História Memórias De Um Novo Mundo - O dia de amanhã

Assim que o dia amanheceu, o vazio que eu sentia na noite passada foi substituído por um brilho nos meus olhos de teor sexual, quase não consegui dormir na minha cela pensando no que eu poderia ter feito com Mark e não fiz. Tive a chance de me sentir mais humana, de me entregar a algo tão natural do ser humano, mas o passado conseguia me prender a coisas que não tinham mais solução.
Perdi meu filho. Meu irmão mais velho.
Eram as pessoas que eu mais amava e me importava e então encontrei Glenn, Kim e meus outros dois meio-irmãos mais novos, perdi dois deles. Encontramos os irmãos Dixon e T-Dog e depois  achamos o acampamento, várias pessoas do grupo morreram. E continuou nesse mesmo ritmo, achamos que o CCD nos daria respostas, o lugar explodiu, a fazenda então virou nossa casa e então os zumbis tomaram conta, depois disso passamos vários meses na estrada e por fim encontramos a prisão.
Agora sim parecia que tinha tudo pra dar certo e ai surge o Governador como pedra no nosso caminho, novamente quase perdi o Glenn e Maggie, Daryl se foi e Oscar morreu na confusão em Woodbury, era coisa demais pra pensar, meu desejo era de ligar o foda-se e viver sem ficar apreensiva ou com medo de perder as pessoas que eu amava.
Então eis que o Governador surge com alguns de seus homens armados, atiram contra a prisão, um dos homens vem com uma van e arrebenta nosso portão dando abertura para os zumbis. Daryl e Merle estavam voltando para a prisão e nos ajudaram, o Governador se foi satisfeito com o que tinha feito.
Axel foi atingido por uma bala e morreu sem nem saber o que estava acontecendo, transformaram nosso "lar" num verdadeiro inferno.

- Eu já disse que não vamos sair! - Rick vociverava assim que todos entramos no bloco de celas, Hershel estava firme com a idéia de que deviamos ir embora de lá, não era mais seguro.
- O Rick tem razão, a gente lutou pra conquistar esse lugar e não vamos desistir assim - falei abertamente para que todos ouvissem.
- Claro, é melhor viver como ratos - Merle resmungou atrás de uma cela mais afastada onde tinhamos trancado ele. Contou que Andrea estava viva e em Woodbury.
- E você tem uma ideia melhor? - falei com agressividade.
- É. Deviamos ter saido ontem a noite e agora estar lutando por mais um dia de vida. Mas agora perdemos essa chance não é mesmo?
- A gente não tem medo daquele desgraçado - Daryl falou da parte de cima no bloco.
- Mas deviam, aquilo que vocês viram, foi só o modo dele tocar a campainha.
Todos ficamos olhando para Merle que tinha um sorriso debochado na cara de "estamos todos ferrados".
- Ele tem vários homens e muitas armas.
- Tira era daqui. Isso tudo é culpa dele. - Maggie falou olhando com ódio para o homem.
- Não, não. O idiota tem razão. - falei semi-cerrando os olhos para Merle que me lançava um sorriso malicioso a Daryl que concordava sutilmente.
- E também agora não interessa de quem é a culpa, a gente precisa de uma solução - terminei rosnando essas palavras.
- Precisamos sair daqui, olha isso o Axel está morto! - Mark que estava a um canto com os braços cruzados fechou com força os olhos depois de Hershel falar isso - E o Governador vai voltar pra matar o resto de nós.
- Hey! Volta aqui! - Hershel se levantou e foi cambaleando até Rick que ia se retirando sem dizer nada. - Você não está bem e todos nós sabemos porque mas agora não é hora pra isso. Pus a vida da minha família em suas mãos, honre agora a responsabilidade que você quis assumir tempos atrás. - e finalizou.
Rick assentiu fitando vagamente todos que estavam ali.

- A gente devia juntar toda comida e munição que temos e ver quanto tempo pode durar até podermos buscar mais - Glenn sugeriu meia hora depois que Rick tinha voltado.
- Já fiz isso. Assim que ele foi lá pra fora. - falei com a voz aspera.
Estavamos em uma pequena roda tentando discutir novamente qual seria o próximo passo.
- Maggie ficará de guarda junto com o Glenn, Hershel e os outros ficam aqui. - Rick continuou.
- Eu podia subir lá na torre e acabar com os zumbis que estão no pátio - Daryl se ofereceu.
- Não vai dar, temos pouca munição... - falei tentando pensar em algo que desse para resolver, por hora.
- Erin tem razão, se o Governador voltar vamos precisar dessa munição, Merle disse que as estradas devem estar bloqueadas então não vamos conseguir buscar mais. - Rick concluiu, estava muito tenso mas raciocinando melhor depois de ter tomado um ar.
- A gente já passou por isso antes...- Daryl falou pra ninguém em especial.
- É mas antes era só a gente, não existia um espião entre nós! - Glenn gritou, a raiva do que Merle tinha feito com ele subindo a cabeça.
- A gente vai discutir isso de novo? O Merle vai ficar com a gente agora então é bom você se acostumar com isso! - Daryl falou cuspindo as palavras e subiu as escadas até a sua cela. - Vão se acostumando, todos vocês!
- É sério Rick, não acho uma boa o Merle morando aqui com a gente - Glenn sussurrou assim que Daryl desapareceu em sua cela.
- Eu não posso expulsar ele! - Rick falou entre dentes.
- Eu não pediria pra você morar com o Shane depois dele ter tentado te matar! - Glenn não controlava mais seu tom de voz, estava bravo demais para se conter.
- Glenn, foi horrível o que ele fez com você, mas o Merle tem treinamento militar e mais do que nunca precisamos disso agora. - começei falando o mais ternamente possível - Não subestime a lealdade que ele tem com o irmão.
Eu olhava Glenn nos olhos, sentia meus olhos brilhando, ele percebeu mas não conseguiu dizer nada.

- Oi. - Daryl remungou a hora que me viu encostar na entrada de sua cela, eu o observava sentado na cama.
- Não tive a chance de dizer, fiquei feliz que tenha voltado.
- É. E pra que? Pra isso? - ele respondeu num tom desolador enquanto brincava com uma flecha.
Me aproximei e sentei em um banquinho que estava próximo a ele.
- É o nosso lar - falei dando um leve sorriso de lado. Daryl olhou a cela de cima a baixo e parou os olhos em mim.
- É uma tumba.
Mordi o lábio inferior e fechei os olhos.
- Era o que eu costumava dizer...Até você ir embora e voltar feito o filho pródigo - Daryl tinha os olhos muitos fixos na flecha em suas mãos, no fundo eu sentia que ela sabia onde eu queria chegar com aquela conversa.
- Olha, Merle é seu irmão, mas...não é bom pra você. - falei um pouco hesitante, ele fez uma espressão estranha por ter sido tão delicada em tocar nesse assunto.
- Você pode achar que não mas e-eu m-me... minha voz começou a falhar, Daryl semicerrou os olhos. - Me importo com você.
Minha respiração estava forte e eu observava apreensiva o arqueiro que estava um pouco desconfortável.
- Não deixe ele te mudar, Daryl. Você é bom, veja só onde você chegou.
Ainda desconfortável ele olhou ao redor e fixou seus olhos nos meus e soltou uma risada, quando me dei conta do que tinha falado acabei rindo também.
- É. Adorável. - ele comentou tentando segurar a risada.
- Ah cala boca - me levantei do banquinho ainda rindo. - Não esquece que hoje é nossa vez de ficar na torre de vigia - ele assentiu dando um belo sorriso descontraido, não tinha ideia do quanto ele se iluminava ao sorrir.
- Erin! - era Kim, vinha correndo em nossa direção com o rosto quase sem cor.
- É-é o Rick, p-parece que tem a-alguém se aproximando - ela gaguejava e chacoalhava frenéticamente as mãos, ainda estava muito assustada pelo último ataque que tivemos - ele quer vocês lá!
Sem pensar duas vezes Daryl pegou sua besta e eu peguei a T-10, Kim ficou ali só temendo o pior enquanto iamos pra fora.
Chegamos ao pátio já podendo ver que era Andrea, vinha com um zumbi que estava sem a mandíbula e os braços, preso em uma espécie de coleira, ela o largou pra fora assim que Rick abriu o portão gritando se tinha alguém junto, ele a revistou e a levamos pra dentro da prisão, a mulher mau podia acreditar que depois de tanto tempo separados tratariamos ela daquele jeito, mas Andrea era namorada do governador e qualquer cuidado era pouco.
- Depois que você sumiu lá na fazenda achamos que tinha morrido - disse Carol chorando enquanto abraçada a amiga que retribuia e olhava todos ao redor.
- Hershel, o que... - ela disse olhando para onde um dia existiu a perna do Hershel.
- Cadê...cadê o Shane? - Olhamos apreensivos para ela que entendeu o recado.
- E os outros? Lori, T-Dog a Kim? - ela girava em volta do próprio corpo tentando reconhecer todos os rostos.
- Lori não sobreviveu, deu a luz a uma menina. - me pronunciei.
- T-Dog também não. - Carol falou com dor relembrando que ele é quem tinha se sacrificado por ela, Andrea olhava com muito sofrimento para Rick e Carl que tinham perdido alguém tão importante, olhava para mim também.
- E-eu sinto muito - ela dizia apontando pai e filho e depois pra mim.
- A Kim ta bem, só está assustada e preferiu ficar com a Judith. - Daryl esclareceu.
- O que veio fazer aqui Andrea? O estrago que o seu namorado já não foi suficiente? - Rick falou friamente.
- Por favor, não sou inimiga - ela retrucou indignada com a acusação - Vim conversar! Precisa ver vocês e saber que estavam bem. Phillip disse que vocês atiraram primeiro e teve de reagir.
- Ele mentiu, nos atacou e acabou matando um dos detentos, a gente gostava dele - Rick falou recebendo um olhar de surpresa de Andrea que não entendia porque o namorado faria isso, Mark que estava ali se encolheu ao ouvir a menção ao amigo.
- Rick me escuta - ela disse fechando os olhos e seu tom fazendo com que todos ficassem mais atentos ao que dizia. - Ele está se preparando pra guerra, vocês precisam conversar, resolver isso antes que mais pessoas inocentes morram! - ela terminou visivelmente desesperada com a situação, a Andrea de antes teria mantido a calma.
- Não existe conversa Andrea, você não entende, o fim que a gente pode dar nisso é matando o Governandor - Glenn falou amargamente relembrando que quase morreu a mandato do homem.
- Quando você voltar pode dizer a ele se encostar um dedo em qualquer um daqui eu mesmo arranco o outro olho dele.
Daryl disse isso friamente segurando sua besta ao lado do corpo. Derrepente se ouve o choro de Judith, Kim aparece com a bebê no colo e eu vou atrás tentar acalmar a pequena enquanto os outros continuaram a conversa com Andrea por mais um tempo.

- Você tá bem? - pergunto a Kim que parecia estar em outro mundo.
- Uhum - ela resmunga forçando um sorriso que não convencia ninguém, fico observando em silêncio enquanto embalava Judy em meus braços, ela olha para baixo finalmente desabando, as lágrimas escorrendo por seu rosto jovial.
- Eu sou fraca Erin - ela disse com a voz trêmula, aquilo me atingiu como uma facada no estômago, pude ver todo o medo percorrer seus olhos.
- Sou fraca e vou morrer por isso.
- Não diga isso - falei na tentativa de reconfortar minha irmã mesmo no fundo sabendo que era verdade, se fosse igual ao que eu era meses atrás eu mesma já teria levantado essa questão e ainda diria que ela era uma idiota fodida.
- Você vai mudar, vai ser forte, só precisa de tempo. - falei largando Judith no berço e enxugando as lágrimas de Kim que pareceu surpresa com o gesto.
- Todos mudam - disse mais pra eu mesma do que pra ela, relembrando da pequena converção do meu comportamento rude para com todos. Ela pareceu pensar a mesma coisa pois seus olhos brilharam, ela só saiu dali porque viu que Carol e Andrea se aproximavam de nós e aparentemente estavam em uma conversa delicada a julgar pela expressão das duas. Kim não precisava de mais gente vendo ela em um momento de fraqueza.
- Você não pode ir embora sem antes conhecer a bravinha - falei enérgica pegando de novo a bebê no colo que acordou e voltava a resmungar.
- Oi bebê - Andrea disse numa intensa admiração pegando a pequena. - Você é muita preciosa.
Nós três demos risadinhas de prazer quando Judith segurou o dedo de Andrea e começou a chupar.
- Aposto que foi o Daryl que colocou o apelido de bravinha.
Carol e eu acentimos, senti um sorriso bobo se formar no meu rosto quando ela mencionou o Dixon mais novo.
- É sério isso? Você e o Daryl? - Andrea falou surpresa e Carol se afastou me olhando confusa.
- O que? Não, não, não - falei rápido demais, não ia imaginar que um sorriso idiota daria a entender que a gente tinha alguma coisa.
- Capaz, ela está com Mark, aquele presidiário loiro que estava lá com a gente. - Carol fala dando de ombros como se fosse algo muito óbvio, arregalei os olhos.
- Não me olha assim Erin, vi ele voltando da torre com a boca inchada e o cabelo bagunçado.
Andrea me lançou um olhar malicioso e Carol deu uma risada que dizia que tentar esconder isso era inútil, só chacoalhei negativamente a cabeça e sai dando a desculpa de que tinha coisas pra fazer.

Horas mais tarde Andrea voltava a Woodbury, Rick permitiu que ela voltasse com um de nossos carros para garantir que ficasse mais segura, nos despedimos e ficamos dentro da área de celas até o anoitecer, comemos todos em silêncio e acendemos algumas luzes no chão como se fosse uma pequena fogueira artificial. Beth, Hershel e Carol estavam sentados em volta dela Kim e Carl estavam encostados em uma parede próxima, Glenn e Maggie sentados na escada com as mãos entrelaçadas e de pé Rick, Daryl e eu, Michonne e Mark estavam bem afastados de todos. Beth começou a cantar e todos observavam a garota.
- Belo encontro hein. - Daryl comentou baixinho para nós.
- Situação difícil. Pra todos nós - Rick respondeu no mesmo tom enquanto embalava Judy em seu colo.
- Andrea é persuasiva, pelo que ela falou o desgraçado tá armado até os dentes, temos que nos preparar. - afirmei cruzando os braços.
- Vou sair amanhã. Vou pegar um caminho para a cidade e vou levar a Michonne e o Carl junto, ele tá pronto - disse Rick fazendo menção de sair para colocar a bebê no berço. - Quero que você fique no comando enquanto eu estiver fora - falou indicando Daryl - Qualquer coisa que sair do controle você é quem manda, Erin você divide as tarefas de cada um, sei que é boa nisso.
Daryl e eu assentimos e o líder saiu deixando nós dois.
- Você no comando? Mesmo que por um dia, quem diria hein. - sussurrei em tom de aprovação, o arqueiro me olhou de soslaio e deu de ombros.
- Imagine que louco se algo acontecesse com você e só restasse a primeira dama aqui pra resolver tudo? - falei passando as mãos pelo meu rosto e corpo até chegar na cintura dando uma risada um pouco alta quando Daryl soltou um muxoxo.
- Não se preocupe, não vou te fazer mal. - finalizei subindo as escadas direto pra minha cela, senti uma incomodação atrás de mim, vi Mark olhando para Daryl em um misto de ciúme e ódio, foi tão intenso que meu corpo se arrepiou tirando todo e qualquer vestigio de desejo que em qualquer momento senti por ele.
Adormeci com a certeza de que tinha algo errado com Mark, talvez não fosse quem parecia ser.