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História Luz dos Olhoz - Capítulo Único


Escrita por: H0bbit

Capítulo 1 - Capítulo Único


O ser humano tem a triste imagem de sempre ser superior a todos, seja por sua cor, raça, classe econômica ou influência social. Acreditam sempre saberem de tudo, se acham os donos da razão, capazes de prever e impedir o cair de uma folha no outono ou julgar se alguém merece ou não o direito de viver.

O mundo sentiu o impacto dessa arrogância durante a década de 40, quando os que se julgavam superiores aprisionaram; julgaram; forçaram inocentes a trabalharem como escravos; usaram crianças adultos, homens, mulheres e idosos como cobaias de experimentos científicos e, se tivessem sorte, eram mortos logo no começo.

No campo de concentração de Lwów, na Ucrânia, o soldado Michael Schutzer divertia-se durante um belo banquete em sua homenagem: havia batido o recorde de mortes por espancamento no campo, 1.386 em dois anos. Schutzer era um dos favoritos para ser promovido a subtenente, mesmo sem passar por sargento. Como todo bom ariano era alto para poder se mostrar superior aos prisioneiros; pernas e braços bem definidos para fazer jus a seu novo recorde; cabelo loiro bem curto para que nenhum judeu pudesse tocá-lo e os tão cobiçados olhos azul-acinzentados. Os famosos olhos eram descritos por mulheres que tiveram o prazer de conviver com o jovem soldado em Lwów como sendo uma mistura do cinza dos corpos impuros queimados nos fornos do campo com o azul do céu após a mesma se dissipar, lhes mostrando liberdade.

Eis que um dia, em um dos trens que traziam mais e mais vítimas, uma judia lhe chamou a atenção. Cabelos que aparentavam ser pretos cobertos pelo o que poderiam ser os restos mortais de algum parente; rosto tão sujo quanto sua alma; olhos negros como a noite e era tão magra quanto um traidor da pátria. Ela estava gritando com um soldado, não conseguia entender muita bem, mas preferiu intervir. Nunca é tarde de mais para aumentar a vantagem na contagem de mortes, não? Ao aproximar-se agarrou a garota pelos cabelos e a arrastou para longe da fila. Ela esperneava, gritava e tentava mordê-lo como o animal que a julgavam ser, porém não obteve êxito. Schutzer gritava com a jovem, lhe apontava o dedo e desferia tapas em sua face e gritava com a garota, porém ela nada entendia, afinal, só havia aprendido hebraico. Então, no instante em que os dedos nazistas tocaram pela última vez a face judia olhares cúmplices foram trocados e, pela primeira vez, sentiram como se tivessem compreendido-se.

Semanas foram se passando, olhares eram trocados, alguns toques quando a lua alcançava seu ponto mais alto no céu, porém não se ouviam palavras. Ela não falava alemão, muito menos ucraniano, quem dirá um soldado nazista entender palavras hebraicas. Ambos estavam perdidos, o que diabos estava acontecendo? Eram totais opostos, ele, um assassino pelo bem de sua nação, ela, uma vítima da guerra, a caça e o caçador agora eram cúmplices de algo que não sabiam dizer se era carnal ou empírico, se era necessidades físicas ou um sentimento real. Dúvidas levaram o jovem soldado a cometer pequenos delitos. Roubava comida para dar à jovem desacompanhada, às vezes algumas cobertas ou o que julgasse necessário. Mas não significa que havia parado de matar os outros pobres prisioneiros, afinal, essa ainda era sua maior diversão.

Após cerca de quatro meses desde a chegada do trem que trazia a jovem judia, que segundos os registros, chamava-se Reyna, o soldado Schutzer havia se tornado subtenente Schutzer. Hanz, um outro soldado com quem Michael treinava desde sua ingressão às forças armadas, estava empatado com seu colega em número de mortes, o que não agradava muito o até então recordista. Reyna continuava com seus tratamentos privilegiados e sem sequer trocar qualquer compreensão oral com seu cúmplice. O subtenente, por sua vez, aproveitava altas noites com as várias mulheres com quem tinha o prazer de se deitar agora que começara a subir de cargo, porém ainda pensava na garota. O que diabos havia nela que tanto o instigava? Preferiu então não cortar relações com a mesma. Mas afinal, o que era aquilo? Atração física? Por parte dele muita duvidoso, afinal, ela não era bonita para seus padrões; seria a inferioridade? Há muitos casos de soldados que mantém relações sexuais com prisioneiras para mostrarem sua superioridade; Seria talvez a curiosidade pelo diferente? Afinal, era uma relação sem comunicação direta, apenas toques, olhares. Preto na mistura harmoniosa de azul e cinza, músculos com pele e osso, loiro com o preto com vestígios das fornalhas. Quem diria que aquela seria a última noite de contestação.

Quando o sol ameaçava nascer os dois se separaram e rumaram cada um para sua laia. Reyna teve a infelicidade de encontrar com um soldado que fazia sua ronda. Ele a contestou o motivo dela estar fora dos galpões durante toque de recolher. A judia nada entendia, foi quando viu ele se aproximando com a mão fechada em punho e ser acertada em cheio no seu maxilar. Tudo ficou turvo e já não sabia de onde vinham os golpes, quando deu por si estava no chão, cuspindo sangue e vendo uma luz. Os olhos antes negros ficaram cinzas, perderam a vida.

No dormitório dos militares havia uma mesa muito bem posta e farta, todos sentados e prontos para se alimentarem antes de mais um dia de trabalho quando Hanz adentrou o cômodo. Massageava as mãos e sorria malicioso para Schutzer. Foi até o quadro onde haviam as contagens de mortes por cada um e marcou mais um ponto. Selecionou a foto da vítima e todos o aplaudiram de pé o novo recorde. Menos Michael. Uma estranha sensação encheu seu peito, sentiu-se mal, com náuseas e dor de cabeça. Sentiu-se vazio. O que era aquilo? Ele não poderia ter se apegado a jovem judia, ela era sua prisioneira! Mas era tarde de mais, parte dele foi de encontro com Reyna, pois ele estava morto por dentro. É como diz aquele velho ditado: aqui se faz, aqui se paga.


Notas Finais


Um conto pra começar minhas histórias aqui no spirit. Espero que tenham gostado. Beijinhos de luz.


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