"I'm making some changes in my life. If you don't hear anything from me… You are one of them"
Point of View of Charlotte Elizabeth Grey
Alguém anotou a placa do caminhão que havia me atropelado? – foi o que pensei ao acordar em minha cama, sem saber como havia parado ali. Ainda levemente atordoada, olhei para o lado e vi dois bilhetes em cima do criado-mudo:
“Eat me” and “Drink me”.
Não pude deixar de rir quando os recadinhos lembraram-me de Alice no País das Maravilhas ou algo mais tenebroso como Cinquenta Tons de Cinza. Será que eu tinha ficado mais drogada que o Chapeleiro Maluco ou transado com Christian Grey na noite passada?
“Eat me” eram alguns comprimidos longos repousados em um pires branco e “Drink me” um suco de laranja fresco. Fiz o que os bilhetes pediram, quando de repente senti um cheiro de bacon queimado entrando pela porta aberta do meu quarto. Thomas não comia bacon. Era contra a dieta dele. Um frio percorreu a minha espinha quando imaginei que poderia ser Gally dentro da minha casa – Céus, que merda eu fiz? – questionei assustada, afinal, me lembrava apenas de tê-lo beijado na noite anterior no Space Needle.
Aos poucos algumas lembranças inundaram meu cérebro, como o fato de ter saído um pouco alterada da festa, no carro do loiro, sendo surpreendida por outro homem no banco de trás. Num vislumbre veio um flash daquele nojento injetando algo em minhas veias, enquanto Gally montava em cima de mim, tentando abafar meus gritos – Hoje finalmente você será minha! – sua voz provocativa ainda estava impregnada em meus ouvidos.
Saltei da cama enjoada e notei que havia um cateter preso a minha veia. Aquilo significava que eu tinha passado do ponto na noite passada. Ou algo mais sério havia acontecido. Arranquei o mesmo sentindo um pouco de dor e desci as escadas desconfiada, seguindo na ponta dos pés até a cozinha.
Chegando lá dei de cara com uma figura loira, só de camisa social com as mangas arregaçadas, dançando She’s so Cold - Rolling Stones da minha playlist, que ficava sobre o balcão de mármore preto, enquanto preparava ovos e bacon para o café da manhã. Seu corpo se movia de uma forma engraçada e seus pés descalços faziam pequenos pacinhos pelo piso de mármore, enquanto balançava o bacon na frigideira. Tive que conter meu riso pela cena fofa. Fofa até me ligar quem era aquele ser!
- Newton?!?! – disse assuatada, fazendo o garoto tremer ao meu sinal – Mas que merda! – escapou pelos meus lábios trêmulos e confusos com tudo aquilo.
- Bom dia Charlie, como se sente? – disse simpático, sorriso no rosto e olhos pegando fogo.
Ignorei sua pergunta – O que você faz aqui, seu idiota? – insisti brava.
- Tomou seus remédios? – ele questionou preocupado.
- Como veio parar aqui? – devolvi com outra pergunta, curiosa, mas ainda sim mantendo-me rude.
- Isso é um daqueles jogos onde só respondemos perguntas com outras perguntas? – desafiou e eu ri. Bosta!
- Tá afim de perder hoje? – fiz um biquinho, provocando-o.
- Você não é capaz de ganhar de mim, é? – jogou um prato sobre a bancada e despejou os ovos com bacon.
- Desde quando cozinha? – continuei na brincadeira
- Desde quando curte Rolling Stones? – falou com deboche.
- Desde quando dança? – ele ainda não havia se ligado que sacudia o corpo de uma forma espirituosa e desajeitada.
- Desde quando passa a noite comigo e nem me dá um beijo de bom dia? – soltou um riso lindo no canto da boca.
- EU DORMI COM VOCÊ? – gritei histérica, cuspindo o suco de laranja na cara dele.
- Gemeu arrastado meu nome ontem. Qual o problema, não gostou? – falou limpando com o pano de prato a sujeira que eu tinha feito sem querer ao seu lado.
- Por que não me lembro de nada, Newt? – o apagão em minha mente me deixava confusa. Precisava preencher aquela lacuna com informações.
- Como não se lembra da gente fazendo amorzinho no seu castelo, princesa? – continuou gargalhando e ai me liguei que era mentira toda aquela insinuação.
- Como você é tonto garoto! – respirei aliviada, sacudindo minha cabeça.
- Isso foi uma pergunta ou uma afirmação, Charlie? – enfiou um imenso pedaço de bacon goela abaixo, mastigando com um “croc” tenebroso.
- Vai me deixar ganhar essa brincadeira? – lancei curiosa.
- Claro que não espertinha! É tão importante assim ganhar de mim? – me provocou, levando o copo de suco a boca.
- Não mais... – sussurrei curta, fazendo Newt engolir a seco a comida que estava na sua boca, me encarando preocupado.
- Charlie, precisamos conversar – falou buscando por minha mão, encarando meus olhos perdidos. Sua expressão era séria e extremamente protetora.
Concordei e deixei Newt falar e falar e falar durante a hora seguinte. Com cuidado e escolhendo bem as palavras, Greene confidenciou tudo que eu tinha passado na noite anterior com Gally, desde as investidas no Space Needle até a violência no bar, seus cuidados com meu corpo na suite e a visita do Dr. Pattinson pela madrugada. Não contive meu choro histérico quando ele deu detalhes da forma como Gally havia agido na noite passada.
- Charlie, eu sinto muito por tudo... – chorou junto comigo, tentando me acalmar com um abraço. Eu recuei seu toque e pude notar como aquilo o deixou magoado. Recuei pois estava ferida. Recuei pois senti nojo de mim mesma. Recuei por acreditar que aquele garoto merecia algo melhor do que eu.
Mesmo assim Newt insistiu e pediu perdão de joelhos por tudo que tinha feito comigo, dizendo que eu realmente era especial para ele, afirmando que se ele não tivesse feito aquela maldade do vídeo comigo nós dois ainda estaríamos juntos e Gally nunca teria ousado relar o dedo em mim – Me perdoe, Grey, por favor – ele soluçava, com os olhos vermelhos de tanto chorar – A culpa foi minha. Eu sou um monstro. Eu... Eu amo tanto você – confessou.
Essa última parte eu ainda não sabia se levava a sério ou não depois de tudo que ele fez contra mim e disse que o deixaria na geladeira até sentir que ele estava mesmo falando a verdade sobre seus sentimentos comigo. Mas que eu consideraraia aquilo com carinho.
Após o café recheado de sentimentos e sensações diversas, Newt levou-me até o consultório do Dr. Pattinson, aberto única e exclusivamente para eu fazer alguns exames. No caminho, Greene parou seu carro umas três vezes para eu vomitar. Não era o bacon com excesso de gordura no café da manhã. Era Gally que estava causando aquilo.
- Ainda não acredito que você me viu nua... – balbuciei acuada no banco de couro do seu Cooper engraçadinho.
- Relaxe, Lottie. Tente esquecer isso. Esse foi o menor de todos os problemas ontem – ele disse buscando pela minha mão em meus joelhos.
- Desculpe... – pedi rápido ao puxá-la para longe dele.
- Não precisa ter medo de mim, Charlotte. Eu não vou te machucar – ele riu fraco, ainda indeciso sobre o que fazer com sua mão que havia levado um fora da minha.
- Você já me machucou – sibilei arrisca, fritando aquele garoto com meu olhar matador. Greene suspirou e finalmente ficou quieto, apenas servindo de motorista.
Na clinica, Pattinson me recebeu com um olhar puro, me abraçando apertado enquanto a esposa dele nos acompanhava com os olhos cheios de lágrimas. Primeiramente conversei sozinha com ela durante uns quarenta minutos. Lexie era psicóloga e explicou alguns sentimentos que poderiam surgir em mim durante a semana, por conta do estupro. Após isso o Dr. levou-me para a sala de coleta, retirando meu sangue, explicando que era para analisar se eu tinha contraído HIV, por exemplo, ou se estava grávida. Não escondi minha cara de pavor quando ouvi essas opções e notei Newt igualmente tenso, sempre acompanhando tudo de longe, com os olhos embebecidos em lágrimas.
Após a coleta, Pattinson pediu para analisar meu corpo, entregando-me um avental. Trancada na ante sala do ultrassom, senti meu coração disparar com a possibilidade de ficar nua debaixo daquele tecido atingir meu interior fraco – Calma, Charlotte! Ele é só seu médico! Te conhece desde pequena, relaxe sua idiota! – repassei, tentando manter minha postura firme.
Ao notar minha tensão, Pattinson sugeriu – Quer Lexie e o Sr. Greene aqui com você? – concordei com a cabeça, suspirando.
Os dois entraram na sala, sentando-se do lado direito da maca onde eu estava. O Dr. mediu minha pressão, auscultou meus batimentos cardiácos e observou meu corpo, a procura de alguma marca, além da picada recebida no carro por um dos meus agressores.
- Charlotte, preciso te examinar mais a fundo. Você compreende o que preciso fazer? – Pattinson perguntou preocupado, me mostrando o ultrassom. Apenas mordi meus lábios, com uma cara provavelmente apavorada.
- Todos estamos aqui, minha querida – Lexie disse fazendo um cafuné em meus cabelos – Nada vai lhe acontecer – me encorajou.
Deitei meu corpo na maca, encarando o teto da sala de luz fraca. Pattinson pediu licença para me tocar, afastanto minhas pernas e posicionando elas sobre dois apoios, um de cada lado da cama. Envolveu a ponta do ultrassom o com uma camisinha, despejou um gel próprio e quente no aparelho e com cuidado, deslizou aquilo para dentro de mim.
Minha respiração acelerou. Meu coração falhou. Meu rosto estava quente, assim como meu corpo febril. Não contive meus impulsos após lembrar Gally puxando minha calcinha com raiva, rasgando minha carne numa investida brusca, enquanto dizia o quanto ele queria me foder a vida inteira – Céus, como você é gostosa Charlie. Preferia fazer isso da maneira mais fácil, mas você sempre foi uma vadia comigo, me provocando e me usando. Agora chegou a minha vez de te usar, sua putinha – um flash repentino do estupro me alcançou.
Descontrolada, passei a derramar diversas lágrimas dos meus olhos, que escorriam feito duas cascatas. Elas rolavam pela minha maçã do rosto, molhando meu pescoço, enquanto o Dr. Pattinson examinava meu interior.
- Você precisa se acalmar, Charlie! Assim posso te machucar – ele pediu preocupado com meu estado.
- EU QUERO SAIR DAQUI! ME TIRA DAQUI! – gritei perturbada, debatendo-me na cama – POR FAVOR, NEWT – implorei ao loiro ao meu lado, sem reação ao meu súbito chilique.
Pattinson parou no mesmo instante o exame, fazendo-me saltar da maca e correr assustada para a ante sala. Trancada lá dentro, chorando feito uma garotinha assustada, pude ouvir Lexie conversando com eles sobre meu estado pós traumático.
- Newton, por favor, preciso que você tenha muita paciência e tato com Charlotte nos próximos dias. Ela está sensível, provavelmente sentindo-se culpada pelo estupro e vai evitar qualquer contato físico e mais íntimo com qualquer pessoa, inclusive com você. Vou receitar alguns remédios para ela, mas me ligue caso sinta que ela piorou com relação a isso.
Me vesti ignorando as lágrimas que ainda desciam pelo meu rosto e voltei a encará-los lá fora ao abrir a porta com raiva. Após mais uma longa conversa, enquanto Pattinson analisava meu sangue, ambos pediram que eu prestasse queixa na delegacia. Não sei se queria isso. Não estava com vergonha nem nada. Meu medo era a reação de Tommy ao saber daquilo, então expus minhas preocupações aos dois homens e mulher que me escutaram com paciência e carinho. Deixaram nas minhas mãos a decisão e disseram que me apoiariam, mesmo não concordando com ela. Optei por esconder de Thomas. Tinha a mais absoluta certeza de que ele mataria Gally e não queria meu primo passando sua vida na cadeira, então o Dr. achou uma boa ele mesmo ameaçar o grandalhão caso ele se aproximasse mais de 10 metros de mim. Voltei para casa mais tranquila ao saber que o resultado do exame para HIV e gravidez haviam dado negativo, assim como reagente para outras DSTs.
Passei o restante do dia na minha casa, tentando sobreviver na companhia de Newt, assintindo alguns filmes antigos a base de pipoca, coca-cola e Nutella, preparados gentilmente pelo loiro. Greene sabia que aquilo acalmava qualquer mulher.
Ele manteve uma distância segura de mim, sendo sempre muito solicito e cavalheiro, respeitando meu espaço e evitando me tocar de qualquer maneira ou trocar olhares mais longos comigo. Pensei no quanto eu era fraca. Na verdade pensei na Lottie enterrada anos atrás. Ela estava voltando aos poucos e isso me deixou apavorada.
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