História Mercy - You've got a hold of me.

P.O.V SHAWN 

O barulho alto e irritante do despertador do celular penetra em meus ouvidos, fazendo-me ter um sobressalto e acordar assustado. Passo minhas mãos pelos lençóis da cama, tateando em busca do meu celular para desligar esse som irritante. Ando em direção do banheiro com passos lentos e pesados, tentando tardar cada vez o banho matinal. 

Depois de me arrumar, me encaminho até a cozinha, onde estava somente meu pai bebericando uma xícara de café. Com uma preguiça do tamanho da cidade, não comi nada, e só esperei meu pai acabar com o seu café.

Como estava proibido de dirigir o carro, por chegar bêbado na sexta, tive que pegar carona com meu pai. Ele para do outro lado da rua de minha escola, e antes de deixar eu sair, vasculha minha mochila em busca de algum cantil ou qualquer coisa que poderia estar contendo bebida. Depois da revista forçada, ele finalmente me libera. Saio do carro batendo a porta do carona com força, mostrando minha indignação. Estava farto da falta de confiança dele, farto da falta de confiança de todos. 

Estressado e com um pouco de raiva, inicio a travessia da rua com passos furiosos, encarando o chão. Quando de repente, o som de uma buzina acompanhada do chiado de pneus no asfalto. Dou um pulo para trás, desviando do carro que por pouco não me bate. Ando até a janela ponto para começar a gritar, mas o quando a janela desce não acredito no que vejo.

- Jonas? O que faz aqui?

- Voltei para a cidade. Não olha mais por onde anda, Mendes? - Ele pergunta de uma maneira trivial, não parecia estar com raiva.

Como estávamos parados no meio da rua, alguns motoristas que estavam atrás do carro de Nick começaram a buzinar. 

- Vou estacionar, falo com você depois. Foi bom revê-lo. 

Ele se despede e vai a caminho do estacionamento. Quase sou atropelado por outro carro antes de adentrar na escola. Como de costume, vou até a biblioteca, procurar por Selena, que sempre - ou quase - estava lá. Ando entre as enormes estantes de livros por um tempo, até encontrá-la no chão com um livro de capa preta aberto em mãos. Ela chegava na escola meia hora antes de qualquer aluno e fica lendo por esse período, pois depois diz ter "muito barulho para uma biblioteca". Caminhava em sua direção de forma lenta, e já que estava de costas, iria aproveitar para surpreendê-la. Quando me aproximo suficiente, e estava prestes a dar o susto, seu dedo indicador direito se ergue. 

- Nem pense nisso Shawn. - Ela diz de forma calma, antes de fechar o livro e se virar para mim.

O cabelo amarrado em uma única trança, o casaco de renda branco, os olhos escondidos atrás do óculos de grau com lentes grandes. Sempre da mesma forma. 

- Tudo bem, lindinha. Vamos, o sinal já vai bater. - Digo, estendendo minha mão, que logo é agarrada pela dela.

- E então, como foi o encontro com aquela garota, Camila, certo? - Ela pergunta, enquanto saímos da biblioteca, em busca de Ariana que provavelmente estaria na sal de música.

- Foi bem normal na verdade. Ela é bonita, e tem um senso de humor incrível, mas não senti nada por ela. Mas, se ela quiser ser minha amiga, seria numa boa. - Quando termino de falar, e viro um corredor, quando alguém pula em sobre nós dois.

Era Ariana. Ela estava pulando eufórica, repetindo várias vezes "eu disse, eu avisei". Ela só para quando Selena puxa da carteira uma nota de vinte. Ariana olha para a nota com um sorriso triunfante e infantil no rosto. É inevitável não sorrir um pouco também. Ela guarda a nota, separa minha mão com a da Selena - para poder ficar no meio e segurar a mão de ambos -, e recomeça a andar, forçando-nos a segui-la. 

- Eu sabia que você não comeria ela. Gosto dela e tudo o mais, porém, sei que não fica com qualquer uma. - Ariana fala, enquanto nos leva até a sala de música. 

- Você gosta dela desde quando? - Selena pergunta, enquanto entrávamos na sala. - Sempre disse que era uma ladra de apresentações, e que ela nunca seria uma soprano como você. 

A risada que acompanha a fala de Selena é impossível de não fazer.  

- E eu estou mentindo?! - Ariana pergunta, irônica. Não sabia dizer qual era a melhor, nunca vi Camila se apresentar. O sinal toca e Ariana faz um biquinho. - Mas já?

- Culpe o Shawn, que foi me pega tarde na biblioteca. 

- Eu o perdoo pelo fato de não ter ficado com a Cabello. Mas não se esqueçam, minha casa, as sete, não faltem ou matarei os dois! - Ariana diz se distanciando até sumir dobrando em outro corredor.

Selena me acompanha até minha sala, depois vai em direção a dela. Justo no último ano de colégio, eu não divido nenhuma aula com elas. E minha primeira aula é justo de química. Sério, quem consegue entender esse negócio? Eu ainda não sei como nunca reprovei. Tudo que sempre faço, e olhar para frente e fingir que estou entendo tudo, enquanto na verdade estou em uma espécie de sono, só que os olhos abertos. Porém, hoje não foi só em química, fiz isso em todas.

No meio da aula de literatura, não estava me sentindo muito bem. Estava meio tonto, e sinto minha barriga revirar. Peço para ir ao banheiro, e pego o passe na mão da professora com rapidez. Ando apressado até o banheiro mais próximo, e sigo até a pia. Abro a torneira, molhando minhas mãos e em seguida meu rosto. A vista foi pesando, minhas pernas ficaram moles, e logo vou ao chão. Tudo que lembro antes de ficar desacordado foi do som de passos correndo, e logo depois tudo é um branco.

Acordo em uma maca, acho que estava na enfermaria da escola. A luz branca e forte me fez ficar cego por uns segundos, mas deu para ver que havia alguém em uma cadeira ao meu lado. Quando finalmente consigo normalizar minha visão vi que era o meu quase assassino.

- Nick? - Falo baixo.

Ele olha para mim, sorrir, e grita pela enfermeira em seguida. Ela me dá algo para comer e diz para descansar um pouco. Ele volta e fica em pé, me encarando enquanto como o cookie. Ele tem uma habilidade de parecer que está sorrindo o tempo inteiro. Mas isso começou a me incomodar, pois ele só ficou ali, parado. 

- Por quanto tempo eu fiquei desacordado? - Pergunto, para quebrar aquele silêncio mortal.

- Não muito, na verdade. Está se sentindo melhor? - Confirmo com a cabeça. - Que bom. Parece que estamos quites, né? Me redimi de quase ter te matado, salvando sua vida agora. 

- Foi só um desmaio, Nick.

- Fala como se desmaiar por aí fosse algo normal. - Dou de ombros, e ele solta uma leve risada. - Sabe, quando disse que falaria com você depois, não era bem nessa situação que eu esperava. 

- Podemos sair, pode me falar como foi ficar todo esse tempo fora. - Ele apenas confirma com a cabeça, e o silêncio mortal retorna. - Que tal hoje a noite? As sete, Ariana irá fazer um festival de filmes de terror, vai pouca gente. Tá livre nesse horário?

- Claro, Ariana não se mudou, certo? - Nego com a cabeça. - Ótimo, marcado então. - Ele se levanta, e sai.

Nick estava mudado. Mais alto, forte, e o cabelo raspado ficou bem nele, além da barba rala, que lhe dá uma aparência madura. Mas aqueles olhos não escondiam o garoto que ele ainda era. O garoto que um dia já foi meu melhor amigo, e agora nos tratamos como apenas conhecidos. Porém, nada impede que voltemos a ser amigos, certo? Espero que sim.