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História Meu Carma - O Quadro


Escrita por: Lyv__

Capítulo 14 - O Quadro


Encontrei-me andando em direção a uma igreja. Um véu negro estava sob minha cabeça e eu mal conseguia ver as pedrinhas no chão empoeirado. Os únicos dois degraus da catedral estavam escorregadios, então tive que subir lentamente, ou caso contrário, meu corpo encontraria com o chão em um piscar de olhos. O terço pendia em minha mão direita e tive que segurá-lo fortemente entre os dedos, para que não caísse.

Na entrada do local, fiz um breve sinal e adentrei finalmente, sentando-me em um dos assentos no fundo. Em poucos segundos, ajoelhei-me e comecei a rezar, contando meus pecados silenciosamente. Sempre preferi dizer meus pecados eu mesma para Deus, já que era muito estranho dizer isso a um padre.

Contei a Ele minhas mentiras já proferidas; meus pensamentos impuros em relação a Andy, o rapaz bonito que conheci no baile dedicado ao meu noivado. Contei do beijo que demos na mesma noite. Pedi perdão, mesmo sabendo que voltaria a fazer as mesmas coisas assim que meus pés tocassem os míseros dois degraus da igreja. Estava tudo fadado ao pecado, como sempre esteve. Ri intimamente com isso, afinal, era tudo tão previsível. Um ciclo vicioso para humanos fracos como eu.

No meu caminho de volta para casa, pedi ao cocheiro para que fosse sem mim, pois eu precisava andar um pouco. A verdade era que eu queria esbarrar em Andy "casualmente" por aí. Não marcamos de nos encontrarmos, mas quem sabe a sorte hoje estaria ao meu favor?

Meus passos eram lentos e calculados, enquanto meus olhos olhavam tudo em volta furtivamente, procurando o par de olhos azuis que fizeram-me sucumbir as lembranças amargas de que eu estava noiva. Noiva de Logan Peters. Era apenas isso que eu sabia dele, já que nosso casamento era arranjado. Ele não havia comparecido ao baile do nosso noivado, mas papai nos apresentou em uma tarde qualquer na minha casa.

Por um milésimo de segundo, distraída em meio às minhas lembranças dessa fatídica noite em que conheci Andy, esbarrei em um corpo imóvel no meio do caminho. Ergui o olhar e deparei-me com o par de olhos verdes já conhecidos. Era Logan.

— Não sabia que estava em Londres. — ele disse seriamente.

— Não sabia que não comparecia a eventos importantes. — eu disse rispidamente, desviando o olhar.

— Está sozinha?

— Está vendo mais alguém comigo? — ergui os braços para enfatizar.

— Não use esse tom comigo, Katherine. Somos noivos, lembra-se?

— Noivos? — ri, lembrando-me bem de sua ausência no baile — lembra-se você que estou sendo obrigada a este espetáculo ridículo, já que para meu pai sou apenas um objeto de troca.

O olhar de Logan mudou de irritado para preocupado. As sobrancelhas antes arqueadas e tensas, estavam agora um tanto para baixo, junto com um canto de sua boca. Seus olhos verdes escureceram um pouco e senti meu coração quebrar-se ao ver sua expressão.

— Achei que estivesse animada para o casamento. — ele disse, encolhendo os ombros.

— Bom, eu... — de repente, eu não conseguia mais retrucar de forma fria. Havia alguma coisa errada, talvez. — eu estava no começo, mas na noite do baile você deixou-me sozinha! Nem ao menos avisou ou algo assim.

Logan aproximou-se com o olhar sustentando o meu. E por algum motivo, eu não queria desviar daquele transe que pairava nós dois.

— Eu tive alguns problemas com o meu pai. Você sabe, administramos muitas fazendas e não tive tempo para mandar uma carta explicando minha ausência. — sua voz carregava tristeza e desapontamento — minhas sinceras desculpas, Katherine. Se quiser, podemos passar este resto de tarde juntos, para compensar minha ausência.

— Eu não sei, Logan. Minha tia está esperando por mim. Voltaremos para Castle Combe logo pela manhã e preciso arrumar minhas malas.

— Apenas alguns minutos, Katherine, você não irá se arrepender. Confia em mim, certo?

Não, eu não confiava. Eu ainda desejava ver Andy, mesmo que no momento esse desejo tivesse diminuído um pouco. Olhei para o sorriso torto de Logan e talvez — apenas talvez, ele poderia consertar as coisas.

Caminhamos um pouco, lado a lado, passando por ruas as quais eu não fazia ideia de que existiam. Meu estômago revirava-se de forma irritante, como se a qualquer momento eu fosse colocar para fora o almoço nada convidativo preparado por minha própria tia há algumas horas antes. Não estava nada bem afinal, nem mesmo o assunto engraçado de Logan sobre algo o qual eu nem estava mais dando atenção. Minha mente simplesmente não estava ali, da mesma forma como não estava em lugar algum.

Dei-me por mim quando estávamos próximos a catedral novamente, com carruagens passando freneticamente e rapidamente para lá e para cá, num ir e vir incansável. Senti meu estômago revirar mais uma vez quando finalmente paramos. Eu estava enjoada, isso estava claro e se, eu não voltasse para casa logo, vomitaria sob as botas lustradas de Logan.

— Gostou do passeio? — ele perguntou sorridente.

— Ah, sim. — tentei sorrir, mesmo sabendo que tudo o que estava acontecendo era um tanto desconfortável.

— Bem, eu... Não sei se devo, mas tenho esse pensamento há tanto tempo comigo que sinto que vou enlouquecer se não o fizer, mas sinto que irá ficar irritada.

Não sabia do que se tratava, mas estava ficando irritada pelo simples fato de Logan despejar tantas palavras e uma informação, que provavelmente, era incoerente e irrelevante.

— Apenas diga o que é.

— Eu gostaria... gostaria de beijá-la.

Eu não fiquei irritada. Apenas surpresa. Pensei em Andy mais uma vez em muito tempo, desde que aceitei esse passeio vago e estranho com Logan. Pensei que, talvez, foi uma sorte passageira daquela noite em ter nossos caminhos cruzados, afinal, foi apenas um beijo e eu estava noiva, mesmo sendo obrigada a isso. Logan era meu noivo e logo nos casaríamos, então para todos os efeitos, seria o primeiro de muitos outros beijos que estavam prestes a vir, certo?

Meneei a cabeça concordando e vi um Logan corado passando a me encarar. Seu rosto aproximou-se do meu, num movimento rápido, mas ao mesmo tempo demorado. Senti seus lábios roçarem os meus delicamente e vagarosamente.

— Eu prometo amar você, Katherine — suas palavras saíam em um sussurro, como se estivesse proferindo uma reza antiga — e prometo fazê-la apaixonar-se por mim.

***

Acordei com vozes por todo o cômodo. Não me mexi, apenas abri os olhos devagar e esperei focar em alguém conhecido que estivesse ali. Imediatamente, reconheci Jacob, que carregava a caixinha de primeiros socorros de mamãe em uma das mãos. Parecia irritado. O cabelo loiro e grande estava desamarrado, sem estar no seu famoso coque malfeito acima da cabeça. Suas veias estavam saltadas e tensas sob sua pele alva e, pode até mesmo ser exagero, mas poderia muito bem ver até mesmo o sangue fluindo por seus vasos sanguíneos. Estava em pé, andando de um lado para outro pelo quarto.

Meu quarto. Minha cama. Como eu havia parado ali? E por que tem uma compressa de água morna em minha testa?

— Eu não acredito que eles estavam lá! — gritou Jacob para alguém, que mesmo não estando em meu campo de visão, sabia muito bem que se tratava de Noah — os dois juntos, como se fossem amigos! Eles são loucos, nem preocuparam-se com o bem estar dela. Nunca se preocupam!

Provavelmente falavam de mim. Mas por quê? E quem era "eles"?

— Qual é o seu o problema e por quê está gritando no meu quarto? — eu disse, sentando-me com um pouco de dificuldade sob a cama.

Os olhos de Jacob pousaram em mim e em seguida, avançou alguns passos sentando-se a minha frente, na beirada da cama. Um ar preocupado passou a ocupar seu semblante. E com um enjôo repentino, lembrei do sonho que eu acabara de ter. Logan me beijando e Andy... mas quem exatamente é esse Andy?

— Você está bem, Amy? — perguntou Jacob, tirando a compressa de minha testa e examinando meu rosto.

Assenti com um movimento rápido com a cabeça. Olhei em volta e tentei lembrar-me por que Jacob estava gritando com Noah em meu quarto. Lembro-me de ter descido as escadas, pois precisava urgentemente visitar Beth e, depois disso, não lembro mais nada.

— Não seria surpresa se ela não acordasse — murmurou Noah, enquanto permanecia parado com os braços cruzados próximo a cama — você gritou para que o bairro inteiro ouvisse.

Jacob pareceu não ouvir, pois não disse nada, apenas pôs a mão sob minha testa verificando minha temperatura. Jacob fez isso exatamente três vezes.

— O que aconteceu? — perguntei por fim, querendo entender o que havia acontecido para que eu ficasse fora do ar por um tempo.

Jacob pareceu surpreso com minha pergunta e olhou para Noah, o que respondeu com uma cabeça cabisbaixa, enquanto mexia no tapete com a ponta do tênis.

— Você não lembra? — perguntou Jacob, voltando a atenção para mim.

— Não, eu não lembr... — eu estava prestes a completar minha resposta quando eu vi flashes reais invadirem minha visão. Naquela manhã eu estava no atalho para a casa de Beth quando Logan apareceu e me beijou, em seguida, Andrew apareceu. E antes de eu apagar completamente, Andrew chamou Logan de irmão.

Minha boca ficou completamente seca e meu coração ficou acelerado quando mais imagens surgiram. Na maioria, eu estava com Andrew, com roupas vitorianas; estávamos sempre sorrindo. Em outras, eu estava com Logan, mas um sentimento de raiva estava acompanhado misto de compaixão e sentimentos confusos entre Logan e Andrew. Algo estava errado, certo? Eu estava sonhando acordada, claro.

Acho que deixei minha expressão de medo e surpresa transparecer mais do que havia planejado, pois Jacob afastou-se um pouco, parecia assustado. Noah aproximou-se e tocou meu ombro, olhando bem em meus olhos.

— O que você viu? — ele perguntou.

Engoli em seco.

— Do que está falando? Eu não vi nada.

— Eu sei quando está mentindo, Amy — disparou Jacob, afastando o braço do irmão de meu ombro — nos diga o que você viu!

— São sonhos! — gritei irritada sem um motivo aparente. Talvez estivesse nervosa e confusa demais com tudo que estava acontecendo — venho sonhando com coisas aleatórias e sem sentido. São apenas sonhos!

— Sonhos ou memórias? — indagou Noah, com um sorrisinho no rosto.

O quê?

— É questão de tempo — disse Jacob, levantando-se — logo estará tudo claro para ela.

— Do que vocês estão falando? — gritei mais uma vez.

— Vamos deixá-la sozinha agora — disse Noah, de repente — você irá relaxar e voltará ao inferno. Ache Andrew e converse com ele.

Por um breve momento, achei que meu coração pararia ao apenas ouvir o nome de Andrew. Eu tentei retrucar, perguntar o que sabiam sobre mim e sobre Andrew, mas Jacob foi mais rápido, adivinhando perfeitamente sobre minhas indagações:

— Não faça nenhuma pergunta, pelo menos não agora. Apenas volte e procure por Andrew. Nos vemos mais tarde.

E assim, deixaram-me sozinha, confusa, com raiva e frustrada. Contudo, fiz o que me pediram. Deitei-me e idealizei o quarto de Andrew, no castelo que tanto odeio. E em menos de segundo, eu já estava no inferno.

***

O quarto de Andrew estava vazio, como eu havia imaginado, já que o escritório é o único lugar do castelo em que Andrew passa mais tempo que o normal.

Apesar de estar em minha forma astral, a tontura parecia sólida em mim. Meus pés pesavam, juntamente com meus ombros. Andei com dificuldade para fora do quarto, apoiando as mãos nas paredes de cor pastel.

Sabia que pelo horário, Charlotte estava na cozinha e os outros empregados estavam em seus horários de almoço, apesar de não precisarem disso.

Meus passos estavam vacilantes enquanto cambaleava corredor adentro. Minha intenção no momento era de encontrar Andrew e conversar com ele, já que foi isso que Jacob pedira para que eu fizesse, mas eu não sabia se chegaria ao topo da escada.

Com dificuldade, estava em frente ao quadro. Aquele quadro enorme, o qual sua metade era coberta por um manto cor vinho. Na metade visível, mostrava-se ali um Andrew sorridente e com olhar sereno.

Ouvi passos calmos subirem a escada lentamente. Sabia que quem fosse que estivesse subindo, chegaria tarde para impedir minhas intenções.

Minhas mãos estavam trêmulas e suadas após lembrar-me do primeiro aviso que recebi de Charlotte sobre o quadro a minha frente. Aquela manto nunca deveria ser retirado, mas naquele momento, eu precisava fazer isso.

Com os dedos trêmulos e vacilantes, toquei finalmente o tecido macio e um tanto empoeirado. Envolvi com força os nós dos dedos e puxei enfim, revelando a metade coberta.

E bem ali, eu vi uma garota sorridente, assim como Andrew estava bem ao lado. Os cabelos eram longos e encaracolados, e caíam como cascata sob os ombros nus da menina. Usava um vestido vitoriano preto, com detalhes roxos. O tipo de vestido que, provavelmente, eu escolheria para ser o meu preferido.

Tentei afastar-me dali, dando um passo para trás, mas acabei pisando no pé de alguém. Não ousei me mexer, pois sabia exatamente quem estava ali. Senti sua mão grande e pesada repousar em meu ombro, sentindo em seguida um leve choque com o toque quente da pele dele na minha.

— Sim, Amy — Andrew disse calmamente — essa é você.



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