O cômodo era bastante pequeno, e a única iluminação vinha da pequena chama em meu dedo indicador. Meus ossos pareciam feitos de chumbo e minhas pálpebras estavam igualmente pesadas. Eu não fugiria mais. Por ora, apenas esperaria ele me encontrar. Não era lá uma decisão muito sábia, mas... eu quero brincar, foi o que pensei momentos antes de apagar.
Acordei em outro lugar, em uma cadeira bastante desconfortável. Estava em um quarto grande, branco e pouco decorado, uma pequena mesa guardava vários instrumentos médicos que, provavelmente, não tinham como finalidade salvar vidas. O lugar cheirava à gasolina e inseticida e o odor fazia meu nariz se torcer involuntariamente. Não sei por quanto tempo estive inconsciente, mas a primeira coisa que vi foi um ponto vermelho a balançar, minha visão ainda estava um tanto turva e apenas segundos mais tarde percebi que era meu pingente.
A pequena pedra balançava de forma quase hipnotizante, pendurada em um dedo longo e ossudo. Meu primeiro instinto foi avançar, então percebi que estava presa. Presa, não exatamente por corda – o que seria totalmente conveniente para mim –, e sim algum tipo de isolante térmico.
Nada bom.
O homem à minha frente era, de fato, estranho. Sua pele era bronzeada, marcada por hematomas e cicatrizes. Seu rosto era belo, e seus cabelos tinham tons diferentes; refletindo a luz precária do ambiente, brilhavam em variações do loiro. O que me fez reconhecê-lo foi a falta de seu olho esquerdo, claramente substituído por um de vidro, "defeito de fábrica", é o que dizem.
Falterer, é como os chamam. Seus olhos tinham um brilho assassino e seus dentes estavam à mostra em sua boca larga, em um sorriso banhado pelo escárnio. Eu tinha certeza que, antes de qualquer coisa, ele me machucaria.
O homem inclinou-se para frente de repente, como se só agora houvesse percebido que eu estava acordada, deixou seu rosto tão próximo que eu podia sentir sua respiração quente em minhas bochechas.
– Espero que apenas gritos me satisfaçam – ele sussurrou.
Nesse momento notei o quanto minha saia estava desarrumada, mostrando além de minhas meias três quartos. Pisquei. Da faixa de pele aparente, escorreu um fio de sangue, causava apenas uma leve ardência. E voltando minha atenção, novamente, ao estranho homem, vi em suas mãos um grande alicate.
Divertido. Será esse o ritual de boas-vindas?
Antes de qualquer movimento com a ferramenta, ele tirou minha meia esquerda, lentamente, com suas mãos leves, estas que passaram a segurar meu pé nu, sobre o joelho do jovem que havia se sentado em uma cadeira gasta que ali estava. Enfim, o objeto perfurante agarrou a unha de meu dedão. Com certo esforço, o homem pressionou o instrumento e puxou, tranquilamente, como se fosse um ato tão corriqueiro quanto escovar os dentes pela manhã. Doía, sangrava.
Mas...
Minha cabeça pendia para baixo, minha risada era quase inaudível. No entanto, ele continuou – me pergunto o que ele tinha contra unhas –, não podia ver seus olhos, mesmo que o encarasse. E, aos poucos, comecei a me soltar. Aos poucos minha cabeça se erguia, como minhas gargalhadas. Ele me encarou, surpreso, mas logo sua expressão se alterou e ele sorriu abertamente, enquanto, com a pequena lâmina de um canivete, soltava minhas amarras pegajosas.
Grande erro.
– Por que está sozinha, criança? – Indagou.
– Por que estou sozinha? – Indaguei.
O homem abriu a boca. Talvez quisesse responder. Talvez quisesse apenas soltar seu último grito de apelo. Esta foi a última vez em que ele usou sua boca. Em dois segundos, seu belo rosto tomou uma nova forma. Se me permite dizer, ele estava muito mais quente.
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