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História Love Jokes - Capítulo I - Tristeza Insana


Escrita por: Bojack-senpai

Notas do Autor


Capítulo atualizado (19/09/2022)

Capítulo 2 - Capítulo I - Tristeza Insana


 

  Sob as sombras da noite, apenas iluminado pela lua e por poucos postes antigos, com luminárias elétricas que substituíram as velhas luminárias à óleo animal, o Asilo Arkham tinha uma aparência amedrontadoramente fantasmagórica. Seus telhados pontiagudos em formato de enormes triângulos que miravam as estrelas, suas gárgulas angelicais separadas por longas grades negras e suas janelas diversas e retangulares criavam, junto à iluminação bizarra, uma aparência de mansão mal-assombrada.

  Para qualquer um que houvesse de estar naquele local, aquela seria uma noite assustadora em um lugar onde os verdadeiros monstros insanos viviam; mas, os funcionários do asilo já estavam acostumados. “Os verdadeiros monstros estão na mente humana; apenas temos de controlá-los, ou ajudar a controlá-los” era um antigo lema passado para os iniciados naquele conjunto de prédios atijolados.

  O Asilo Arkham era um conjunto de três prédios interligados por grandes passarelas, eram dois prédios maiores e um menor no centro, que davam uma singular aparência de serem pequenos castelos presos à uma mansão antiga. Todos eram revestidos com aparência de tijolos, junto a telhados negros e desbotados que acumulavam uma aparência esverdeada por graças ao limo que por anos se formava e acumulava por toda aquela superfície inclinada, além do toque final: janelas antigas de vidro retangulares e verticais, emolduradas em madeira reforçada.

  Por dentro o asilo víamos divisões por alas específicas e regulamentos metódicos. O Diretor Arkham tentava manter organizado e controlado todo o ambiente psiquiátrico onde mantinha seus internos insanos e problemáticos. Sua divisão de aprisionamento era construída de acordo com a periculosidade dos internos, assim como cada psiquiatra dentro de Arkham possuía seu próprio cartão de acesso conforme seu nível de autoridade e capacidade dentro do asilo. “Casos pequenos para profissionais pequenos” era o que o Diretor Jeremiah Arkham costumava dizer.

 Jeremiah Arkham descendente do fundador Amadeus Arkham, é o atual Diretor do Asilo Arkham, um “negócio de família”; um obscuro e trágico negócio de família. O Diretor era um homem de meia-idade, cabelo liso, castanho grisalho e escorrido. Sua aparência magra e olhos presos a intensas rugas de exaustão e insônia escondiam uma sabedoria e poderes manipulativos únicos de um psiquiatra que já invadira e vasculhara as mais sombrias e nefastas mentes. Era o único, naquele vasto asilo, que possuía o cartão de acesso nível sete.

  Os cartões de acesso, ideia inicial de Quincy Sharp, um antigo Diretor do Asilo Arkham que havia tomado o cargo temporariamente, acabou sendo posto em prática apenas pelo próprio Dr. Jeremiah Arkham, cujo havia se afastado de Gotham por três anos e agora retornara.

  A forma como funcionava o nivelamento de acesso era de acordo com o grau de estudo e experiência, além de um adicional aonde era levado em conta se o profissional possuía métodos  pouco ortodoxos ou tradicionais. Quanto mais capacitado o psiquiatra, maior era o seu nível de reconhecimento dentro de Arkham.

 Uma funcionária relativamente nova no ramo, mas, que já havia se provado de extrema capacitação ao ter estagiado por um ano no asilo antes de ser efetivamente contratada, havia mostrado métodos não ortodoxos que eram capazes de tratar efetivamente algumas mentes insanas que recusavam tratamento convencional exercido pelos psiquiatras que o haviam tentado.

  Esta mesma funcionária agora vagava uma última vez pelos corredores de Arkham antes de ir embora. Havia sido responsabilizada pelos cuidados de um criminoso classe três, Logan Howard. Decidido passar uma última vez em sua cela para confirmar como estaria o paciente, a funcionária descia a escadaria de pisos amadeirados recentemente reformados para chegar ao corredor dos loucos infames onde encontraria seu paciente.

  A funcionária possuía belos cabelos loiros presos em um coque, belos olhos de tamanhos perfeitos e com sua íris de um azul claro como se os mares de um País tropical ali banhassem, seus lábios carnudos e sem exageros pintados por um batom vermelho sangue quase completamente enegrecido, era um espetáculo que acompanhavam um quase nunca visto enorme sorriso sensual e estonteante.

Os pacientes de Arkham, sejam daquela ala ou de outra, não podiam evitar olhar e paquerar aquela bela mulher que passava por entre eles. Seu jaleco branco com seu nome escrito e sua foto em um crachá preso ao peito sobre uma camisa vermelha e uma saia negra que se estendia até um pouco acima dos joelhos, era um de seus métodos não ortodoxos para criar uma abertura com seu paciente.

Caminhou pelo corredor inicialmente escuro, onde as lâmpadas acendiam automaticamente com a aproximação metro a metro do próximo sensor, criando conforme andava um caminho iluminado; isto para economizar energia já que já passara da hora de saída dos funcionários e o local deveria estar vazio no momento, com a exceção máxima do Diretor e de alguns funcionários da parte de limpeza.

  Aquela área do asilo era completamente definida por celas com parede frontal de vidro reforçado, para observação dos pacientes. Suas celas possuíam um mínimo de confortabilidade: uma cama com colchão desgastado, roupas de cama muitas vezes mal lavadas, pia de plástico e privada de um metal pesado e soldado no chão. As paredes de vidro reforçado possuíam cada uma um comunicador de voz, para conversação entre paciente e psiquiatra sem necessidade de retirá-lo de dentro, e uma pequena passagem fechada por chave, onde era posto comida para que o paciente pudesse pegar.

  Cada cela possuía a sua frente em um pequeno pedestal de metal, uma marca numérica, junto ao nome e uma foto anexada. A marca numérica era significativa para reconhecimento do nível de psicose e periculosidade do paciente. Logan Howard era nível três, um nível destinado a paranoicos psicóticos com traumas perturbadores.

  Um pouco antes de chegar à cela de seu paciente destinado, a Doutora passara por um dos mais perigosos criminosos psicóticos com transtorno de personalidade antissocial que Gotham já havia tido o azar de conhecer; o Coringa. Ele estava sentado, encolhido, quieto num canto, mal era reconhecível naquele estado. Podia vê-lo sem camisa, e notar algumas tatuagens em seu corpo, mas, nada mais. Estava escuro em sua cela e a única iluminação precária que entrava ali vinha do chão onde a Doutora andava. As celas, assim como o corredor, acendiam apenas com aproximação.

  A Doutora sempre possuíra um enorme interesse por aquele paciente, desde alguns anos atrás quando tivera notícias dele pela primeira vez na cidade de Gotham. Infelizmente o falido palhaço do crime estava em um nível muito superior ao permitido para a Doutora. O criminoso que havia sido detonado pelo obscuro mascarado antes de ser levado para o Asilo Arkham, era nível 7. Ninguém podia tratá-lo. Ouvira até mesmo histórias de que não havia tratamento para ele, nada funcionava, segundo boatos. De qualquer forma, era a sua própria maneira, admirável. Ao menos antes era.

 Continuou sua caminhada retomando seus pensamentos sobre como poderia abordar e continuar o tratamento de Logan, cujo já apresentava uma forte melhora e mudança de perspectiva. Ao chegar na cela, viu seu paciente sentado na cama acolchoada lendo um livro cujo iluminava com a pequena lanterna plástica. A Doutora havia combinado com ele que se fosse capaz de terminar o livro que emprestara, conversaria com o Diretor para dar-lhe um colchão melhor. Ser capaz de realizar acordos onde ele barganhava sem se irritar ou ameaçar era um grande avanço. Sua determinação em ler o livro, junto de seu aparente interesse no tema, eram outros dos sinais diversos de avanços conquistados.

— Sr. Howard. – A Doutora chamou-o ao tocar seu dedo no botão verde do comunicador e então falar por um pequeno microfone acoplado.

— Srta. Quinzel, à que devo a honra? Já não está tarde para a senhora estar por aqui? – Dizia o homem calvo, com sobrancelhas grossas e óculos de haste escura. Embora um assassino antes até animalesco quando em estado de paranoia devido aos seus surtos psicóticos, agora mostrava uma feição simpática para a Doutora Quinzel.

— Vim ver como estava antes de ir. Apenas um último “check-out”. – A Doutora Quinzel observava seu paciente do outro lado do vidro. Parecia calmo. Parecia estável. Ótimo.

— Não deveria passear por aí sozinha esta hora da noite, Dra. Quinzel. Sabe-se lá o que acontece quando as portas de Arkham são trancadas e a noite torna-se vazia nos andares acima. – Dizia Logan com um olhar intrigante e um sorrisinho de canto de lábio.

— É por isto que nos veremos amanhã, e depois, e depois, e depois, Sr. Howard. Essas brincadeiras e tentativas de assustar, assim como sua conotação de ameaça implícita, apenas atrapalham o senhor propriamente. – Harleen mantinha-se indiferente, como se aquilo fosse lamentavelmente tedioso.

— Não ameaçaria a senhorita, nem que fosse capaz disso, Srta. Quinzel. – Disse ele em uma forma de desculpas.

— É Dra. Quinzel, para você, Sr. Howard. Boa noite. – A Dr. Quinzel sabia ser extremamente fria. Fria suficiente para amedrontar um criminoso psicótico paranoico como Logan Howard.

  A Dra. Quinzel retornou pelo caminho a que viera, mas, novamente encontrou-se presa e intrigada com o homem de cabelo esverdeado encolhido no canto da cela, no escuro, com as mãos aparentemente esticadas sobre os joelhos. Aproximou-se. Luzes acenderam dentro da cela e pôde vê-lo, agora claramente.

  O homem sentado ao chão e de cabeça baixa, agora levantava o olhar e o rosto pálido para a bela Doutora. Seu olhar era triste, vazio, e sua expressão era como se houvesse se perdido há muito tempo. Um súbito sorriso simpático sem mostrar os dentes fora exibido pelo Coringa para a Dra. Quinzel, a surpreendendo. Sentira um estranho frio na barriga.

  Aquele homem não era feio como dito nos boatos e como vira uma vez em um documentário. Na verdade, parecia um homem quase comum. Apenas parecia perdido. Sua olheira havia se intensificado desde que houvera sido levado para Arkham, seus dentes antes quebrados foram consertados com partes de prata dando-lhe um visual diferente do comumente visto antigamente.

  Recobrando-se da hora, a Dra. Quinzel adiantou-se a sair daquela ala para buscar sua bolsa em sua sala de trabalho, seu consultório, e ir enfim embora para casa. Não sabia o porquê, mas, estava bastante interessada naquele homem. Claro, todo psiquiatra está. Até mesmo Jeremiah arriscou tratá-lo uma vez, mas, desistira quando nenhum de seus métodos adiantara, além disso, ainda fora ameaçado. Ser ameaçado pelo Coringa não era nada bom, mesmo que ele estivesse preso em uma cela de tamanha segurança.

  Após apanhar sua bolsa em sua sala de trabalho, a Dra. Quinzel adiantara-se para o carro. Não por temer a escuridão pouco iluminada pelas luzes fantasmagóricas dos postes locais, mas, por estar exausta e querer seu merecido descanso.

  A Dra. Quinzel era noiva de um advogado criminal já havia oito meses e seus sentimentos sempre foram confusos desde sua infância dolorosa; graças a sua infância dolorosa; e com isto não sabia ao certo o como se sentia sobre o seu noivo. Acreditava, porém, ser feliz. Seu relacionamento era como qualquer outro, havia momentos altos e baixos, porém Robert sempre fora um homem gentil. O que claro, ela não estava acostumada.

 _____________________Coringa__________________________

  Sentado ali no escuro daquele lugar grotesco e cheio de aberrações, sentia-se como um animal enjaulado. Estava destruído, não era mais o homem que fora havia meses. Sentia crescer dentro de si uma dependência mortal e dolorosa por qualquer coisa que pudesse lhe oferecer um pouco de emoção, um pouco de risada. Os meses encarcerados naquele lugar haviam sido cruéis.

  Durante todo este tempo os médicos de Arkham haviam tentado todos e quaisquer métodos conhecidos para tratamento e estudo daquele homem, porém, ele resistia e até parecia se divertir com tudo aquilo. Muitas vezes as coisas não acabaram bem, e por fim, Jeremiah Arkham, o Diretor do asilo, decidiu que aquele homem não tinha salvação e nem poderia ser estudado profundamente, por isto deveria ficar trancado a todo o momento em sua cela de observação.

  O homem que teve seus dentes quebrados, inicialmente recebeu, pelo tratamento odontológico do asilo, dentes de prótese para reconstrução dos restos que haviam sobrado. O próprio homem arrancou as próteses aos berros e gargalhadas. Disse ao dentista que o pagaria se arrumasse para ele próteses de prata, queria lembrar-se do que perdera. De quem o fizera perder sua beleza.

  Sua mente doentia alucinava em um misto de lembranças reais e irreais, perdido em um emaranhado de pensamentos psicóticos e curiosos. Nenhuma gargalhada. Não havia graça. Estava entediado por todo o tempo em que estivera ali. A mínima graça da situação havia sido tirada dele quando pararam de tentar tratá-lo.

  Encontrou-se então pensando nos olhos azuis daquela mulher que havia parado para observá-lo há algumas horas.  A questão sobre quem seria aquela mulher batia em sua cabeça. “Ela também está entediada. Nenhuma risada. Nenhuma piada.” Ele pensava. Como ondas, seus pensamentos psicóticos retornaram. “Eu deveria arrancar aqueles olhos e colocar um sorriso em sua face. Eu deveria.” Olhou para a escuridão através do vidro transparente a sua frente, levantou-se e caminhou até ele.

  Talvez ainda pudesse fazer uma piada. Apenas talvez. Era estranho sentir-se inseguro, incerto. Não era típico dele. Ao menos não antes de se tornar quem é agora. Não antes de ser quebrado. Aquele sentimento trazia recordações que não pareciam reais, nem mesmo daquele tempo. Lembranças que pareciam de outra vida. Pesadelos mais precisamente. Nada do que pudesse rir.

  Olhou seu corpo e lembrou-se de que havia retirado a camisa para admirar suas tatuagens, mas, acabara se perdendo em pensamentos. Cada tatuagem em seu corpo tinha uma história, um costume antigo que criara. Era como fotografar, marcar-se com memórias, para saber que eram reais. Sua origem, seu nome, sua gargalhada, seus desejos, momentos importantes, tudo em seu corpo.

  Lembrou-se da perseguição que o levara até aquele momento. Lembrou-se do garoto que matara. Perguntava-se se a piada ainda estava fresca na cabeça do grandalhão mascarado. As marcas criadas por lembranças marcavam o corpo de ambos os colididos; enquanto ele tatuava memórias em seu corpo, criava memórias dolorosas que o cavaleiro das trevas jamais poderia esquecer. Não era a primeira vez que o marcava de forma dolorosa, mas, talvez esta houvesse sido a colisão mais intensa.

 Deitou-se na cama e engenhosamente começou a formular a possibilidade do show não ter acabado, e sim, apenas ter passado para o próximo ato. Talvez ainda houvesse alguma piada para ser contada. De alguma forma, tinha de encontrar sua realidade insana mais uma vez, mesmo que houvesse perdido tudo.

 _____________________Quinzel__________________________

  Deitada em sua cama, coberta por seu edredom branco com bordados de flores, observava seu noivo dormir após uma noite relaxante na banheira e um sexo quente. Havia algo errado, só não sabia dizer o que. Seu sono não chegava, não conseguia adormecer e em algumas horas teria de se levantar para outro dia de trabalho.

  Sentiu o pano macio do edredom e escorreu sua mão esquerda até o rosto de Robert, onde pôde sentir sua barba mal cortada. Acariciou-lhe a face devagar, até encontrar seu cabelo liso e arrumá-lo atrás da orelha. Ele era um homem bastante bonito. Tinha sorte, sabia disso.

  Embora todo o trabalho, todo o estresse de ser um advogado criminal dedicado, Robert ainda conseguia tempo para dedicar-se a sua mulher. Tinha de ter. Ele também tinha sorte.

  Quinzel se punha de barriga para cima a observar o ventilador no teto que girava incansavelmente, mas, seus pensamentos concentrados passavam e vagavam dentre seus pacientes e o homem aparentemente depressivo que vira encostado no canto de sua cela naquela noite.

  Sabia que ele não era problema dela, e nem deveria ser; era perigoso demais, instável demais. A ficha daquele homem, seus laudos emitidos por todos os psiquiatras que tentaram quaisquer métodos, diziam claramente o quão perdido era. Nenhuma memória aparentemente real, ou ao menos não dissera nenhuma que pudesse ser considerada, instabilidade de humor elevado, nenhuma noção de moralidade, psicose extrema, e apesar de toda a demência, mostrava um intelecto acima do normal.

  Quinzel não podia deixar de considerá-lo um desafio de enorme interesse. Sabe-se lá o que aprenderia e o que ganharia ao desvendar a mente daquele paciente. Ele parecia tão frágil no momento, que talvez fosse a hora certa de tentar. Com os métodos certos achava que poderia conseguir encontrar uma base para se apoiar e adentrar o máximo que pudesse na mente insana do Coringa.

  Aquela ideia a animava tanto que não podia dormir. Seus olhos não fechavam, não importando o quanto tentasse, o sono não vinha. Pondo-se sentada na cama, olhou a pequena biblioteca de livros que tinha em uma série de prateleiras de madeira no canto do quarto. Livros dos mais variados temas, separados de forma esquematizada por temas e seriedade.

  Havia livros do Robert e seus na prateleira. Ficções, aventuras, suspenses, sexuais, históricos, estudos psiquiátricos, filosóficos dentre outros. Talvez, já que a insônia lhe acompanhava firmemente naquela noite, devesse ler algo.

  Pondo seus pés para fora da cama, ainda nua, sentiu o frio ambiente causado pelo ventilador congelar sua pele lisa. Tocou o chão com a ponta dos dedos e sem fazer barulho moveu-se silenciosamente até a estante. Vasculhou inicialmente pela divisão de temas contidos ali até encontrar a seção de estudos da psicologia e psiquiatria.

  Passou a ponta dos dedos entre os livros enquanto buscava um nome, algum título que lhe fosse útil para suas perguntas e planejamentos futuros. Queria algo que fosse voltada a insanidade, a análise do humor, da comédia, algo voltado também à psicopatia nos graus mais elevados. Após um pouco mais de um minuto, encontrou.

  Puxando os livros com cuidado para não fazer barulho e acordar Robert acidentalmente, segurando com as pontas dos dedos em cima e embaixo dos quatro livros que encontrara. Finalmente os retirara efetivamente sem grandes e incômodos barulhos.

  Levantou-se e levando os livros consigo, caminhou até fora do quarto, para o corredor da casa. Estava escuro, mas, seus olhos já haviam acostumado. Andou até a escada e desceu-a até a sala. Queria sentar-se confortavelmente em alguma poltrona.

  Pegou seus óculos de hastes e aros negros, com lentes arredondadas que não faziam perder em nada a seriedade, e colocou-os em sua face. Uma imagem ainda mais intelectual e ao mesmo tempo sensual se formava quando com aqueles óculos; seu noivo sempre lhe dissera o quanto era admiravelmente bonita com óculos.

  Dando início aos seus estudos vasculhou pelas mais diversas páginas dos livros selecionando e sublinhando quaisquer bases e semelhanças a que pudesse usar para entender o máximo possível sobre o homem pálido que vira aquela noite e cujo havia despertado ainda mais seu interesse.

  A noite passava vagarosamente enquanto ela lia completamente submersa em uma análise quase meditativa sobre tudo aquilo. Mas, sentia que nada ali era suficiente para o que poderia encontrar caso um dia viesse a cuidar do Coringa. Aquilo era amedrontador e ao mesmo tempo excitante.

  Quando vira o como já era tarde, só então sentira o peso do cansaço daquele enorme dia de trabalho e da noite de leitura e estudo. Sua mente já não mais se concentrava no Coringa, no Logan, ou em qualquer outro paciente, apenas queria deitar-se e apagar.

  Horas mais tarde, quando seu despertador tocou, levantou-se sentindo seu corpo e sua mente ainda pesar com a dormência causada pelo sono. Quase se arrependia de ter ficado acordada até mais tarde estudando.

  Desligou o despertador e então novamente olhara para o seu noivo que estava ao seu lado. Ele tinha sorte, sua carga horária de trabalho era menor do que a dela. Não ligava, amava o que fazia. Talvez se sentisse mais em casa quando em Arkham do que quando em sua própria casa. Era estranho.

  Após levantar-se e pegar sua roupa de trabalho que havia deixado separada numa cadeira perto da cama na noite anterior, vagou estonteada até o boxe do banheiro, e sem raciocinar corretamente o que fazia, ligou instintivamente o chuveiro. Gelada! Saltou com um susto repentino e estremeceu de frio. Havia acordado. Esquecida que na noite anterior, após o sexo com seu noivo, tomara uma ducha de banho frio para resfriar o corpo quente.

  Com cuidado para evitar a água gelada, passou seu braço por volta da ducha até encontrar o registro metálico também gelado do chuveiro e fechá-lo. Após mudar a configuração de temperatura na válvula próxima ao chuveiro, retornou a ligá-lo. Agora sim, quente.

  Já no Asilo Arkham, pensou em ir até o escritório do Diretor e pedir a ele uma chance de examinar e cuidar do Coringa, embora pensasse que com certeza seria negada, já que ele era um paciente de classe sete, enquanto ela era uma psiquiatra de classe quatro, infelizmente.

 Apagando sua nova obsessão curiosa de sua cabeça, retornou a concentrar-se em seu trabalho. Andou até sua sala, e encontrando um dos guardas de Arkham próximo a ela, onde ele normalmente ficava, decidiu pedir-lhe logo que trouxesse Logan para ela. Queria começar mais cedo hoje.

— Hei, amigão. – Ela o chamou, sem lembrar corretamente seu nome. – Luca. – Consertou-se ao ler o nome dele no crachá.

— Sim, Dra. Quinzel. – Ele atentou-se a ela. – Precisa de algo?

— Vamos buscar o Sr. Howard mais cedo hoje. Tudo bem? – Ela parecia extremamente simpática.

— Claro, Doutora. Sem problemas. – Ele não sorria, mas, também não era um homem seco. Seu tom de voz era simpático.

— Deixe-me apenas pôr minhas coisas na sala e prepará-la, e então vamos. – Ela passava seu cartão de acesso na fenda da tranca automática onde pedia uma identificação de acesso permitido para entrar. Somente a Doutora Quinzel, o Diretor Jeremiah Arkham e os seguranças poderiam adentrar naquela sala.

  Sua sala não era muito grande, mas, também não era pequena, era padronizada para todos os psiquiatras, exceto os de classe seis e sete, que possuíam salas maiores e mais personalizadas. Um luxo para poucos.

   Após deixar sua bolsa em cima da mesa, ajeitou uma série de papéis, pondo-os em uma gaveta, em seguida empurrou um pouco a poltrona Divã grande e negra, típica dos psiquiatras, embora a cor tenha sido a própria Dra. Quinzel quem escolhera.

  Abrira as cortinas de persianas retangulares brancas para que a luz do sol pudesse invadir a sala. Ajeitou outra poltrona menor e confortável onde sentaria, perto da poltrona Divã do paciente e então analisou todo o contexto da sala. Livros em estantes na parede, persianas abertas, mesa de madeira com papéis e canetas sobre ela, de frente para a parte esquerda da poltrona Divã, onde ficariam as pernas deitadas do paciente, caso o mesmo assim se pusesse, e por fim, pôs a poltrona aonde sentaria em uma posição angular e calculada, seguindo as leis da conversação e da empatia psicológica. Perfeito. Hora de pescar.

  Pedindo para o guarda que a seguisse até lá, ele assim a obedeceu. O andar dos pacientes mais psicóticos ficava dois andares abaixo da sala da Doutora Quinzel, no subsolo. Teriam de pegar o elevador. Assim fizeram.

  Já no andar correto, ao sair do elevador e andar até à escada que levava a parte inferior onde encontraria os mais diversos, perigosos e doentes pacientes, sentiu seu coração acelerar ao lembrar que passaria pela cela do Coringa. Não entendia o porquê se sentia assim, mas, sabia que ficava excitada com a ideia de estudá-lo e tratá-lo; talvez uma coisa puxasse a outra.

  Caminhando com o guarda a seu lado, antes de chegar à cela de Logan Howard, surpreendeu-se ao ver o Coringa parado, em frente à parede de vidro com uma expressão séria e vazia, olhando-a com certo interesse. Não diminuiu o passo, controlou-se e manteve a caminhada.

  Finalmente chegara ao paciente classe três, Logan Howard. E ele ao vê-la surpreendeu-se perceptivelmente. Era cedo.

— Sr. Howard. – Ela o chamou ao apertar o botão verde do comunicador, permitindo a conversação.

— Dra. Quinzel. Por que tão cedo? – Ele perguntava com sua voz serena.

— Quero adiantar um pouco as coisas hoje, Sr. Howard. Tudo bem para o senhor? – Ela havia aprendido na faculdade que a melhor forma de iniciar uma conversação e abertura, era utilizar da educação e do respeito, assim, a chance de reciprocidade e agrado eram maiores, mesmo com um psicopata.

— Sem problemas, Doutora. – Ele disse se afastando da parede de vidro e do comunicador esticando os braços para a entrada do guarda e revista cotidiana antes da retirada do paciente de sua cela.

— Entre, Luca. – A Dra. Quinzel pediu ao segurança.

  Luca era um homem grande, negro, com cabeça raspada e vestes brancas com um grande logo do Asilo Arkham nas costas e um menor no peito. Andou até o Sr. Howard e passou suas mãos grossas e enormes por diversas áreas do seu corpo onde ele poderia esconder algum tipo de objeto cortante. Nada. Estava limpo.

  Logan Howard já não tinha um surto psicótico ou alucinações aparentes havia meses. Era um ótimo sinal de que os tratamentos e sessões da Dra. Quinzel estavam funcionando.

  O segurança segurou-o pelo antebraço e puxou corredor a fora, deixando a Dra. Quinzel para trás. A bela mulher loira pôde ver o enorme segurança subindo as escadas com o paciente, adiantando-se até o elevador. Sozinha no corredor infame, a Dra. Quinzel começou a andar em direção a saída, mas, antes parou novamente em frente à parede de vidro da cela do Coringa.

  Ele a observava com um olhar curioso, seus olhos tristonhos eram ao mesmo tempo intensos e belos. Ela se concentrou, dispersou suas curiosas emoções e então se aproximou do comunicador.

— Gostaria de outra chance? – Ela disse a ele. Sua voz tinha um tom diferente do normal. Por quê?

— Com você? – Ele perguntou já sabendo a resposta.

— Você quer, ou não? – Ela tentava ser mais incisiva, pressionando-o.

— Seria maravilhoso. Perfeito. – Ele exibia um sorriso tristonho, como se agradecesse.

  Aquele sorriso a fez sorrir. Contendo-se rapidamente, desligou o interfone se afastou ainda olhando os olhos claros e esverdeados do homem tristonho a sua frente, até que retornou a sua realidade e virou-se em direção a escadaria. “Há algo de diferente nele.” ela sentia estar cada vez mais curiosa.

  Chegando ao elevador, viu que o segurança Luca e seu paciente, o Sr. Logan Howard, a esperavam dentro do enorme bloco de metal. Luca segurava a porta enquanto ela se aproximava.

— Desculpe a demora, garotos. Estava checando os outros pacientes. Pedido do Diretor Arkham. – Por que mentira? Parecia uma criança que quase fora pega fazendo o que não deveria.

— Que nada, vamos Doutora. Vamos colocar o pacote em seu devido lugar. – O segurança segurava agora o homem bem menor do que ele com as duas mãos em seus antebraços.

  Daquela maneira, era como se Luca segurasse um enorme Oscar, uma forma de premiação para as grandes celebridades. Talvez pintando o Sr. Howard de dourado, ele realmente parecesse com um. Doutora Quinzel quase riu ao pensar naquilo. “Profissionalismo.” lembrou-se.

  Já na sala, a Doutora pediu para que Luca os deixasse e então trancou a porta após a saída do segurança.

— Qualquer problema, é só gritar, Doutora. – Ele disse antes de sair.

  Luca era um segurança bastante simpático, embora raramente fosse visto sorrindo. Trabalhava ali já havia algum tempo, anos para ser mais exato. Seus dois filhos foram criados com o dinheiro suado que conseguira com seus anos de trabalho no Asilo Arkham.

  Luca esteve em Arkham em alguns dos seus piores momentos. Viu psiquiatras enlouquecerem, pacientes humanos e meta-humanos fugirem, o morcego de Gotham travar algumas de suas batalhas dentro daquelas paredes. Já fora até mesmo feito de refém! Era um soldado fiel.

  Já na sala da Dra. Quinzel, estando mais à vontade, sem ninguém lhe segurando, nem uma cela pequena de quatro paredes, Logan Howard caminhou até a poltrona Divã e sentou-se enquanto aguardava o início da sessão.

  A Doutora Quinzel pegou um monte de papéis que estavam em cima de sua mesa de madeira, algumas canetas e então sentou-se na poltrona em frente ao seu paciente, Logan Howard.

— Agora sim. Bom dia, Sr. Howard. – Ela disse com um pequeno sorriso.

  Os raios de sol que adentravam pela vidraça da janela batiam na face da Doutora Quinzel e fazia não só sua pele clara, mas, seus cabelos loiros tornarem-se dourados e brilhosos. Seus olhos iluminados pelo sol eram muito atraentes.

— Bom dia, Doutora. Estou quase terminando o livro. – Disse Howard, iniciando o assunto.

— Incrível! Eu te emprestei o livro tem apenas três dias e já está terminando! – Ela fingiu estar surpresa e contente. “O faça achar que é impressionante. Estimule-o.” Ela sabia o que fazer.

— Sabe, eu nunca pensei que uma história tão devaneia sobre uma criança e uma baleia branca, poderia ser tão esclarecedora e comovente. – Ele dizia com o olhar perdido entre lembrança e imaginação do que havia lido.

— Que bom que está gostando, Sr. Howard. Em que parte está? – Ela confere a veracidade.

— Acabei de ler a parte em que o pai do garoto o proíbe de ir atrás da Baleia, mas, ele decide construir um barco. Noite após noite, o pequeno Dimmy está a construir seu pequeno barco. – Ele mostrava um sorriso de canto de boca enquanto fazia o som de uma rápida risada contida e balançava a cabeça negativamente.

— Ah, sim! Lindo, não é? – A doutora continuava a conversação sobre o livro.

— Lindo. Você verá, logo terei meu colchão. – Ele corta o sentimentalismo para seu ponto de interesse.

— O que importa não é o que você ganha com isto, mas, o que você aprende. Entendeu? – A Doutora Quinzel o olhava por sobre os óculos.

— Claro. Eu estou aprendendo. Devo trabalhar duro, mesmo que pareça que não posso fazer, para alcançar o que quero. – Disse ele sobre o que estava aprendendo.

— Exatamente. Ponha-se no lugar dele, como você era antes, e não como você é agora. Ponha-se no lugar do pequeno Dimmy. Vamos, feche os olhos. – Ela pedira e ele fizera, fechara os olhos. – O que você faria se fosse o Dimmy, quando seu pai lhe proibiu de ver a baleia que tanto ama?

— Eu teria cortado sua garganta. – Ele admite.

— E quais as consequências dos atos? – Ela o lembra.

— Provavelmente eu não conseguiria ver a baleia, pois seria preso. – Ele parecia ter entendido, e agora demonstrara tristeza ao pensar na hipótese.

— Muito bem, Sr. Howard! O senhor está entendendo. O senhor nunca poderia conseguir o que quer, matando as pessoas.

— Doutora Quinzel, eu conto os meses que não alucino e nem tenho vontade de cortar ninguém. – Ele sorria contente e orgulhoso.

— É mesmo? E quanto tempo tem? – Ela era simpática.

— Cinco meses e dezesseis dias sem alucinação. Cinco meses e vinte oito dias sem sentir a maldita necessidade de matar. – Ele contava aquilo com todo orgulho.

— Impressionante, não é? Isso é graças a você! Você fez isso para você mesmo! – Ela o lembrava de forma animada, com belas congratulações.

— Não, Doutora. Foi você! Você fez. – Ele não precisava dizer, ela sabia.

  Duas horas se passaram enquanto os dois conversavam e enfim o tempo com o Sr. Howard chegou ao fim. Levantando-se da poltrona, Quinzel ofereceu-lhe água, e ele aceitou um copo. Após beber, o próprio se levantou e andou em direção a pesada porta de metal.

— Sr. Luca, por favor, venha pegar o paciente. – Disse a Doutora Quinzel pelo interfone.

  Um segundo depois a porta metálica se abriu e o grandalhão entrara na sala, já puxando Logan Howard pelo antebraço até fora da sala. Parou um segundo esperando que a Doutora fosse com ele, mas, ela o avisou:

— Você pode levá-lo para mim, Luca? Eu tenho de conversar com o Diretor. Então estou um pouco enrolada. Tudo bem? – Seu sorriso era incontestável.

— Claro, Doutora. Nenhum problema. – Luca se virou carregando o pequeno Logan Howard até o elevador. Fora a última visão que tivera de Luca e Howard naquela manhã.

  Era meio-dia quando decidiu enfim ir até o diretor. Recolheu em sua mesa algumas anotações que havia feito na noite anterior, mais algumas ideias que tivera para o tratamento do Coringa. Juntou toda a papelada e pôs dentro de uma pasta bege. Aquela poderia ser a grande oportunidade da sua vida, só tinha que convencer o diretor.

  Arrumando-se um pouco mais em frente a um espelho que tinha em sua sala, consertou um pouco o cabelo, e ajeitou o jaleco branco que vestia. Era agora. Saíra da sala, e caminhara até o elevador.

  A sala do Diretor Jeremiah Arkham era no último andar, no prédio central. Para chegar lá, teria de pegar um elevador para o quarto andar do prédio em que trabalhava, passar pelo enorme corredor que conectava o prédio em que trabalhava com a mansão, e então lá pegar outro elevador até o andar do Diretor.

  Enquanto esperava o elevador terminar de subir, revia suas anotações e ideias, uma por uma. Em sua compreensão, eram fantásticas e possuíam uma enorme possibilidade de dar certo. Só precisava de uma chance. Estava nervosa.

  O elevador tinha uma música antiga e entediante, até desconfortável, mas, a Doutora Quinzel mal a ouvia. Estava acostumada, e distraída. Revia milhões de vezes o que diria ao diretor. Suava. “O Coringa...” ela pensava.

 Finalmente o elevador chegara ao andar predestinado. A Doutora adiantou-se apressadamente, entre passando os corredores do prédio até chegar à conexão do prédio em que estava com a mansão central e rapidamente passar por ela também, mas, antes que chegasse ao outro lado, não pôde evitar olhar pela enorme janela e ver o quão alto era. Não tinha medo, era acostumada à altura, era excitante.

 Chegou enfim ao último elevador, e quando pretendia adentrar, uma senhora de idade e um homem loiro com um sorriso encantador adentraram primeiro.

— Vêm, ainda tem espaço. – Disse o rapaz.

— Obrigada. – Ela entrou, encolhendo-se num dos cantos.

 Pela mínima distância em que o homem loiro e a senhora de idade ficavam um do outro, com certeza já se conheciam há tempo. O Asilo Arkham possuía um enorme arsenal de psiquiatras e outros médicos, era completamente utópico acreditar que todos pudessem se conhecer.

— Você viu como Jerry têm se comportado ultimamente? – Perguntou a senhora ao rapaz loiro.

— Não, na verdade não. Não mantenho contato com ex-pacientes. Como ele está?

— Maluquinho. – Ela disse com uma risada.

— Ele estava quase bom quando eu o tratei. – O rapaz estranhou.

— Medicamentos... Ele teve um surto outro dia, tentou quebrar a janela da cela dele e passar por entre os cacos e barras. Muito sangue. – Disse a senhora com uma expressão de pena e desaprovação.

— Que medicamentos eram estes? – O rapaz parecia preocupado.

— Lindsey quem deu. – Respondeu a mulher.

— Aquela vadia não faz ideia do que faz. Como Jeremiah pode manter o contrato desta mulher?

— Dizem que ela deu pra ele. Ela é esperta. – A senhora concluiu.

— Santo Freud. – O rapaz rira. – Sortudo é o Doutor Jeremiah.

— Eu daria para ele também, se ainda fosse jovem. – Ela afirmou com convicção.

— Primeiro, esta sua tal juventude foi há pelo menos trezentos anos. Segundo, você teria dado para todo mundo, Cintia.

  Ambos riram, e finalmente o elevador parara no andar a qual eles haviam configurado. “Os Doutores da Ala B são todos assim?” ela se perguntava. A porta fechara e a Doutora Quinzel retomou seus pensamentos concentrados sobre o que falaria com o Diretor.

  Foi então que um pensamento embaraçoso e engraçado, mas, que preferia esquecer veio a sua cabeça. “Se eu ainda fosse como anos atrás, eu também daria para ele, por uma chance com o Coringa” ela então balançou a cabeça sentindo seu rosto corar “Que merda estou pensando? Aquela época já passou. Sou noiva, vou me casar, sou feliz.” acordou de seus pensamentos com o som que o elevador emitia para avisar que faltavam três andares para o último andar, o local de predestinação.

  Finalmente a porta abriu e a Doutora Quinzel pôde ver onde estava. Ao final do corredor havia uma porta dupla de madeira com imagens de corvos talhados. A porta do Diretor não era como as outras do Asilo Arkham, não era automática. Uma boa e velha porta de madeira rústica.

  Caminhou nervosa até o fim do corredor, notando que já havia se passado um ano desde que pusera seus pés naquele lugar pela última vez. Fora numa noite, final de expediente, antes de sair pelos portões do Asilo Arkham, um segurança a havia parado para avisar-lhe que o Diretor a chamava em sua sala.

  Naquele momento ela pensou que seria demitida por causa de um experimento que havia começado no último mês. A Dra. Quinzel testava um novo método em seu tratamento com um paciente chamado Rodrigues Flants, onde o hipnotizava e ao mesmo tempo ativava uma maior carga de transmissão neuronal com a utilização de pequenos pulsos elétricos que eram transmitidos diretamente nas regiões do sistema límbico e córtex pré-frontal. Na melhor das hipóteses, como já havia se mostrado, Rodrigues seria capaz de recordar mais perfeitamente de eventos traumáticos e racionalizá-los, podendo definir mais rapidamente uma forma de vencer seu conflito interno sob os comandos da Doutora Quinzel e assim curar-se. Na pior das hipóteses, Rodrigues teria partes neuronais danificadas, ou até queimadas, tornando-se um demente, entrando em um tipo de coma sem nunca voltar de seu estado semiconsciente, ou ainda piorando seus sintomas e transformando-se em um caso perdido.

  No mesmo instante apressou-se para a sala do diretor, como fazia no dia presente, a diferença é que naquela época ela havia sido convocada para subir até lá. E ao chegar à sala do diretor, tão nervosa quanto agora, após bater à porta e ter permissão para abrir a pesada porta de madeira com a maçaneta de cristal, havia visto o Diretor Arkham sentado em sua cadeira revendo uma série de documentos.

  Ao se aproximar do Diretor, notara que alguns daqueles papéis eram sobre ela; Documentos de identificação civil, certificados, currículo, anotações de pesquisas próprias da Dra. Quinzel, dentre outras coisas que se sabe lá como havia conseguido. Estranhou tudo aquilo. “Entre, Dra. Quinzel. Bom vê-la.” ele havia dito naquela noite “Quero conversar sobre suas recentes pesquisas e iniciativa com o tratamento do Sr. Flants.” ela lembrava, ele nem sequer tirara os olhos de um dos documentos ao revelar qual o assunto.

  Naquela noite a Dra. Quinzel havia sido promovida da classificação mais baixa, a classe um, para uma das mais altas e bem pagas do Asilo Arkham, a classe quatro. Desde então ela tem recebido a responsabilidade dos cuidados de alguns dos mais psicóticos internos. Sempre houvera sucesso.

  De volta à realidade, notou ter parado bem em frente à porta da sala do Diretor. Levantou a mão direita e com sua base deu pequenas e repetitivas batidas na porta de madeira. Esperou a permissão para entrar na sala; sabia que o Diretor considerava um total desrespeito o ato de adentrar em sua sala sem permissão, e ele não tolerava desrespeito, era a autoridade máxima no local e deveria ser vista como tal.

  Alguns segundos depois, a Dra. Quinzel ouvira a voz rouca e grossa do diretor anunciar a permissão para a entrada em sua sala.

— Doutora Quinzel. – Disse ele, sem mais cumprimentos. Sua expressão facial era completamente seca e sem nenhum tom de emoção. Nem mesmo estava surpreso com a vinda repentina da Dra. Quinzel a sua sala.

  A sala da Diretoria era enorme, rodeada por livros e decorações de madeira escura polida. Jeremiah Arkham tinha uma sala realmente luxuosa, com decorações caras e extravagantes, como seus três tapetes persas, sua lareira e uma estátua de um tipo de alce negro. Se havia ainda algo que a Doutora Quinzel já havia percebido desde que havia sido contratado como estagiária há dois anos, eram os muitos troféus e medalhas douradas num canto exposto da enorme sala.

  O Doutor Arkham em toda sua carreira havia sido premiado por alguns estudos publicados e participação em descobertas incríveis nos campos diversos da psicologia e psiquiatria clínica e criminal. Até mesmo havia publicado um livro que contava como havia ajudado o FBI a capturar Enri Edd, um psicopata serial killer que agia em Las Vegas, conhecido como o “Pesadelo sedutor E.E”. As credenciais de Jeremiah Arkham eram de dar inveja.

— O que quer, Doutora? – Jeremiah sempre fora um homem frio e de poucas palavras.

— Senhor, quero que dê uma olhada em pesquisas que andei fazendo, e quero que pense em uma proposta que farei.

— Uma proposta? – O Diretor pareceu interessado pela iniciativa, e mais ainda por haver pesquisas para sustentar a proposta.

  A Doutora Quinzel sabia que o Diretor se interessava mais por fatos do que por palavras sem base. Sabia que de forma alguma daria um paciente perigoso e complexo como o Coringa, que é um interno classe sete, para uma psiquiatra classe quatro sem nenhuma base sustentável para sua proposta.

— Me dê um segundo para avaliar suas pesquisas. – Disse ele pegando o envelope bege das mãos magras, porém macias da Dra. Quinzel.

  Assim, sem antes mandar sua subordinada sentar-se, ele começou, leu e analisou cada um dos quinze papéis dentro da pasta, o que deve ter levado não menos que dez minutos, antes de decidir escutar o que a já bem vista Doutora tinha para dizer.

  O magro e nada alto homem pálido e de cabelo castanho escorrido, olhou fixamente por cima dos óculos para a mulher loira e atraente a sua frente, e então pondo-se para trás em sua confortável cadeira, estendeu a palma da mão quase esquelética em direção a cadeira na frente de sua escrivaninha, como que convidando a Doutora Quinzel a sentar-se e finalmente dizer-lhe sua proposta.

  Aliviada por já estar cansada de ficar em pé aguardando, de forma um tanto envergonhada e até mesmo desajeitada, a Doutora Quinzel puxou a cadeira macia e sentou-se em frente à escrivaninha do Diretor. Observou-o por um segundo antes de começar a falar.

— Minha proposta é que permita que eu trate o Coringa. Ao menos que eu faça um teste com ele, e se der certo, ele se torna meu paciente. Caso não dê, fico ao seu critério. – Ela deu uma pequena pausa antes de começar de novo e revelar qual sua grande ideia. – O Coringa parece gostar de atenção, que olhem para ele, que seja visto. Gosta de mostrar para todos que o seu ponto de vista é o correto. Que não é só ele, todos são horrendos com seus demônios internos. E por isto, o que deveríamos fazer é simplesmente sermos nós mesmos, sem regras ou limitações. Talvez ele se considere até mesmo um poeta ou um filósofo a sua maneira! Mas, acima de tudo, como qualquer sociopata, ele ama ter poder sobre as pessoas e tudo ao seu redor.

— Está dizendo que ele quer apenas mostrar o seu ponto de vista para a sociedade, e mata por isto? – O Diretor Arkham não parecia muito convencido.

— Não, senhor. Estou dizendo que ele mata porque para ele isto é completamente natural e instintivo. É o correto. É o que ele sente vontade e não nega de forma alguma. Para ele, o autocontrole é uma piada ridícula da qual ele não participa. Inclusive, devo dizer que suas piadas são como deboches contra aqueles que preservam a moralidade a qual ele discorda. Ele aceitou a própria insanidade como um presente, como uma descoberta. Ele entende a insanidade como a verdadeira natureza humana. – Ela esperou outro segundo, numa pausa dramática, e então continuou. – Sua “necessidade de atenção” é simplesmente uma necessidade ou forma de “brincar” com a comida. Sua sociopatia e sua psicose foram geradas em algum ponto junto ao momento em que perdeu sua sanidade. Entendendo o quando e como ele perdeu sua saúde mental, talvez possamos encontrar uma forma de tratá-lo.

— Acha que eu mesmo já não pensei nisto? Ele se recusa a quaisquer métodos. Não se interessa, nem facilita. Ele é uma armadilha.

— Eu não o vejo assim, Doutor. Vejo como uma oportunidade. Uma fronteira a qual devemos ultrapassar. Quero testar alguns de meus próprios métodos. Dar-lhe um falso poder sobre mim, para criar abertura e então entrar lenta e incisivamente em sua real natureza e mente doentia.

— Devo admitir, é interessante. – Ele se pôs para frente e sem tirar os olhos da Doutora Quinzel, retirou de uma das gavetas da parte interna da escrivaninha, alguns documentos presos por grampo, em seguida mais um pequeno monte de CDs presos por um laço vermelho. – Sabe o que é isso, Doutora Quinzel?

— Os arquivos de outros psiquiatras? – Ela já havia visto aquele tipo de organização da papelada com logos do Asilo Arkham carimbados nas folhas. Quando vira as papeladas sobre ela na mesa do Diretor há um ano, possuíam a mesma marca. Documentos privados de alto nível do Diretor Arkham.

— Não só arquivos de outros psiquiatras. Arquivos de psiquiatras que tentaram diversos tipos de tratamento com o Coringa. – Ele empurrou tanto os CD’s como os arquivos para perto da Doutora Quinzel, agora surpresa e tão interessada que podia sentir sua boca salivar. Quinzel havia descoberto muito sobre o Coringa através dos boatos que ouvira ao longo dos anos, principalmente nos últimos meses, assim como pelas informações espalhadas pela internet, que hora ou outra lhe aparecia, porém, agora tinha em posse documentos oficiais das tentativas de tratamento do próprio Rei palhaço do crime de Gotham.

— Antigos psiquiatras do Coringa? – Ela abrira rapidamente um dos arquivos, e folheou-o por alguns segundos.

  Após as primeiras páginas que continham informações comuns sobre o psiquiatra, vira rascunhos do mesmo que datava entre uma distância de quatro dias até o fim do manuscrito. Notara que na última folha havia algumas manchas vermelho escuro. Não entendeu o que era no início. Até que passou a página.

  Havia cinco fotos, onde uma delas era de pontos dados em uma área com hematoma onde deveria haver uma orelha. Em outra, marcas no pescoço também bastante escuras, como se aquela pessoa da foto houvesse sido enforcada com tanta força que a circulação inchara a ponto de quase estourar, ou ter seu pescoço quebrado.

  Ela entendera o porquê ninguém mais recebera permissão para tentar tratar o Coringa. Ele era completamente instável. Extremamente perigoso. Embora aquelas imagens houvessem lhe deixado um tanto apreensiva sobre sua ideia quase impulsiva de se responsabilizar pelos cuidados do Coringa, ela não mudara de opinião.

— Se deseja mesmo se responsabilizar pelo Coringa... – O Diretor pegara outro papel numa gaveta de sua escrivaninha. – Então se responsabilize por si mesma. Arkham não será processado por suas próprias decisões.

— Eu posso fazer isto. – Disse a Doutora Quinzel pegando o formulário entregue pelo Diretor.

  Quinzel lera o formulário e as cláusulas do contrato de cuidados para com o suposto sociopata classe sete, o Coringa, e sem se demorar demasiadamente, assinou o documento.

— Diretor, posso ficar com os CD’s e arquivos? – Ela perguntou um tanto quanto sem jeito enquanto prendia os fios de cabelo por de trás da orelha, cujo antes estavam cobrindo uma das lentes dos seus óculos, e atrapalhando sua visão.

— Faça como quiser. A partir de amanhã, ele será seu. – Ele então soltou uma pequena risadinha bastante inadequada para o momento e concluiu. – Isto claro, se você não se tornar dele antes.

  Por fim, o Diretor virou sua cadeira para trás e ficou de frente para a lareira quente. Acenou com a mão sem dizer nada, em um gesto quase de expulsão. A Doutora Quinzel entendeu. Normalmente o teria xingado silenciosamente de grosso e mal-educado, mas, estava tão agradecida com a oportunidade que apenas se levantara e saíra, como ordenado.

  Sentia seu corpo quase em chamas por tamanha animação. Via-se excitada com a ideia de ter o maior criminoso e psicopata de Gotham, fora um homem de extremo fascínio sob seus cuidados. Sua grande oportunidade!

         _______________________Coringa__________________________

  Dentro daquelas quatro paredes retangulares, separadas do mundo por uma camada de vidro, não se ouvia nada, exceto os sons emitidos ali mesmo. Gritos, lamentações, discussões, vozes completamente insanas. Aquilo tudo era desesperador. Sendo separado do mundo de tal forma onde o paciente condenado jamais voltaria a sentir uma real brisa da manhã. Tudo o que era consideravelmente real para os pacientes de Arkham, eram suas celas e seus psiquiatras.

  No início, aquela sensação de impotência era demasiadamente esmagadora. Perturbadora até. Mas, com o tempo, tornava-se apenas desagradável e entediante. Para muitos ali, seria assim até o fim. Eles sabiam. Eles temiam.

  Sentado na cama, em um completo tédio, sentia como se estivesse perdendo sua essência de forma cada vez mais rápida. Sentia-se furioso e ao mesmo tempo imensamente triste, sentia-se abandonado. Talvez seus sentimentos fossem mais como uma queda infinita, onde via a si mesmo de uma forma deplorável, e embora tentasse algumas vezes se reerguer, a piada já não tinha mais graça.

  Seus pensamentos se limitavam a lembranças do pequeno Robin sangrando em sua frente, do furioso e atrativo Cavaleiro das Trevas, o Batman, arremessando sem dó cada um dos seus homens para fora do carro, e surpreendentemente um pensamento um pouco mais obscuro, ou ao menos confuso: O olhar curioso e atraído daquela mulher com quem falara mais cedo.

  Já não lembrava há quanto tempo uma mulher não o olhava assim. Já não se lembrava mais como era realmente estar com uma mulher. Tornou-se tão obcecado e satisfeito com sua própria insanidade e com toda a diversão que podia obter com o “Louco mascarado de Gotham”, que para ele já não fazia diferença. Elas não entendiam a piada, de qualquer forma.

  Da última vez em que falara com aquela bela mulher loira, pôde ler seu nome no crachá. “Dra. Quinzel” lembrou-se. Pensamentos cada vez mais incomuns passavam por sua cabeça, e aquilo lhe deixava angustiado. “O que ela tem de tão incrível?” Pensou consigo mesmo.

  De qualquer forma, gostando ou não, percebera sentir-se atraído de alguma forma por aquela psiquiatra. “Gostaria de outra chance?” Ele se lembrara do que ela o havia perguntado mais cedo. Esperava que ela não fosse outro “Pé no saco”, como havia sido os outros psiquiatras, cujo ele não demorara muito para mandar embora.

  Imaginava o que a Doutora Quinzel iria fazer. O olhar dela mais cedo o pegara de surpresa. Sentia-se tão horrendo, tão fraco, e mesmo assim ela o olhara com aqueles olhos azuis de forma igual a como ele olhava para o Cavaleiro de Gotham toda vez que o encontrava, com admiração, curiosidade e alguma forma de excitação. “Se ela não entender a piada, vou apenas arrancar seus olhos.” Ele havia decidido.

  Não demorara muito para que coincidentemente, aquela belíssima mulher surgisse batendo na parede de vidro da sua cela. Olhou para a mulher do outro lado, sem sair da cama onde estava. Ouviu então o som de um bip emitido pelo ligar do interfone comunicador.

— Boa tarde, senhor Coringa. – Ela disse olhando-o quieto em sua cama. Ela tinha um lindo sorriso simpático nos lábios.

— Quinzel. – Disse ele em resposta, mostrando lembrar o nome dela.

— Dra. Quinzel, sim. – Ela tentara não se importar com a falta do título no pronunciamento do Coringa. – Eu consegui. – Ela parecia animada.

— Dra. Quinzel. Certo. Imagino que pôr vir até mim, você deva ser a minha mais nova psiquiatra. – Ao contrário dela, ele evitava demonstrar animação.

— Oh, sim! Eu consegui permissão para brincarmos juntos! – Ela retirava uma cópia de um documento qualquer, o qual não fazia menor diferença para o homem ali sentado.

— E você, Quinzel... – Ele se levantou rapidamente da cama. -... Você acredita ser capaz de brincar comigo? – Sua voz tornou-se grossa e assustadora no final da frase, como em um tom de ameaça. Mas, embora a Doutora Quinzel tenha sentido um pequeno contrair dos músculos de forma instintiva, forçou-se a transparecer tranquilidade e graça.

— Sabe, senhor Coringa, eu admiro o senhor. Eu acredito no senhor. – Ela parecia um tanto tímida naquele momento, como uma adolescente envergonhada com seu primeiro amor.

  Aquelas palavras fizeram parar naquele mesmo instante, o homem insano de cabelos verdes. “Afinal, o que diabos ela está falando?” ele se perguntava. Ele sem perceber havia deixado escapar um pequeno sorriso sem muito mostrar os dentes.

— Eu quero entender, senhor Coringa. Eu preciso entender como o senhor se perdeu. Como deixou de ser aquele homem tão incrível e amedrontador. Imagino que o senhor também queira saber.

— Você diz que quer me entender; será mesmo? Diz que não sou amedrontador, então por que não entra e conversa comigo aqui dentro? – Ele não gostara nada das palavras duras que a Doutora Quinzel havia pronunciado, embora fosse verdade. Não era de seu agrado sentir-se como um gato inofensivo.

— Não é mais como era, Senhor Coringa. Mas, posso ajudar a reencontrar-se. Atingir o máximo do seu potencial. – Ela afirmava com tanta convicção que aquilo começara a parecer interessante para ele.

— Eu não preciso de você para dizer quem eu sou. Eu nunca precisei saber inteiramente quem eu sou. Eu sou quem eu sou. Mas, talvez, você queira saber quem é. Não seria este o caso, seria, Doutora Quinzel? – Ele abrira um sorriso maior, deixando seus dentes metálicos de prata amostra enquanto se aproximava do vidro.

  Desta vez a Doutora Quinzel tinha de admitir, sentiu um forte calafrio percorrer seu corpo inteiro. Aquele sorriso macabro e sua acusação perspicaz lhe pegaram de surpresa. Talvez, de certa forma, a Doutora Quinzel houvesse se interessado imensamente pela insanidade admitida do Coringa, por não se sentir completa em sua própria identidade e sanidade. Era algo que guardava desde sua infância, sem jamais contar a ninguém, exceto uma vez para sua psicóloga quando iniciou sua vida acadêmica na faculdade de psicologia, após cursar medicina há muitos anos.

— Por que ao invés de tentar arrancar qualquer pedacinho inexistente de mim, eu não arranco você de quem você pensa ser? – Sua voz era um misto de sensualidade e serenidade, seguida por um tom extremamente brutal. Mas, enfim, uma risada.

— Isto seria interessante, senhor Coringa. Talvez devêssemos tentar qualquer dia desses.

— Me impressiona o velho Jemizinho ter permitido que outra psiquiatra viesse falar comigo. Ainda mais depois do que aconteceu com senhorita Lana. – Seu sorriso macabro não desaparecia.

— Você arrancou a orelha dela por não ser capaz de te escutar corretamente, não foi? – Aquela suspeita certeira surpreendera o Coringa que ao mesmo instante perdera todo o seu sorriso. Sentia-se desconcertado. Ela havia entendido.

— Você entendeu a piada. – O Coringa havia repentinamente se interessado ainda mais por aquela mulher. Era surpreendente. – Talvez eu arranque mesmo os seus olhos para usá-los como chaveiro.

  A Doutora Quinzel começou a rir e aquilo também impressionara o Coringa. Ela havia entendido de novo? Era a segunda pessoa a qual entendia suas piadas. Isso mudava tudo.

— Sabe, senhor Coringa, eu estou responsável pelo senhor agora. Se precisar de algo, por favor, não hesite em me pedir.  Se eu puder, eu farei.

— Dra. Quinzel, a senhorita é mesmo inacreditável. – Ele batia palmas para ela.

— Obrigada. – Ela sorriu sem jeito.

— Será muito divertido conversar com você. Espero que não se torne entediante. Se for o caso, é sério, eu vou fazer o seus olhos de chaveiros. Oh, eu juro que vou. São tão lindos! – Ele era extremamente sensual, mesmo com palavras tão ameaçadoras. A sua afeição pelos olhos da Doutora Quinzel a fizera corar.

— Obrigada. – Ela parecia lisonjeada.

  Repentinamente o homem de cabelos esverdeados e camisa alaranjada padrão do Asilo Arkham impactara fortemente suas mãos contra a parede de vidro, fazendo com que por um segundo a Doutora Quinzel saltasse para trás com um pequeno susto.

  O palhaço rira descontroladamente por alguns segundos, mas, logo se conteve. Não estava acostumado com este novo som de suas risadas e nem com a aparência a qual o Homem Morcego deixara seus dentes. Estava arruinado, lembrou-se. Aquilo lhe fez sentir-se um tanto melancólico, o que era incomum para ele que antes não se sentia assim de forma alguma. Aquele lugar o estava afetando.

— Eu vou amar ouvir suas risadas amanhã. Espero que as minhas não sejam um incomodo. – Disse a Doutora Quinzel, quase como que se lesse a mente do palhaço do crime.

— Doutora Quinzel. – Ele mostrou certo respeito. – Está certo então. Eu serei seu, meu docinho, mas, não diga que não avisei.

— Você é a pessoa mais interessante que já conheci, admito isso, senhor Coringa. Mas, não sou sua. – Um pequeno desafio em seu tom, ele percebera isso.

— Não, você não é. Ainda não. – Ele se afastava com pequenas gargalhadas, chegando cada vez mais para perto da parede. – Ainda não, Doutora Quinzel. Mas veremos quem irá se transformar primeiro.

  Em meio ao som macabro das risadas do Coringa, agora tão altas e intensas quanto como antes de ser trago para Arkham, a Doutora Quinzel se despedira do insano homem que lhe serviria como a maior experiência de sua carreira e de sua vida. Talvez o seu método funcionasse afinal. Talvez não. Sabia que o Coringa seria o maior de todos os desafios. Sabia que no final, um dos dois não seria mais o mesmo. A insanidade se tornaria a sua moradia, ou a sanidade se tornaria a dele. Nada é destruído verdadeiramente, tudo se transforma. Ambos sabiam disso, e isto lhes parecia tão divertido!


Notas Finais


Mais uma atualização (19/09/22), e devo dizer que é incrível reler esta história e lembrar o caminho que planejei, as pequenas sementes que plantei, e as mentiras que Harleen tenta contar para si mesma, enquanto busca no Coringa uma resposta para a sua própria história e existência, para o seu próprio entendimento. Espero que estejam gostando, afinal, estamos apenas no início da história aqui. Uma história não de amor, mas, de loucura e obsessão.


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