CAPÍTULO ESPECIAL - DAWN.
"Talvez a madrugada seja para pensar, e não dormir."
A madrugada silenciosa era irrompida apenas pelo característico som dos muros se movendo dentro do labirinto. Tudo permanecia em paz.
Dentro da sede, no cômodo em que os recém-chegados repousavam, agora adormecidos, Gally estava inquieto. Não conseguia dormir, de forma alguma. Sentado defronte para as camas, afiava uma de tuas facas, a qual roubara do baú de armas e escondia para si, por precaução. A mente crepitava em pensamentos ruins. Poderia até mesmo levantar e, naquele momento, assassinar cada um dos três, com um corte preciso na garganta. Mas seria óbvio demais. Limitou-se a esperar, a visão começando a queimar de uma espécie de exaustão e ansiedade.
Levantou-se, caminhou em direção aos novatos, e observou um por um. A garota em nada lhe chamou atenção, mas parecia menos desprezível do que Teresa, talvez até conseguisse conviver com a mesma. Já não podia dizer o mesmo do tal Perseu.
Perdido em meio á pensamentos, não notou algo. Um par de olhos esverdeados, que em meio á semiescuridão, lhe fitavam. Quando os notou, levou um susto, mas não deixou transparecer. Pensou em chamar os demais, mas logo pareceu não valer a pena. Acordar aqueles idiotas não adiantaria de nada, no dia seguinte resolveriam o caso.
Diferente dos outros dois, o menino não disse nada. Ainda parecia muito assustado, e não tirava os olhos de Gally por um instante que fosse.
-Perdeu alguma coisa, seu plong? -Atirou no ar, baixo o suficiente para não acordar a ruiva e o platinado.
Ele negou. O maior se aproximou dele, que piscou algumas vezes, freneticamente.
Mentalmente, o clareano decidiu que deveria soltá-lo. Não tinha sentido desperdiçar as cordas que poderiam ser úteis para algo mais importante. Então, sacou uma das facas, e estava prestes á cortar, quando o outro disse:
-Não… Me machuque. Por favor. -A voz era doce.
Ele olhou para baixo e viu o menor encolhido, quase preparado para receber um soco. O primeiro pensamento que se passou por tua cabeça foi de como aquilo era patético, mas este deu lugar á um sentimento misto de curiosidade e estranha admiração.
Por que parecia tão frágil?
-Se lembra do teu nome? –Questionou.
O pequeno fixou o olhar em algo, pensativo. Gally notou que aquele deveria ter uns quinze anos, no máximo. O mesmo murmurou algo inaudível, e o mais velho pediu para que repetisse.
-Castiel.
Era um nome diferente, não soava ruim. Lembrou que havia um anjo assim chamado, mas não fazia ideia de qual fosse. Enfim, não importava.
Em dois gestos, libertou o menor. Então pode ver os olhos do garoto marejarem. Se perguntou o motivo, e fitou os punhos do mesmo. Estavam mais do que roxos, quase pretos. Devia doer muito. Mas o menor se segurava com todas as forças para não chorar.
Continuava patético.
-Vai passar logo. Durma de novo. Não tem nada para fazer agora.
Ele assentiu.
-Não… T-em luz?
-Luz? Pra que?
O garoto fez um sinal de negação com a cabeça, como quem diz “nada importante”. Mas Gally sacou, e riu. Gargalharia se pudesse.
-Tem medo de escuro, trolho? -Esboçou um sorriso maldoso.
Castiel ficou um pouco vermelho, e encolheu os ombros.
-Claro que tem! Céus, não acredito. -Se perdeu em meio às risadas, mas parou bruscamente ao olhar mais uma vez para o menino.
Parecia magoado, e se antes já era pequeno, agora parecia menor ainda encolhido da forma que estava. Gally sentiu algo. Uma pontada no… Coração. Culpa? Não, impossível.
-Pare de ser ridículo. Feche esses olhos de mértila, e durma.
O outro ia obedecer, virando-se de barriga para cima, quando de repente gemeu de dor.
-O que foi?
Os olhos dele transpareceram dor, e o mais velho se perguntou o motivo.
-Fala logo!
Castiel se sentou na cama, e devagar tirou tua blusa. Gally queria saber por que, mas não pode deixar de prestar atenção. A pele era clara, e o peitoral torneado, com abdômen definido. Ainda sim, permanecia parecendo indefeso. Na parte da frente, uma única outra tatuagem. Um número, em seu ombro. Onze. O que significava?
De vagar, ele virou-se de costas. E lá estavam elas. As asas majestosas. Porém, agora, havia algo errado. Estas se encontravam contornadas por arranhões, vermelhos e aparentemente inflamados. Mal limpos, com vestígios de sangue seco.
Como não havia os reparado antes, quando descobriu a tatuagem? Se o garoto dormisse daquela forma, acabaria por piorar. E o idiota ainda podia contar a alguém que o vigia não fez nada. Droga.
Sem dizer uma palavra, saiu do quarto. Em breve voltou, com um vidro de álcool e um lenço. Não daria satisfações do que faria, apenas agiria rapidamente.
-Vire-se. -Pediu para o garoto, que o fez prontamente, porém inseguro.
Agora era a parte difícil. Gally molhou o tecido no álcool, e escolheu em qual ferimento aplicaria primeiro. Quando tocou a pele tatuada do menor, ele urrou.
-Shhhh! Quer acordar todo mundo, porra!
O outro se calou, mordendo as bochechas, lábios, arranhando as palmas das mãos, tudo para não deixar nenhum som escapar. No começo, o clareano não ligava em machuca-lo. Apenas aplicava com força, sem pensar. De repente, ouviu um soluço. Devia tê-lo ferido mais. Revirou os olhos. Não pediria desculpa, mas tentaria amenizar a dor, não aplicando daquela forma.
No próximo machucado, visou tomar um pouco mais de cuidado, em vão. A mão se deixou pesar quase involuntariamente, fazendo o menor arquear a coluna. Gally respirou fundo. Olhou diretamente para as asas, e focou em um ponto ferido. Os detalhes da pele clara eram quase tão desenhados quanto à própria tatuagem. Muito delicada, aparentemente. Pensando nisso, pousou o lenço em um dos últimos ferimentos. Castiel não demonstrou ter sentido tanto, relaxando a coluna.
Terminou o serviço. Pegou os utensílios e os jogou em um canto do quarto.
-Agora deite e durma. -Falou simplesmente, se sentando no chão de madeira, encostado na parede. O mais novo deitou-se de lado. Cobriu-se e suspirou, a dor estava passando.
-Obrigado. -Murmurou, alto o suficiente para Gally erguer o olhar.
-Cale a boca, e durma. -Frisou a última palavra.
Logo, ele acabou por se entregar ao sono. O turno de Gally acabou, dando lugar a um construtor. Saiu dali caminhando, com um único pensamento em mente.
"Ele não precisava agradecer”.
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