Capítulo XXVI
A viagem não foi muito longa, mas o moreno pensou que fossem comer a algum local público e não que acabasse na casa de Nina. O marido dela ainda estava na clínica e ainda que a casa fosse visivelmente de classe alta, não havia qualquer empregado. Aliás, Nina pediu desculpa por não ter preparado nada antes de sair de casa, porque mesmo ela não tinha a certeza que fosse conseguir encontrar e convencer Eren a acompanhá-la. Consequentemente, os dois acabaram por começar a preparar uma refeição na cozinha ao som de música de ritmo latina e outras que Eren não pôde deixar de comentar.
– Pensava que era só a Annie, o Armin e os nerds dos eventos japoneses que ouvissem estas músicas. – Comentou Eren, provando o tempero da comida.
– BTS é sul-coreano, Eren. – Retificou Nina com um ar pouco impressionado. – Eu nunca fui muito esquisita com a música em geral, mas foi sem dúvida, o Levi e a Hanji que me fizeram escutar bandas coreanas e também alguns cantores japoneses.
– E ver anime, aposto.
– Claro. – Confirmou. – Pelo teu tom de voz…
– Já vi a minha dose na companhia de Armin e Annie que são mega fãs de muitas séries e admito que gostei de algumas. Não são as histórias de crianças que eu pensava que eram. – Admitiu.
– Pronto, não és um ignorante. Nem tudo está perdido. – Sorriu, colocando a mesa na cozinha.
Eren pensava o contrário. Ele estava completamente perdido, sem compreender por que razão aquela mulher insistia tanto em falar com ele e agora, estavam os dois na cozinha a preparar o jantar e a falar sobre música e animação japonesa. Não era o que esperava quando aceitou entrar no táxi. O que esperava que fosse um jantar estranho na companhia de alguém que parecia ter dificuldades em aceitar a palavra “não”, parecia longe de acontecer. Era no mínimo invulgar que estivesse naquela situação e embora existisse algum desconforto pelo desconhecido, a presença da mulher ao seu lado era de uma forma que não podia explicar, aconchegante. Como se apesar de estar numa casa de elevado status social, a sensação de que estava numa casa onde as pessoas podiam conversar ou permanecer num silêncio confortável, era possível. Diferente do silêncio permanente, sozinho e até gélido que sempre recordava da cidade de Sina.
Preparam a refeição para três pessoas, ainda que o marido de Nina tenha dito para não esperarem por ele e iniciarem a refeição. Ela encolheu os ombros e sentaram-se frente a frente. As trocas de palavras sobre música ou séries mudaram de uma forma quase subtil para outros temas. Nada muito invasivo e quiçá fosse por isso, que não teve muitos problemas em falar com ela.
Não recordava em que momento falou mais do que pretendia, mais do pensava ser possível e em certos momentos, envergonhou-se e esperou que viessem palavras ásperas ou no mínimo, um olhar que o julgasse pelas coisas que tinha contado.
Era tão estranho, estar sentado à mesa com uma desconhecida a falar dos seus fantasmas e não sentir tantas hesitações como achava que seria o normal. Como se falar com um de desconhecido fosse mais simples e podia ter mentido, omitido e até floreado os acontecimentos, os seus pensamentos e sentimentos, mas não o fez.
– Essa pessoa sou eu. – Concluiu, passando a mão no rosto e limpando uma das poucas lágrimas que escaparam e com a outra mão colocou o copo vazio sobre a mesa. Os pratos também já estavam vazios, mas Nina não se moveu, escutando atentamente e deixando escapar poucas palavras de incentivo para que deitasse tudo para fora e não hesitasse. – O monstro de que ouviu falar.
A mulher de elegantes cabelos repletos de pequenas tranças que caíam sobre as suas costas, esboçou mais um dos sorrisos compreensivos.
– Está na hora de retribuir, mas antes uma sobremesa. Tenho fruta e mousse de chocolate, qual preferes? – Questionou a mulher, saindo da mesa.
– Pode ser mousse. – Disse ainda um pouco desorientado com tudo o que tinha dito sem pensar. – Retribuir?
– Já partilhaste bem mais do que esperava, portanto, o justo será que faça o mesmo. – Abriu o frigorífico e retirou duas taças de mousse. Em seguida, pegou em duas pequenas colheres numa das gavetas do móvel da cozinha. – Cheguei a dizer-te antes que eu e o Levi temos uma relação bem próxima, já te perguntaste do porquê?
– Porque o seu marido é terapeuta dele?
– Ó se fosse apenas isso. – Disse com um sorriso mais triste, sentando-se novamente.
– Obrigado. – Murmurou ao ter a taça e a colher colocada na frente dele.
– Essa é uma pequena parte, querido. Uma parte insignificante. Nós temos coisas em comuns. Nós partilhamos fantasmas, demónios e escuridão. No fundo, sou obrigada a acreditar que todos nós acabamos por criar algum monstro dentro de nós e a questão é, se o deixamos ou não alcançar a superfície. – Disse a mulher, sentando-se do outro lado da mesa, captando a atenção do moreno com aquelas palavras. – No entanto, ao contrário do que aconteceu com o Levi, eu tive o apoio dos meus pais. Eles fizeram o melhor que puderam e sabiam, mas é muito complicado quando tu próprio não aceitas ajuda. Não importa o nível social que alcances aqui ou em qualquer lugar, para muitos, pessoas como eu nunca deveriam chegar aí.
– Pessoas como…
– Não és tão inocente ao ponto de achar que a minha cor de pele não incomoda ninguém, pois não? – Questionou. – Cresces e desde pequena achas normal ter e brincar só com bonecas branquinhas, as personagens dos filmes mais bonitas, as princesas são branquinhas, as grandes marcas colocam anúncios com loiras, a pele branca é um prestígio e a outra é suja, sinónimo de classe baixa e vítima dos mais diversos comentários. Na escola, começas a entender que nem sempre querem brincar contigo, frequentas as melhores escolas mas os professores e funcionários olham como se não encaixasses ali e não importa o quanto os teus pais digam que te amam e que te aceitam como és porque cresces a odiar-te. Todos os dias olhas a tua imagem no espelho e desejas ser diferente. Mais do que isso, desejas nunca ter nascido. – Levou a colher com o doce de chocolate até à boca, aproveitando para fazer uma pequena pausa. – Tens poucos amigos e cometes o erro de acreditar que estão ao teu lado, mas diante da dificuldade, chegam inclusive a fingir que não te conhecem e então, tentas encontrar formas de compensar e eu comecei por encontrar conforto na comida. – Com um ar pensativo, segue-se mais uma pequena pausa. – E depois não és só a preta da sala, mas também a gorda. Sempre que abres a boca para falar, todos mostram os sorrisos jocosos. Queres deixar de ser o centro das atenções, mas não deixam de humilhar-te todos os dias. Queres alguém com quem conversar, mas no fundo, sabes que não podes confiar em ninguém e então… a comida deixa de ser suficiente. Odeias-te ainda mais quando te vês ao espelho e segue-se o álcool, as drogas, os cortes e as inúmeras tentativas de suicídio. Os teus pais começam a odiar-se por se sentirem impotentes diante do sofrimento da filha e perdem a conta de cada vez que me encontraram numa poça de sangue ou em overdose. – De olhos fixos no moreno, acrescentou. – Mas eu lembro-me de cada tentativa que fiz. Eram reais e amaldiçoei os meus pais por cada vez que me pararam. Eu queria colocar um ponto final em tudo, fugir dessa realidade na qual não queria ter nascido.
– Como é que…?
– Contra a minha vontade, acabei internada e pensei que pudesse ser o pior que me podia ter acontecido.
– Então, conheceste o teu marido…? – Ia perguntar Eren, juntando as peças da história.
– Irónico, não é? Que o terapeuta que ataquei e insultei tantas vezes, mais tarde se transformasse na pessoa que mais amei e penso que é quando vês esse sentimento refletido nos olhos de outra pessoa, que começas a substituir todos os fantasmas, demónios e ódios por outras coisas. – Sorriu, retirando mais uma colher do doce. – Eu bati no fundo, Eren. Não penso que pudesse descer mais do que aquilo que aconteceu e as coisas só melhoraram, quando aceitei ser ajudada, quando aceitei que qualquer coisa precisava de mudar e eu tinha que lutar para que o mundo não me deitasse abaixo daquela forma. Quando conheci o Levi, reencontrei demónios refletidos nele, encontrei fantasmas igualmente terríveis e dolorosos e ele aceitou que muita gente podia não compreender o que havia dentro dele, mas eu via. Não gostamos um do outro à partida, ele via-me como mais uma pessoa que lhe vendia palavras vazias. Até que um dia ele viu-me como eu vi a ele. E tu sabes o que isso significa… olhar nos olhos de alguém e mais do que a superfície, ver a profundidade, quase como ver a alma e repentinamente… – Esticou a mão até tocar na mão de Eren. – … há uma conexão e nós chorámos nessa ocasião porque era como encontrar alguém que não precisava de palavras porque nos compreendia perfeitamente.
Mais tarde, Mike entrava em casa e assim que viu a luz acesa da sala, mas televisão apagada, tentou fazer menos barulho. Presumiu que a esposa tivesse adormecido no sofá, mas em vez de encontrá-la a dormir, surpreendeu-se ao vê-la sentada, mas com Eren deitado a dormir com a cabeça sobre as pernas dela que acariciava os cabelos castanhos. Pela respiração dele, notava-se que teria estado nalgum estado emocional intenso antes de se deixar pela pelo sono.
– Boa noite, querida. – Beijou de leve a mulher nos lábios que sorriu.
– Boa noite. – Respondeu, mantendo assim como o marido um tom de voz cuidadoso para não acordar o elemento adormecido na sala.
– Suponho que a vossa conversa tenha corrido bem. – Comentou Mike, sentando-se no outro sofá que ficava quase em frente ao outro, onde se encontrava Nina. – Lamento não ter conseguido chegar antes, mas para a próxima semana, penso que já terei os horários finalmente regularizados.
– O teu paciente está a mostrar melhorias?
– Sim e se amanhã o quadro clínico se mantiver como ontem e hoje, posso retomar horários mais aceitáveis. – Respondeu. – E como está ele?
– É complicado, no entanto, penso que vamos a tempo de o ajudar. Não é tão grave para que o faça cair em algum vício, mas é uma questão de tempo. – Dizia sem deixar de alisar os cabelos castanhos. – Quando sentes muita dor cá dentro, inevitavelmente vais procurar alguma forma de parar isso e para ele regressar a Sina é ficar perto de velhos fantasmas e também da tentação de mergulhar novamente na pessoa que era antes.
– Então, ele está de facto diferente. – Comentou Mike. – E em relação ao Levi? É o que suspeitávamos?
– Sim, ele ama o nosso baixinho e felizmente, está mais maduro para compreender o que isso significa. Por outro lado, é preciso resolver isto que está a atacá-lo por dentro.
– Pensas que seria necessário a minha intervenção?
– Julgo que isso só será necessário se não formos a tempo de ajudá-lo de outro modo. Para já não tem decaído para vícios antigos que teve e por isso, se alguma coisa começar a mudar já, as coisas podem melhorar. – Respondeu Nina. – Claro que essa é a minha opinião como não especialista.
Mike sorriu.
– Podes compreendê-los de uma forma muito especial, Nina. Nunca duvides daquilo que podes fazer e já fizeste. Decerto que agora em diante, ele estará em boas mãos, partindo do princípio que ele aceita a nossa ajuda.
– Aceita sim, sabes que sou teimosa. – Sorriu divertida. – Em primeiro lugar, retirá-lo daquele emprego tenebroso que o está a fazer confundir educação com ser excessivamente passivo quanto ao que lhe dizem. Por bem menos, eu já teria feito enfiado a mão na cara de alguém. – Viu o marido rir. – Vou precisar da tua ajuda, coisa fofa.
– Só tens que dizer.
– É uma ideia arrojada, mas eu tenho uma sugestão que possivelmente pode aproximar aqui o moreno dos nossos amigos e ao mesmo tempo, resolver o problema de um certo baixinho.
A expressão de espanto cobriu o rosto de Mike.
– Queres sugerir que ele…?
– Exatamente, bombom. – Confirmou.
– Por que será que isso me cheira a algo casamenteiro? – Perguntou um pouco divertido. – Mas escuta, isso pode correr muito mal. Não será muito cedo para…
– Não vou forçar, entendes? Mas o Eren precisa de ver que realmente pode contar com as pessoas à sua volta, que tem erguer a cabeça de novo e enfrentar estes riquinhos com a mania que são mais que os outros e assim que estiver melhor por dentro… bom, o resto pode acontecer naturalmente.
– Mesmo depois de o Levi dizer que a história dos dois não existe mais?
– Essa história nunca terminou realmente e pode até nem ter continuação como um romance, mas os dois estão neste clima civilizado, mas com muitos receios. Sinceramente, eu tenho curiosidade de saber o que pode acontecer. Podem ficar só amigos.
– E tu acreditas mesmo nisso ou estás a tentar convencer-me disso?
– Eu sou uma romântica, Mike. Eu quero acreditar no romance, mas nunca forçá-lo e assumo todas as responsabilidades, se isto for um erro. Alinhas comigo, marido desnaturado que deixa a mulher mais linda de todos os tempos sozinha em casa?
Mike riu e abanou a cabeça.
– Prometo que os horários vão melhorar e depois fico ao lado da mulher mais maravilhosa e linda de sempre.
– E?
– E sabes que estou ao teu lado para o que der e vier.
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– Não. – Respondeu sem demonstrar qualquer incerteza à medida que acabava de fechar a própria camisa e confirmava que a sua aparência voltava a ficar elegante como antes.
Encostado à secretária e puxando o fecho das calças, os olhos castanhos mostraram alguma contrariedade após aquela resposta que não pretendia deixar margem para argumentação.
– Mas seria a oportunidade perfeita para passarmos algum tempo juntos. Só os dois.
– Tiago, eu não vou de férias. Vou viajar por motivos relacionados com o trabalho e não como lazer. – Disse Levi, ajeitando as mangas da camisa azul clara.
– E eu podia ajudar a relaxar nas horas vagas. Nunca passamos muito tempo juntos. – Tentou argumentar, reaproximando-se do outro. – Sabes como sou bom a desanuviar toda essa tensão que tens sentido nos últimos tempos.
– Tens dificuldade em perceber um não? – Questionou, mantendo a mesma assertividade de antes.
– Queres ensinar-me de novo? – Provocou com um meio sorriso, passando a mão no peito do outro que o observava. Este último abanou a cabeça, afastando aquele toque que podia transformar-se rapidamente em algo inapropriado.
– Já disse que vamos parar por aqui e preciso que aceites isso. – Distanciou-se e abriu uma das janelas do gabinete dele. – Além disso, não compreendo a insistência.
– Quase nunca nos encontramos fora daqui. Podíamos aproveitar para fazer outras coisas.
– Nós não somos compatíveis a fazer outras coisas. – Olhou para Tiago que encolheu os ombros. – As nossas tentativas de conversar, acabam sempre contigo a ocupar a tua boca com outra coisa. Arrependido destes nossos encontros? Pensei que fosse uma coisa evidente desde do princípio.
– E é evidente. – Respondeu Tiago. – Mas para quebrar a rotina, pensei que gostasses da ideia, mas enfim, o Sr. Smith é que perde. – Ironizou na última parte e assim que acabou também de ajeitar as roupas, piscou o olho antes de sair.
“Pelo menos, parece que estou com melhor aspeto do que tinha antes”, Levi observou o próprio reflexo, concluindo que não havia muito que pudesse fazer quanto às olheiras, mas tempo de qualidade com o Tiago, melhorava sem dúvida o aspeto em geral, “Nada como um bom orgasmo”, suspirou, “Mas o Mike tem razão. Também preciso de encontrar tempo para descansar”.
O encontro com Tiago no gabinete não tinha sido programado, mas aparentemente o funcionário enquanto preparava o café habitual da manhã, ouviu parte da conversa entre Isabel e Petra sobre a viagem dele no fim de semana. Resultado? Juntamente com o café veio a conversa de acompanhá-lo na viagem e com a troca de provocações, Levi acabou por ceder a mais momento entre eles. Só que como Tiago descobriu, concordar com sexo não significava uma porta aberta para concordar com outras coisas.
Entretanto noutro gabinete, Petra escutava com muita atenção cada informação e detalhe dado por Isabel acerca da viagem, na qual a primeira iria acompanhar Levi. Usualmente, Isabel estava ao lado do amigo, mas com a empresa numa fase crucial do novo software, ambos concordaram que um deles deveria ficar.
Ora, também sendo certo que Petra estava em fase de formação no seu trabalho como secretária e com um desempenho até ao momento positivo, seria um teste importante para provar que podia substituir Isabel sempre que esta não pudesse estar ao lado de Levi.
– Espero estar à altura. – Confessou Petra um pouco nervosa, mas feliz por depositarem nela confiança para a tarefa que tinha em mãos.
– Vai correr tudo bem, vais ver. Qualquer coisa, não hesites em entrar em contacto comigo ou mesmo falar com o Levi. Acredita, ele prefere que tires qualquer dúvida que tenhas do que esperar que alguma coisa de errado aconteça. Não penses que te julga menos capaz ou competente por causa disso, estamos todos a aprender. – Explicou Isabel. – Como também já disse, o Reiner e o Eld vão convosco, apesar da insistência do Oluo para trocar com um deles. Sabes que de certo modo até sinto pena por ele.
A razão para que Petra tivesse conseguido o emprego na Survey Corporation, devia-se em parte às boas referências dadas pelo amigo dos tempos de escola, Oluo. Depois de formar-se em secretariado, a jovem mulher de cabelos claros não conseguia encontrar nada na sua área. Como não tinha estudado em Sina e não tinha contactos, embora a chamassem para algumas entrevistas, acabava por não conseguir o emprego pretendido. Durante algum tempo, trabalhou numa loja de roupa e depois como rececionista num pequeno hotel até que o amigo com quem até perdeu o contacto durante algum tempo, tornou a encontrá-la numa rede social e disse que podia ajudá-la a conseguir uma boa oportunidade. Mesmo com várias dúvidas, Petra enviou o currículo e ao contrário do que o seu pessimismo pensava, foi contactada dias mais tarde e depois de uma entrevista em que Isabel acabou por deixá-la bem confortável, ela acabou por ficar com o emprego.
Contudo, a nova secretária pensou que fosse trabalhar noutro piso diferente e não ver aquele que ela e muitos conheciam como o viúvo mais desejado dos últimos tempos. Ela própria não resistia em ver as poucas fotografias que o CEO da Survey Corporation tinha em alguns meios de comunicação social. Mesmo que nunca se encontrasse com ele, Petra pensava que sentiria na mesma o frio na barriga por pensar que trabalhava no mesmo edifício que ele. Sentia-se como uma espécie de fã, que mesmo que soubesse que o cantor de uma determinada banda ou ator nunca fosse olhar para ela, já ficava contente por poder estar tão perto quanto possível dele.
Portanto, qual não foi a surpresa dela quando viu que não só ia trabalhar no mesmo edifício, como era no mesmo piso e Isabel, alguém que Petra também admirava muito por tudo o que tinha alcançado, queria confiar nela como uma possível substituta para as ocasiões em que não pudesse estar presente. Isso significava trabalhar de perto com Levi Smith e ela pensou que o coração fosse sair pela boca, quando os dois foram apresentados pela primeira vez.
As poucas informações que chegavam à comunicação social falavam de alguém igualmente implacável na capacidade de fazer negócios e um homem de difícil acesso. Porém, ele mostrou não só educação como até mais do que cordialidade, desejando que o futuro dela na empresa não fosse uma coisa passageira e que se transformasse em mais um membro da equipa.
Outra coisa também era certa. As fotografias podiam ter qualidade, mas vê-lo frente a frente não se equiparava às fotografias ou aos cenários que imaginou. Havia sem dúvidas razões para que Levi fosse bastante cobiçado.
Claro que Oluo, agora que estava mais próximo do amigo, dado que eram quase vizinhos em Sina, notou essa admiração e quem sabe, outros sentimentos por Levi. O resultado disso era embaraçoso, pois o amigo não parava de imitar Levi como um método de chamar a atenção de Petra. Ela não era idiota. Sabia perfeitamente dos sentimentos do amigo e sentia bastante gratidão pelo que ele tinha feito e gostava dele, mas não… não daquela forma em que imaginava ter uma relação com ele, um futuro ao lado dele com casa e filhos. Não, esses sonhos não o incluíam e se antes tinha alguns momentos fantasiosos enquanto lia notícias, agora uma pessoa em concreto aparecia muitas vezes nesses cenários.
– Não faço de propósito, mas estas coisas não se escolhem. – Disse Petra. – Se penso que seria mais racional e de pés no chão, interessar-me e ser correspondida pelo Oluo, sim seria. Mas não consigo vê-lo dessa forma.
– E esta viagem com o Levi não vai ajudar, sobretudo se tiverem tempo livre. Ele pode acabar por ir até à praia próxima do hotel onde vão ficar e vê-lo sem camisa não ajuda ninguém. – Comentou Isabel que riu ao ver Petra corar. – E isto vem de alguém que tem namorado. Bom, esse meu comentário fez com que o Farlan parasse de comer tantos bolos e apostasse em manter uma boa forma física por isso, eu saí a ganhar de qualquer das formas.
– Estou a tentar não pensar nessas coisas.
– Leva biquíni. Nunca se sabe. Pode ser que dê tempo para fazer praia. – Aconselhou Isabel.
– Eu sei que ele não se interessa exatamente por mulheres por isso, quero sobretudo fazer um bom trabalho e ser da confiança dele e também da tua.
– Ele não é totalmente imune ao sexo feminino, mas sim, sabes que estou com estas brincadeiras mas espero que acima de tudo, aproveites para aprender bastante com esta experiência. Eu não acredito que ele já esteja preparado para um relacionamento sério, seja com quem for, mas gosto de pensar que com o tempo, as coisas acontecem.
Repentinamente, veio uma batida na porta.
– Petra?
– Entra, Levi. Estamos já no fim da reunião. – Informou a ruiva com um sorriso e assim que o amigo entrou, ela reparou como Petra corou ligeiramente ao olhar para ele que sorriu na direção dela antes de dizer o que pretendia.
No fim da troca de palavras, Levi saiu e deixou as duas mulheres para trás na sala. Vendo ainda o ar envergonhado de Petra, Isabel comentou:
– Estavas a imaginá-lo sem camisa, não é?
– Huh?! Não! Ó meu Deus, não!
Isabel riu alto por ver uma negação tão evidente que somente revelava uma verdade completamente oposta ao que tinha dito. Ela divertia-se com essas coisas, mas esperava que a amiga não se magoasse no futuro. Infelizmente, não via um cenário em que Petra tivesse os sentimentos correspondidos, mas desejava sinceramente que isso não impedisse a secretária de manter uma amizade com Levi.
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– A tua técnica de sedução não funcionou, Tiago? – Perguntou a voz do outro lado. – E dizias tu que seria fácil convencê-lo.
– Pensava que não colocaria tantas dificuldades, até porque ter muito trabalho não atrapalha as nossas pausas. Já a filha é outra conversa.
– Ainda atrapalha?
– A miúda viu-me um par de vezes e por alguma razão, não me suporta. – Deixou escapar o fumo por entre os lábios, vendo outros colegas de trabalho passar por ele no espaço exterior. – Não que me importe, até porque já tenho o que quero dele.
– Mas podias ter mais. Afinal de contas, não é todos os dias que tens a oportunidade de ter esse tipo de proximidade de alguém como ele. – Dizia a voz do outro lado. – Não aproveitas como deves.
– Queres que saia por aí na comunicação social a dizer o quê? Que deixo ele comer-me dia sim, dia não?
– Pagavam-te bem por isso.
– E fodia o resto da minha vida. – Piscou o olho a uma colega que passou. – Não, eu não vou estragar tudo, embora tenhas razão. A esta altura, esperava pelo menos alguns presentes além do sexo selvagem.
– Ainda nada?
– Nada. – Confirmou. – Não me leves a mal, nada contra o sexo selvagem, mas estava à espera que em algum momento, fosse ter mais algumas regalias.
– Aumento de salário?
– Presentes, caralho. Sei lá um apartamento mais decente, um carro para não ter que vir todos os dias de transporte público. – Disse, voltando a colocar o cigarro na boca.
– Pedes pouco. – Ironizou a outra voz. – Mas sabes Tiago, já te disse que se levasses as coisas um pouco mais a sério, terias esse viúvo ricaço nas mãos.
– Não quero relacionamento.
– Queres sexo e a parte do dinheiro sem compromisso? Complicado. Se parasses com essa tua alergia à ideia do relacionamento, investias um pouco mais…
– E fingir-me interessado por aquela peste da filha e pelas conversas sobre o trabalho para o resto da minha vida?
– Não teria que ser o resto da tua vida…
– Claro, convenço a pessoa mais difícil que conheço a pôr-me uma aliança no dedo, e se por milagre isso acontecesse. – Riu antes de prosseguir. – Imagina por milagre assinamos uma coisa por comunhão de bens e o quê? Divorcio-me? Estás mesmo a ver isso acontecer? Acho que prefiro deixar as coisas como estão.
– Não terias que esperar pelo divórcio.
– Ah sim? E fazia o quê?
– A peste num colégio longe e ele… bom, acidentes acontecem.
Tiago riu alto.
– A sério, que esse é o teu conselho? Puta que pariu, o Levi diz que preciso de mudar de amigos e talvez tenha razão. Comeste merda ao almoço, foi? Tu achas mesmo que eu sou lunático a esse ponto?
– Não é uma questão de ser lunático. Nunca mais terias que trabalhar na vida e podias ter bem mais do que podes imaginar. A fortuna dele parece não ter limites.
– Escuta, eu não vou casar e muito menos matar ninguém. – Abanou a cabeça. – E se tu visses como os seguranças andam em torno dele também não dirias essas coisas sem ter medo de levar um tiro no meio da testa. A sério, eu posso não estar totalmente satisfeito como as coisas estão, mas com certeza não coloco o meu pescoço em risco para mudar isso.
– Estás mal habituado, Tiago. Queres tudo muito fácil e não queres correr riscos.
– Isso não é um risco, é suicídio na certa.
– Não se conheceres as pessoas certas.
– Ok, vou desligar. A pausa do almoço está a terminar e além disso, claramente um de nós está insano.
– Ainda vamos voltar a falar sobre isto, Tiago. Podias estar a ter uma vida de rei, bastando teres a coragem de fazer mais qualquer coisa além de dar o cu.
– Pelo menos um de nós trabalha e não tem tempo para ter essas ideias. – Ironizou, desligando a chamada.
“Nada como ter um amigo a aconselhar casamento e homicídio”, pensou enquanto deitava o cigarro fora e retirava umas pastilhas de mentol de um dos bolsos, “Se gostava de viver como um rei? Claro, quem não quer? Mas ele está completamente doido. Ninguém iria tão longe…”
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Devido à ansiedade provocada pela viagem, Petra mal dormiu na noite anterior. Disfarçou as consequências de uma noite em branco com maquilhagem, só que já devia saber que não poderia esconder a ausência de horas de sono durante o tempo todo. Porém, pensou que teria tempo de chegar ao hotel e dormir, visto que partiram sexta à noite para que sábado de manhã, fosse realizada a primeira reunião.
A secretária nem notou a partir de que momento, depois de sentada no avião ao lado chefe, fechou os olhos e assim ficou durante praticamente toda a viagem. Isto, até que despertou com a voz dele e toque no braço dela.
– Petra?
Ao abrir os olhos bastante ensonados, reparou nos olhos cinzas bem próximos e que estava encostada não à cadeira, mas ao ombro de…
– Sr. Smith! – Endireitou-se em choque. – Peço imensa desculpa!
– Não te queria acordar, mas estamos a chegar e é preciso que coloques o cinto de segurança para a aterragem. Depois podes descansar o que precisares no hotel.
– Eu peço imensa desculpa, Sr. Smith.
– Levi. – Corrigiu ele com um ligeiro sorriso. – Não precisas de tanta formalidade fora das reuniões. – Colocou o próprio cinto e viu a secretária seguir o exemplo, ainda visivelmente embaraçada. – Acho que tinha uma mensagem da Isabel, mas deram o aviso para desligar todos os aparelhos e por isso, só posso ver quando estivermos fora do avião.
– Está… quer dizer, estás preocupado?
– Não penso que seja nada de muito relevante. Talvez mais uma mensagem a desejar boa sorte ou a perguntar se já chegámos ao hotel.
No entanto, após a aterragem e entrarem no carro de vidros fumados que Eld, um dos seguranças guiava, com Reiner ao lado e atento ao exterior, Petra percebeu que a mensagem de Isabel parecia ter alterado o humor de Levi. Por um lado, veio a notícia de que Sasha se encontrava no hospital com contrações, mas por outro lado, isso significava que Bianca teria que ficar com outra pessoa. Até aí tudo bem, mas Isabel e Farlan não estavam na cidade, pois tinham ido visitar um familiar que estava com problemas de saúde. Isso significava que sobrava somente Nina e Mike, mas com o trabalho dos dois, não era fácil encontrar o tempo adequado para ficar com a pequena. Também Hanji não era uma possibilidade, visto que Levi recordava-se muito bem do que tinha acontecido da última vez que deixou a filha com a madrinha insana.
Ainda assim com tudo isso sobre a mesa, o CEO não aceitou muito bem aquela ideia de Isabel que tinha sido aparentemente combinada com Nina.
– Não era a primeira pessoa que tinha em mente e nem sequer consideraria, mas nós os dois sabemos que tu também tens evitado resolver este problema como quem evita uma praga. Levi, ela não pode estar sempre contigo ou com as mesmas pessoas. A Bia precisa de alguma estabilidade, como a que tinha com o Farlan.
– Foi a Nina que teve essa ideia? Mas porquê? Onde está a Bia?
– Com a Nina, a caminho do único baby-sitter improvisado de serviço. – Respondeu a ruiva. – A menos que prefiras que tente encontrar uma de urgência neste preciso momento. Se me disseres que pensas que a segurança dela está em causa, é só dizer e eu encontro outra pessoa contra os conselhos da Nina.
– Isabel, só gostava de ser avisado com tempo.
– A Sasha disse que o bebé só nascia dentro de duas semanas. Não é exatamente algo que possamos prever com exatidão e não podes culpar outras pessoas e sim a ti próprio por não quereres resolver isto. – Disse a amiga. – O Berth está com eles. Ele será o primeiro a agir se vir alguma coisa irregular.
– Depois vou falar com a Nina, mas por enquanto vou deixar como está…
Ouviu a amiga suspirar.
– Quando voltares da viagem, temos que conversar seriamente sobre isto. Pergunto-me se não devias reconsiderar a ideia de colocá-la num infantário ou na pré-escola, até para que se vá habituando a brincar e estar com outras crianças.
– Depois penso sobre isso, Isa… obrigado e até segunda.
– Até segunda, Levi.
Levi – Mensagem:
Avisa quando a bebé nascer, Connie. Quero saber se está tudo bem.
Connie – Mensagem:
Claro. Parece que as contrações têm que ficar + próximas, uma conversa que ñ entendo, mas aviso assim que a herdeira nascer.
Levi – Mensagem:
Boa sorte ;)
Encostou a cabeça ao assento do carro com um ar cansado e diante do olhar preocupado de Petra e dos seguranças.
– Se a pequena está na companhia do Berth não tem que se preocupar. – Reiner decidiu intervir.
– Eu sei, é só que… bom, talvez também precise de descansar. – Concluiu e ao notar os olhares dos outros ocupantes do veículo, acrescentou. – Estou bem. Não se preocupem.
“Digo eu que confio nele a ponto de não acreditar que possa fazer mal à minha filha, mas quase tenho um ataque de fúria na direção da Isabel por sequer pensar nessa possibilidade. Mas de todas as pessoas porquê ele? Será que não devia deixar a Bia com a Hanji e arriscar que ela perca de novo a minha filha no meio de um centro comercial? Não… é claro que não. O Mike também disse que é normal que tenha instinto paternal para proteger a minha filha, mas quero protegê-la do quê? É óbvio que ela não vai estar só com ele. Vão lá estar a Annie, o Armin e claro o olhar atento do Bertholdt. E mesmo que ele estivesse sozinho com ela, qual é o meu problema com isso? Será que parte de mim ainda acredita que ele possa fazer mal aos outros?”, fechou os olhos, “Na verdade, não tenho exatamente provas de que ele esteja mudado, exceto aquilo que a Annie e o Armin comentavam ocasionalmente e claro… quando trocámos aquelas poucas palavras durante o evento, eu posso estar errado, mas eu não vi a mesma coisa de antes… talvez não saiba dizer exatamente o que vi quando o olhei olhos nos olhos e isso… talvez isso seja o problema”.
Levi – Mensagem:
Temos que falar Nina.
Nina – Mensagem:
Falamos quando quiseres, meu príncipe :p
Mas fica sabendo que não vais mudar as minhas ideias.
Levi – Mensagem:
Não entendo por que razão fizeste uma coisa destas.
Nina – Mensagem:
Estás com medo do quê, Levi?
Melhor dizendo…
Tens medo pela tua filha?
Ou por ti?
Os olhos cinzentos observaram o ecrã em silêncio antes de digitar a resposta:
Levi – Mensagem:
Acabou, Nina.
No entanto, eu tenho o direito de duvidar se ele realmente mudou, ao ponto de confiar a minha filha aos cuidados dele.
Porque se ele não tiver mudado, como parece que queres que acredite, é a minha filha que vai sofrer e eu não vou permitir uma coisa dessas.
Nina – Mensagem:
Achas que colocaria a Bia numa situação dessas?
Levi – Mensagem:
Não, mas o pai sou eu e quem decide com quem ela deve ficar, sou eu.
– Sr. Smith? Ah, quer dizer, Levi? – Chamou Petra já com a porta do veículo aberta e com os dois seguranças atrás dela com as malas por perto.
– Já saio. – Respondeu, guardando o telemóvel num dos bolsos.
“Dizem que às vezes sou muito protetor da minha filha, mas tenho a certeza que isto não é um exagero da minha parte. Mesmo que não aconteça nada, eu aceitei o passado, mas não sofro de amnésia por isso, lamento pelas boas intenções que a Nina possa ter, mas eu tenho todo o direito de ter dúvidas e escolher aquilo que considero melhor para a Bianca”.
Só depois de instalado no quarto e de conversar por vários minutos com Bianca, a pequena nuvem negra que parecia pairar sobre a cabeça de Levi dissipou um pouco. A filha sorria e dizia que iria ter a primeira festa do pijama e que tanto Armin como Annie estavam a preparar-se. Quanto a Eren ao que tudo indicava, ainda não tinha chegado do trabalho, o que apenas deixava o homem de olhos cinzentos mais apreensivo. Os três adultos daquela casa também trabalhavam e isso obviamente incluía Eren, então no que estaria Nina a pensar?
“Preciso de recuperar horas de sono antes da reunião de amanhã. Não posso pensar nisto toda a noite”, tentava convencer-se a si mesmo, já deitado na cama e de olhos fixos no teto.
Ele nem foi consciente a partir de que momento desistiu de dormir e ficou no computador longas horas antes de inevitavelmente, ceder ao cansaço. Porém, o sono além de ter uma duração curta também não foi tranquilo e por isso, despertou quando ouviu um som forte de algo a cair no chão.
Ao abrir os olhos bem alerta, apercebeu-se que teria empurrado o computador durante o sono para fora da cama. Ainda com a respiração agitada, virou-se para o lado oposto e com uma das mãos tocava o colchão, procurando instintivamente o conforto de…
– Erwin… – Murmurou no silêncio.
“Às vezes, esqueço que já não está aqui…”.
Flashback
– Não tens que esconder ou passar por nada disso sozinho porque quando acordares, podes estender a mão e eu vou estar sempre aqui. – Murmurava, acariciando os cabelos negros do jovem que escondia o rosto repleto de lágrimas contra o peito do loiro.
– É uma promessa? – Veio a voz fraca.
– É uma promessa.
Fim do Flashback
– Tinhas razão, Erwin. És péssimo a cumprir promessas. – Deixou escapar um pequeno sorriso, abanando a cabeça. – Mas pelo menos cumpriste outras igualmente importantes por isso, estás perdoado. – Acrescentou e logo escutou uma batida na porta e revirou os olhos ao ver que alguém entrava pela janela. – Não, Reiner. Ninguém está a atacar-me durante o sono e podes dizer ao Eld que não precisa de estar do outro lado da porta. Podem voltar a dormir.
– Tem a certeza que está tudo bem, Sr. Smith? Ouvi um barulho e…
– O computador caiu da cama. – Apontou para o mesmo antes de se abaixar para apanhá-lo. – Vês? Nada de errado. Podes cancelar a equipa de matadores furtivos que devem estar espalhados por aí.
– Não brinque, Sr. Smith. A sua segurança é uma coisa séria.
– E eu não desvalorizo o vosso trabalho, mas às vezes uma brisa na cortina, é só uma brisa na cortina e não alguém que está a esconder-se lá, assim como um computador no chão, também é apenas isso.
– Se é assim, lamento incomodar.
– Eu é que lamento tirar os dois da cama por causa do meu hábito de trazer o computador para a cama. – Disse, passando uma das mãos nos cabelos.
Ouviu mais uma batida frenética na porta e arqueando uma sobrancelha na direção de Reiner, este encolheu os ombros até que reconheceram a voz.
– Sr. Sm… ah, Levi está tudo bem?
– Parece que não fomos os únicos preocupados. – Comentou Reiner.
– Parece que não. – Suspirou antes de abrir a porta e aliviar o estado de apreensão de Eld e ao mesmo tempo, explicar a Petra que tudo não passava de um mal-entendido e que deviam todos voltar para as respetivas camas.
Assim que ficou sozinho no quarto novamente, colocou o computador fechado sobre uma pequena mesa e olhou para a cama. Havia dias tão cheios de atividades que nem reparava, mas às vezes, em dias em que no passado podia procurar Erwin e encontrá-lo do lado oposto da cama, esses dias… esses dias faziam-no pensar como a cama estava vazia.
*_*_*_*_*_*_*_*_*_*_*_*_*
Naquele dia também ia chegar um pouco mais tarde a casa, mas não resistiu à vontade de regressar ao cemitério. Não nas mesmas circunstâncias. Não, desta vez queria falar de algo bom e foi o que fez. Perdeu a noção da hora, mas depois daquela noite a conversar com Nina em que envergonhado, acordou com a cabeça deitada sobre as pernas da mulher que sorriu juntamente com o marido dela e disseram que podiam ir levá-lo a casa ou se quisesse, podia passar a noite no quarto de visitas. Ele pediu desculpa por ter adormecido e acabou por escolher voltar para casa.
O certo é que as palavras de Nina tiveram ainda mais impacto do que pensava. Fez com que refletisse bastante acerca do seu comportamento desde que tinha chegado a Sina. Com todo aquele receio de regressar a velhos hábitos em vez de lidar com o problema, encolheu-se e deixou que todos rissem e falassem o que quisesse, quer fosse na cara dele ou pelas costas.
Nina não teve problema algum em indignar-se e dizer sem qualquer rodeio que aquilo era uma atitude de alguém fraco e sem personalidade. As palavras foram duras, mas honestas e aparentemente, o que precisava para que ao fim de algumas horas em mais um turno de trabalho repleto de momentos em que tentava esconder como as coisas o magoavam, começou por responder… e assim que começou, foi incapaz de parar até dizer em alto e bom som na cara da chefe que se despedia daquele ninho de cobras.
Contudo, mesmo com o que chamaria de espírito mais leve a correr dentro dele, não pôde deixar de surpreender-se novamente com a visita que tinha em casa. Isso e também porque os amigos estavam de pijama no meio da sala a juntar mais mantas, cobertores e almofadas.
– Eren! Finalmente chegaste! – Disse Armin animado.
– Olá Eren! – Bianca acenou com um sorriso e também trajava um pijama. – Chegaste a tempo da festa de pijamas! Vai pôr o teu!
– Chegaste mais tarde, mas pareces contente com alguma coisa. – Comentou Annie.
– Sei que isto pode não parecer uma boa razão, mas despedi-me no trabalho. – Respondeu incapaz de esconder o sorriso e coçando os cabelos.
– Queres saber uma coisa? São ótimas notícias. – Armin foi o primeiro a manifestar-se. – Não nos falavas grande coisa, além do salário e horários, mas era fácil ver que não estavas contente lá.
– Concordo e tenho a certeza que irás encontrar qualquer coisa melhor. – Annie também demonstrava o mesmo apoio, mas esse momento foi interrompido por mais um momento em que Bianca dizia ao moreno para mudar de roupa e este ao virar-se, quase teve uma síncope ao ver um segurança que não tinha visto antes.
Eren nem sabia como era possível não ter visto alguém com aquela altura.
– E este é…? – Perguntou.
– É o meu amigo, Eren. – Disse Bianca. – É o Berth. Diz olá, Berth.
– Boa noite, Sr. Jaeger. – Disse num tom que não escondia como estava a cumprimentar simplesmente porque a criança tinha pedido.
– Eren é suficiente.
“Parece que também conquistei a simpatia deste. Já não bastava o tal Reiner a olhar para mim como se quisesse eliminar-me, agora também tenho esta torre a olhar para mim. Será que devia aceitar esta ideia de dormir na sala com este tipo aqui a olhar? Posso não acordar amanhã”.
Ainda que tivesse as suas dúvidas acerca da própria segurança, Eren acabou por não conseguir contrariar a menina e foi dessa forma que os quatro acabaram por dormir no meio da sala. Felizmente Bertholdt retirou-se a uma certa altura e quando Annie perguntou se devia preparar algum dos quartos para o segurança dormir, Bianca disse:
– Berth prepara tudo e volta aqui rápido, se for preciso. Pode até estar ainda aqui na sala e vocês não sabem.
– Tudo o que eu queria. Ter pesadelos com gigantes assassinos durante a noite. – Ironizou Eren e recebeu uma cotovelada de Armin.
*_*_*_*_*_*_*_*_*_*_*_*_*
Petra não sabia se devia preocupar-se mais com o crescente mau humor de Levi ou com a mancha negra cada vez mais evidente nos olhos, demonstrando um cansaço cada vez mais percetível. Sendo verdade que ele soube manter uma postura irrepreensível durante as reuniões em escritórios ou durante as refeições que tiveram com clientes novos e outro que queria falar de ajustes nos custos, Petra e mesmo os dois seguranças de cabelos loiros por vezes, trocavam olhares entre eles. Os três estavam preocupados e isso apenas aliviava um pouco, quando o chefe deles falavam com a filha sempre que tinha algum tempo livre. Até mesmo a menina de sorriso fácil, chegou a dizer ao pai que devia descansar porque não estava com bom aspeto.
Como sempre fazia diante da filha, ele sorria e dizia que isso seria mais fácil quando estivesse de volta a casa. A secretária viu algumas dessas trocas de palavras, pois teve a maior parte do tempo na companhia de Levi, ajustando itens na agenda e conversando sobretudo sobre temas relacionados com trabalho. A ideia do passeio na praia ou sequer uma refeição a sós entre os dois não foi sequer uma possibilidade, dado que o homem de olhos cinzentos e aparência cansada, não parecia estar disposto e além disso, tiveram menos tempo livre do que esperavam. Ainda assim, na noite anterior ao regresso deles a Sina, ele pediu desculpa por não ter sido possível aproveitar um pouco da paisagem, apesar do tempo agradável.
Aquando dessas palavras, a secretária sorriu e disse que não havia problema. Pelo menos isso na frente dele, mas depois em algum momento em que se viu sozinha no quarto, pensou que seria uma boa ideia pedir vinho e afogar as frustrações e acima de tudo, os receios por não ter feito um bom trabalho. Ela compreendia que Levi estivesse apreensivo por estar longe da filha, mas em parte também se queria culpar por possivelmente não ter estado à altura do trabalho e por isso, ter acabado por sobrecarregar mais a estadia dele.
No entanto, ela devia saber que aquilo era uma péssima ideia porque ela não era o tipo de bêbada que dormia ao fim de uns copos. Pelo contrário, era o tipo de bêbada que fazia coisas das quais se arrependia profundamente no dia seguinte e dessa vez, não seria exceção. Nunca no seu estado normal, ela iria somente com um roupão rosa e lingerie por baixo do mesmo, descalça e com uma garrafa de vinho na mão, bater na porta do quarto de Levi.
– Petra?
– Sei que fui uma assistente de merda estes dias.
– Huh? Estás bem? – Perguntou e ia retirar a garrafa que a secretária levava na mão, mas ela não só não deixou, como acabou por empurrá-lo e entrar no quarto.
– Não, não quero as tuas mãos perto de mim porque eu tenho umas coisas para dizer e contigo tão perto, o meu cérebro não vai funcionar. – Disse, sentando-se na cama dele e colocando a garrafa no chão perto dos pés dela.
Levi fechou a porta e sentou-se na cadeira que havia numa mesa onde o computador estava ligado. Virou-se na direção da mulher e esperou que ela falasse.
– O que aconteceu?
– Sei que estar longe da tua filha não deve ser fácil, mas eu estraguei tudo, não é? Sou uma péssima secretária e…
– Hei, claro que não. – Interrompeu. – Petra estiveste bastante bem como já disse antes.
– Há momentos em que dizemos isso só para que os outros não se sintam mal, mas podes dizer a verdade, eu aguento. – Disse ela com o rosto com um rubor evidente causado pela bebida.
– Escuta, compreendo que o meu mau humor não ajuda ninguém a acreditar nas minhas palavras quando digo que estou satisfeito com o trabalho, mas a verdade é que este meu mau humor não tem rigorosamente nada a ver com o teu trabalho. – Disse num tom calmo. – A Isabel nunca deixaria que ninguém incompetente me acompanhasse e eu estou bastante satisfeito com o que fizeste e todo o apoio que me deste.
– De verdade? – Perguntou com lágrimas nos olhos.
– Sim, Petra. Obrigado. – Disse com um sorriso discreto.
Tentando limpar algumas lágrimas, a mulher teve acalmar-se um pouco antes de continuar.
– Pensei que estava a piorar tudo, nem sabes como é um alívio ouvir-te dizer isso.
– Podes atirar as preocupações pela janela. Está tudo bem com o teu trabalho.
– E apesar disso, não tivemos tempo sequer de dar um passeio. Estiveram dias bonitos de praia. – Levi ia interromper, mas a secretária continuou. – E a Isabel pôs aquelas ideias na minha cabeça como seria ver-te na praia e agora… Deus que desperdício. Trouxe três biquínis diferentes para nada.
Após uma pequena surpresa inicial, o homem deixou escapar um sorriso divertido.
– Quem sabe para uma próxima.
– Não me dês esperanças.
– Olhar não tira pedaço. – Disse ele ainda divertido.
– Sei que não te interessas por mulheres, não é? – Perguntou sem rodeios.
– E no entanto, isso não impede que se interessem por mim. Ainda assim, não quero que penses que estou a pisar no que sentes, é só que…
– Não, tudo bem. Eu também nem tenho a certeza do que sinto. Deves ter ídolos, certo? Algum cantor, ator, alguma personalidade que admires muito. Imagina como seria poder conhecer essa pessoa de perto, passar tempo com ela depois de teres imaginado mil e um cenários românticos em que até te casavas com um deles e vivias feliz numa pequena casa plantada à beira-mar. – Explicou ela com um ar sonhador. – Sim, eu sou esse tipo de pessoa que imagina um milhão de coisas, mesmo que o ídolo em questão só tenha olhado na minha direção uma vez e se calhar, pode até nem ter sido para mim.
– É assim que te sentes em relação a mim?
– Talvez, não sei. Parece igual e qualquer coisa mais. – Admitiu e deixou escapar um longo suspiro.
– Espero que encontres essa pessoa com quem possas tornar todas essas coisas realidade.
Petra olhou diretamente para ele e também com um sorriso, respondeu:
– Espero que também possas amar de novo e ser feliz assim como todos viam que eras na ao lado do Sr. Erwin Smith. Ah… aquele também era outro Deus Grego.
Levi riu um pouco novamente. Aquela troca de palavras teve um rumo que não esperava, mas preferia assim do que ver o ar desolado no rosto de alguém por não ser capaz de corresponder a sentimentos. Seria até melhor daquela forma, quando os sentimentos não estavam bem definidos e ainda não tinham tido tempo de crescer. A dor era menor. Petra era inclusive capaz de sorrir com a rejeição e desejar que ele encontrasse outra pessoa além de Erwin. Podia até pensar que seria um delírio de alguém embriagado, mas aquela mulher que acabou por deixar que dormisse na cama dele, não era o género de pessoa que mentia quando estava sob o efeito do álcool. Pelo contrário, ela disse aquelas e outras coisas que demonstravam medos e sonhos verdadeiros. Aquelas coisas que não contamos a qualquer pessoa ou em qualquer circunstância.
Isso tornou-se bem evidente quando na manhã seguinte teve que acordá-la e Petra recordando fragmentos da conversa da noite anterior, desfez-se em desculpas e mal olhava na cara de Levi que dizia que não havia qualquer problema. Mesmo durante a viagem de avião, a secretária quase não dizia uma palavra sem morrer de vergonha e o homem ao lado dela concluiu que teria que dar tempo ao tempo para que aquilo passasse, mas sempre que podia tranquilizava-a, dizendo que não pensava menos dela pelas coisas que tinha conversado. E era verdade. Ele preferiu que as coisas tivessem ocorrido daquela forma do que algum dia descobrir que os sentimentos podiam ter evoluído para um patamar mais sério e ele… era perfeitamente consciente que dificilmente iria corresponder.
Aliás, após a morte de Erwin, na primeira conversa que teve com Mike disse abertamente e sem hesitação que o mais provável seria que vivesse o resto da vida dele sem ninguém ao seu lado. Era bastante doloroso perder alguém importante ou amar a pessoa errada.
Contudo, conforme o tempo foi passando, concluiu que também não seria certo fechar-se para esse tipo de sentimento, visto que fazia dele uma pessoa mais distante e fria. Portanto, decidiu que deixaria as coisas seguirem um rumo imprevisível. Se tivesse que acontecer, acontecia e se tivesse que viver sozinho, também o faria mas recusava-se a fugir ou esconder-se.
O medo nunca foi um bom conselheiro e no entanto, nem sempre era capaz de fugir das paranoias que este lhe podia causar.
Quando chegou a Sina, depois de deixar Petra em casa para um merecido dia de descanso, Levi sentia como se também tivesse a sofrer algum efeito de ressaca, apesar de mal ter tocado em álcool. A ausência de horas decentes de sono e descanso estavam a deixá-lo com umas dores de cabeça mais intensas e por isso, apesar das sugestões de Reiner para ir buscar Bianca depois de o deixar em casa, ele recusou, dizendo que não iria para casa sem a filha.
– Annie, esqueceste outra vez das chaves? Ainda dizes que sou que tenho a cabeça nas nuvens!
A porta abriu-se e ambos se surpreenderam. Levi não esperava que Eren viesse abrir-lhe a porta de toalha na cintura e o moreno ainda com pasta de dentes no rosto, também não escondeu a perplexidade ao ver o outro.
– Ah… tu não chegavas mais tarde?
– Que horas achas que são? – Indagou Levi, olhando por momentos na direção do carro onde Reiner aguardava e fazendo sinal de que poderia demorar um pouco.
– Não sei bem, nestes últimos dias não tenho tido horários. – Respondeu. – A Annie saiu com a Bianca. Acho que foram a uma mercearia qualquer e já voltam. Podes entrar e esperar, se quiseres. – Virou as costas, caminhando pela sala e Levi decidiu entrar, fazendo mais um sinal ao segurança de que não era necessário acompanhá-lo e que devia aguardar no exterior.
– Sabes se ainda demoram?
– Devem ser só uns minutos. Saíram há pouco tempo, mas não iam comprar grande coisa. – Respondeu à medida que subia as escadas e Levi sentou-se num dos sofás, vendo o moreno continuar o percurso para o piso de cima.
– Aproveita para não só para vestir qualquer coisa, como também para limpar a pasta de dentes que tens na cara.
Ouviu o moreno resmungar sobre qualquer coisa antes de desaparecer no andar de cima e abanou a cabeça.
“Francamente, continua distraído como sempre e se houvesse ainda mais degraus com aquela toalha, iria deixar-me ver bem mais do que intencionava”, passou a mão nos cabelos, “Pelo menos tudo aparece normal…”.
Alguns momentos mais tarde, Levi nem se tinha apercebido que tinha fechado os olhos por alguns momentos e acabado por cochilar. Mais tarde, ouviu movimento na cozinha e questionou-se se a filha já teria chegado, mas não quis acordá-lo. Levantou-se e ao entrar na cozinha, reparou que Eren era o único que se encontrava lá.
– Ainda não chegaram, mas a Annie enviou mensagem a dizer que podiam demorar mais um bocado porque iam passar pelo parque, mas entretanto já avisei que deviam vir para casa porque já chegaste. – Falou, colocando alguns dois cubos de açúcar no café. – Queres?
– Não, obrigado.
– Parece que precisas. – Comentou o moreno.
– Preciso de ver a minha filha, só isso. – Respondeu, encostado na porta da cozinha.
– Isso não é tudo stress e cansaço por causa do trabalho, não é? – Perguntou Eren e nesse momento, o outro decidiu aventurar-se pela cozinha e retirou umas das torradas que havia sobre a mesa.
– Que outra razão poderia haver? – Questionou Levi, sentando-se perto da mesa e Eren manteve-se de pé, junto ao móvel onde se encontrava o micro-ondas e o fogão.
– Achas mesmo que faria mal à tua filha?
Os olhos cinzentos focaram-se nos verdes.
– De onde tiraste essa ideia?
– Sempre que falavas com ela, ouvia-te perguntar uma e outra vez como tinha sido o dia e a tentar confirmar com quem tinha estado. Podes ficar descansado, a maior parte do tempo, ela passou com o Armin e a Annie. Nunca esteve sozinha só comigo. – Falou num tom mais áspero do que pretendia.
– Se um dia fores pai, vais compreender que é normal que seja cauteloso, sobretudo tendo em conta tudo o que aconteceu antes.
– Ah, então a treta do “desejo que sejas feliz”, era uma piada para não quebrar o papel que te ensinaram a ter em Sina?
– Não, eu realmente quero que sejas feliz, mas isso não significa que sofra de amnésia, Eren. Se estás ou não mudado, também é cedo para dizer e por isso, não me podes culpar por ser cauteloso.
– Parece que a falta de descanso é o remédio santo para deixares de ser tão politicamente correto. – Ironizou Eren. – Começas a ser mais sincero, admitindo que pensas que posso até fazer mal a uma criança.
– Não acredito nisso, mas como pai não posso deixar de preocupar-me.
Eren desencostou-se do móvel onde estava e pousando a mão com força sobre a mesa, inclinando-se ligeiramente sobre o rosto de Levi que não desviou o olhar, disse:
– Eu não fiz nada, nem nunca faria nada à tua filha.
– Estás a tentar intimidar-me?
– Estou a tentar que me digas olhos nos olhos, que realmente pensas que posso fazer mal à tua filha.
– Não, não és. – Disse, empurrando de leve o moreno. – E eu oiço bem, não precisas de te aproximar tanto.
– Não te preocupes, não vou comentar nada sobre o perfume de mulher que provavelmente tens nas roupas. – Disse o moreno, voltando a encostar-se no móvel e pegar na chávena de café.
Levi arqueou uma das sobrancelhas.
– Estás a falar do quê?
– Vá, não te faças de inocente, Levi. Tanto eu como qualquer pessoa que prestasse atenção por cinco segundos às conversas que tiveste com a Bianca, via que estavas sempre acompanhado.
– Não que eu tenha que dar satisfações, mas o que tens tu a ver com a minha vida pessoal? – Levantou-se da mesa, virando as costas. – Cuidado para que não pensem que estás com ciúmes.
– E se estiver?
Levi parou e olhou de soslaio para o moreno.
– Então, estás com ciúmes da pessoa errada. Essa pessoa inocente que acreditava nessas brincadeiras morreu, Jaeger. – Respondeu e ao ouvir a porta da entrada, saiu na direção da voz de criança que escutou invadir a casa e colocar um sorriso no rosto dele.
Quando por fim, Levi regressou ao carro onde Reiner os esperava, o homem de cabelos negros apesar de tentar partilhar do entusiasmo da filha, não estava nem um pouco orgulhoso da troca de palavras com Eren. Antes de entrar na casa, tentou focar-se em ser educado e manter a naturalidade, mas ter o moreno a abrir a porta de toalha, era uma espécie de provocação que a cabeça dele não estava preparada para processar naquele estado de cansaço e por isso, acabou por falar com um tom bem mais seco do que pretendia.
Não só isso, tinha insinuado de forma nada subtil que achava que Eren seria capaz de fazer mal a Bianca, embora já tivesse racionalizado várias vezes que o moreno não faria tal coisa. Porém, aparentemente, a parte menos racional e provavelmente alimentada pelo cansaço, parecia estar contra o racional.
“Preciso de uns dias antes que enlouqueça”, pensou, suspirando.
– Quero fazer uma festa surpresa.
– Festa surpresa? – Questionou Levi certo que tinha perdido parte da conversa da filha.
– Sim! – Confirmou sorridente.
– Para quem? – Quis saber, tentando perceber entre a mente cansada e facilmente irritável, se havia algum evento que estivesse a esquecer, além da visita a Connie e Sasha que teria que fazer, assim que descansasse algumas horas.
– Sabes que dia é 30 de março, pai?
– 30 de março… – Repetiu pensativo.
– Uma pista. É um aniversário. – Disse Bianca, mantendo a atitude animada.
– Aniversário de 30 de março… só me lembro do Eren. – Falou sem pensar.
– Huh? Também perguntaste? Ou foi o tio Armin que contou?
– Ah… – Balbuciou ao aperceber-se que tinha falado sem pensar. – Pois, deve ter sido. – Forçou um sorriso. – Queres fazer uma festa para ele? Porquê?
– Descobri que a família dele é o tio Armin e a tia Annie e nós temos tanta gente, pai. Não achas que o dia ia ser mais feliz com todos?
– Eu…
– Por favor, pai. – Pediu. – Por favor, por favor, por favor!
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