Assim que o garçom levou o café e eles escolheram a sobremesa, todavia, o interrogatório começou:
- Como foi à gravidez? - perguntou ele, indo diretamente ao ponto, como sempre.
Renata suspirou, aliviada que ele estava começando com uma pergunta fácil, em vez de com acusações.
- Foi típica, eu acho - respondeu ela. - Não houve complicações, e mesmo os enjôos matinais não foram tão ruins. Eles não se limitavam às manhãs, o que fazia abrir a padaria e trabalhar 12 horas por dia ser uma aventura. - acrescentou com uma risada. - Mas não foi tão terrível quanto eu esperava.
Depois, Jerónimo quis saber cada detalhe do nascimento de Dann. Data, hora, peso, altura, quanto tempo o parto tinha durado...
- Eu deveria ter estado lá -- murmurou ele suavemente, olhando para a mesa. Então, ergueu os olhos para ela. - Eu merecia estar lá. Para vivenciar tudo.
Renata se preparou para o ataque, para receber toda raiva e ressentimento que sabia que ele estava sentindo... E que ela provavelmente merecia. Mas em vez disso, Jerónimo murmurou:
- Por mais que isso me incomode, não há como voltar no tempo, e só podemos seguir em frente. Então, aqui vai à oferta de um acordo, Renata.
Os olhos azuis a encararam com determinação.
- Agora que sei sobre Dann, quero participar de tudo. Ficarei aqui por um tempo, até que você se acostume com essa idéia. Até que eu pegue o jeito de ser pai e ele comece a me reconhecer como tal. Mas depois disso irei querer levá-lo para casa.
E com aquilo, Renata enrijeceu, fechando os dedos ao redor da xícara de café.
- Isso não é uma ameaça - acrescentou ele, obviamente notando a tensão dela. - Não estou dizendo que quero levá-lo para Pittsburgh para sempre. Honestamente, ainda não sei como resolveremos essa questão, mas podemos deixar para mais tarde. Só estou falando sobre uma visita, de modo que eu possa apresentá-lo para minha família, informar minha mãe que ela tem outro neto.
Oh, Eleanor iria adoraria isso, pensou ela com sarcasmo. Ficaria radiante com outro neto, especialmente outro menino para carregar o nome Linhares. Mas a mãe de seu neto era outra história... E a mãe dele ficaria feliz com ela fora de cena.
- E se eu não concordar? Com nada disso?
A sobrancelha dle se arqueou.
- Então, eu serei forçado a ameaçar, suponho. Mas é essa a direção que você quer tomar? Tenho sido bastante amigável sobre toda a situação até agora, embora nós dois saibamos que tenho motivos suficientes para estar furioso. Dando um gole de seu café, ele inclinou a cabeça de lado, parecendo muito mais calmo do que ela se sentia.
- Se você quer que eu fique furioso e faça ameaças, apenas diga. Mas se preferir que hajamos como dois adultos maduros, determinados a criar o melhor ambiente possível para nosso filho, então sugiro que aceite meus planos.
- Eu tenho escolha? - perguntou ela com irritação.
O sorriso dele foi tanto presunçoso quanto confiante.
- Você teve a escolha inicial de me contar ou não que estava grávida, e decidiu não me contar, então... Não realmente. A bola está no meu campo agora.
A bola estava definitivamente no campo de Jerónimo... Com tudo mais. Mas, então, ela soubera que isso aconteceria desde o minuto que ele subira a escada para o apartamento acima da padaria e descobrira o filho, não soubera? Sua única opção
agora era ser cordata, e esperar que ele continuasse a fazer o mesmo.
A mão de Jerónimo estava em seu cotovelo enquanto eles saíam do restaurante, guiando-a em direção ao saguão. Velhas redes de pesca e bóias decorativas alinhavam as paredes, e subitamente ela percebeu como a decoração deveria ser estranha para as pessoas de fora, uma vez que não havia mar, rio ou lago na cidade para justificar aquilo.
- Suba comigo - sussurrou ele, perto de sua orelha.
Renata lhe lançou um olhar tão incrédulo que ele teve de rir de sua reação.
- Isso não é uma proposta - ele a assegurou, então arqueou as sobrancelhas numa tentativa de flerte. - Embora eu não me oponha há um pouco de sedução após jantar.
No saguão, ele a virou para a esquerda, para longe da entrada principal do hotel, e para a direção da grande escadaria que levava aos quartos de hóspedes.
- Tenho uma coisa para lhe mostrar - continuou ele, enquanto eles subiam a escada.
- Agora, isso parece uma proposta, ou talvez uma paquera de mau gosto.
Jerónimo sorriu, tirando a chave do quarto de seu bolso. Não um cartão-chave, mas um chaveiro de plástico em formato de um farol.
- Você me conhece melhor do que isso. Não precisei de paquera de mau gosto da primeira vez, e não precisarei agora.
Não, ele não precisara. Jerónimo havia sido muito charmoso para flertar com ela como os outros rapazes faziam na época. O que o tornara ainda mais atraente, fazendo-o se destacar dos demais.
Quando eles chegaram à porta dele, Jerónimo abriu-a e deu um passo atrás para que ela o precedesse. Renata já visitara a Hospedaria do Porto, é claro, mas nunca estivera num dos quartos de hóspedes, de modo que, quando entrou, olhou ao redor por um momento.
Mesmo que a grande plaqueta de latão na frente do prédio não tivesse
identificado o hotel como um marco histórico, ela teria sabido que era apenas pelo interior. O trabalho elaborado em madeira, o papel de parede preservado e os móveis
antigos... Tudo indicava isso.
Felizmente, o quarto dele não era decorado com motivos do oceano. Em vez disso, havia minúsculas rosinhas no papel de parede amarelado pelo tempo, e tanto a cama de solteiro quanto a cama grande de quatro colunas eram cobertas em renda
branca.
Era quase engraçado ver ele o homem de negócios alto, poderoso e moderno parado no meio daquele ambiente formal do século XIX. Ele destoava totalmente de seu entorno.
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