assim que o sentiu tocar em sua cintura, ela deu um longo suspiro.

- Amor... – Ele a chamou.

- O que? – Respondeu com certa frieza.

- Você não vai apagar a luz?

               Sentindo-se ainda mais irritada do que antes, ela se inclinou sobre a mesinha e apagou o abajur. Fernando voltou a se deitar, e nem ao menos tentou provocá-la. Mesmo que ela estivesse disposta a negar, sua raiva aumentou e ela acabou adormecendo emburrada.

 

 

 

•••

 

 

 

               No dia seguinte, após se arrumar para o trabalho, Fernando desceu para tomar o café da manhã. As meninas já estavam à mesa e Letícia terminava de servi-las. Uma cena típica do cotidiano da família, se não fosse pelo fato de Lety estar séria demais, diferente de todas as manhãs.

- Bom dia. – Ele disse ao se aproximar da mesa.

- Bom dia. – As meninas responderam em uníssono, mas Lety apenas forçou um sorriso. – Amor, pode levar as meninas para a escola hoje? Preciso chegar mais cedo no trabalho.

- Sim. – Ela respondeu apenas, servindo o café para ele.

- Você não vai tomar café?

- Estou sem fome.

               Sofia e ele se olharam, e a garota apenas mexeu os ombros, sem saber o que tinha acontecido.

- Eu vou ver se o correio chegou. – Antes que um deles pudesse perguntar alguma coisa, Lety saiu da sala de jantar, deixando Fernando confuso e curioso.

- Eu fiz alguma coisa? – Ele perguntou à mesa.

- Você que tem que dizer isso. – Sofia riu. – Vocês brigaram?

- Que eu me lembre não.

- Ela está assim desde que acordamos. Parece chateada com alguma coisa.

- Você fez alguma coisa na escola?

- Eu não!

               Os dois viraram-se para Anna.

- Eu também não fiz nada, eu juro! – Ela disse rapidamente.

- Se nenhum de nós fez nada, por que ela está chateada? – Fernando escorou-se à mesa. – Faz o seguinte. Quando forem para a escola, tentem descobrir o que aconteceu. Quando eu chegar do trabalho resolvo isso, tudo bem?

- Certo. – Sofia concordou.

- E se ela só estiver desmonitada? – Anna comentou.

- Desmo o que? – Sofia a olhou.

- Desmonitada. Minha professora disse isso na sala ontem. Quer dizer que a pessoa está triste com alguma coisa e não tem vontade de fazer nada.

               Fernando riu.

- É desmotivada, filha.

- Isso!

- Quem sabe? Mas agora eu preciso ir. – Fernando se levantou. – Não se esqueçam de investigar o que aconteceu.

- É como um filme de espiãs? – Anna perguntou empolgada.

- É sim!

- E eu posso usar os seus óculos escuros, papai?

- Acho que não vai ser necessário, meu amor. – Ele riu e se inclinou beijando sua testa. – Até mais tarde.

- Bom trabalho, pai. – Sofia disse quando ele também se despediu com um beijo na testa.

- Obrigado.

               Assim que ele saía da sala, Letícia voltava e os dois se esbarraram.

- Já estou indo. – Ele disse olhando-a.

- Tudo bem.

               Ele esperou que ela dissesse “tenha um bom dia no trabalho, eu te amo” como sempre fazia, mas ela permaneceu em silencio. A “chateação” era muito mais grave do que ele pensava.

- Então, até mais tarde. – Ele lhe deu um rápido beijo, que não foi retribuído com tanta animação.

- Até.

               Sem dizer mais nada ele se afastou. Letícia suspirou e percebeu que Sofia e Anna a olhavam curiosas.

- Terminem o café. Não podemos nos atrasar. – Disse desanimada, porém com a voz mansa.

               As duas continuaram a tomar o café em silencio e Lety seguiu para a cozinha, afim de descontar sua frustração nas louças.

 

 

•••

 

 

               À caminho para a escola das meninas, Letícia foi surpreendida com uma pergunta de Sofia sobre o seu humor naquela manhã. Sem saber exatamente o que responder, Letícia mentiu que estava tudo bem e que só estava em um dia ruim. Mas depois da insistência da filha, ela enfim resolveu confessar o que a perturbava.

- Não adianta negar, mãe. Nós sabemos que você está chateada com alguma coisa e...

- Tudo bem. – Ela disse rapidamente. – Eu estou... Chateada pelo assunto do... Casamento. – Ela olhou para Anna pelo retrovisor.

- Ah... – Sofia a olhou. – Você... Não gostou de algo que o papai disse?

- Não, não foi exatamente isso. É que... – Ela suspirou. – Eu não pensava que me importava com isso até o assunto surgir no jantar.

- Você está triste com o seu casamento, mamãe? – Anna perguntou curiosa.

- Não meu amor, não é isso. – Lety sorriu.

- Então você está chateada por que... – Sofia abaixou a voz para que Anna não escutasse. – Não teve o casamento dos sonhos.

- Parece mais estranho quando é dito em voz alta. – Ela torceu a boca. – Mas acho que sim. Eu não queria que passássemos o resto das nossas vidas lembrando de um casamento arranjado.

- Casamento arranjado? – Anna perguntou.

               Letícia praguejou mentalmente por ter dito isso em voz alta, e agora teria que explicar tudo à Anna, o que seria ainda mais difícil.

- É que o papai e a mamãe não se casaram como nos filmes, Anna.

- E por que não?

- É complicado. Nós apenas... Assinamos alguns papéis.

- Isso quer dizer que vocês não são casados?

- Claro que são. – Sofia respondeu. – Assinar os papeis conta mais do que uma cerimônia bonita.

               Letícia a olhou.

- Eu estou sendo boba, não é?

- Não, mãe. – Sofia riu. – Eu entendo que você queira ter um casamento dos sonhos. Só estou surpresa por ter demorado tanto tempo para perceber isso.

- É que não parecia tão importante antes. Ainda não parece... Quero dizer... Nós já somos casados, nos amamos, temos vocês. Não é como se realmente importasse...

- Mas você gostaria que acontecesse.

               Lety balançou a cabeça concordando.

- Tudo bem, não se preocupe. Vamos fazer o seguinte... Vou jogar algumas indiretas para o papai durante o jantar. Ele com certeza vai pegá-las no ar e vai perceber que vocês dois precisam conversar sobre isso.

- Você quem deveria pensar em fazer psicologia. – Letícia riu.

- Não. Na verdade... Eu... Estava pensando em fazer medicina.

               Aproveitando que o sinal avermelhou, Letícia voltou sua atenção para Sofia, demonstrando sua surpresa.

- É mesmo?

- Sim. Não apenas pelo Caio, mas... Eu realmente gosto do que o papai faz. Percebo quando ele fala sobre o trabalho o quanto é gratificante, e eu me interessei por isso.

- Meu amor, isso é ótimo! Já disse isso à ele?

- Não. E não pretendo dizer enquanto não estiver perto de fazer o vestibular. Ainda tenho um ano para isso. Tenho medo de mudar de idéia e decepcioná-lo.

- Você nunca o decepcionaria.

               Sem notar que o sinal se esverdeou, Letícia tocou carinhosamente no rosto de Sofia e sorriu. Só quando o carro de trás buzinou e chamou sua atenção que ela percebeu que estava empacando o transito.

- PASSA POR CIMA! – Gritou irritada, fazendo Anna e Sofia rir.

               Após deixar as meninas na escola, Lety seguiu para a livraria, sentindo-se um pouco mais aliviada por ter desabafado com Sofia. Por mais que a situação ainda não estivesse sido resolvida, falar sobre isso com alguém a deixou um pouco mais leve. Só lhe restava esperar o jantar para saber se Fernando se animaria com a sugestão, ou se acharia aquilo uma grande perda de tempo. Depois de estacionar o carro em uma rua próxima, Lety caminhou até a livraria, e assim que abriu a porta, foi surpreendida com uma comemoração de Carolina e Bruno, seu funcionário.

- O que é isso? – Ela perguntou divertida notando os confetes que eles jogavam nela.

- Não sabe que dia é hoje? – Carolina perguntou surpresa. – Não acredito...

- Eu disse que ela não se lembraria. – Bruno riu.

- O que foi? O que estamos comemorando?

- Não acredito que você se esqueceu que hoje completa oito anos da inauguração da livraria!

- Ai meu Deus! – Ela colocou as mãos à testa. – Eu não acredito que me esqueci disso.

- E nem eu! – Carolina andou até o balcão, pegando uma garrafa de champanhe. – De qualquer maneira, ainda bem que eu comprei isso. Imaginamos que você se esqueceria. Você é a única mãe de família aqui. – Ela riu. – Bruno, faça as honras, por favor.

               Bruno pegou a garrafa de champanhe e em pouco tempo a estourou. Carolina colocou as taças em sua frente e ele as encheu. Após cada um receber a sua, as taças foram erguidas e Lety disse com orgulho:

- Que venham muitos anos mais!

               Os três brindaram suas taças e tomaram a champanhe logo depois.

- Eu não acredito que me esqueci dessa data tão especial... – Lety choramingou caminhando até o balcão. – Eu estava planejando tantas coisas legais para essa data. Descontos, promoções, eventos...

- Ainda temos tempo. – Carol disse. – Podemos fazer isso no fim de semana.

- Você acha?

- Claro que sim!

               Lety sorriu escorando-se ao balcão.

- Eu só preciso cancelar o meu jantar com Omar.

- Jantar? Que jantar?

- Ele me convidou para jantar fora no sábado.

- E você está calma desse jeito?

- Como assim?

- Carol, e se ele for pedi-la em casamento?

- Ai meu Deus! – Ela exclamou. – Você acha?

- Por que não? – Lety disse animada.

- Espera... – Bruno se aproximou. – Só por que ele a chamou para um jantar romântico ele precisa pedi-la em casamento?

- Ele não costuma me chamar para jantares românticos. – Ela respondeu. – Costumamos fazer isso na minha casa ou na dele.

- Mesmo assim, ainda acho que estão exagerando. Ele pode apenas querer ter um simples jantar romântico.

- Por que você é tão estraga prazeres? – Lety perguntou.

- Não sou estraga prazeres. Só estou dizendo que vocês mulheres imaginam um pedido de casamento especial. Ele pode fazer isso hoje enquanto Carol está assistindo televisão, ou pode fazer quando ela menos esperar.

- Lety tem razão, você é estraga prazeres. – Carolina suspirou. – Não tem graça um pedido de casamento se não for romântico!

- O importante não é o pedido em si?

- Não! – Carolina exclamou. – O importante é uma coisa romântica! Um jantar, um buque de flores, uma surpresa...

- Não acredito. – Bruno balançou a cabeça. – Lety, você que é uma mulher casada, como foi o seu pedido de casamento?

               Carolina olhou para o chão e Letícia continuou em silencio.

- O que foi? Eu disse algo errado?

- Não... – Ela respondeu desanimada. – Eu... Não tive um pedido.

- Como não? Fernando não pediu sua mão?

- Não.

- Então vocês resolveram se casar apenas?

               Por mais que Bruno fosse um ótimo funcionário e amigo, Lety nunca se preocupou em contar à ele sobre como começou o seu romance com Fernando, até porque isso não importava. A única coisa que lhe importava era que todos soubessem que eles se amavam e que tinham uma linda família juntos, e de fato era o que Bruno sabia sobre eles.

- Nós tivemos um casamento arranjado.

- O QUE?

- É tão surpreendente assim? – Perguntou envergonhada.

- Não, é que... Isso é sério? Em pleno século vinte e um? E no Brasil? Como foi isso?

- É uma longa história. O fato é que nós casamos por obrigação, e... Acabamos nos apaixonando.

- Uau... – Ele sorriu. – Daria um ótimo livro.

- É.

- Mas o que importa é que os dois são o casal mais lindo que já vimos! – Carolina disse animada. – E não é porque não teve um pedido de casamento romântico ou uma cerimônia dos sonhos que Lety vai ficar desanimada, não é?

               Ela não respondeu.

- Não é? – Carolina a olhou. – Lety, o que foi?

- É que... Ontem durante o jantar Anna perguntou como Fernando e eu nos casamos.

- E o que você disse?

- O mesmo de sempre. Que contaríamos quando ela crescesse. E então ela começou a falar sobre o casamento dos sonhos, com um vestido de princesa e várias outras coisas, e eu... Meio que... Senti falta de não ter tido isso.

- Ah, amiga... – Carolina segurou sua mão. – Você nunca tinha se importado com isso...

- Eu sei, e me sinto péssima com isso. Sempre estufei o peito para dizer que Fernando e eu não precisamos de nada disso para sermos felizes. Mas é que eu não consigo parar de pensar qual a sensação de planejar um casamento. Procurar o vestido perfeito, enlouquecer com os preparativos... Eu... Adoraria ter passado por isso.

- Mas você ainda pode passar por isso. Vocês só precisam planejar uma cerimônia.

- Depois de tantos anos? Não parece bobeira?

- É claro que não! Seria lindo! Imagina que bela história para contar à Anna? E imagina a felicidade dela de participar do casamento dos próprios pais?

               Letícia riu.

- Eu não sei. Não sei se Fernando concordaria.

- Fernando comprou um par de alianças para vocês depois de um mês de convivência. Você realmente acha que ele não toparia isso?

- Ele pode achar perda de tempo. Como Sofia mesmo disse no carro hoje, o que importa é estar casado no papel.

- E a cerimônia também importa e muito. E se é importante para você, tenho certeza que será para ele também.

- Vocês mulheres são loucas... – Bruno resmungou. – Se Lety já está casada e feliz, por que fazer uma cerimônia agora?

- Porque é o desejo dela, e ela quer realizá-lo. E você está começando a me irritar. Por que não vai tirar poeira dos livros da vitrine? – Carolina respondeu impaciente.

               Bruno bufou e se afastou das duas.

- Não ligue para ele. Como eu disse, se é importante para você, então diga para Fernando. Tenho certeza que ele concordaria.

- Você acha?

- Claro que sim!

               Lety sorriu.

- Tem razão. Vou conversar com ele sobre isso hoje a noite.

- Ótimo. Agora... Vamos deixar as comemorações de lado, e vamos abrir logo essas portas. Precisamos de muitos clientes hoje para comemorar o aniversário!

- Com certeza! – Lety respondeu animada.

 

 

 

•••

 

 

               À noite, Lety terminava de servir o jantar com o bom humor de sempre. Estava decidida a conversar sobre aquele assunto com Fernando, e talvez com o incentivo de Sofia ele concordaria com a idéia da cerimônia de casamento. Depois que arrumou a mesa, não demorou muito para que Fernando chegasse do trabalho. Ele a cumprimentou e Letícia lhe deu um beijo animado, totalmente diferente do que lhe deu pela manhã.

- Hum... Oi. – Ele sorriu após o beijo. – Está animada.

- Sim. – Ela sorriu.

- Posso saber o motivo?

- Nada especial. Ah! Sabia que hoje é o aniversário da livraria? Oito anos.

- Oito anos? Tudo isso?

- Sim!

- Meus parabéns, meu amor. – Ele a puxou para um abraço. – Um sonho realizado há oito anos.

- Sim, e graças à você. – Ela retribuiu o abraço.

- Graças à nós dois. – Ele sorriu. – Bom... Vou subir para tomar um banho e desço para jantar, tudo bem?

- Certo.

               Fernando lhe deu outro beijo demorado, e pareceu satisfeito por ela estar de bom humor. Assim que se afastou, Sofia e Anna entraram à sala.

- Lavou as mãos? – Lety perguntou à Anna.

- Sim, mamãe.

- Lavou mesmo? Posso conferir?

               Anna riu e mostrou as palmas das mãos para Lety.

- Ah, muito bem!

- E então... – Sofia cochichou quando Anna seguiu para a mesa. – Falou com ele?

- Não. Ele foi tomar o banho.

- Pode deixar que já sei exatamente o que dizer.

               Lety riu e as duas acompanharam Anna à mesa. Depois de alguns minutos Fernando desceu e se juntou à elas, animado com a harmonia da casa naquela noite.

- E então, como foi na escola hoje? – Ele perguntou.

- Bem. – Sofia respondeu apenas.

- Muito bem. – Anna sorriu.

- Ótimo. – Fernando olhou para Lety. – E na livraria?

- Foi tudo bem. – Ela sorriu.

               Fez-se silencio à mesa enquanto Lety e Sofia trocavam olhares cúmplices. Por um tempo apenas o barulho dos talheres batendo no prato podia ser ouvido à sala, até Sofia quebrar o silencio.

- Ahm... Pai.

- Hum?

- Você não tem vontade de ter um casamento?

               Letícia se engasgou com o suco. Fernando a olhou estranhamente, mas se preocupou em ajudar Letícia a se desengasgar. Ela não esperava que Sofia fosse ser tão direta assim.

- Está tudo bem? – Ele perguntou à Lety.

- Sim. – Respondeu com a voz embargada.

- Por que a pergunta, Sofi? – Ele a olhou. – Eu já sou casado.

- Não quis dizer isso. Eu quis dizer se você nunca se interessou em ter um casamento de verdade. Vestir um terno, ficar no altar, essas coisas.

               Fernando riu.

- Não entendo por que esse assunto de repente, mas respondendo sua pergunta, não. Não vejo necessidade disso.

               Letícia ficou em silencio.

- Por que não?

- Oras, porque eu já sou casado, amo minha esposa, e tenho duas filhas lindas. Não preciso de mais nada.

- Mas não é questão de precisar. Não acha estranho dizer que são casados e não ter nenhuma foto para comprovar?

- Nós temos muitas fotos.

- Fotos do casamento, pai.

- Por que está tão interessada nesse assunto? Você não está querendo dizer que já está pensando em...

- Não, pai. Claro que não. – Ela revirou os olhos.

- Graças à Deus! – Ele suspirou aliviado.

- Só estou curiosa... Nunca falamos sobre isso.

- É porque sua mãe e eu não me importamos com isso, não é Lety?

               Letícia apenas forçou um sorriso.

- Não é? – Ele tornou a perguntar.

- Você não se importa de sermos casados apenas no papel?

- Não. Eu tenho certeza que fiz a escolha certa. Não me importa se começou de forma errada.

- Mas deveríamos ter boas lembranças de um momento tão especial. Nós nos apaixonamos depois de casados...

- E é isso o que importa. Nos apaixonamos.

- Sim, é claro. Mas talvez se tivéssemos uma comemoração para isso...

- Você nunca se importou com isso, Lety. Por que isso agora?

               Ela olhou para Anna e Sofia que prestavam bastante atenção na conversa. Fernando não parecia querer ceder, e aquele assunto começava a tirá-la do sério. Sem querer mais discutir sobre aquilo e se magoar ainda mais, Lety colocou o garfo sobre a mesa e afastou a cadeira.

- Com licença. – Disse levantando-se.

- Aonde você vai? – Fernando perguntou confuso.

- Vou para o quarto. Estou sem fome.

               Sem esperar mais tempo, ela saiu da sala, subindo diretamente para o seu quarto.

- O que foi que deu nela? – Fernando perguntou confuso.

- Ai, homens são todos iguais... – Sofia suspirou.

- E isso é jeito de falar?

- Desculpe, pai. Mas é porque vocês são lentos para perceberem as coisas. Não vê que ela ficou chateada porque você não está se importando com essa história de cerimônia.

- E por que isso agora? Ela nunca se preocupou com isso.

- Vai ver agora ela teve vontade de ter o casamento dos sonhos.

               Fernando suspirou.

- Eu vou conversar com ela. – Ele se levantou e saiu da sala deixando Anna e Sofia sozinhas.

- Por que os homens são todos iguais? – Anna perguntou.

 

 

•••

 

 

               Letícia tentava espairecer a frustração enquanto lia um livro, embora ela não prestasse atenção em nenhuma palavra que lia. Enquanto aquele assunto martelava em sua cabeça, ela percebeu Fernando entrar no quarto e caminhar em direção à cama. Sem tirar os olhos do livro, ela o ignorou até que ele quebrasse o silencio.

- Você está brava?

- Não. – Respondeu apenas.

- Por que saiu da mesa daquele jeito?

- Só perdi a fome.

- Não foi só isso.

- É claro que não foi só isso.

- Então me diga o que está acontecendo.

               Ela fechou o livro com raiva e o olhou.

- Me espanta você não se preocupar que não tivemos um casamento digno.

- Lety, mas isso realmente importa? Já falamos sobre isso tantas vezes e você sempre disse que não se importava se tivemos um casamento arranjado.

- Eu não me importo!

- Então qual é o problema?

- O problema é que eu não quero me lembrar pelo resto da vida que nossa união foi apenas uma assinatura obrigada em alguns papéis.

- Meu Deus! Já estamos juntos há oito anos e agora você deu para ficar neurótica com essa história?

- Ah, então eu sou neurótica por querer um casamento romântico? – Ela perguntou ofendida.

- Não, eu não disse isso.

- Disse sim!

- Está bem! Me desculpe! – Ele disse em voz alta. – Eu nunca imaginei que isso fosse tão importante para você.

- Não é. – Ela resmungou voltando a abrir o livro.

- Ah, não é?

- Não!

- Você é tão difícil de agradar, Letícia. – Ele suspirou impaciente. – Uma hora fala que quer, e outra hora fala que não é importante.

- Não é importante para mim se não é para você. Você quer que eu te obrigue a ter uma cerimônia de casamento? Posso pegar algumas cordas na garagem e te amarrar no altar.

- E começamos com as ironias! – Reclamou colocando uma das mãos à testa. – Eu juro que tento te entender...

- Depois de oito anos já deveria ter entendido.

- É impossível te entender! – Ele aumentou a voz.

- Ótimo! Esqueça esse assunto, esqueça que falamos sobre isso! Se você não se importa, então eu também não me importo! Fim de conversa! Vamos continuar casados apenas no papel. Não interessa o romantismo!

               Fernando bufou e soltou os braços pesadamente sobre suas pernas.

- Eu não vou continuar essa discussão boba com você. – Ele a olhou. – Quando você se acalmar, conversamos.

               Antes que ela pudesse responder, ele saiu do quarto deixando-a à sós. Letícia fechou o livro com ferocidade e o jogou sobre a cômoda. A situação estava ainda pior do que antes.



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