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História Magoar, Perdoar e Esquecer (Edição de Ouro) - Alguém revelou (último capítulo)


Escrita por: GSilva

Capítulo 27 - Alguém revelou (último capítulo)


ALGUÉM REVELOU

            O tom na voz de Andrew era sério, evidenciando que aquilo não era mentira. Ele não mentiria sobre aquela situação, aliás, sabendo que eu estava destruído por dentro.

            — O quê? — Perguntei. — Assassinado?

            Ele deu um passo para trás, deixando nossos corpos distantes. Acho que Andrew pensava que eu poderia atacá-lo se aquilo fosse uma mentira.

            — É verdade. — Ele afirmou. — A polícia comunicou aos familiares hoje, durante o enterro, não esperaram. A família contou para nós, os amigos de Larry.

            — Isso é horrível! — Eu exclamei, em puro choque e horror. Uma coisa era me conformar que Larry tinha morrido num acidente, outra, bem diferente, era aceitar o fato de que ele tinha sido assassinado.

            — Sim. E ainda tem mais. Os policiais disseram que o assassino pode ser alguém próximo. — Andrew continuou. — Tipo, você sabe o que isso significa?

            Parei para pensar, desviando meu olhar dele. Minha cabeça estava explodindo, pelo choque que havia acabado de passar, por minha tentativa de suicídio inconsciente, da escuridão que se estendia atrás e à frente da minha vida. Eu sabia o que aquilo significava.

            — Nós. — Respondi. — Os policiais acham que fomos nós.

            Andrew deu um passo à frente, olhando-me com uma espécie de tristeza e piedade, mas ainda podia ver traços sérios nele.

            — Isso mesmo. Também significa que provavelmente seremos presos. — Ele respondeu. — Na verdade, não todos nós.

            — Como assim?

            — Bom, você já deve ter imaginado isso, mas tudo o que aconteceu nos últimos meses, desde que nos conhecemos, foi uma batalha sociopata. — Ele respondeu. — Então...

            — Então eu sou o principal suspeito. — Interrompi, com meus pensamentos à mil.

            — Não, não foi isso que eu...

            — Faz sentido, para falar a verdade. Eles devem ter investigado sobre o meu passado, sobre as coisas que fiz no Colégio Vargas, sobre você é sobre a Alexia. — Eu disse. — Eles devem estar pensando que eu assassinei o Larry porque ele não quis ficar comigo.

            Andrew ficou em silêncio, olhando-me com aqueles olhos verdes. Ele parecia prestes a falar alguma coisa, com as costas eretas e um braço quase levantado. Ele queria dizer que eu estava errado, queria me confortar diante daquilo, daquela acusação, mas simplesmente não podia. Ele sabia que eu estava certo.

            — Sim, faz sentido. — Disse ele. — Mas não foi você.

            Dei um passo à frente, aproximando-me dele. O barulho da água do lago chegava aos meus ouvidos como um epílogo da minha experiência de quase morte. Pude ver Andrew mais de perto, o modo como as cicatrizes em seu rosto pareciam belas, ainda que agonizantes, o modo como seu cabelo se enrolava quando ficava molhado. E, contra a luz do Sol, consegui enxergar o vapor emanando dele. Ele estava muito quente.

            — Eu não quero acreditar que foi você, mas... Greg? — Disse ele.

            — Claro que não fui eu! — Rebati. — Eu não te matei quando você disse que não ficaria comigo.

            Ele pareceu magoado, desviando o olhar.

            — Me desculpe. Mas, se não foi você e nem outra pessoa que eu conheço, quem mais poderia ser? — Andrew perguntou. — Greg, você tem alguma ideia de quem pode ter feito isso?

            — Não, acho que não. — Respondi, afastando-me novamente.

            Realmente, eu não tinha nem ideia de quem poderia ter sido. Minha mente vasculhava o perfil de cada pessoa que eu conhecia, desde Aqua até Ryan, mas não consegui achar nada de útil. Até que... Lembrei-me do que minhas amigas disseram sobre Thomas, há alguns dias: ele parecia muito estranho no dia do plano, no dia que eu e Larry nos beijamos. Lembrei que tinha pensado nisso, que talvez ele tenha visto o nosso beijo, mas também descartei a possibilidade. Mas e se? E se ele realmente teve coragem de fazer algo parecido. Eu não duvidaria, já que Thomas mentiu sobre Lucas, ameaçando o meu namorado contra mim.

            — Espere. — Comentei. — Thomas.

            — Thomas? Aquele garoto que me bateu no ano passado? — Andrew perguntou, com um pequeno esboço de sorriso no rosto.

            — Sim.

            — Não, não acho que foi ele. Tudo bem, ele é agressivo, mas não acho que tem coragem para matar alguém.

            — Andrew, só pode ser ele. — Respondi. — Talvez você não saiba, mas ele causou o maior problema no colégio há dias. Thomas é terrível.

            — O que ele fez?

            Antes de continuar a falar, limpei a garganta e pensei, tentando achar todas as minhas lembranças sobre o dia do plano, sobre a mentira e a descoberta da verdade.

            — Ele mentiu para mim. Quase me separou do meu namorado. — Falei. Aos poucos, fui contando toda a história, desde a divulgação do áudio até o plano de Larry, mas, é claro, deixei a parte do beijo oculta. Andrew não precisava saber.

            Quando terminei de falar, ele estava com os olhos singelamente arregalados e grande parte da água que o encharcava já estava secando. Olhei para seus olhos por um tempo, tentando procurar alguma reação, mas ele apenas disse:

            — Por que não me contou isso antes?

            — Achei que você estava muito ocupado. — Respondi. — Você parecia, pelo menos. E quase não nos falávamos mais. De repente você apareceu com essa história de mudança para o exterior.

            — Mas, Greg, isso é muito grave. — Andrew rebateu. — Você sabe que está me dando provas de um assassinato, não sabe?

            — Não são provas. Tudo isso não prova nada. — Respondi. — Mas, sim, acredito que foi o Thomas.

 

            Andrew virou de costas, olhando para o céu. Não pude ver seu rosto, captar alguma emoção, alguma reação, mas quando ele se virou de frente enxerguei algo diferente. Havia uma seriedade muito diferente no olhar dele, algo que eu nunca tinha visto. Eu nunca tinha presenciado aquela parte dele: o Andrew que queria me proteger a todo custo.

            — Nós temos que dar um jeito de descobrir. — Disse ele.

            — Eu talvez tenha um jeito. — Respondi. Ele me olhou seriamente e, sem dizer nem uma palavra, balançou a cabeça em negação. — Eu preciso falar com ele.

            — Não, não, não. Você não vai chegar nem um centímetro perto dele. — Andrew respondeu. — Sério. Se ele for um assassino de verdade, se... Eu não vou deixar você se arriscar.

            Ele desviou o olhar e foi mais para trás. Parecíamos tão distantes, tão diferentes. Dei um passo à frente e estiquei o braço, segurando no antebraço dele.

            — Andrew, ei, olhe para mim. — Eu disse. — Não se preocupe, eu vou ficar bem. Preciso fazer isso, por Larry.

            O puxei para perto de mim, segurando-o fortemente. Meus braços contornaram seus ombros e ele fechou as mãos nas minhas costas. Descansei minha cabeça no ombro dele e acrescentei, em voz baixa:

            — Não se preocupe. Eu vou ficar bem.

 

***

 

            Passei aquele fatídico final de semana contando os segundos para a segunda-feira. Fiquei dentro do quarto durante grande parte do tempo, apenas saía para comer ou tomar banho. Meus pais respeitaram essa mudança de comportamento, pois achavam mais do que justificável.

            Andrew, Aqua, Alison e Alicia não me deixaram sozinho, apesar de não terem ido me visitar. Todos os meus amigos, até as pessoas mais improváveis, me mandavam mensagens de conforto. Eu tentava responder a maioria, mas eram muitas. Passei grande parte dos dois dias conversando com Andrew. Expliquei para ele como estava me sentindo, sobre o luto, sobre a saudade de Larry, sobre tudo, principalmente sobre sua mudança para o exterior. Ele não parecia querer me deixar sem um sorriso no rosto, pois quase toda hora me mandava algo. Não teve um minuto do final de semana que eu passei com o celular longe.

            Na noite de domingo, meus pais foram ao meu quarto e perguntaram se eu realmente queria ir ao colégio no dia seguinte. Eu respondi que não, porque era a verdade, mas também disse que precisava ir, embora não fosse sábio. Eles me deixaram sozinho para pensar.

            Na segunda de manhã, levantei-me um pouco mais tarde do que o normal. Tudo parecia morbidamente triste, desde o ato de levantar até o de arrumar os materiais da aula do dia. Eu suspeitava que não haveria aula, por causa do ocorrido, mas, mesmo assim, não podia desperdiçar a chance de descobrir a verdade.

            Meu irmão me acompanhou durante o percurso, tentando colocar algum tópico interessante na conversa, algo que não tivesse nada a ver com Larry. Mas era impossível não pensar no meu melhor amigo. Quando estávamos a dois quarteirões do colégio (eu já podia vê-lo como um prédio azul atrás de um muro verde), comecei a lembrar de Larry e finalmente tive aquele surto de realidade. Eu iria chegar, iria entrar no colégio, e não o veria. Iria entrar na sala de aula e ele não estaria lá. Nunca mais. Nunca mais o veria, não sentiria sua felicidade e nunca mais o faria sorrir.

            Lágrimas surgiram novamente e eu reduzi o passo, começando a tremer levemente.

            — Greg? Você está bem? — Ryan perguntou, virando-se para trás.

            — É claro que não. — Respondi.

            Ele não disse nada, apenas continuou andando. Fiquei imaginando como aquilo deveria estar sendo para meu irmão: é claro, com certeza Ryan estava abalado pela morte de Larry, mas não sentia o mesmo que eu. Obviamente, para ele, a dor é mais forte quando não é com si mesmo. Meio que irracionalmente, pensei como seria se a situação fosse ao contrário, se o melhor amigo dele tivesse sido assassinado.

            Sem dizer mais nada, voltei a andar.

 

            Todos no colégio pareciam notar a minha dor. Eles me olhavam, perfurando minha mente com seus olhos perspicazes, procurando por segredos escondidos na minha mente. Eu abaixei o olhar e não retribuí nenhum sorriso triste, ou um “sinto muito” falado ao ar. Continuei andando, seguindo o caminho que conhecia tão bem quando a palma da minha própria mão.

            Ao entrar, vi algo diferente. Na rampa que levava à entrada do auditório havia uma longa faixa negra, um retângulo gigante de tecido preto. Um símbolo de luto. Eu me senti culpado naquele momento, culpado porque eles pareciam sentir mais dor do que eu, culpado porque não retribuía o amor que algumas pessoas tentavam me dar. A ironia naquilo era que a faixa foi colocada no mesmo lugar que eu expus a traição de Alexia, no ano anterior. Em outras situações, eu poderia até ter sorrido.

            Não parei de andar, como o acostumado. Ryan parou no mesmo lugar onde ficávamos desde que começamos a estudar naquele colégio, mas eu segui meu caminho até o pátio do ensino técnico. Foi ali, naquele lugar, que eu vi Larry pela primeira vez. Ele esbarrou em mim enquanto corria e não percebeu que nossas vidas colidiram ali. Eu já tinha dito isso alguma vez, ou pensado. Porém, estar lá e perceber que nossas vidas realmente colidiram, foi um choque. Novas lágrimas ameaçaram aparecer, mas eu as espantei. Sinceramente, eu não queria mais chorar; a fase de luto que eu precisava já tinha sido passada. Afinal, não adiantaria mais chorar.

            E eu não vivia apenas de Larry. Tinha meus amigos, minha família, meu namorado. Todos eles queriam que eu fosse feliz, e eu precisava superar tudo. Continuei a andar até chegar ao pátio, esperando encontrar algum rosto conhecido. Não havia uma única pessoa conhecida ali, nem Larry (obviamente), nem Andrew, nem Lucas ou minhas amigas; mas não desisti. Apoiando a mochila num lado só das costas, continuei, entrando no corredor e virando na porta da minha sala.

            Quando entrei, notei que algumas pessoas já estavam lá. Algumas olhavam para mim, outras pareciam sobrecarregadas demais para isso. As que tinham coragem para me olhar, exibiam sorrisinhos tristes e eu tentei ao máximo parecer generoso quanto aquilo. Ainda não tinha pensado sobre como estava sendo para os outros amigos do Larry, em Anne, Pierre ou Aimee. Não tinha certeza, mas suspeitei que até a Iliana ou o William já sabiam.

            Virei-me para o lado onde geralmente me sentava. Minhas amigas ainda não tinham chegado, mas eu continuei até chegar numa mesa e me sentei sobre ela, deixando a mochila de lado. Descansei as minhas costas e rezei para que alguém chegasse. Por favor, Larry, entre por aquela porta e me diga que tudo foi um pesadelo. Por favor.

            Abaixei minha visão e fiquei grande parte do tempo olhando para baixo, até que uma voz quase desconhecida me fez olhar para cima.

            — Greg?

            Um choque passou por mim. Esforcei-me a reconhecer aquelas características físicas, a fim de descobrir quem era. Eu nunca poderia esquecer.

            — Anne. — Eu disse.

            — Oh, Greg... — Ela ecoou tristemente e se aproximou de mim.

            A garota me envolveu com os braços finos dela, apertando-me. Senti a dor no abraço, naquele abraço silencioso que pareceu ser pouco para curar tanta dor.

            — Como você está? — Perguntou ela, com lágrimas nos olhos. Dei uma rápida olhada nas roupas dela e vi a cor: tudo preto. Ela ainda estava de luto.

            — Estou destruído. — Respondi.

            — Eu também estou péssima. — Disse ela. — Ele... Ele realmente se foi.

            — Sim, eu nem consigo acreditar. Pensei que talvez pudesse ter sido um pesadelo.

            — Infelizmente, não é. — Anne respondeu. Desviamos nossos olhares. — E é justamente sobre isso que eu queria falar com você.

            — Sim?

            — Eu fui até a casa dele, após o... acidente, e descobri isso. — Ela respondeu, retirando a mochila das costas.

            Observei enquanto ela se inclinava sobre a mochila e retirava algo de lá de dentro. Eu senti uma pontada gigante no coração e um enjoo que quase me fizeram desmaiar. Era um papel rosa, um bilhete que eu já conhecia, dobrado em formato de coração. O Correio-Elegante.

            — Eu acho que isso é seu. — Disse ela, entregando-me o bilhete.

            Meus olhos se encheram de lágrimas enquanto girava o papel nas mãos e lia o que estava escrito. Era uma declaração de amor que eu havia escrito para Larry, algo muito simples, mas que mudou minha vida completamente.

            — Obrigado. — Respondi, sorrindo gentilmente e me aproximando para abraçá-la novamente.

            Quando interrompi o abraço e abri os olhos novamente, vi aquilo esperava tanto: Thomas estava parado na entrada.

 

***

 

            Inúmeras imagens passaram por meus olhos: Larry contra mim, me beijando nos fundos do colégio, Andrew parado na entrada da sala quando eu disse que gostava dele, Thomas ficando irritado por essa revelação. Tudo passou por mim como um flash, mas culminou em nada.

            Eu me levantei, sentindo um calor muito estranho subindo por minhas veias, e, quando vi Thomas parado na entrada da sala, percebi que nunca tinha sentido tanta raiva de alguém como sentia dele, nem de Alexia. O que eu sentia por Alexia nem podia ser comparado ao meu sentimento por Thomas.

            Fui avançando mais rapidamente. As pessoas ao meu redor pareceram perceber que algo estava errado, pois se afastaram e me olharam. Eu estava a menos de dez centímetros de Thomas quando parei de andar.

            — Eu não acredito que você teve coragem de aparecer aqui. — Eu disse. — Depois de tudo.

            — Greg? — Thomas disse. — Do que você está falando?

            Eu perdi a paciência e levantei a mão. Com um pouco de força, bati contra o peito dele e fui levando-o até o lado externo da sala, fazendo-o chocar as costas contra a parede do corredor.

            — Depois de ter mentido para mim, depois de ter feito Lucas se separar de mim, depois de todas as mentiras que você contou, ainda assim, você quis aparecer hoje. — Eu disse, com raiva, meu rosto muito próximo do dele. Pude ver o medo no olhar de Thomas.

            — É claro que eu não poderia faltar! — Ele argumentou, com a voz numa oitava acima. — Greg, eu posso ter mentido, mas não sou um monstro. Eu queria te dar meus pêsames por Larry.

            — Não fale o nome dele, você não tem caráter para isso! — Elevei a voz, falando com os dentes cerrados. — Você o matou e ainda teve a coragem de aparecer?!

            — Greg, eu não fiz isso. — Ele suplicou. — Eu juro.

            — Pare de mentir! — Realmente gritei desta vez, fazendo minha voz ecoar por todo o local.

            Diversas pessoas apareceram no corredor, todas querendo ver aonde aquela história iria dar. Provavelmente os outros alunos queriam me ver chorando, mas nem uma única lágrima caiu naquele momento.

            — Eu nunca faria isso, Greg, você tem que acreditar em mim. — Thomas respondeu. — Eu nunca conseguiria matar alguém.

            — Você mente, mente, mente. — Rebati. — Tudo o que você disse, desde que voltou para essa merda de colégio, é mentira. Tudo. Você não conhece o significado da palavra “verdade”.

            — Eu não estou mentindo! — Disse ele, elevando ainda mais a voz. Eu senti uma ponta de dor naquela voz, uma dor verdadeira, então me afastei e o deixei livre da minhas garras. — Sério, Greg, eu nunca mentiria sobre isso. Eu não o matei. Eu sei que não teria nem uma chance se ele morresse. E... E eu te amo, Gregory, mesmo.

            Virei-me de costas para ele.

            — Greg, eu te amo. — Thomas ecoou.

            Eu abri os olhos.

            — Não. Sem mais mentiras! — Respondi.

            Não me lembro de como, mas virei-me para ele tão rapidamente que todos se assustaram. Meu punho se elevou numa velocidade surpreendente e atingi um belo de um soco no maxilar de Thomas. Ele caiu instantaneamente, com seu sangue manchando o chão.

            Eu não senti piedade.

            Levantei meu braço novamente para acertá-lo com mais um soco, mas senti braços me envolvendo e me puxando para fora. Não era Larry, nem Lucas. Andrew. Reconheci-o pelo perfume e pela forma como seus braços me seguravam.

            — Me solte! — Gritei. Ele continuou imutável, puxando-me para longe de Thomas, para longe daquelas pessoas. — Me solte! Eu preciso vingá-lo. — Gritei outra vez, referindo-me a Larry.

            Fiquei na esperança de que ele me soltasse, mas isso não aconteceu. Ele apenas me deixou livre quando já estávamos no pátio do ensino técnico.

            — Greg, você é um demônio. — Disse Andrew. — Deixe Thomas em paz.

            — Mas eu não posso. Ele matou o Larry! — Protestei, finalmente deixando as lágrimas de ódio surgirem.

            — Não, não foi ele. — Disse Andrew. — Eu preciso falar com você, e precisamos sair daqui agora. A Alexia quer falar com você.

            — O quê? Agora? — Perguntei. — Mas ainda preciso falar com meu namorado.

            — Ele pode esperar. — Andrew rebateu. — A Alexia está muito ansiosa para te falar algo. Ela já me contou, mas quer falar com você pessoalmente.

 

***

 

            Andrew acelerou o carro conforme entrávamos numa avenida. Seus olhos ainda estavam centrados na estrada, olhando para os carros à nossa frente e para as placas de sinalização. Já eu... Apenas tinha olhos para ele. Não conseguia pensar em alguma coisa para falar, então apenas fiquei olhando-o por grande parte do trajeto.

            De vez em quando, me dispunha a olhar para os lados, para ver se reconhecia alguma casa ou algum ponto de referência, mas todas as minhas tentativas terminaram sem nem um resultado. Eu não conhecia aquele lugar, não sabia para onde ele estava me levando. Supus, também, que colocar o rádio para tocar não adiantaria em nada no nosso silêncio, até porque o clima de luto ainda pairava sobre nós.

            — Estamos quase chegando. — Ele disse, sem tirar os olhos da estrada, quebrando nosso silêncio. — Não vai me perguntar por que o tirei do colégio e o trouxe para cá, sem ao menos deixá-lo conversar com o Lucas?

            Eu fiquei estupefato. A primeira frase dele desde que tínhamos entrado no carro, mas, mesmo assim, não gostei da entonação em sua voz. Parecia, pelo tom e pelo modo como Andrew falou, que ele achava que eu não estava me importando com a situação. Idiotice, é claro, porque eu estava muito preocupado com tudo aquilo.

            — Eu pensei que fosse um segredo. — Respondi.

            — Não é. — Ele respondeu. — Só é muito sério.

            — Okay. — Respondi, prolongando as vogais. Não gostei do jeito dele, do modo como falou, parecendo tão centrado e convicto em algo que não queria me revelar. Obviamente, ele não queria me contar, mas, aparentemente, não cabia a ele revelar ou não a verdade. — Bom, então... Por que está me levando para a casa da Alexia?

            — Ela quer te contar algo.

            — Sim, você já disse. Mas, o que é tão horrível assim, a ponto de te deixar tão fechado? — Perguntei novamente. Ele apenas virou o rosto para o outro lado e não respondeu. — Bem, você pediu para perguntar.

            — Não. Eu só queria que você falasse alguma coisa. — Respondeu ele. — Queria ouvir a sua voz.

            — Então bastava me perguntar sobre qualquer outra coisa.

            — Sim. À propósito, acho que Thomas vai ter que ir para um hospital. — Ele respondeu, com um leve sorrisinho no canto dos lábios. E aquela foi a primeira vez que eu quis sorrir desde a sexta-feira, desde a morte de Larry. Era Andrew, ele me dava essa sensação, essa vontade de ser feliz apesar de tudo.

            — Eu também acho. — Respondi. — Mas receio que fiz algo errado.

            — Como assim?

            — Você disse que não foi ele, disse que não foi o Thomas que assassinou o Larry. — Respondi.

            — Sim, mas... Não vá me dizer que não queria bater no Thomas. — Ele disse sarcasticamente. Dessa vez, eu sorri de verdade.

            — Ok, eu queria. Mas, que fique bem claro, aquilo foi para vingar a briga que ele teve com você no ano passado.

            Andrew gargalhou e virou o volante. Entramos numa ruazinha adjacente à principal, com fileiras e mais fileiras de carvalhos em ambos os lados da calçada. Reconheci as espécies das árvores porque me dediquei à Biologia no Ensino Fundamental. Ele continuou pela rua esburacada até chegar ao seu final (era uma rua sem saída) e de repente parou.

            Um calafrio percorreu todo meu corpo. Eu sabia que estava sendo estúpido, que não devia pensar naquilo, mas não podia deixar de achar tudo tão íntimo. Há algo estranhamente íntimo em ficar sozinho com alguém num carro, numa rua sem saída. Quis abrir a porta do automóvel e sair correndo pela rua, gritando algo sem sentido, mas me contive.

            — Chegamos? — Perguntei. Ele assentiu lentamente antes de destrancar as portas do carro.

            — A Alexia mora aqui. — Andrew respondeu, apontando para a última casa da rua: um pequeno “sobrado” de tijolos e concreto, uma casa simples, porém conservada.

            — Então é aqui que vocês estão se encontrando? — Perguntei, arqueando as sobrancelhas. Tentei criar um clima legal entre nós, talvez até engraçado, mas ele não sorriu e virou o rosto para o outro lado.

            — Na verdade, não. Ela não me deixa vir aqui, apenas de vez em quando.

            — Como assim? Ainda não estão prontos para um almoço em família?

            — Não, não é isso. — Ele respondeu. — Venha, você vai entender quando vê-la.

            Eu não perguntei o que aquilo significava, por que ele soava tão sério e preocupado sobre algo que obviamente me envolvia, apenas comecei a andar. Ele não disse mais nem um palavra, mas podia sentir sua presença logo atrás de mim, como um guarda-costas.

            Eu não queria entrar lá, mas precisava descobrir a verdade e, se Andrew realmente tinha convicção naquilo, então, tinha que reencontrá-la.

            O terreno da casa começava num pequeno jardim de carcas-vivas e gnomos-de-jardim, cortada por uma passarela de pedra que interligava o portão da propriedade até entrada da casa. Eu fui à frente, olhando para os lados, tentando absorver cada mínimo detalhe daquele local. Pretendia memorizar tudo aquilo, certo de que todas as pessoas iriam me perguntar sobre como era a casa da Alexia.

            — Ela está lá dentro. — Disse Andrew.

            Continuei. Falando em termos de nerd, aquele momento parecia ter saído de um roteiro de algum filme de terror: eu, à frente, Andrew mais atrás, esperando a minha entrada numa casa misteriosa. Tudo pareceria menos tenebroso antes não fosse pelo céu que começava a escurecer. Rezei para que não começasse a chover. Finalmente, subi o curto lance de escadas que levava à entrada da casa e me virei para trás.

            — Não precisa bater. — Disse ele.

            Eu franzi o cenho e me virei para a porta novamente. Um calafrio percorreu toda a minha espinha, fazendo-me arrepiar. Algo parecia errado, algo parecia tremendamente errado, como se eu estivesse entrando na toca de um dragão ou coisa parecia. Rezei para não morrer queimado.

            Coloquei minha mão na maçaneta e, com uma leve pressão em torno do metal gélido, movi a placa de madeira para frente. A porta rangeu conforme foi se abrindo e um cheiro horrível subiu. Parecia algo morto, alguma carniça, que vinha diretamente do corredor principal. Com uma última olhadela para Andrew, que parecia muito tenso, entrei na casa.

 

            O cheiro horrível foi se intensificando conforme aproximamo-nos do centro da casa, pelo corredor principal. Tudo estava escuro e não havia nem um sinal de alguém naquela casa, além de mim e de Andrew. Porém, pensei que Alexia ainda era muito nova para poder morar sozinha.

            — Onde estão os pais dela? — Perguntei, com a voz baixa por nenhum motivo em especial.

            — Eles a abandonaram. — Ele respondeu, sem nenhuma paz na voz.

            — O quê?!

            — É verdade. E eu não tive muito tempo para arrumar essa bagunça. Eles a deixaram. — Disse ele. — Assim que souberam da doença.

            — Doença? — Perguntei. Ele permaneceu em silêncio e olhou para o lado.

            Eu olhei para onde seus olhos apontavam e notei um lance de escadas que levava até o andar superior. Pelas paredes havia retratos de uma família. Tive que me aproximar mais das fotos para perceber que era a família dela – engraçado, eu nunca pensei que ela poderia ser boa para qualquer pessoa, mas era. Vi retratos de uma família feliz, num parque de diversões, numa praia, em Londres e até no Egito.

            — Ela já viajou muito, não é? — Perguntei.

            Andrew se aproximou de mim e disse numa voz gutural.

            — Ela está lá em cima. Pode subir. Eu vou ficar aqui mesmo.

            Olhei para ele com piedade, pensando em como eu, sendo quem era, conseguiria conversar sozinho com Alexia sem esbofeteá-la na cara. Ele parecia mais sério do que nunca, então apenas me virei para a escadaria.

            Conforme meus pés tocavam os degraus, a escadaria rangia e parecia reclamar do meu peso. Continuei lentamente, passando meus dedos pelo corrimão, absorvendo a suavidade da madeira, olhando para mais retratos que adornavam as paredes daquele ponto. Quando cheguei lá em cima, nem tive coragem de olhar para baixo, porque provavelmente desceria correndo para Andrew. A atmosfera naquela casa parecia muito terrível.

            A escada terminava num corredorzinho que levava a uma única porta. Meu coração disparou. Aquilo realmente parecia um filme de terror. Meus passos se tornaram mais lentos, mas minhas mãos começaram a tremer violentamente. Fui me aproximando, mais e mais, cuidando para não fazer alarde com o assoalho que rangia, e de repente me encontrei frente a frente com a porta.

            Não precisa bater.

            Minhas mãos contornaram a maçaneta e eu a girei lentamente. Essa porta não rangeu quando entrei, ao contrário, parecia estranhamente silenciosa. Quando meus olhos se ajustaram ao novo cômodo, quase caí para trás por causa do choque.

            Aquele sótão não parecia, em nenhum detalhe, com o resto da casa. O teto e o chão eram de uma tonalidade branco-amarelada e as paredes pareciam estranhamente rosadas. Um carpete bem grosso se estendia pelo chão e eu o toquei assim que entrei, sentindo sua maciez. Duas grandes janelas estavam na parede oposta e pouca luz (por causa do tempo que se fechava) entrava por elas. Olhei primeiramente para a direita, observando os detalhes do papel-de-parede, mas, quando olhei para a esquerda, realmente levei um susto.

            Alexia estava lá. Quero dizer, nem bem a reconheci. A garota estava deitada numa cama, com lençóis brancos e um monte de travesseiros. O local parecia adorável, mas ela não parecia mais a mesma. Levei um tempo para reconhecê-la. Alexia não parecia mais àquela garota bela, forte e corajosa que me confrontava no ano passado, pelo contrário, agora sua aparência tinha se reduzido ao puro desastre. Eu pude ver seus ossos salientes no pequeno vestido rendado que vestia, seus cabelos escassos, revelando seu couro cabeludo, seus olhos fundos e as maçãs do rosto proeminentes. Pude ver como ela parecia frágil, como um barco de papel numa correnteza, e, de repente, um reflexo de choque passou por mim. Ela estava com alguma grave, terrível e irremediável doença.

            — Alexia? — Perguntei, aproximando-me. Ela me mirava com aqueles olhos arregalados e eu contive um grito. — Alexia? É você?

            — Greg. — Respondeu ela. Sua voz soou muito mais rouca do que de costume, parecendo um robô. — Sim, sou eu. Não faça essa cara.

            Eu olhei para ela por mais um tempo. Tamanho foi o choque que eu tive, tão grande que mal pude desviar o olhar dela.

            — Venha, sente-se. O meu amor disse que você estava vindo. — Ela respondeu. Eu franzi o cenho por um milésimo, até perceber que o “meu amor” era, na verdade, Andrew.

            Olhei para a cama ao lado dela. Havia uma cadeira lá, na qual, provavelmente, Andrew se sentava todos os dias, e rezava por algo que não podia ter. Mas o que me chamou mais a atenção não foi a cadeira, mas sim o criado-mudo além dela. Havia muitos comprimidos em cima daquele criado-mudo.

            Aproximei-me da cadeira e, puxando-a lentamente para perto de mim, sentei-me sem fazer nem um ruído.

            — O que aconteceu? — Perguntei.

            Ela exibiu um sorrisinho doce e levantou os braços magros, que mais pareciam dois gravetos. Em sua mão havia um aparelho, algo que eu já tinha visto. Eu sabia o nome, mas perguntei ainda assim:

            — O que é isso?

            — É um gravador. Para todos... — Ela parou, tossindo violentamente, e depois voltou a falar com a voz falhando. — Para ninguém dizer que você está mentindo.

            — Mentindo? Mentindo sobre o quê? — Perguntei.

            Ela, pela primeira vez em muito tempo, pareceu dar um sorrisinho gentil para mim. Mas não era gentileza, com certeza não era. Era maldade.

            — Não está óbvio, Greg? — Disse ela. — Eu matei o Larry.

 

***

 

            Meu coração parou naquele instante. Eu apenas consegui olhá-la nos olhos durante um longo período, tentando captar seus sentimentos, mas tudo que vi ali foi uma garota cínica e sem piedade. Quis levantar para socá-la, mas minha compaixão falou mais alto, prendendo-me à cadeira.

            — O quê? — Perguntei.

            — Você ouviu. — Disse ela. — Eu matei o seu amigo.

            — Por quê? Como? Onde? — Perguntei novamente sem pensar duas vezes, com cada palavra atropelando a próxima. — O que aconteceu com você?

            — Eu vou te contar. — Disse ela, tossindo mais uma vez e se ajeitando na cama. — Mas só não me fique fazendo perguntas. Esses remédios já me dão dor de cabeça demais.

            Ela se sentou, com as costas encostadas à cabeceira da cama, olhando para mim com um fogo quase oculto no olhar.

            — Você deve ter se perguntado por que saí do Colégio Vargas. — Alexia começou. — Bom, até já deve ter imaginado o motivo. Por causa da Iliana. Mas meus problemas começaram desde bem antes, por causa de você. Na nossa primeira briga sociopata, quando você me expôs e fez com que Andrew terminasse comigo, eu não tinha para onde ir. Fiquei sozinha por um tempo, deve saber disso, e fiz amizade com algumas pessoas estranhas. Não demorou muito para alguém me oferecer algo que “mataria a minha tristeza”.

            Ela fez uma pausa, olhando tristemente para mim.

            — Eu comecei a usar drogas. — Disse ela. — Comecei com maconha, depois fui para as mais pesadas, e, quando a Iliana me drogou para se vingar de mim, tive a minha primeira overdose. Foi aí que descobriram a minha doença...

            — Andrew já mencionou isso...

            — Cale a boca, ainda estou falando. — Ela interrompeu grosseiramente. — Eu tenho uma condição um pouco rara que me fez ficar dependente dessas drogas. Eu não posso viver sem uma dose por dia. Isso é horrível, eu sei, mas, junto com Andrew, consegui mais drogas para me manter viva.

            — Foi por causa disso que você saiu do colégio?

            — Sim. E tem mais. — Ela pigarreou um pouco. — Minha condição foi piorando, porque as drogas foram sugando a minha vida. Imagine. É a sensação de ter sua própria pele sendo retirada de você enquanto se está numa caldeira de água quente. É horrível. Mas, graças a Andrew, consegui passar por isso. Você entendeu o meu ponto, não?

            — Eh, acho que sim. — Respondi, estreitando os olhos. — Você está doente.

            — Não, não é isso. O que eu quis dizer é que amo o Andrew e toda a minha vida, literalmente, gira em torno dele. — Ela respondeu, revirando os olhos.

            — E onde Larry se encaixa nessa história? — Perguntei, sem medo de ser interrompido novamente.

            — Eu já ia falar. — Ela disse, tossindo mais um pouco. As mãos dela alcançaram um dos recipientes de medicamentos, lentamente, puxando-o para perto. — Eu estava aqui, sozinha, quando seu “ex-amigo”, Thomas, apareceu sem avisar. Fiquei com um pouco de medo, confesso, mas o recebi bem. Ele disse que tinha algo para falar sobre você. — Alexia fez uma pausa para tossir mais uma vez antes de continuar com seriedade. — Ele disse que você estava beijando o Andrew.

            — O quê?! — Respondi imediatamente. — De onde ele retirou isso?

            — Foi o que ouvi. — Ela respondeu. — Há alguns dias antes da morte do Larry. Imagine como me senti naquele momento, quando descobri que a razão da minha vida estava se agarrando com meu inimigo.

            — Alexia, nós não somos inimigos...

            — Quieto. — Ela interrompeu. — Eu fiquei com muita, muita raiva, mas consegui pensar o suficiente para elaborar uma vingança. Tive que pesquisar muito para achar o homem perfeito. Contratei alguém para sabotar os freios do carro do Larry. Eu não podia machucar o Andrew, porque o amava e ainda o amo, mas sabia de outra pessoa que você amava além dele. E então você sabe do resto.

 

            Continuei em silêncio após o fim do relato dela. Eu simplesmente não tinha palavras (e ainda não tenho) para descrever como estava me sentindo naquele exato instante. Eu não estava exatamente com raiva, mas também não posso dizer que queria abraçá-la. Afinal, Thomas e ela foram os responsáveis pela morte do Larry.

            — Mas, por que está me contando isso? Por que não me deixou pensar que foi o Thomas, sozinho? — Perguntei.

            — Porque você é meu legado. — Disse ela. — Esse gravador vai mostrar a verdade para o mundo. E eu não tenho muito tempo de vida, talvez algumas semanas, então quis falar tudo de uma vez. Por mais que eu te odeie, por mais que eu queira te ver sofrer, acho que Andrew não está preparado para isso.

            Ela abriu o recipiente de remédios e o levou para perto do peito, apertando-o contra os ossos. Algo naquilo parecia terrivelmente errado.

            — Alexia, o que você está fazendo? — Perguntei. — Por quê?

            — Ele te ama, sabia? Estou falando do Andrew. — Disse ela, sem nem uma emoção no rosto. Foi naquele momento, naquele ínfimo momento, que eu pude perceber que ela estava desistindo, que aqueles remédios seriam sua salvação desse mundo horrível. — Por favor, cuide dele. Fique com ele. Andrew te ama.

            Tudo aconteceu muito rápido.

            Antes que eu pudesse me aproximar dela e impedi-la, Alexia levantou o recipiente de remédios e colocou todos os comprimidos na boca, engolindo-os rapidamente. Senti a dor no olhar dela, dor por querer deixar aquele mundo. Um susto me fez levantar e eu corri para perto dela, retirando o vidro de comprimidos de suas mãos, mas ele já estava vazio.

            Num impulso nervoso, gritei por socorro.

            — Andrew! Andrew! Venha aqui!

            Imediatamente, ouvi os passos dele correndo pela escada e a porta abriu com um ruído horrível. Alexia já estava começando a tremer.

            — O que aconteceu? — Gritou ele.

            Eu me afastei dela quando ele me empurrou para o lado. Lágrimas apareceram nos meus olhos, enquanto via aquela cena deplorável. Ele a pegou nos braços, aquele corpo tão frágil e decadente, e uma seringa misteriosa surgiu nas mãos dele.

            — Eu estava falando com ela e ela simplesmente tomou os remédios. — Eu respondi, com a voz rouca.

            Ele enfiou a ponta da seringa no peito dela e apertou o dispositivo. Vi o líquido entrar nas veias da garota.

            — Bobagem! — Gritou ele. — Você fez isso! Você quis matá-la porque não suporta que alguém te odeie!

            — Andrew, eu não...

            — Saia daqui!

            — Por favor...

            — SAIA.

            Ele olhou para mim e eu consegui sentir o que ele sentia por mim naquele momento. Ódio. Eu não conseguia mais olhá-lo nos olhos, não conseguia mais ver aquela cena horrível na minha frente, então, virei-me para sair do quarto.

            — Quer que eu chame uma ambulância? — Perguntei rapidamente. De soslaio, vi que o corpo dela já tinha parado de tremer e, felizmente, seus pulmões ainda funcionavam.

            — Não. — Disse ele. — Apenas vá.

 

            Enquanto descia as escadas, parei para pensar em tudo que tinha me acontecido nos últimos meses, desde que conheci o Andrew. E agora paro para refazer minha pergunta inicial, quando ingressei no segundo ano do ensino técnico do Colégio Vargas: Se eu soubesse que aquele seria o momento decisivo, um momento que regeria todos os momentos seguintes da minha vida, não teria continuado. Para quê? Para chegar ao final e sofrer tudo isso?



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