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História Memórias Rasgadas - Capítulo LI


Escrita por: Imagination

Notas do Autor


Obrigada pelos comentários, mensagens, favoritos e a todos os que acompanham a fic!

Capítulo 51 - Capítulo LI


Capítulo LI

 

Ainda sentia como se a realidade e os pesadelos estivessem muito próximos, quando Bianca entrou no quarto. A expressão aliviada e alegre da filha ao vê-lo, forçou a que empresário fizesse o possível para que ela não visse como ele se sentia. Já há algum tempo que não tinha a necessidade de esboçar sorrisos forçados. A cada um que mostrou à filha e amigos, sentiu um nó na garganta. Os olhos de todos pareciam, ainda assim, observá-lo com pena e preocupação. Quem sabe, isso até tivesse razão para acontecer porque Levi continuava a ter a sensação que havia qualquer coisa muito errada com ele.

– Não mudaram a minha cama durante o tempo que cá estive?

– Não. – Respondeu Armin, cuidando dos pensos num dos braços do amigo. – O Eren comentou a mesma coisa. Ainda estás a pensar nos pesadelos que tiveste? Tendo em conta o que tem acontecido ultimamente, se calhar até deverias considerar normal.

– Quando cheguei aqui, chegaram a fazer exames ao meu sangue?

– Sim, mas a Hanji informou-me sobre o que te deu.

Levi queria pedir ao médico para fazer novamente análises ao sangue, mas pela expressão apreensiva dele, ponderou que o amigo fosse considerar um exagero. Quem no seu perfeito juízo, pediria análises ao sangue depois de uma noite de pesadelos? Esses que tinham razão para existir. Com tudo o que estava a acontecer, era normal. Era até expectável, pois muitos deles envolveram lembranças de maus tratos nas mãos do tio.

– Levi, eu podia receitar algum calmante mas como o Mike deverá estar mais dentro do assunto nesse aspeto, aconselho-te a falar com ele.

– Achas que estou perturbado, não é?

– Qualquer um de nós está, mas sei pelo Eren que nem sequer tens respeitado o mínimo de horas de sono e tu sabes que isso tem consequências. – Explicava pacientemente. – Podes ter comportamentos pouco habituais e...

A mente do empresário começou a desligar daquela conversa. Armin podia ter a melhor das intenções, mas era óbvio que estava a questionar o estado mental dele. O que à luz dos acontecimentos até era normal. Aliás, Levi começava a questionar-se a si mesmo. Talvez todo o stress, trabalho, falta de descanso e perdas de amigos, estivesse mesmo a ter um impacto mais forte do que queria admitir.

Agradeceu a Armin pelos cuidados e viu o amigo sorrir e sair para pouco depois encontrar Mike que terminava uma chamada.

– Vou ter que regressar ao meu consultório, mas e então? Como está ele?

– Fisicamente? Melhor do que esperava, mas acho que lhe devias receitar qualquer coisa para que descanse.

– Não gosto de o deixar dependente de medicação para descansar mas...

– Acho que ele precisa, Mike.

O psiquiatra já tinha notado a aparência forçada que o amigo tentava passar aos outros. Não estranhava que estivesse a sentir-se afetado por tudo o que vinha acontecendo ultimamente, só que gostava que o amigo não se culpasse pelas coisas erradas. Agora mais do que nunca era evidente que estavam a tentar prejudicar Levi e todos os avisos e pedidos de Erwin no passado faziam todo o sentido. Ele e os restantes amigos sempre tentaram protegê-lo e ajudar em tudo o que fosse necessário, mas a situação começava a descambar para um terreno perigoso em que vidas se iam perdendo. Isso teria um impacto negativo na vida de qualquer pessoa, mas para Levi seria trazer de volta fantasmas. Fantasmas de culpa que esperava que não conduzissem Levi de volta a um ódio tremendo que sentia por ele próprio quando o conheceu pela primeira vez. O sentimento de culpa era como um veneno.

Além disso, Mike começava a questionar se ele próprio começaria a ficar paranoico com as pessoas em torno do amigo. Não que desconfiasse diretamente dos amigos, mas por exemplo, estranhou todo um ressentimento e inimizade na direção da visita de Dina Jaeger. Não que as relações com ela e a família em geral fossem as melhores. Nunca foram, mas o psiquiatra recordava-se de como Bianca falou bastante bem da mulher de cabelos loiros, que aparentemente se aproximava cada vez mais de Levi e da filha. Ele sabia do interesse que essa mulher tinha num possível casamento do filho com Levi, que na opinião de Mike, jamais aconteceria.

Contudo, sentia uma necessidade cada vez maior de sentar-se com algumas das pessoas de quem notou uma tensão mais evidente na presença de Dina. Entre elas destacaria a mudança de comportamento de Bianca e sem dúvida, a postura de Eren que lhe parecia sempre entre o defensivo ou agressividade, conforme o grau de interação entre os dois. Era como se o moreno estivesse sempre desconfiado e à espera que alguma coisa acontecesse.

Mike deixou esses pensamentos de lado assim que entrou no quarto, onde Levi se encontrava. Este tinha os olhos presos nas próprias mãos e parecia bem distante. Uma postura desanimada e cansada.

– Parece que daqui a pouco já te vão deixar ir para casa.

Os olhos cinzentos ergueram-se para encontrar os do amigo. Porém, ao contrário do que tinha feito durante horas, agora não tentava disfarçar a exaustão e falta de ânimo.

– Ainda bem. Não quero continuar aqui.

– Queres conversar um pouco? – Sugeriu Mike.

– Não me disseram como ficaram as coisas com o Reiner.

– Capturaram vários cúmplices, graças a teu plano arrojado e o Reiner está a garantir que nada de suspeito acontece com os prisioneiros... algo semelhante à morte súbita dos responsáveis pelo ataque naquele evento de caridade. – Explicou de forma resumida. – Mas não é sobre isso de que devíamos falar.

Viu o homem de cabelos escuros mostrar um sorriso triste.

– Também achas que não estou bem da cabeça.

– Não é isso. Eu acho que estás exausto e sob uma grande pressão.

– Podes dizer, Mike. – Olhou para o amigo com uma expressão desanimada. – Queres dar-me algum calmante ou qualquer coisa que me ajude a dormir. Podes dizer.

– Sim, mas não gosto de ver na tua cara que pensas que isto é algum retrocesso.

– Podes dar-me o que quiseres, talvez eu precise mesmo de descanso. – Suspirou.

Mike não estava totalmente satisfeito com o estado de espírito do amigo. No entanto, considerou que seria melhor medicá-lo pelo menos, por uns dias. Tinha a certeza que o repouso, mesmo que induzido por medicação, teria efeitos positivos.

Quando por fim, Levi recebeu autorização para deixar o hospital, Bianca regressou para os braços do pai e insistiu em passar todo o tempo perto dele.

– Obrigado, Eren e desculpa por...

– Não peças desculpa. – Interferiu, não deixando o outro terminar a frase. – Ela tem todo o direito de querer estar contigo. – Comentou, referindo-se a Bianca que se encontrava adormecida contra o peito do empresário.

– Sim, mas estou a deixar que fiques a fazer tudo cá em casa e eu sei que também devias ter tempo para ti.

– Não queria estar noutro lugar que não fosse aqui ao teu lado, Levi. Fico feliz por poder ajudar, sobretudo quando precisas. – Disse, acariciando os fios negros.

– Promete que também vais descansar.

– Sim, não te preocupes com isso. - Continuou a afagar os cabelos do outro. – Olha, quanto ao que me disseste no hospital, eu estive a tentar confirmar o que pode ter acontecido. Aparentemente, todas as camas podem ter algum tipo de objeto para imobilizar pacientes, ou seja, aquele material é removível e pode ter sido colocado e retirado depois.

– Tu acreditaste em mim? – Perguntou entre o perplexo e tocado com o gesto.

– Sei que já fiz muita merda que faz com que muitos duvidem que eu seja capaz de acreditar nos outros, mas eu quero realmente ser alguém em quem possas confiar para qualquer coisa.

– Eren...

– Podes contar comigo para tudo. Podes contar-me tudo e eu vou ajudar a que descubras a verdade quer seja um sonho ou uma realidade. – Afirmou. – Por isso também sei que era possível o Zeke ou outra pessoa ter entrado no teu quarto por outra porta. Não sei se aconteceu, mas ainda vou voltar lá para tentar saber mais.

– Eren... sei que não gostas nada de hospitais. Eu... eu nem sei o que dizer. Só posso dizer que te amo...

– E eu também. Cada vez mais, Levi. – Beijou os lábios do empresário e pouco depois deixou o quarto. Antes de deixar o quarto, o moreno anda viu Kuro subir para cima da cama e aconchegar-se perto de Levi e Bianca. A imagem dos três deixou um sorriso no rosto de Eren que então saiu, encostando a porta com cuidado.

Seguidamente, desceu até à sala onde Mike, Nina, Petra e Hanji conversavam, aguardando o regresso dele. Aquela pequena reunião na sala estava a acontecer a pedido de Mike, caso contrário ele e os restantes presentes já teriam ido para as suas respetivas casas.

Eren sentia como se tivesse mesmo feito algo de valor. Uma coisa que nem mesmo o Levi esperava, mas doía-lhe ver como o outro parecia desesperar para que alguém acreditasse nele e todos apenas sorriam com uma pena mal disfarçada. Podia ser mesmo cansaço ou somente um pesadelo vívido, mas Eren queria descobrir a verdade. Parte dele, a parte em que acreditava que a sua família de sangue era capaz de tudo, dizia para ir a fundo naquela busca pela verdade.

Depois de uma troca de palavras um pouco seca entre os dois, Eduardo acabou por ir com Historia e Ymir. Ao que parece a advogada queria falar com ele e Eren ainda estava um pouco chateado com o amigo por este o ter impedido de ajudar Levi.

– Está a dormir?

– Sim e está em boa companhia. – Respondeu à pergunta de Nina.

– Então não percamos mais tempo. – Disse Mike. – Há uns dias atrás, mais precisamente pouco depois do casamento, a Hanji e a Petra falaram comigo sobre um assunto que se te deixar desconfortável, podemos falar só os dois, Eren. Ainda que, levando em consideração o perigo dos últimos tempos, eu gostaria de ter mais respostas do que perguntas muito em breve.

– E qual é o assunto? – Questionou Eren um pouco apreensivo por ter as atenções focadas nele.

– Dina Jaeger. – Respondeu o psiquiatra, vendo o moreno ficar tenso em resposta.

– É importante, Eren. – Falou Hanji. – Nós achamos que o Mike não deu logo a devida importância ao que dissemos.

– Na verdade, fui eu que vi. – Interveio Petra. – E compreendo que com a agitação destes últimos dias não tenha sido fácil encontrar um momento para conversarmos.

– O que foi que viste? – Perguntou Nina curiosa.

– Aos olhos de muitos pode ter parecido que o Eren ameaçou e começou a gritar na direção da Dina sem razão. Mas eu vi como ela olhou para ti, Eren. Foi um olhar que não consigo esquecer até hoje.

– Eren, eu e qualquer pessoa aqui entende que não possas ter uma boa relação com ela, tendo em conta que ela é a primeira esposa do teu pai que resolveu ter duas famílias. Só que às vezes, tenho a sensação de que é mais do que isso. Se não quiseres falar aqui na frente de todos...

– Não, tudo bem. – Falou, interrompendo o psiquiatra. – Se não contarmos tudo o que sabemos a uma altura destas, até podemos estar a prejudicar mais as coisas. Eu prefiro que saibam a verdade porque assim como disse antes ao Levi, ele não devia chegar perto daquela mulher...

– Eu sabia que não podia ser a única a não ir com a cara daquela cobra! – Disse Hanji.

Antes de mergulhar em lembranças concretas, Eren tentou explicar o melhor que recordava as circunstâncias em que conheceu Dina Jaeger. Por irónico que ele e todos pudessem achar ou até mesmo de mau gosto, ele conheceu-a sem saber que ela era oficialmente a mulher do pai. Este nem sequer os apresentou como deveria, mas achou que seria uma boa ideia, deixar o filho de outra mulher com Dina. Ela sabia evidentemente quem ele era, mas ele nunca a tinha visto antes.

– Por que razão o teu pai te deixou ficar algumas vezes com ela? – Perguntou Petra confusa assim como os restantes. – Não seria no mínimo estranho?

– A minha mãe ia passar uns tempos fora por causa de trabalho e teria que ser ele a ficar comigo. Só que pelos vistos, também não quis ter essa responsabilidade e achou que ela seria a pessoa indicada. – Suspirou. – Eu sempre andei um pouco de um lado para o outro. – Num tom um pouco mais desanimado, acrescentou. – Eu não era uma responsabilidade que outros quisessem ter.

 

Flashback

– Quando disseste que tinhas um favor para me pedir, isto não passou pela minha cabeça, Grisha. – Olhou na direção do menino que estava ao lado do pai um pouco cabisbaixo e pouco à vontade. Não só porque estava na casa de uma desconhecida, mas também porque a mulher claramente desde do princípio olhou para ele como se fosse a pior coisa que tinha visto.

– Dina são só uns dias e esperava uma atitude mais racional da tua parte.

– Racional? Tu trazes o filho de outra mulher para a minha casa e eu é que preciso de falar em racionalidade? Já ouviste falar em bom senso? – Olhou novamente para a criança com uma expressão de desprezo. – Dá-me náuseas só de olhar. É a tua cara.

– Esperava uma conversa um pouco mais civilizada, mas não estou a perguntar nada. Ele não vai ficar sozinho ou só com as desmioladas das empregadas que nunca sabem o que ele está a fazer. Aqui sei que pelo menos, estarás atenta ao que ele faz ou deixa de fazer.

A troca de palavras pouco afáveis entre os dois adultos prosseguiu à medida que a criança de cabelos castanhos e ainda bem perto do progenitor, pedia em silêncio que no fim, não tivesse que ficar ali. Preferia voltar para casa e lidar com o distanciamento e falta de atenção das empregadas do que ficar numa casa onde claramente não era bem-vindo. A mulher parecia detestá-lo com todas as forças e os dois nem sequer se conheciam. Tinha o pressentimento de que se ficasse ali, o tempo ali passado seria mais do que desconfortável.

O certo é que no fim da conversa a roçar quase uma discussão, Dina resignou-se àquela tarefa dada pelo marido. Este último não mostrou qualquer vontade de negociar ou ceder perante qualquer insulto ou chantagem e por fim, a mulher terminou por se resignar. Principalmente depois de ouvir algo que Eren não entendeu na altura. O pai tinha falado em colocar um ponto final em tudo e ficar com uma mulher que o soubesse escutar e obedecer como uma boa esposa devia fazer. O pequeno não podia imaginar que aquelas palavras significavam que para todos os efeitos, ele e a mãe eram uma segunda opção na vida de Grisha. Uma segunda família que o médico utilizava como um escape da primeira e essa segunda família oficialmente não existia. Perante a lei, perante todos os outros, ele era casado com Dina Jaeger e tinha um único descendente, Zeke Jaeger.

Na altura, tudo isso era desconhecido. Aquela mulher, a existência de outra criança não entravam sequer no universo de Eren. Aquele foi o seu primeiro contacto com aquilo que iria mais uma vez demonstrar aquilo de que as pessoas eram capazes. E, claro, revelar as verdadeiras cores do pai. Esse que na altura por ingenuidade ainda admirava. Era seu pai e pensava que o natural seria sentir-se feliz quando estava com ele. Mesmo quando parecia que o progenitor não estava muito interessado nele e quase sempre parecia desapontado com alguma coisa.

Porém, no passado Eren acreditou que ainda podia fazer melhor e que um dia quando fosse o que o pai e os outros esperavam. Quem sabe lhe dessem mais atenção e as pessoas à sua volta quisessem estar com ele em vez de evitá-lo. Ele só queria descobrir o que tinha feito de errado e corrigir para poder ser o motivo de orgulho do pai e assim, quem sabe também ter a mãe de volta a olhar e a conversar com ele.

A ingenuidade de uma criança pode ser dolorosa quando confrontada com a realidade.

– Posso ir lá para fora? – Perguntou a criança depois de um longo silêncio.

– Porquê?

Eren viu que no exterior daquela casa, mais precisamente no jardim, parecia haver alguém que podia ter a sua idade. Um pouco mais velho talvez, mas ainda assim seria alguém com quem conviver. Usualmente, estava rodeado de adultos portanto, conviver com outra criança mesmo que não partilhassem a mesma faixa etária seria fugir da rotina. No entender do moreno, podia até ser a única coisa positiva que iria acontecer na casa daquela desconhecida.

– Está um menino lá fora. Eu gostava de brincar um bocadinho. – Disse ainda um pouco intimidado pela postura e expressão da mulher à frente dele.

– O meu Zeke não se dá com gente como tu, pirralho. – Respondeu num tom ríspido. – O Grisha pensa que vou fazer aquilo que aquela outra puta não fez, mas eu tenho mais que fazer do que educar um bastardo.

Os olhos verdes refletiram confusão pelas palavras de ódio que lhe eram dirigidos. Quando a mulher de face severa avançou na direção dele, o menino encolheu-se antes de ser puxado pelo braço e quase arrastado pela sala.

– Está a doer! Larga o meu braço! – Queixava-se.

– Calado!

– Mas dói! – Disse, tentando libertar-se e cada vez mais irritado e confundido com o que estava a acontecer, reagiu. Aprendeu que aquela não seria a melhor forma de reagir, mas era só uma criança. Uma criança perdida, confusa e desorientada no meio de ódios que não compreendia.

Em resposta à agressividade de Dina, ele mordeu a mão que segurava dolorosamente o braço dele.

A reação a isso também não demorou. Um golpe forte no rosto dele. A cólera era visível nos olhos da mulher e por mais asneiras e comportamentos pouco recomendáveis que tivesse tido em casa, mesmo diante do pai, ele nunca tinha visto tal coisa no rosto de alguém. Sentiu medo e tentou distanciar-se. Queria até fugir daquela casa, mas a mulher prendeu os cabelos dele com as duas mãos e arrastou-o. Gritos soaram pela casa e alguns dos funcionários que ali trabalhavam, vieram ver o que se tratava. Ninguém interveio. Ninguém disse nada. Ninguém o ajudou enquanto foi arrastado até uma pequena arrecadação da casa. Foi empurrado para o interior daquele lugar escuro e frio diante dos insultos de Dina.

– Sua peste nojenta que nunca devia ter nascido!

– És uma bruxa! – Gritou de volta com o rosto em lágrimas.

– O teu paizinho queria que te desse educação, não é? Então, vamos ver se vais continuar com vontade de falar assim comigo. – Ironizou. – Até o papá voltar ou vamos ver… até quando me apetecer, vais ficar aqui dentro sozinho até aprenderes a falar comigo. Até aprenderes que sempre que me vires, vais lembrar-te da merda que és e que não tens o direito sequer de olhar para mim.

– O que foi que eu fiz? Por que é que és má para mim?!

– Vamos ver até quando te vai apetecer gritar assim para mim. – Falou, olhando com nojo para a mão que sangrava antes de fechar a porta violentamente.

Ao ver-se no escuro e ouvir a chave rodar, indicando que estava trancado, Eren entrou em pânico. Não pensava que a mulher por mais má que fosse, cumprisse aquela ameaça. Nem mesmo o pai que tentou amedrontá-lo várias vezes sobre o seu comportamento, dizendo que o ia deixar fechado no escuro do quarto ou mesmo na rua, não cumpriu com qualquer desses avisos. As palavras do pai deixavam-no triste na mesma, mas os castigos ficavam-se pelo tom de voz elevado.

Em poucas ocasiões alguma das empregadas de casa, chegaram a fechá-lo no quarto como castigo. Contudo, como sabiam que ele ficava muito agitado no escuro e chorava, acabavam sempre por deixá-lo sair ou até ligar a luz e deixá-lo só por poucos minutos antes de o deixar sair. Todos acabavam por sentir alguma pena, não ir adiante com as ameaças ou até ter algum receio, no caso das empregadas, de que o pai ou mãe dele acabassem por despedi-las. Algo que ocorreu em alguns momentos no passado quando consideraram que houve exagero nos castigos.

– Abre a porta! Eu tenho medo! Não gosto do escuro! Abre a porta! – Gritou várias vezes, batendo com os punhos na porta entre várias lágrimas.

Não gostava do escuro. Sempre lhe contavam histórias acerca de monstros que o iriam levar ou devorar devido ao seu mau comportamento. Quando lhe diziam isso, fazia-se de forte e afirmava não acreditar em nada disso. Só que posteriormente, acabou por pedir à mãe que deixasse sempre uma pequena luz acesa antes que ele adormecesse. Às vezes jurava que podia ouvir os monstros. Às vezes questionava se as histórias seriam reais.

Fosse qual fosse a razão, o medo do escuro fez parte do seu universo assim como de tantas outras crianças. Todavia, nem todas as crianças tiveram que enfrentar os seus medos daquela forma. Muitas delas não se viram fechadas durante horas a fio e nos dois dias que se seguiram sem que ninguém abrisse a porta.

Eren até acreditava que mais do que abrir a porta por pena, Dina acabou por fazê-lo porque sabia que não só a criança não se tinha alimentado durante aquele tempo, como provavelmente teria feito todas as suas necessidades naquele espaço. Não foi por pena pelo estado dele que mandou abrir a porta, mas porque sabia que teria outra discussão feia com Grisha se este regressasse para encontrar o filho naquele estado.

Portanto, pediu que tratassem da higiene dele e quando apareceu na frente da criança com um prato de comida, a mulher não o colocou logo na frente do menino esfomeado.

– Não olhes para mim. Cabeça baixa.

O menino obedeceu.

– Tenho…

– Quando queres alguma coisa, o que é que tens que fazer? Como é que pedes?

– Posso comer… por favor?

Mesmo depois de comer, Eren teve medo de ser fechado naquele lugar de novo. Onde, além de nunca abrirem a porta, não lhe deram de comer e nem quiseram saber se ia ou não à casa de banho.

Nunca tinham feito nada daquilo com ele e com medo que a mulher repetisse o castigo ou até piorasse como ela ameaçou, resolveu não olhar para ela, não falar a não ser que lhe perguntasse alguma coisa e passou o resto dos dias naquela casa entre a sala e um outro quarto com poucos brinquedos e uma televisão ligada.

Nunca falou com o outro menino, que naquela altura, desconhecia ser o seu meio-irmão.

Não voltou a levantar a voz ou desobedecer naqueles dias. Não contou nada do que aconteceu ao pai ou à mãe porque Dina prometeu que iria saber a verdade e ele iria arrepender-se.

Fim do Flashback

 

– Que horror. – Falou Nina por fim. – E tu nunca falaste disso a ninguém?

– Falei de algumas coisas com a minha avó. – Admitiu. – Ela quis saber o que tinha acontecido na casa da Dina porque eu tremia só de falarem no nome dela. A minha avó sempre me quis proteger e mal soube que era daquela forma que era tratado cada vez que o meu pai não tinha com quem me deixar, ela fez de tudo para sempre ser a pessoa que passaria a ficar comigo.

– Que tipo de psicopata faz uma coisa dessas com uma criança? – Perguntou Hanji indignada.

– E os teus pais nunca suspeitaram? A tua avó não lhes disse? – Perguntou Petra.

– Acho que contou ao meu pai. Ele veio confrontar-me com isso, mas a Dina estava lá e eu… acobardei-me e não fui capaz de confirmar. – Uma expressão desolada fixou-se no rosto do moreno. – A minha avó fez tanto por mim e eu naquele dia, fi-la passar por mentirosa.

– Não te podes culpar por uma coisa dessas, Eren. – Interveio Mike. – Eras uma criança e depois do que passaste, ser colocado numa posição dessas, é normal que tivesses medo. No fundo, não havia ninguém, aparentemente à exceção da tua avó, em quem pudesses confiar.

– Sim, mas eu gostava de poder ter dito a verdade. A Dina acusou a minha avó de estar a ficar senil e outras coisas que não percebi como eram graves.

– O teu pai não a defendeu? – Perguntou Nina.

– O meu pai achou que tanto eu como a minha avó estávamos a exagerar. – Respondeu com um sorriso amargo. – Também repreendeu a Dina pela forma como ela estava a falar da minha avó, mas não foi além disso. Ela sempre soube manipular tudo à sua volta para que a situação fique sempre a favor dela. Nem mesmo quando a minha avó morreu, isso foi diferente.

 

Flashback

O conceito de morte para uma criança era tão estranho. Ninguém conseguia explicar-lhe.

Nunca mais poderia estar com a avó, a única pessoa de quem sentiu um carinho genuíno. Ele recordava todo o sangue, todos os ferimentos, o impacto do acidente mas acreditou que pessoas boas como a avó dele fossem curadas pelos médicos. Porém, esses ainda foram capazes de salvar a vida do outro homem que provocou o acidente por excesso de velocidade e infração de outras regras de trânsito, mas a avó dele que sempre lhe deu todo o amor, essa eles não salvaram.

Quando soube que a avó não ia voltar mais, foi a primeira vez em muito tempo que Carla o abraçou e chorou com ele. A avó gostava muito de Carla também, ainda que não concordasse com tudo o que acontecia, sobretudo no que dizia respeito ao neto.

– A mãe vai falar ali com uns amigos que vieram também despedir-se da avó, ok? – Passou a mão nos cabelos do filho. – Eu já venho. Fica aqui sossegadinho que eu já volto, Eren. Fazes isso pela mãe?

A criança assentiu, vendo todos os rostos na sua grande maioria desconhecidos, trocarem murmúrios entre si. Não os via tão tristes como ele se sentia. Conversavam até mesmo perto do local onde a avó descansava. Queria empurrá-los a todos para fora dali a gritos e pontapés, mas a avó não merecia isso. A avó sempre foi tão importante para ele que fazia todo o sentido respeitá-la, principalmente sabendo que não tornaria a vê-la de novo.

Ainda estava a tentar segurar as novas lágrimas que queriam cair, sentado numa cadeira quando viu que alguém se aproximava dele. Como estava cabisbaixo, teve que erguer o rosto para ver que adulto iria tentar confortá-lo com palavras vazias. Ficou inquieto ao encontrar Dina.

– Parece que a avó agora já não está aqui para proteger o neto favorito. – Falou com um certo escárnio. – Como é que ela pôde preferir-te a ti do que ao meu filho? Tu que vieste depois e és um bastardo nojento.

– Por que é que és tão má? A minha avó morreu e tu…

– Porque mereces. – Respondeu. – Se não merecesses, ela ainda cá estaria. Bastardo nojento que virou essa demente contra mim, mas que finalmente teve o que mereceu.

– Fizeste mal à minha avó? – Perguntou entre o medo e alguma fúria que ia subindo de tom, não só pelas palavras mas também pelas suspeitas. Depois do que tinha vivido ao conhecer Dina, a ideia de que ela pudesse ter feito alguma coisa à sua avó parecia-lhe mais do que uma possibilidade.

Em resposta, Dina limitou-se a sorrir de lado e a frisar que a ‘velha teve o que mereceu’. Escutando essas palavras, o menino deixou-se guiar pelo impulso. Gritou na direção da mulher de cabelos loiros antes de ir na direção dela. Entre insultos e alguns golpes que ainda conseguiu desferir antes que o puxassem, esqueceu toda a cerimónia fúnebre e focou-se no ódio que sentia.

Quando a mãe e o pai vieram para o seu lado e o progenitor chegou a golpeá-lo no rosto para que parasse com aquele escândalo e comportamento, por fim ouviu o que Dina dizia. A versão que contava aos pais dele assim como a todos os presentes. Ela era a vítima que tinha vindo desejar os pêsames a uma criança que parecia ter sido criada por selvagens e que não só não reconhecia palavras de conforto e carinho, como ainda agia como um total desequilibrado.

E mais uma vez, não houve uma única pessoa que acreditasse nele.

A única pessoa que alguma vez acreditou nele estava morta. Chegar a essa conclusão fez com que algo bastante podre e distorcido começasse a nascer e crescer dentro dele.

Fim do flashback

 

– Penso que terá sido a partir desse dia em que vendo que dizer a verdade não servia de nada diante de todas aquelas pessoas habituadas à mentira, que qualquer coisa mudou. Por muitas coisas boas que a minha avó me tivesse ensinado e mostrado, aquela era a verdade nua e crua à minha frente. Ninguém queria saber. Ninguém acreditava em mim. Eu estava irremediavelmente sozinho a partir daquele momento. Se fosse apenas ignorar-me, talvez fosse mais suportável, mas pisar, humilhar, rir do meu sofrimento fez com que visse aquilo do que ela era capaz… daquilo que as pessoas são capazes de fazer e eu… – Olhou para os outros que o escutavam com atenção. – E eu quis que todos eles e todos quantos se cruzassem comigo sentissem o mesmo. Deixei de achar que fazia sentido tentar fazer o bem ou o certo porque não havia uma única pessoa que reconhecesse isso. A pessoa que alguma vez o fez, tinha morrido. – Seguiu-se uma pequena pausa no seu raciocínio. – Não penso que isso justifique tudo o que fiz na minha vida. Não posso atirar as culpas todas para os outros porque parte dessa culpa também é minha. Parte disso fez com que ferisse o Levi no passado e isso é uma coisa que até hoje me arrependo e não sei se algum dia vou conseguir perdoar-me pelo que fiz, mesmo que ele me tenha dado o perdão dele.

Os ouvintes daqueles relatos e memórias ainda processavam tudo o que tinham escutado. Aquilo acabou por explicar as razões pelas quais Dina não era digna de qualquer confiança e também entender um pouco melhor o que foi a infância de Eren.

Para Hanji, uma parte dela recusava-se a querer aceitar aquilo como uma justificação para tudo o que aconteceu com o melhor amigo. Porém, ela própria reconhecia que essa era a parte emocional. Eren já tinha reconhecido várias vezes que tinha errado e era óbvio que ainda se martirizava muito por tudo. Sendo também evidente o bem que ele trouxe à vida de Levi. Ela não podia negar que o amigo estava feliz por ter o moreno de volta à vida dele e isso no fundo, era o mais importante para ela.

– Pode não justificar tudo o que fizeste na tua vida, mas isto que partilhaste connosco é um exemplo de como o ambiente em que crescemos pode ser tão tóxico para nós e o impacto que pode ter na…

– Mike, eu agradeço o que estás a tentar dizer, mas eu podia ter sido diferente. O Levi e tantas outras pessoas não cresceram num berço de ouro que eu tive, tornaram-se melhores pessoas do que eu.

– Um berço de ouro é só mesmo isso, os bens materiais que nunca te faltaram. – Interveio Mike. – E assim como qualquer um de nós é consciente nesta sala, isso pode até ser um ponto positivo, mas não é tudo e não é o mais importante. Não tiveste outras coisas e nem é justo que te compares com o Levi ou outras pessoas. Cada um é diferente, mas deixaremos esse tipo de conversa para quando regressares ao meu consultório. Por agora temos que nos focar em outros aspetos.

– Desculpem, mas… – Falou Petra bastante absorta nos seus pensamentos. – Eu estava a pensar numa coisa. O acidente em que perdeste a tua avó… tu não achas que…?

– Não. – Eren esboçou um sorriso triste. – Sei que ela não teve nada a ver com isso. Apenas disse aquelas coisas porque acho que no fundo até queria ter tido interferência no que aconteceu. Ela sempre teve o hábito de dizer coisas maldosas dessas quando via a desgraça alheia na vida dos outros.

– É um monstro. – Afirmou Nina. – Como é que alguém pode sentir gosto em fazer uma coisa dessas? Credo, como é que deixámos que ela se aproximasse tanto?

– Ela sempre foi assim, mas eu nunca tinha evidências de nada e nem qualquer credibilidade para desmentir o que quer que fosse.

– Mas agora é diferente. – Disse Hanji. – Agora sei que não é só uma suspeita da minha parte. A Petra também viu, tu contaste coisas bem importantes e eu agradeço que tenhas partilhado isso connosco. Agora sabemos que temos que manter a ela, o marido e o Zeke longe do Levi. Também devíamos deixar alguém a vigiá-los.

– Bom, talvez a Historia tenha mesmo razão. – Comentou Mike.

– Em quê? – Perguntou a esposa do psiquiatra.

– Eu dizia que era muito arriscado e paranoico pôr um investigador privado a vigiar essa família, assim como ela sugeriu há uns tempos atrás. Ela queria assegurar-se do envolvimento dos Jaegers em alguns acontecimentos, mas precisava de outro tipo de provas. – Respondeu o homem pensativo, coçando um pouco a pequena barba que tinha. – Pode ser arriscado, mas penso que agora mais do que nunca, devíamos estar precavidos. Tudo o que tem acontecido tem ido longe demais e talvez sejam necessárias medidas extremas.

 

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– Desculpa que te tenha chamado logo assim depois de tudo o que aconteceu, mas gravar estas informações é bastante importante para mim. – Dizia Historia, transferindo o ficheiro que tinha acabado de guardar para várias fontes distintas.

Ymir estava numa mesa ao canto da sala ao desenhar no seu bloco de desenhos alguns esboços para futuras tatuagens. Ela não quis perder nada do que era dito da parte de Eduardo à companheira dela. Sabia que não havia razão para preocupar-se e podiam perfeitamente ficar sozinhos a conversar, só que ela nunca conseguia fugir de alguns ciúmes e possessividade relativamente à advogada.

No entanto, a conversa que escutou depressa dissipou esses pensamentos e trouxe outros bem mais preocupantes. Era incontestável que aquilo em que Historia estava envolvida, mostrava-se cada vez mais perigoso. Se por um lado, Ymir ficava contente porque a parceira encontrava mais alguma resposta, por outro lado sabia que significava um perigo acrescido.

Às vezes, discutia com Historia por causa do envolvimento da advogada em processos que podiam arruinar a carreira dela e mais importante que tudo deixavam a vida dela em perigo. Não era necessário ser nenhum génio para perceber que havia gente muito perigosa e sem escrúpulos no meio de todas aquelas histórias. Alguém que pelos vistos, estava bastante perto a julgar pelas palavras de Eduardo ao descrever novamente as circunstâncias em que conheceu Tiago e as palavras que esse lhe tinha dito antes de Historia o acusar e colocar atrás das grades.

Como prevenção para que tanto Tiago como Thomas não tivessem mortes “acidentais” ou misteriosas na cadeia, Historia conseguiu inclusive movê-los para outras localizações. Os dois encontravam-se em parte incerta e a ser sujeitos a vários interrogatórios. Um deles, Tiago, iria receber a visita de Mike que não seria nada de inocente, mas sim uma forma de conseguir informações daquele que parecia ser mais vulnerável.

– Só mais uma pergunta, agora fora deste caso. – Disse Historia, vendo Eduardo espreguiçar-se na cadeira.

– Às ordens, doutora advogada. – Disse sorridente.

– Conheces ou a tua família conheceu o Logan Andrade?

– O tipo que cagava diamantes? – Perguntou Eduardo e Ymir riu. Ouvindo esse tipo de comentários, ela até conseguia entender como é que ele se tinha enturmado tão bem com os outros.

– Bom, é uma forma de o descrever. – Disse Historia igualmente divertida. – Era conhecido como o magnata dos diamantes.

– Pois, eu ouvir falar dele. Ouvi como toda a gente. – Comentou. – Mas não sei muito mais. A minha família não era próxima. Os meus pais chegaram a comentar uma ou duas vezes, quando se falou da morte da mulher dele, que o viram só umas duas vezes em eventos de caridade. Era só um conhecido como era de muita gente.

– Pois… enfim, obrigada. – Falou a advogada com um sorriso.

– Também estás metida nessa história da morte misteriosa desse tipo dos diamantes? – Eduardo assobiou. – Esse sim deve ser daqueles casos cheios de teias de aranha.

– Faço o meu melhor. – Respondeu sem querer entrar em muitos detalhes. – Mas pelo menos, a nossa conversa também parece te ter deixado de melhor humor.

– É, eu sei. – Coçou a cabeça. – Não queria ter aparentado tão mal disposto, mas…

– O Eren ainda está chateado pelo de ontem? Por não o teres deixado ir atrás do Levi?

– Parece que sim. Já vai respondendo a algumas mensagens, mas parece que ainda não estou em território amigo. Ainda há minas pelo trajeto. – Espreguiçou-se novamente.

– Não te preocupes, isso passa-lhe. – Disse Ymir e o Eduardo ia responder, quando a campainha do apartamento soou.

– Olha, a pizza chegou. – Disse Historia. – Veio rápido.

– Vou lá dentro buscar o dinheiro. – Disse Ymir. – Vai pondo a mesa, loirinha e tu faz-te útil se quiseres comer e vai abrir a porta, seduzir o rapaz da pizza enquanto procuro o dinheiro.

– Ymir! – Repreendeu Historia.

– Deixem comigo, eu seduzo e quem sabe até nem paguemos nada. É o mínimo que posso fazer depois de me convidarem para comer aqui. – Disse Eduardo divertido, indo até à porta.

Tudo aconteceu muito rápido. À medida que cada um realizava tarefas diferentes, assim que Eduardo abriu a porta, viu o rapaz que trazia a pizza ser empurrado para logo surgir alguém de rosto tapado. Instintivamente, Eduardo fechou a porta imediatamente, mas o disparo soou logo em seguida. Uma munição forte para que ao mesmo tempo que berrava em voz alta para Historia e Ymir saírem, o disparo que veio assim que fechou a porta, ultrapassou essa barreira que o separava do desconhecido. Uma dor que lhe cortou a respiração surgiu à altura do seu abdómen e a porta escancarou-se.

O desconhecido entrou, ignorando por completo a pessoa que tinha atingido e adentrado na casa.

Entretanto Ymir já tinha agarrado rapidamente na mão da companheira e fugido para outra divisão. Não ficaram as duas no mesmo local e a mulher de tatuagens nos braços e expressão decidida a proteger a loira, pegou numa cadeira à medida que escutava passos na direção da cozinha onde se encontrava. Aquilo que tinha receado, começava a tornar-se uma realidade. O desconhecido estava claramente à procura de alguém em específico.

Prendendo um pouco a respiração, aguardou pelo passo seguinte e ao mesmo tempo que desferiu com todas as forças a cadeira sobre o atirador, ouviu uma outra voz proveniente da sala onde tinha visto Eduardo fechar a porta. Ela assim que se apercebeu que algo de errado estaria a acontecer, tentou em primeiro lugar, proteger a parceira. Sabia que Eduardo não podia estar bem e no pior dos casos, podia estar às portas da morte, mas não iria poder socorrê-lo com aquele desconhecido à solta.

Contudo, foi com surpresa que viu um dos seus vizinhos aparecer no corredor onde agora estava o atirador ainda de rosto coberto. Ela tinha conseguido atingi-lo a ponto de o deixar inconsciente e quem sabe até com algum hematoma grave.

– Menina Ymir, ouvi um disparo e vim logo ver se… – Era um dos vizinhos, que ela sabia através da companheira que se tratava de um agente da polícia reformado.

Era uma daquelas pessoas que sempre tentava saber alguma coisa de todos e tinha sempre alguma conversa quando as encontrava na entrada do prédio ou no elevador. Porém, Historia sempre dizia que tinha um bom coração e que queria genuinamente ajudar os outros e ali estava uma prova inegável. Ao reconhecer o som de um disparo não hesitou em vir ajudá-las.

– A ambulância está a chegar, ok? Fica acordado e a falar comigo. – Pedia Historia pouco tempo depois, ajoelhada ao lado de Eduardo que deitado no chão, tentava obedecer aos pedidos que lhe faziam.

A polícia já tinha chegado primeiro do que os serviços de emergência médica, mas a advogada e até mesmo Ymir estavam a fazer os possíveis para que aquele que tentou protegê-las, não fosse mais uma vítima de todos aqueles acontecimentos terríveis dos últimos tempos.

 

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– São calúnias! Ele só está a dizer estas coisas porque estamos a suspendê-lo de uma forma que acabará por ser…

– Não. – Interferiu o médico de cabelos loiros. – Eu posso até ser suspenso temporariamente por um simples desrespeito de algumas regras e porque o Dr. Jaeger não me quer a trabalhar aqui. No entanto, o que acabo de apresentar perante todos à sua frente são provas irrefutáveis de que adulterou inúmeros resultados de exames e ocultou tantos outros. Não é palavra contra palavra, eu tenho provas que todos que estão aqui presentes receberam. – Mantendo o olhar fixo no médico furioso, mas que tinha entrado naquela sala minutos antes, confiante e arrogante. – Eu sabia que depois do que aconteceu, iria no mínimo suspender-me. Um dos maiores erros que cometemos é sermos excessivamente confiantes que controlamos tudo e afinal, as coisas não são bem assim. Fiz questão de que se eu fosse suspenso, eu não fosse o único a sair. Afinal de contas, quem tem telhados de vidro não devia arriscar-se tanto. Além disso, o que recolhi nestas últimas horas que cá estive, não se encontra apenas nas vossas mãos, assim como fiz questão de enviar para alguém que penso que verá em breve num tribunal, Dr. Jaeger. – Colocou o crachá de identificação e outros papéis sobre a mesa. – Agora com a licença de todos, vou retirar-me.

Ainda ouviu algum insulto da parte de Grisha na sua direção, mas Armin não olhou para trás. Já estava satisfeito com o que tinha conseguido descobrir nas últimas horas. A sua capacidade de relacionamento interpessoal permitiu que no tempo em que esteve a trabalhar naquele hospital, aprendesse com facilidade quais as pessoas que inconscientemente lhe passariam informações valiosas. Foram as diversas conversas, a desconfiança acerca do envolvimento de Grisha com todos os pacientes que tiveram alguma ligação com os acontecimentos recentes rodeando Levi e outras peças que foi juntando, que o permitiram reunir aquelas provas. Enviou-as em primeiro lugar para Historia.

Quando a advogada lhe pediu que estivesse um pouco mais atento a Grisha, o loiro suspeitou de imediato que Historia soubesse mais do que lhe tinha dito. Na altura, conversando com Annie, a namorada mostrou-se um pouco apreensiva por pensar que seria arriscado observar e seguir de perto os comportamentos de Grisha e por vezes, também de Zeke. Curiosamente, o filho era mais cuidadoso que o pai e por isso, não havia muito que pudesse dizer acerca de Zeke, mas Grisha com certeza foi confiante demais e isso iria custar-lhe caro.

Mesmo assim, é bastante claro que além dos Jaegers e possivelmente, do ainda desaparecido Nile, há mais alguém interessado no Levi… e é esse alguém que sinceramente, agora preocupa-me mais porque seja quem for, está perto e tem uma forma de saber os passos que o Levi dá”, pensava enquanto entrava no carro.

 


Notas Finais


Até ao próximo capítulo!


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