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História Memórias Rasgadas - Capítulo XLVI


Escrita por: Imagination

Notas do Autor


Obrigada a todos pelos comentários, favoritos, mensagens e a todos que acompanham a fic!

Peço desculpa por não ter podido atualizar antes, mas entre falta de tempo livre, visitas em casa e cansaço tive que dividir a escrita por vários dias e com demasiadas pausas e hoje nem pensava que fosse terminar a revisão, mas cá estou eu.

Espero em breve ter mais algum tempo para compensar estes atrasos quem sabe com alguma oneshot que tenho em mente.

Capítulo 46 - Capítulo XLVI


Capítulo XLVI

 

Os olhos azuis abriram-se. A imagem ainda era turva e pouco clara. As formas e luzes começavam a fazer sentido lentamente e ao virar o rosto, encontrou uma figura familiar que fez com que se quisesse sentar assim que a viu. Porém, as mãos desse logo seguraram os seus ombros, impedindo-o de fazer isso.

– Não me assustes desta forma, Reiner. – Pediu. – Não te levantes ainda. O Dr. Jaeger ainda quer falar contigo.

– Sr. Smith onde…? – Ia perguntar, mas ao ver o espaço à sua volta, tornou-se bastante evidente que se encontrava no hospital. – Como é que…?

– Na verdade, estava à espera que conseguisses explicar isso. – Disse Levi ainda preocupado. – Mas por agora fico aliviado por te ver acordado. Como estás? Sentes dor? Enjoado?

– Não precisa ficar tão preocupado, Sr. Smith. Estou bem. – Afirmou, vendo que não teria qualquer outro tipo de resposta enquanto não tranquilizasse o empresário que parecia bem nervoso. Se bem que já o conhecia há tempo suficiente para saber que aquele comportamento até era normal. Era e sempre foi o último a preocupar-se com ele próprio e o primeiro a preocupar-se com os outros. Reiner já tinha trabalhado para outra pessoa antes de ser chamado para a família Smith, porém o relacionamento sempre foi estritamente profissional e distante.

Contudo, aprendeu desde do princípio que Levi não era assim. Mesmo no início quando este ainda lhe parecia terrivelmente silencioso e perdido no meio dos seus fantasmas, demonstrava sempre pequenos gestos que o fizeram estranhar nas primeiras vezes. Não esperava nenhuma proximidade. Não esperava que ninguém perguntasse pelo trabalho. Se estava entediado, se era aborrecido, como é que tinha escolhido aquela profissão, se gostava ou se queria fazer outra coisa. Não eram perguntas vazias de interesse. Pelo contrário, Levi sempre ouviu atentamente cada resposta e quando começou a tornar-se numa pessoa que não baixava a cabeça, passou a sorrir de leve na direção dele quando agradecia. Agradecimentos que não eram necessários, mas ele sempre fez questão de dizer. Pouco a pouco, Reiner entendeu que naquela família não seria mais uma figura no exterior ou quase invisível, mas alguém próximo. Levi dizia mesmo que o considerava família e se ainda restasse qualquer dúvida acerca disso, eram momentos como aquele que o faziam ter a certeza que o empresário nunca mentiu acerca disso.

– Estou bem, Sr. Smith. Um pouco desorientado, mas nada de grave. – Resolveu tranquilizar ainda que sentisse uma dor estranha nas costas. Não intensa, mas como se alguma coisa ardesse. Ter-se-ia ferido em algum lado? Não recordava. Aliás, custava-lhe recordar os últimos acontecimentos que o levaram a estar ali.

– O Dr. Jaeger disse que não sofreste qualquer golpe na cabeça, pelo menos não na área que afetasse a memória. – Disse Levi, mantendo-se ao lado de Reiner para que este não se atrevesse a sair da cama onde estava. Virou a atenção para o médico. – Tem que haver outra explicação. Tem a certeza que não encontrou qualquer traço de nenhuma substância estranha?

– Não. – Respondeu Grisha. – As análises estão normais. Porém, posso assim como expliquei antes, fazer outro tipo de análise. Um pouco mais específica que comportará alguns custos…

– Não quero saber dos custos. – Cortou Levi com alguma irritação. – Faça o que for necessário.

– Com certeza, Sr. Smith. – Respondeu Grisha, saindo do quarto.

– Sr. Smith?

– Sim? Queres alguma coisa? – Perguntou apreensivo e Reiner sorriu um pouco.

– Calma. Não precisa de se preocupar tanto. De verdade que estou bem. – Assegurou. – Apenas queria perguntar o que aconteceu? Ou o que sabe? E… – Olhou em volta. – Onde está a Bianca? Está acompanhada pelo Eld? O Gunther? Ou chamou o Bertholdt?

– A Bia está na sala de espera com a Nina, o Mike e o Gunther. – Explicou. – Não te recordas mesmo do que aconteceu? Diz-me uma coisa, Reiner… qual é a última coisa de que te recordas? Lembras-te do que pedi para fazeres? – Perguntou. – Desconfio que isso esteja por detrás do que aconteceu.

– Eu… – Começou, tentando recordar os últimos acontecimentos.

Recordava o casamento entre Isabel e Farlan e como aparentemente estaria a correr bem, até ao momento da explosão. Os momentos que vieram depois da explosão também eram evidentes. Retiraram Estela do carro em chamas, melhor dizendo Levi arriscou-se e Zeke também os auxiliou. Oluo e Connie morreram no local e Sasha… bom, a última coisa que recordava era que ela estava no hospital em estado crítico. Soube disso pouco antes de Levi lhe pedir para ir à casa de…

– Reiner?

– Fui à casa do Nile, mas a casa estava… quase como que abandonada. – Disse, passando uma das mãos nos cabelos e tentando lidar com a frustração de imagens tão pouco claras na mente dele.

– Ele não estava lá? Não o perseguiste até algum sítio?

– Perseguir?

– Não sei, estou a especular. – Respondeu Levi. – Foste encontrado a alguns quilómetros da casa do Nile dentro de um carro que não te pertencia. Estavas inconsciente. Não te recordas de ter entrado num carro? O que aconteceu dentro da casa? Entraste em confronto com alguém? Com o Nile?

– Não… não, eu acho que a casa estava vazia. – Respondeu confuso não só com as perguntas, mas com as falhas de memória. Conseguia ver-se dentro da casa, a caminhar no interior, a verificar gavetas e outros locais. Porém, as imagens não surgiam como uma sequência, mas como pedaços.

No entanto, pelo que tinha ouvido o Dr. Jaeger dizer, não havia vestígios de alguma substância estranha no seu sangue. Isso não era coerente com aquelas falhas de memória porque sendo certo que sentia alguma dor de cabeça, essa não parecia ser a razão por detrás disso. Havia mais qualquer coisa e que claramente, só poderia associar a algo que lhe tenham dado. Mas quem? Como? O quê? Teve um confronto com alguém? Como é que não se recordava?

Como é que ele pode ter dito que não havia nada de suspeito nas análises?”, questionou-se e felizmente, ficou satisfeito por ver que a mente dele não estava tão distorcida. Ele sabia que a família Jaeger e o Nile Dok mantinham alguma proximidade. Portanto, não seria tão estranho que não pudesse exatamente confiar nos resultados daquelas análises. Vendo que no braço também tinha uma agulha que estaria a limpar os vestígios que pudesse haver, dava-lhe quase certeza absoluta que não encontraria a resposta ali. Não podia confiar nas palavras de Grisha e nem de qualquer médico daquele hospital. Talvez apenas Rico, mas isso seria uma ideia para depois.

De momento, teria que desconfiar assim como fez até ao momento, de qualquer palavra ou “boa” ação dos Jaeger na direção da família Smith.

– Desculpa, Reiner. Devia deixar-te descansar e não insistir mais nisto agora.

– Não peça desculpa, Sr. Smith. Eu lamento que de momento não consiga recordar, mas assim que souber mais qualquer coisa, digo-lhe.

– Ok, não te preocupes. Por agora fico aliviado que estejas bem. – Virou as costas. – Tive medo que… não quero que nada te aconteça por minha causa, Reiner. Acho que mesmo depois do longo caminho que fiz até agora, não estou tão preparado quanto pensava para perder pessoas.

– Lamento não ter conseguido aperceber-me do explosivo antes.

– Não. – Virou-se para o segurança. – Não te culpes pelo que aconteceu. A culpa não é tua.

– Nem sua, Sr. Smith. – Afirmou e viu um sorriso triste.

– Bom… isso já será mais difícil que acabemos por concordar.

 

*_*_*_*_*_*_*_*_*_*_*_*_*

 

Eren enviou outra mensagem quando estava perto do prédio onde vivia Eduardo. Contudo, este não respondeu e o moreno desistiu de esperar até porque estava cada vez mais preocupado. Sendo certo que ninguém ficaria bem depois do que aconteceu, continuava que o outro tivesse desaparecido daquela forma. Ainda se questionava se o acidente envolvendo um veículo trouxe más memórias ao amigo relativa aos irmãos, mas cada vez que tentava seguir essa linha de pensamento, parecia-lhe pouco provável. Eduardo sempre pareceu alguém que lidava perfeitamente com o passado e não deixava que isso o assombrasse. Portanto, a atitude era um tanto confusa, mas Eren queria saber o que se passava e se possível ajudar.

Apressou mais os passos, mas quando estava já a pouca distância da porta do apartamento de Eduardo estranhou o som da música alta. Um dos vizinhos passou pelo moreno, grunhindo entre os dentes sobre a música e por momentos, Eren pensou que o som fosse de outra casa, mas parado diante da porta, concluiu que era mesmo do apartamento do amigo. Confuso, hesitou antes de erguer a mão para tocar à campainha, mas ao escutar a voz do amigo, carregou no botão.

A voz de Eduardo e outra voz parou de soar, mas a música continuava quase ensurdecedora quando a porta se abriu. O amigo estava apenas com umas calças desportivas e o torso coberto de pequenos arranhões, além das marcas de batom evidentes no rosto e os cabelos desalinhados.

– Eren, o que…?

Ainda estupefacto Eren aproximou-se um pouco do outro e percebeu que o cheiro vinha da casa era de algo familiar.

– Só podes estar a brincar. – Disse Eren. – Eu aqui preocupado que estivesses mal, mas parece que estás melhor do que pensava.

– Escuta, Eren não é…

– Sei que nem sequer os conhecias há muito tempo, mas vir para casa fumar merdas e comer putas... – Olhou para as duas mulheres quase despidas no sofá que tinham um ar bem divertido. – Este era o nível que não pensava que fosses descer. E chamaste-me aqui para quê? Para assistir? Se foi isso podes ir à puta que pariu!

– Não, eu não… escuta, eu não sei quem são elas! Eu não…

– Claro, elas caíram aqui de paraquedas. – Ironizou o moreno. – Esquece, tu não me deves satisfações, mas eu pensava que… puta que pariu nem sei o que esperava encontrar, mas isto com certeza não era uma das hipóteses.

– Será que me podes ouvir por mais de 10 segundos antes de me acusares injustamente?! – Perguntou irritado.

– Qual acusar? Eu tenho olhos na cara! – Ripostou Eren no mesmo tom. – O Connie, a Sasha e o Oluo podiam não ser teus amigos ou apenas conhecidos, mas pessoas morreram ontem e tu vieste para casa fumar e comer putas… diz-me lá o que queres que pense sobre ti?!

– Morreram…? – Questionou num tom mais baixo com um ar perturbado.

– Não atrapalho mais. Não faço ideia por que razão me chamaste aqui, mas se estiveste todo este tempo também só a rir de mim também já não me surpreenderia. – Disse num tom que não escondia o ressentimento. – Não serias o primeiro a mentir e com certeza não serás o último nesta cidade com gente nojenta.

– Hei, Eren! Espera!

Ouviu a voz de Eduardo chamá-lo várias vezes e com receio de acabar por ouvir mais mentiras, correu pelo corredor e desceu rapidamente as escadas. Não queria estar ali. Se possível queria até esquecer o que tinha visto. Pensava que já tinha tido a sua dose de desilusão com pessoas, mas a vida mostrava-lhe mais uma vez que não era assim.

Se Eduardo também esteve a rir dele, era apenas mais um. Se aquela era a forma “saudável” de lidar com o que aconteceu, então também não compreendia como podia ter mentido tanto.

Se calhar todas aquelas tretas de falar com um psiquiatra ou psicólogo eram só mais mentiras. E se ele for como eu? Que mergulha no lixo para poder esquecer? Eu fiz o mesmo antes e ele se calhar também sempre o fez… e só quis alimentar-me de mentiras? Como é que pude pensar que alguém em Sina iria querer mais do que mentir?”, sentiu as lágrimas engrossarem, “Se calhar acreditei numa pessoa que nunca existiu de verdade”.

Mesmo que fosse uma pessoa recente na vida dele, Eren teria que admitir que o outro deixou uma marca na sua vida. Algo que não conseguia compreender que fosse mentira. Relembrava as conversas, as palavras trocadas, sorrisos e a forma como se sentia na companhia do outro. Custava-lhe aceitar que fosse mentira. Doía-lhe aceitar que fosse mentira e a sua mente mesmo com a raiva a nublar a maior parte do raciocínio, esforçava-se para tentar encontrar uma justificação. Mas que razão poderia haver para o que tinha acabado de acontecer? Por que razão não conseguia simplesmente aceitar que aquilo era real?

Parou de andar.

Notou que mais uma vez saiu sem ouvir. Sem dar oportunidade do outro falar. A raiva dizia-lhe que não havia nada que pudesse ser dito que explicasse aquilo. Outra parte, uma que lhe dizia que tinha agido de cabeça quente, insistia para voltar ou pedir a Eduardo para conversarem num outro momento em que estivesse mais calmo.

Que justificação pode haver? Ele estava a divertir-se quando poucas horas antes pessoas morreram… e mesmo assim, eu não consigo aceitar que isso seja uma coisa dele”, tentou limpar o rosto com uma das mãos.

Do carro parado a alguns metros saiu uma figura que se dirigiu ao moreno ainda perdido em pensamentos conflituosos. Assim que estava próximo o suficiente, os olhos verdes encontraram alguém que o fez de imediato reavivar a cólera de antes.

– O que é que tu queres?

– Não te posso cumprimentar quando te encontro na rua?

– Não. – Virou as costas, mas o outro passou para à frente dele. – Sai da frente, Thomas. Acredita que estou sem paciência para as tuas merdas.

– Bloqueaste o meu número e mesmo os outros que tentei usar para falar contigo. Não é nada justo da tua parte tratar-me dessa forma. – Insistiu sem sair da frente do moreno.

– Eu não tenho obrigação nenhuma de falar contigo. Agora sai da…

– E se formos beber um café?

– Comeste merda de manhã, foi? Achas mesmo que vou contigo a algum lado? Sai da…

Não teve a oportunidade de concluir a frase, pois recebeu um golpe no rosto. Aconteceu tão rápido que não teve sequer o ato reflexo de se proteger, recebendo em cheio a chapada na face.

Em choque recuou até sentir a parede atrás dele.

– Só queria que conversasses comigo. Que me desses a oportunidade de corrigir o que fiz antes, mas tu és teimoso. – Disse num tom seco, dando passos na direção de Eren. – Pior, tentas fingir uma coisa que não és. Não és nenhum santo, Eren e mesmo assim, eu esperei pacientemente, aturei todas as manias que tinhas e só queria passar um bom bocado contigo. Iria continuar a suportar ver filmes ao teu lado. Até continuaria a fingir algum romance o resto dos nossos dias, apesar de ambos sabermos que não há puta que tenha aberto mais as pernas do que tu.

– Fica longe de mim! – Tentou empurrar Thomas, mas notou com as mãos e braços estavam trémulos e portanto, a ação quase não produziu efeito nenhum.

– Ainda há tempo para mudares de ideia e reconsiderares. Afinal de contas, pensa como estou a ser generoso. Pensa como gosto de ti ao ponto de esquecer todos os outros e ficar com um produto usado. É até meio romântico se pensares bem. – Sorriu ao ver que Eren o olhava, apesar do medo e das várias emoções se confundiam nos orbes verdes. – Vem, vamos então para o nosso passeio.

– Eu não vou a… ah! – A resposta foi cortada por um golpe no estômago e assim que prostrou, Thomas agarrou os cabelos dele e um dos braços, puxando-o sem cuidado até ao carro. O moreno sentiu-se aterrorizado ao aperceber-se que apesar de tentar, o pânico retirava-lhe as forças e era empurrado como se não fosse nada.

 

Flashback

– Cada vez que falo disto, cada vez que qualquer coisa me faz recordar o que aconteceu… eu estou lá de novo. – Disse, fechando um pouco os olhos. – E não posso fazer nada. Não tenho forças para fazer nada. – Abriu os olhos e saiu da cadeira. – Não vou continuar a falar disto. Nem sei como conseguiste que…

– Eren podemos parar por hoje. – Interveio Mike. – Não precisamos de continuar a falar dessas memórias, mas quero que tenhas em mente uma coisa. Por favor, escuta-me Eren.

O moreno parou perto da porta. Estava agitado. Queria sair dali, afastar aquelas memórias que se refrescaram ao tocar no assunto. Porém, não pôde deixar de parar. Sempre tinha a tendência de sair sem ouvir tudo o que lhe queriam dizer e isso começava a pesar cada vez mais na sua consciência e por isso, parou.

– Não imagino o que possas dizer que faça com que isto… não há nada que ninguém possa dizer ou fazer para que…

– Um dia podes precisar de lutar contra isso e impedir que esse pânico, essas memórias sejam a razão pela qual não lutas. Pelo contrário, elas deviam ser a razão para lutar para que nunca mais uma coisa dessas te aconteça. Não és tão frágil como pensas, Eren. Ninguém que sobrevive a uma coisa dessas é.

Fim do Flashback

 

A porta do carro estava aberta enquanto Thomas o empurrava para dentro. Se entrasse naquele carro, se fosse levado sem lutar com certeza iria arrepender-se muito mais. Aquela troca de palavras com Mike ficou mais presente na mente dele do que qualquer coisa que tivesse acontecido no passado. Possivelmente esse tenha sido o rastilho para se defender. Sem olhar para Thomas que estava atrás dele a empurrá-lo, limitou-se a mover a cabeça para trás com força suficiente e felizmente, pontaria para bater diretamente no rosto dele. Ao desorientá-lo um bocado, procurou empurrá-lo, arranhá-lo e até golpear com as mãos e pernas para que o afastasse.

Vendo que nem tudo era efetivo e que não estava a recorrer a tudo o que tinha à sua disposição, chamou por ajuda. Afinal de contas estavam no meio da rua. Haveria pessoas a circular e bastava que uma delas chamasse a polícia. Ele não era tão ingénuo ao ponto de acreditar que alguém o iria ajudar diretamente, mas acreditava que chamassem a polícia.

– Só estás a piorar as coisas para ti!

Assim que viu que o outro tentava cobrir a boca dele com a própria mão, Eren não pensou duas vezes e mordeu com força a mesma, provocando mais insultos e mais um espasmo de dor. Assim que viu que podia distanciar-se, tentou correr mas logo tropeçou quando o outro bateu-lhe numa das canelas, fazendo-o cair no chão.

O moreno ia tentar levantar-se, mas Thomas puxou-o novamente por uma das pernas, querendo arrastá-lo para dentro do veículo a qualquer custo. Os olhos verdes prenderam-se ao chão, tentando cravar as mãos em qualquer brecha que houvesse para impedir que fosse arrastado, visto que não era tão fácil pontapear naquela posição. Em seguida, quando ia levantar o rosto para pedir diretamente ajuda a qualquer um dos transeuntes que estivesse por ali, apenas viu alguém passar por ele. Por momentos, sentiu o pânico regressar, julgando que Thomas talvez não estivesse sozinho, mas a outra pessoa bateu em Thomas e permitiu que Eren se afastasse.

Assim que olhou para ver quem era, ficou mais do que perplexo ao ver Bertholdt. Não estava com a roupa formal de cores escuras que usava durante o trabalho. Usava algo bem mais casual, indicando que estaria de passagem e que mesmo assim optou por não ignorar o que estava a acontecer.

– O que…? – Thomas tentou falar, mas o segurança bateu com mais força e Eren viu o outro cair inconsciente perto do carro.

Em seguida, o segurança voltou-se para o moreno que se encontrava sentado no chão ainda em choque com o que acabava de ver. Viu Bertholdt parar à frente dele e estender-lhe a mão.

– O que estás aqui a fazer? – Perguntou Eren com um tom ainda estremecido.

– Eu é que pergunto isso. – Ripostou Bertholdt. – Estou de folga. Apesar das circunstâncias, o Sr. Smith insiste em que mantenha os dias livres a que tenho direito. – Explicou, mantendo a mão estendida na direção de Eren que acabou por aceitar para se levantar com alguma dificuldade. – Queres que entre em contacto com o Sr. Smith?

– Não. – Respondeu. – Obrigado.

– Suponho que não queiras perturbar o Sr. Smith com mais problemas. – Comentou Bertholdt, olhando de soslaio para Thomas que continuava inconsciente no chão.

– Não…

– E que por isso não queiras ser visto num hospital ou aqui quando a polícia chegar. – Acrescentou. – Vão fazer perguntas e ele vai saber.

– Tens razão. – Concordou Eren, optando por seguir Bertholdt por alguns minutos até estarem distantes do local. – Vives naquela área? – Perguntou ao fim de todo um silêncio que se manteve durante o caminho.

– Não, mas tenho amigos por ali. – Respondeu Bertholdt. – Porquê?

– Por nada. – Respondeu Eren.

– Vais para casa sem problemas a partir daqui? – Perguntou o segurança.

– Sim.

– Espero que com tudo o que está a acontecer, realmente não comentes nada disto com o Sr. Smith.

– Eu disse antes que não o queria incomo…

– Eu sei, mas os deslizes acontecem. – Cortou o outro. – Devias ter cuidado. Penso que ele já está com demasiada coisa na cabeça para se preocupar ainda mais. Nós os dois sabemos que ele ficaria ainda mais perturbado e em vez de colocar-me a tratar da segurança dele, iria fazer-me andar atrás de ti. Penso que eu serei mais útil zelando pela segurança dele e da filha de perto do que lidar com ex-namorados que tu não soubeste controlar.

– Tu andaste a bisbilhotar a minha vida? – Perguntou Eren entre os dentes.

– O Sr. Smith já pediu que tivesse algum cuidado contigo e com aquele Thomas antes. Ao contrário dele, procurei saber um pouco mais sobre o assunto para saber se realmente justificava essa preocupação. – Disse, observando o moreno que após um curto silêncio também encarou o outro.

– Isto é mesmo tudo preocupação pelo Levi ou odeias-me por alguma razão em particular?

O outro arqueou uma das sobrancelhas.

– Por que razão te deixei essa impressão?

– Estiveste na festa de casamento sem a permissão do Levi? Viste a explosão? Viste o Eduardo sair? Foste tu que o fizeste sair? Conheces o Thomas? Queres que guarde segredo pelo que aconteceu aqui apenas por preocupação com o Levi ou há mais alguma coisa que eu deva saber?

Quando fez a primeira pergunta, as outras seguiram a corrente. Por mais que o segurança o tivesse ajudado com Thomas, não conseguia deixar de ver nos olhos do outro um certo desprezo por ele. Não era uma coisa que acontecesse só agora, mas desde que se cruzaram e Eren não conseguia afastar aquele desconforto perto do outro. Tudo bem que havia pessoas que riam, que o odiavam abertamente mas Bertholdt sempre lhe pareceu mais discreto e de certa forma mais assustador.

– Tantas perguntas. – Começou por dizer. – Inspiro assim tanta falta de confiança em ti? Mesmo depois de ter ajudado com o teu ex-namorado que ao que tudo indicava não iria levar-te para um passeio muito agradável. Embora eu não precise que confies em mim porque não te devo explicações, Eren.

– Também não acho que o Levi confie em ti, caso contrário não estarias de folga num momento destes. Aparentemente nem ele te quer por perto. – Apontou.

– É a tua opinião. Quem diria que eras tão desconfiado. – Comentou.

– Nesta cidade onde as pessoas vestem as mentiras como verdade não devias esperar outra coisa. – Disse Eren e viu o outro dar um passo na direção dele com uma expressão que não conseguiu identificar para logo em seguida ser apanhado de surpresa pela pergunta.

– Será que já tivemos esta conversa antes?

– Huh? Eu não acho que…

– Claro que não. Não sou alguém particularmente fácil de recordar, exceto se tivermos em conta a minha altura, mas de resto não penso que tenha nada de especial pelo qual deva ser recordado.

– Estás a ser irónico ou estás mesmo a dizer que nós já nos falámos antes? – Perguntou Eren confuso.

– Não estou a dizer nada. Bom, tenho que ir. Cuidado no caminho para casa, Eren. – Disse, voltando as costas e partindo noutra direção.

Eren ainda ficou parado por alguns momentos. Não entendia bem o rumo daquela conversa. Sendo certo que podia ter acusado Bertholdt injustamente, aquelas não eram as respostas que esperavam. Será que realmente já teriam falado antes? Mas como o próprio disse, ele tinha uma característica memorável que seria a altura dele. Poderia ser só ironia pela falta de vontade em responder às perguntas dele? Mas não quis responder por sentir-se ofendido ou por que existia algum fundo de verdade nelas?

A cabeça dele doía. Não só pela violência física que viveu momentos antes, mas ainda mais agora que se sentia mais rodeado de perguntas do que de respostas.

Contudo, decidiu que naquele momento não iria continuar ali parado e muito menos a pensar sobre o assunto, pois prometeu que iria ao encontro de Levi no hospital. Só que tendo em conta que não queria aparecer lá com vestígios do confronto que ocorreu entre ele e Thomas, decidiu passar por casa primeiro para tomar um duche, mudar de roupa e colocar alguma da base de Annie na cara. Felizmente não se cruzou com Annie ou Armin que pareciam ir ficar na cama até um pouco mais tarde e saiu rumo ao hospital.

O moreno esperava mais um dia complicado, mas poucas coisas o podiam ter preparado para o que viu quando chegou. A família de Oluo e Connie pareciam estar destroçados mas conversavam baixo e com algumas palavras de conforto sobretudo de Mike, que se encontrava lá com a esposa que tinha Bianca nos braços. Tentavam distraí-la da voz mais alta de um homem que não se importava em ser discreto com a voz elevada no meio do corredor do hospital.

– De que me servem as tuas desculpas, Smith?! Vai trazer a minha filha de volta? Pouco provável! Mas que ainda te atrevas a utilizá-la nas tuas experiências…

– Não é uma experiência. – Cortou Levi. – Está comprovado que resulta e queria só que tivesse a oportunidade de…

– De meterem-me mentiras na cabeça para fazer-me acreditar que o quê? Não és o responsável pelo estado da minha filha? Pela morte do marido dela e do coitado que trabalhava para ti? Sempre lhe disse para se manter longe de gente da tua laia que não olham a meios para…

– Eu compreendo que esteja transtornado com o que aconteceu e ninguém pode compreender pelo que está a passar, mas eu…

– Não és tu que estás naquela cama a morrer e a pedir autorização para fazer experiências. – Olhou para o Levi de cima abaixo. – Sem qualquer escrúpulo e tão habituado a mentir que acha que…

– Páre! – Eren interveio. – Por que raio está a falar assim? Ele não tem culpa do que aconteceu!

– Está tudo bem, Eren. – Murmurou Levi, posicionando-se entre o moreno e o pai de Sasha. – Ele…

– Não pode falar assim contigo! – Insistiu Eren.

O pai de Sasha ainda olhou novamente na direção de Levi com raiva visível nos olhos antes de sair e Eren queria ter persistido em defender o empresário. Este último parecia disposto a deixar que o culpassem pelo que tinha acontecido. O moreno não podia aceitar uma coisa dessas.

Só que mesmo não estando muito interessado nos motivos do pai de Sasha, Eren decidiu questionar acerca da razão para a exaltação. Até porque pelo meio das acusações havia referências a experiências que o moreno não entendeu.

– Tentei explicar-lhe que podia utilizar o programa HOPE para falar com a filha.

– Isso é possível?

– É um dos usos do programa e segundo me disseram, a Sasha continua num estado delicado mas o programa foi desenhado para atuar também nestes casos. O tempo de imersão tem que ser menor e mais controlado, mas é possível. – Explicou e deixou escapar um longo suspiro. – Penso que ele não entendeu que eu apenas queria dar-lhe a oportunidade de falar com a filha. – Olhou para Eren. – Estás bem? Pensei que o Eduardo viria contigo, mas pareces…

– Isso sou eu que pergunto. – Cortou o moreno. – Olha, acho que tu devias ir falar com a Sasha.

– Eu não sou família, Eren.

– És sim. – Contrariou. – Nem sei como podes pensar que não és família. Acho que isso pode ajudar o pai dela a entender ou pelo menos… eu não sei o que acontece quando uma pessoa está em coma. Se continua a ser consciente ou se está simplesmente no escuro e sozinha. Seja como for, se é possível que ela veja alguém, acho que devias ir.

Levi ficou pensativo, mas depois assentiu, concordando com aquela ideia. No entanto, antes de ir ao encontro dos médicos, referiu de novo que Eren estava estranho como se alguma coisa tivesse acontecido e que queria saber o que era, assim que conseguisse falar com Sasha.

O moreno não expressou a resposta com palavras. Deixou um beijo na testa do outro que sorriu um pouco com o gesto antes de ir ao encontro dos médicos. Quanto a Eren foi ao encontro de Mike, Nina e Bianca.

 

*_*_*_*_*_*_*_*_*_*_*_*_*

 

O médico com quem Levi falou, quis começar uma extensa explicação acerca do processo do programa HOPE. Isso até ao momento em que o empresário recordou o profissional, que ele mesmo tinha participado na construção do programa, portanto, não tinha dúvidas sobre o funcionamento. O único receio é que Sasha ainda estivesse excessivamente fragilizada ou com algum dano cerebral grave, mas o médico assegurou que além de um pequeno inchaço, não havia riscos no uso do HOPE. No entanto, ambos concordaram que o limite da imersão não deveria ultrapassar os 20 ou 30 minutos.

Ao entrar no quarto onde estava Sasha, o nó na garganta regressou em força. Ela continuava pálida e o ruído das várias máquinas ecoavam pelo espaço. Era quase ensurdecedor e por momentos, Levi não escutou algumas das palavras do médico e pediu que repetisse. O profissional entendeu o desconforto do empresário e guiou-o para um cadeirão posicionado ao lado da cama.

O homem de cabelos negros sentou-se com o pequeno aparelho na mão antes de respirar fundo e posicioná-lo. O médico apenas confirmou que o aparelho de Sasha continuava operacional e fez um sinal afirmativo antes de o outro recostar-se no cadeirão e fechar os olhos. Respirou fundo mais uma vez, dando o comando de voz para o programa iniciar.

No caso de Sasha, o programa era ativado externamente e segundo os médicos estaria a correr sem problemas e que esperavam que essa fosse uma das razões para acreditar que não havia danos cerebrais graves.

Ao abrir os olhos de novo, o espaço escuro à sua volta focava num ecrã onde pedia o nome de utilizador e uma palavra-passe. Introduziu as informações e em seguida selecionou a opção de conectar-se ao aparelho mais próximo. Surgiu o nome de Sasha e pouco tempo depois a permissão. O cenário escuro sumiu e em mais um piscar de olhos estava na frente de uma escola e pelas características do edifício à sua frente, reconhecia o local. Já lá tinha ido outras vezes e por um lado, surpreendeu-se com a riqueza de detalhes que estava diretamente relacionado com o utilizador daquele cenário. Por outro lado, concluiu que aquele sem dúvida seria dos lugares que a professora melhor recordaria.

Algumas crianças passaram por ele, assim como outros funcionários à medida que percorria o mesmo caminho que fez outras vezes, quando foi visitar a amiga. Em pouco tempo, estava parado na frente da porta de uma sala que não conseguiria esquecer e viu a mão tremer um pouco antes de abrir. Perto de uma das janelas abertas com dois livros na mão e uma pequena mala ao lado, a professora olhava para o exterior com um sorriso. Assim que ouviu a porta, ela sorriu.

– Olá Levi. – Saudou com a energia do costume.

Ali estava ela completamente livre de qualquer ferimento, amputação e máquinas à sua volta. Os cabelos presos, feições rosadas, uma camisa azul clara e umas calças de cor escura com umas pequenas sandálias brancas. Um estilo simples, mas que sempre lhe assentou bem, podendo por vezes enganar quem a julgava sempre assim uma figura serena. O que até podia ser, pelo menos até existir comida em jogo.

– Sasha… – Murmurou com uma voz mais trémula do que pretendia, mas logo tentou controlar as próprias emoções, pois não sabia se a mulher a poucos metros era consciente de onde estavam. Se se julgava num sonho, se era consciente do programa HOPE e pior se recordava o que teria acontecido. – As aulas já terminaram por hoje?

– Sim. – Confirmou. – Mais um dia em que fico feliz por ter escolhido esta carreira. – Acrescentou, caminhando na direção do amigo. – Vens acompanhar-me? Mal posso esperar para chegar a casa e ver a Estela e o Connie. Espero que ele não tenha destruído a casa entretanto.

– Pois, esperemos que não. – Disse, deduzindo que quem sabe a amiga até considerasse que aquilo nem fosse um sonho, programa ou alucinação. Possivelmente para ela fosse uma realidade, o que o deixava com pensamentos conflituosos quanto a isso. Por um lado, viver naquela doce ignorância deixava-a feliz, mas por outro lado estava a viver uma mentira.

Porém, se por fatalidade não resistisse à gravidade dos ferimentos, que lado positivo podia justificar dizer a verdade? Qual o lado positivo de a deixar infeliz? Não era preferível que se aqueles fossem os seus últimos momentos, ela fosse feliz?

Existia também o outro lado da moeda. Ela recuperar a consciência e descobrir que viveu uma mentira. Podia desejar não sair dali nunca. Podia desejar não querer regressar para a realidade.

Não… ela não faria isso. Pela filha, ela não faria isso”, concluiu.

Quando estavam próximos à residência onde Sasha vivia com a filha e o marido, ela parou de andar e virou-se na direção de Levi, mantendo o sorriso.

– Não precisas de ter medo, Levi. Eu sei.

– Sabes? – Confirmou confuso.

– Parabéns, o programa é definitivamente um sucesso. O nível de pormenores e aquilo que podemos adaptar ao nosso gosto é impressionante. – Elogiou.

– Então, tu sabes… desculpa, eu não sabia como dizer ou se devia dizer.

– Confesso que no início fiquei um pouco confusa. – Admitiu. – Mas que as coisas acontecessem exatamente como queria e principalmente que já tivesse regressado ao trabalho, sendo que a Estela é tão nova… Havia vários pontos que me fizeram questionar estes cenários que são como eu os recordo e que as pessoas em grande parte atuam como eu espero que o façam. – Tocou no rosto de Levi que sentiu um aperto no peito ao notar que mesmo sendo uma réplica, havia qualquer coisa que lhe dizia que não estava somente a sentir um gesto manipulado por números e códigos, mas que existia qualquer coisa real. – Estás com uma expressão muito abatida, preocupada e acima de tudo culpada. Eu tenho a certeza absoluta que não existe razão sobretudo para a última.

– Sabes o que aconteceu? – Perguntou, erguendo a própria mão para tocar na dela que se mantinha no rosto dele.

– Já tentei várias vezes, mas não sei como vim aqui parar. – Respondeu. – Só sei que antes estava rodeada de escuridão e agora posso viver isto mesmo que eu saiba que não é real. É melhor do que onde estava antes, mas tendo em conta que estou aqui significa que tive um acidente, certo? Estou no hospital?

– Sim. – Confirmou, distanciando-se do toque daquela mão.

– E a minha Estela e o Connie?

– A pequena está bem. – Respondeu, engolindo em seco. – Mas o Connie…

Sasha esboçou um sorriso triste.

– Desde do momento em que me apercebi que o programa HOPE estava a funcionar, sempre esperei encontrá-lo de verdade. – Virou as costas e viu no jardim onde o marido e a filha estavam sentados. Connie falava com Estela completamente absorto no próprio mundo. – Embora este que aqui seja exatamente como recordo, sempre soube que não era mesmo ele. Então, o que aconteceu é grave… estás com a minha filha?

– Ainda não teve alta. Esteve em observação, mas está bem. Hoje pensava em levá-la ou deixar que os pais do Connie ou mesmo que o teu pai a leve. Sem dúvida deves preferir que a pequena esteja com a tua família enquanto não te recuperas.

– Os pais do Connie depois de tanto tempo a tentar ter um filho, optaram pela adoção e agora… com esta perda, não penso que seja justo sobrecarregá-los e o meu pai…

– Eu tentei que viesse aqui ver-te, mas penso que não compreendeu muito bem o conceito do programa. Ele tem receio que esteja a usar-te para alguma experiência e eu só queria que vocês tivessem a oportunidade de se ver e falar. – Explicou o empresário.

– O meu pai é uma pessoa complicada, que nunca aprovou que tivesse deixado a pequena aldeia que vivíamos para vir para a grande cidade. Sei que me ama muito e também à neta, mas… – Olhou para Levi. – Preferia que ela ficasse aqui perto de mim com outra família que também tenho. É um pedido egoísta, mas eu gostava de pedir ao melhor padrinho que mantivesse a minha Estela por perto. Queria vê-la assim que possível, assim que me for permitido acordar… mas se não puder acordar, quero pedir outra coisa. Um pedido ainda mais egoísta e que podes recusar, mas queria que fosses tu a cuidar dela. – Limpou algumas lágrimas. – Podes até dizer que é mesmo tua filha, se isso for mais fácil para ti e menos doloroso para ela.

– Não, eu não vou fazer uma coisa dessas. – Negou de imediato. – Escuta, eu fico com ela mas só até ao dia em que possas tu cuidar dela. Não podes desistir assim. Não podes falar como se a luta já estivesse perdida. Ela precisa de ti. Eu quero muito que possas estar com ela e de volta comigo, com a Bia, com todos…

– Eu quero estar com a minha filha e vou lutar com todas as minhas forças para que isso seja possível, mas preciso que prometas que se o pior acontecer.

– Sasha, eu…

– Promete, por favor. Os pais do Connie já devem estar num sofrimento terrível, o meu pai é muito boa pessoa mas tem tendência a guardar rancores e vai querer afastá-la de tudo e de todos. Ninguém pode viver assim e ser feliz. Eu quero que ela cresça vendo tudo de maravilhoso que este mundo tem para oferecer. Quero que faça muitos amigos, que esteja no nosso círculo de amigos… quero o melhor como qualquer mãe ou pai deseja. Eu sei que é um pedido terrivelmente egoísta, que não tens obrigações mas Levi, eu confio que se eu não puder, tu e também a Bia juntamente com os nossos amigos vão ser a melhor família que ela pode ter. Portanto, preciso que prometas. – Insistiu.

Levi hesitava na resposta e notou uma expressão cansada no rosto da amiga.

– Ok, eu prometo mas só se souber que lutaste mesmo até ao último momento. Até lá por ela e por mim não podes desistir. – Pediu e viu a amiga anuir. – Pronto, agora tenho que ir. Vou tentar convencer o teu pai a visitar e se ele não puder, então algum dos nossos amigos vai aparecer, mas tenho que ir agora. Vejo que estás mais cansada. Estas visitas têm um limite porque ainda estás num estado delicado.

– Tudo bem. Obrigada, Levi. – Beijou o rosto do amigo. – Cuida bem da minha Estela até eu sair deste hospital.

 

*_*_*_*_*_*_*_*_*_*_*_*_*

 

Aproveitando que a esposa ficava na companhia de Eren, Bianca e os recém-chegados Armin e Annie, Mike dirigiu-se ao quarto onde Reiner se encontrava. Dispensou a presença do médico presente que sendo o Dr. Jaeger, este não escondeu o desagrado ao ser convidado a sair mas teve que o fazer, pois não tinha um motivo real para permanecer no quarto.

Era bastante evidente que o segurança ainda estava confuso e Mike teve acesso aos exames que fizeram relativamente a possíveis danos que afetassem a memória. Não havia nada de físico que justificasse aquilo, portanto restava a hipótese de que lhe teria sido administrado alguma droga. Porém, a esses exames não conseguiu ter acesso. Saber que era o Dr. Jaeger que cuidava desse processo também não o tranquilizava e apenas aumentava as suspeitas.

– Então recebeu?

– Sim. – Confirmou Mike, tentando manter um tom de voz baixo e discreto. – Enviaste duas logo antes da chamada, mas não tive tempo de ver até desligares. Disseste que ias tirar mais e enviar, mas as restantes nunca chegaram.

– Mas se são só duas fotos… – Murmurou Reiner frustrado. – Não será suficiente.

– Vou ter que falar com a Historia para saber o que pensa acerca das imagens, mas antes de nos focarmos nisso… Reiner, pelo que entendi não conseguiste ver quem te atacou, mas quando estavas a descrever a manobra de imobilização, parecias muito pensativo.

Os olhos azuis encararam o psiquiatra.

– Na hora em que tentei dizer ao Sr. Smith o que aconteceu, as coisas ainda estavam muito baralhadas, mas agora quanto mais consigo recordar, mais tenho a certeza que alguém usou exatamente a mesma técnica em mim antes.

– Quem?

 

Flashback

– Tem a certeza que isto é uma boa ideia, Sr. Smith? – Perguntou o segurança, olhando tanto para Erwin como para Levi que se encontrava à frente dele descalço na relva e com as mangas arregaçadas até aos cotovelos.

– Não tenhas medo por mim, Reiner. – Disse Levi. – Não sou assim tão indefeso como pensas.

E de facto, apenas nos primeiros golpes, Reiner cometeu o erro de acreditar que teria alguma vantagem dado que o outro apenas se esquivava. Porém, aquilo teve um propósito claro: observar os movimentos do adversário para depois retirar as suas conclusões e atacar em conformidade. Ao contrário do que poderia aparentar, Levi era bastante forte e algum tempo depois, Reiner estava de joelhos com um braço a apertar com força o pescoço dele e sem qualquer hipótese de fuga. Pelo contrário, o mundo parecia apagar-se até que o outro o largou.

Levi passou para a frente dele, estendendo-lhe a mão para ajudá-lo a levantar-se.

– Onde é que aprendeu isso?

– O meu tio podia ter muitos defeitos, mas sempre fez questão que aprendesse este tipo de coisa. – Explicou em resumo. – Onde eu vivi, era perigoso não saber defender-me. Penso que ele tinha alguma noção real de artes marciais, mas que adaptou ao seu modo com truques menos legais e que colocariam em risco a vida dos outros. Quando fores atacado dessa forma, tens que ter uma reação forte e imediata. Dependendo de quem for, usa até os dois cotovelos com todas as forças para tentares, se possível, partir alguma das costelas. Parece um conselho terrível, mas pode safar-te de problemas. Lembra-te que se apanhares alguém que consiga executar isto ou reages no momento, eu depois não terás força para reagir e vai manter isto até caíres inconsciente ou pior.

– Será que podemos praticar, Sr. Smith?

Fim do Flashback

 

– Mas o tio dele não morreu naquele incêndio que houve na prisão? – Questionou Mike.

– Ele sempre me disse que não acreditava que o tio tivesse morrido. Acreditava que tivesse sido ele a provocar o incêndio para escapar.

– Morreram dezenas de pessoas.

– Bom, ele sempre disse que o tio não olhava a meios para cumprir alguma finalidade. – Retrucou Reiner que então bateu na cama com um dos punhos. – Ele ensinou-me perfeitamente como devia reagir e mesmo assim, quando confrontado não pude fazer nada.

– Não te podes censurar, Reiner. Pelo que disseste, não devia ser possível ninguém entrar na casa sem que te apercebesses. Pelo que dizes, nem sequer ouviste passos e o local era propício para que qualquer ruído chamasse a tua atenção. Isso significa que não lidaste com nenhum amador e sim com alguém que sabia o que estava a fazer. – Comentou Mike.

– Mas por que razão ele voltaria agora? Eu pensava que o Nile odiava toda a família Ackerman. Então por que razão chamaria um deles para ajudar? – Perguntou Reiner cada vez mais confuso.

– Eu não acho que ele esteja com o Nile. – Respondeu Mike pensativo, começando a caminhar pelo quarto. – Pelo perfil psicológico que me foi permitido traçar, não vejo o Nile pedir ajuda dele. Nem vejo o tio do Levi como a pessoa que está por detrás de toda esta onda de vingança contra a família Smith e em concreto contra o Levi.

– Na altura em que o Sr. Smith disse que o tio teria sobrevivido ao incêndio, tanto eu como o Erwin ficámos preocupados, mas ele descartou dizendo que o tio provavelmente iria desaparecer e não se deixaria apanhar de novo. O tio sempre iria conseguir recomeçar de novo em algum lugar. Era a especialidade dele.

– O que até pode ter acontecido, mas pelo registo criminal dele também é óbvio que Kenny Ackerman além de outros crimes relacionados com tráfico de droga, assaltos violentos, entre outras coisas, executava trabalhos sujos e assassinato a quem pagasse boas quantias. O que significa que alguém está a pôr dinheiro no bolso dele para agir e tendo em conta quem é o alvo desta vez… não podemos descartar a hipótese de alguma vingança. Afinal de contas, o Levi alcançou algo que ele provavelmente nunca imaginou que fosse possível.

– Mas se é assim, por que razão não me eliminou quando teve oportunidade? Pelo que vi do registo dele, ele não gosta de deixar pontas soltas e…

– Está a ser pago, Reiner. – Interrompeu Mike. – Alguém deu essas ordens. Alguém quer propositadamente criar paranoia. O Levi e a Bianca não podem estar sem vigilância. Não acho que exista um risco imediato de algo que atente contra a vida deles, mas acho que… acho que estão a tentar empurrar o Levi para uma espiral depressiva de novo. O objetivo dessa pessoa não é simplesmente dinheiro ou sequer a morte dele, essa pessoa quer ver sofrimento. – Concluiu.

 


Notas Finais


Até ao próximo capítulo!


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