1. Spirit Fanfics >
  2. Meu Melhor Amigo >
  3. O melhor dia da minha vida

História Meu Melhor Amigo - O melhor dia da minha vida


Escrita por: jaimencanto

Capítulo 8 - O melhor dia da minha vida


               Por mais que eu soubesse que eu não era a única errada naquela história, a culpa estava me perturbando. Não dormi durante toda a noite pensando na discussão com o Fernando, e pensando que ele estava bravo comigo por eu ter mentido sobre Antonio. De certa forma eu não tirava sua razão, mas Fernando não precisava ter feito toda aquela cena. Mas, não era bem assim que as coisas funcionavam, e mesmo que eu soubesse que não estava totalmente errada, de alguma maneira eu achava que teria que me desculpar com ele.

               Já fazia quinze minutos que eu encarava o celular, pensando se deveria ou não ligar para ele. Antonio me aconselhou a deixar que as coisas se acalmassem, mas para mim, Fernando já teve o tempo que precisava para isso. Eu estava ansiosa para saber se nossa briga tinha mesmo o deixado com raiva, ou se foi apenas de momento. Depois de tanto pensar, decidi ligar para ele, mesmo que não tivesse a mínima idéia do que falar. Assim que liguei, o telefone chamou algumas vezes, e por um segundo pensei que ele não fosse me atender, até ouvir sua voz do outro lado da linha.

- Alô?

- Oi. – Falei me deitando à cama. – Está... Tudo bem?

- Sim, e com você?

- Eu não sei. – Respondi sincera. – Depois de ontem...

- Sobre isso... Eu, bem... Não queria ter gritado com voce muito menos ter dito aquilo.

- Mesmo?

- Eu acho que entendo porque voce mentiu, e não tenho o direito de ficar nervoso com voce por isso.

               Suspirei aliviada, sorrindo logo depois.

- Que bom que disse isso.

- Então... Estamos bem?

- Acho que sim.

- Que bom... Porque quero te fazer um convite.

- Convite?

- Sim! Ontem minha despedida não foi como eu esperava... E bem... Eu queria que passássemos o dia juntos.

- E a Marianne?

- Ela vai ficar o dia inteiro ocupada com as coisas do casamento.

- Eu quero muito, Fernando, mas...

- Mas?

- Não sei se é uma boa idéia.

- Não se preocupe. Não vamos falar sobre o casamento, não vamos falar sobre nossas desavenças nos últimos dias. Vamos apenas dar um passeio, como fazíamos antes.

               Parecia tentador. Imaginar passar um dia com Fernando, sem falarmos sobre toda aquela confusão era bom demais para ser verdade.

- Vamos, Lety... Por favor.

               Ele estava mesmo implorando, e eu conseguia imaginar exatamente sua feição de suplica, e não conseguia resistir àquilo.

- Tudo bem. – Respondi rindo. – Preciso aprender a dizer não para você mais vezes.

- Não precisa não. – Ele riu. – Eu passo aí em uma hora.

- Tudo bem.

- Até logo.

- Até.

               Desliguei o telefone com um sorriso bobo nos lábios. Eu não sabia o que me esperava naquele dia, mas só de saber que eu estaria com Fernando, a felicidade tomou conta de mim.

 

 

 

                                                           -----------------------------

 

 

 

               Demorei algum tempo para escolher a roupa ideal, principalmente porque não sabia quais lugares freqüentaríamos. Mas por estar em um dia extremamente quente, optei por um simples short e uma camiseta. Assim que terminei de me arrumar, abri a porta do quarto pronta para descer e esperar por Fernando, quando Antonio abriu a porta do seu quarto e me olhou divertido.

- Aonde vai toda sensual? – Ele cruzou os braços escorando-se ao portal.

- Não estou sensual. E vou dar uma volta com Fernando.

- Ah, então fizeram as pazes?

- Parece que sim.

- Isso é bom. E será que ele ainda me odeia?

- Não, claro que não. – Respondi rindo.

- Que bom. Não queria ter que colocá-lo na minha lista.

- Não seja bobo.

- Então... Bom passeio.

- E você? O que vai fazer hoje?

               Antonio não precisou responder. Logo atrás, dentro do seu quarto, o primo de Marianne passou tomando uma xícara de café. AO me ver, seus olhos se arregalaram e por pouco ele não deixou a xícara cair no chão.

- Ah... – Sorri sem jeito. – Bom... Aproveite.

- Eu vou. – Antonio riu. – Você também.

- Obrigada.

               Prendi o riso e caminhei em direção ao elevador. Se a família de Marianne ao menos imaginasse o que o primo dela andava fazendo, tenho certeza que seria uma grande confusão. Parei diante do elevador e assim que as portas se abriram, me assustei ao ver Fernando dentro dele.

- Ei! – Ele sorriu animado. – Estava indo até o seu quarto.

- Eu não sabia que já tinha chegado. – Sorri, feliz em vê-lo.

- Achei que você ainda não tinha terminado de se arrumar. Você está mesmo me surpreendendo. – Ele me olhou de cima a baixo.

- Quer olhar para o meu rosto enquanto fala comigo? – Brinquei e ele sorriu sem jeito.

- Você não vai entrar?

- Ah... Claro.

               Entrei no elevador e parei ao seu lado. Fernando apertou o botão para o térreo e as portas se fecharam. Ficamos em silencio por um tempo, mas quando abri a boca para quebrá-lo, o elevador parou com um baque, fazendo com que eu me agarrasse ao braço de Fernando.

- O que foi isso? – Perguntei assustada.

               Fernando apertou o botão de térreo freneticamente, mas o elevador permaneceu parado.

- Acho que estragou.

- Estragou? Com nós dois aqui dentro?

- Parece que sim, não é?

- Ai meu Deus! – Suspirei impaciente. – Era só o que faltava.

- Daqui a pouco devem nos tirar daqui, não se preocupe.

- Por que está tão calmo?

- Porque não adianta ficarmos nervosos, oras. – Ele arregaçou as mangas da sua camisa. – E também porque não é tão ruim ficarmos a sós por um momento.

               Semicerrei os olhos e preferi não respondê-lo. Fernando já começava com as provocações.

- Oi! Estão me escutando? Vocês dois! – Uma voz ecoou pelo elevador.

               Fernando e eu olhamos em volta, querendo saber de onde vinha aquela voz.

- Eu não consigo ouvi-los, mas façam sinal de positivo para a câmera se estiverem me ouvindo.

               Fernando virou-se para a câmera fazendo o sinal.

- Ótimo! Escutem, estamos procurando o problema, mas não se preocupem, logo vamos resolvê-lo.

               Suspirei cruzando os braços e Fernando olhou para o chão, sentando-se logo depois.

- Vai ficar em pé aí enquanto resolvem o problema?

               Revirei os olhos e me abaixei, sentando ao lado dele.

- Está começando a fazer calor. – Falei abanando o meu próprio rosto.

- É só relaxar, Lety. Ele já disse que vai resolver o problema.

- Acontece que eu não tenho essa calma que voce tem em momentos assim.

               Ele não respondeu. Ficamos em silencio por alguns segundos, até ele suspirar tão alto que me fez olhar para ele.

- Podemos terminar a nossa conversa de ontem.

- Que conversa?

- Sobre... O que você sente em relação à tudo isso.

- Para ser honesta, não quero falar sobre isso, Fernando. Você combinou que não falaríamos do casamento hoje.

- Mas não vamos falar do casamento. Vamos falar sobre o que voce sente com tudo isso.

- Eu já disse tudo o que eu tinha para dizer.

- Mas eu não. – Ele me olhou. – Ainda tenho... Algumas coisas para dizer.

               Continuei olhando-o, esperando que ele continuasse.

- Eu me sinto mal por não ter notado o quanto tudo isso estava te magoando... Na verdade, eu me sinto péssimo. – Ele encarou suas mãos. – Eu sabia que isso te afetaria, mas não sabia que seria tanto.

- E por que pensou isso?

- Porque eu simplesmente achava que você só queria que continuássemos nossa amizade.

- Mas é o que eu quero.

- E é apenas isso que você quer? – Ele tornou a me olhar, e eu não respondi. – Eu queria que você entendesse o que está acontecendo...

- Eu entenderia se voce me e explicasse.

- É que é...

-... Complicado, eu sei. – Suspirei. – Você sempre diz isso.

- Se eu pudesse explicá-la, eu juro que já teria feito isso.

- E o que o impede de fazer isso?

- Várias coisas.

- Você não confia em mim?

- Pelo contrário. Eu confio minha vida à voce.

- Então eu não estou entendendo qual é o problema.

- É exatamente por isso.

- Fernando, eu nunca percebi o quanto você é complicado. – Escorei a cabeça à parede. – Deus! Quanto mais eu tento te entender, menos eu entendo.

               Ele ficou em silencio.

- Eu só queria que as coisas não estivessem tão estranhas entre nós dois. Nós não somos os mesmos de antes. Não temos as mesmas conversas. Eu sinto que você esconde algo de mim o tempo inteiro, e você faz questão de demonstrar isso, como fez agora. Diz que as coisas estão complicadas, mas não conversa comigo sobre isso.

- Eu também não queria que as coisas estivessem estranhas.

               Dessa vez foi minha vez de ficar em silencio.

- Eu só queria que o dia de hoje fosse... Como antes. Eu sinto falta de me divertir com você, e se quer saber, eu sinto falta de cometer alguma loucura.

               Eu o olhei abismada.

- É, eu sei! Eu estou sentindo falta de cometer loucuras! – Ele balançou a cabeça rindo. – Mas faz tanto tempo que não me divirto, que não dou gargalhada de alguma coisa... Eu realmente precisava disso.

               Escorei em seu ombro e o olhei divertida.

- Eu poderia te ajudar com isso.

               Ele riu.

- Eu não pensaria em outra pessoa para isso.

- Tudo bem. Então... Que tal se nós... Deixássemos essas desavenças para trás, e passássemos um dia fazendo coisas que você gosta? Seria uma despedida minha para você.

- Eu adoraria.

- Ótimo! Então... Faça uma lista de coisas que você tem vontade de fazer, mas nunca teve coragem.

- Agora?

- É claro! Parece que o conserto dessa porcaria não vai ser tão rápido como nos disseram.

- Mas eu não tenho nada para anotar...

               Tirei o celular do bolso do short.

- Tecnologia, Fernando.

               Ele riu, tirando o seu celular do bolso.

- Tudo bem, mas não vale espiar. Você só pode ver quando eu terminar.

- Certo. Vou até me afastar para você não pensar que vou trapacear.

               Me afastei, sentando um pouco mais longe dele. Fernando riu e voltou sua atenção para o celular, começando a digitar. Ele realmente queria fazer aquilo, e eu não poderia deixar de estar animada. Fernando era o único de nossa turma que nunca foi fã de cometer loucuras. Por mais que ele nos acompanhasse em nossas aventuras, sempre tínhamos que convencê-lo muito antes, e no fim, ele sempre se divertia. Eu poderia não ter aceitado sua sugestão, já que eu ainda não entendia os motivos de Fernando querer se casar. Era um mistério, e quanto mais ele tentava se explicar, mais confuso ficava. Mas era tentador passar um dia inteiro com Fernando fazendo coisas que eu normalmente faria, e coisas que normalmente ele estaria ao meu lado quando eu fizesse. Talvez durante o dia ele se sentisse um pouco mais à vontade para me dizer o que realmente estava acontecendo, e talvez pudéssemos resolver aquilo de alguma maneira. Isso me deixou ansiosa.

- Pronto. – Ele me olhou.

- Já?

- Eu meio que já tinha algumas coisas em mente.

- Posso ver?

- Pode.

               Voltei a me aproximar e me sentei ao seu lado, olhando para a tela do seu celular.

- Não brinca! – Exclamei lendo a primeira opção. – Você quer mesmo fazer tudo isso?

- Não garanto que terei coragem. Mas, sim... Eu quero. – Ele sorriu.

- Bom... – O olhei animada. – Então teremos que começar com isso!

               De repente com um baque, o elevador voltou a funcionar. Fernando e eu nos levantamos rapidamente, e quando as portas se abriram, dois funcionários estavam à nossa espera.

- Vocês estão bem? – Um deles perguntou.

- Sim! – Fernando me olhou e sorriu. – Estamos ótimos!

 

 

 

                                                           --------------------------

 

 

 

- Muito bem. Vamos fazer o item numero um. – Olhei para o celular de Fernando em minha mão enquanto caminhávamos pela calçada. – Eu não acho que é o que precisamos essa hora da manhã.

- Não precisamos fazer a lista na ordem.

- Mas essa é a graça!

- Você quer mesmo tomar um porre às dez da manhã?

               O olhei pensativa.

- Não, é melhor deixarmos isso para mais tarde.

- Exato.

- Então... Vamos para o segundo. Ah! Esse é ótimo! E é bem típico para você fazer. Ainda não acredito que não fez isso.

- Você sabe que eu não tenho coragem.

- Mas agora vai ter. Está de jejum?

- Não.

- Então está perfeito!

- Não podemos pular para o terceiro item?

- Não! – Exclamei segurando sua mão. – Deve ter um hospital por aqui, não é?

- Talvez.

- Fernando! Você precisa me ajudar! Se colocou na lista vai ter que fazer, e sem chorar!

               Ele suspirou impaciente.

- Ali no outro quarteirão tem um hospital.

- Ótimo! Vamos para lá!

               Puxei Fernando pela mão e caminhamos em direção ao próximo quarteirão. Logo chegamos ao hospital, e Fernando se negou a entrar por um tempo, até que eu praticamente o obriguei a entrar à base da força. Me senti uma mãe carregando o seu filho até o hospital, e todos nos olhavam quando entramos e caminhamos até a recepção.

- Bom dia! – A recepcionista nos olhou. – Posso ajudá-los?

- Bom dia! Ele gostaria de doar sangue.

- Ah! Sim! – Ela o olhou.

- Acredite, ele está mais animado do que aparenta.

               Ela riu.

- Tudo bem. Precisa preencher esse formulário. – Ela colocou um papel sobre o balcão. – E depois ele irá passar pela triagem para fazer alguns exames necessários. Você não está em jejum, não é?

- Não. – Respondi por ele.

- Ótimo. Assim que terminar de preencher o formulário, pode me entregá-lo.

- Obrigada. – Peguei o papel com uma prancheta sobre o balcão e o entreguei à Fernando. – Não vai querer que eu preencha para você, não é?

               Emburrado ele pegou o papel e seguiu até uma cadeira. Eu o acompanhei e me sentei ao seu lado, olhando para o formulário.

- Quantas perguntas.

- Se quiser podemos desistir e pular para o próximo item.

- Não! Espertinho!

               Fernando suspirou e começou a preencher o formulário.

- Quantos parceiros você teve no período de um ano... – Comentei divertida. – Essa vai ser difícil, hein?

               Ele me olhou com seriedade, mas depois riu.

- Não me desconcentre, Letícia.

- Tudo bem.

               Esperei que ele preenchesse todo o formulário, e quando terminou, Fernando me olhou dando um longo suspiro.

- Pronto.

- Vamos entregar o formulário para a moça. – Eu me levantei olhando-o. – E não fique com essa cara. Ela vai pensar que eu te seqüestrei e estou te obrigando a doar sangue.

- E não é isso?

- Não! Você quem colocou na lista.

- E eu me arrependo amargamente.

- Para de chorar, Fernando! Vem logo!

 

 

                                            ---------------------------------

 

 

 

               Depois de quase uma hora esperando por Fernando, ele saiu da sala olhando para o seu braço, onde tinha um pequeno curativo no local que tiraram o sangue.  Me levantei animada e esperei que ele se aproximasse.

- E então? Como foi?

- Horrível. Quase desmaiei. – Ele me olhou. – Se eu soubesse que voce não poderia entrar comigo, eu não tinha aceitado.

- Você parece uma criança! Fez uma boa ação, não está feliz?

               Ele sorriu.

- Estou.

- Viu só? Então item dois, riscado. Me empresta o celular, por favor.

               Fernando tirou o celular do bolso, me entregando.

- Vamos para o item três e... Ah! Esse definitivamente é o meu favorito!

- Deixa eu ver. – Fernando olhou para o celular. – Ah... Sobre isso... Eu ainda não tenho certeza e...

- Se está na lista, precisa fazer! – Disse animada. – Eu nem acredito que voce vai mesmo fazer isso!

- Está bem, mas com uma condição...

- Qual?

- Você vai ter que fazer comigo.

- Sabe que isso não é problema para mim, não é?

               Ele suspirou.

- Tem razão.

- Mas tudo bem, eu topo! Pelo menos lá vou poder segurar sua mao para você não chorar.

- Eu não chorei!

- Tá! – Balancei a cabeça rindo. – Vamos! Temos que achar um estúdio que esteja com horário vago.

               Saímos do hospital e passamos por várias ruas à procura de um estúdio. Entramos em dois, mas ambos estavam com os horários cheios. Finalmente encontramos um, que não era tão bem aparentado, mas era o único que restava por ali.

- Tem certeza? – Fernando segurou em meu braço antes que entrássemos. – E se não for... Limpo?

- Nós só vamos saber se entrarmos. – Entrelacei meu braço ao seu e o puxei em direção ao estúdio.

               Assim que abrimos a porta, o barulho do sino que havia em cima dela despertou a pessoa que estava no balcão. Um homem totalmente tatuado com vários piercings em seu rosto e uma barba enorme nos olhou. Por um momento pensei que ele nos repreenderia por termos entrado ali sem marcar horário, mas caminhei até o balcão, mesmo que Fernando tenha tentado me impedir segurando em meu braço.

- Bom dia! – Disse educadamente.

               Ele não respondeu. Continuou nos encarando, parecendo que fizemos algo errado. Ele era realmente amedrontador, e nos olhando daquela maneira ficava ainda pior.

- Eu sei que não marcamos horário, mas o meu...

- Só faço se marcar horário. – Ele respondeu com a voz grave.

- Tudo bem. – Fernando disse rapidamente. – Nós voltamos outra hora.

- Não, espera! – Segurei Fernando pela camisa antes que ele saísse. – Escuta, eu sei que deveríamos ter marcado horário, mas você é o único estúdio que está... Vazio. – Olhei em volta. – Não teria como nos encaixar em algum horário?

- Não ouviu o que eu disse? Se não marcar horário, eu não faço!

- Você realmente quer dizer isso ou é algum tipo de código?

- Lety! – Fernando me repreendeu.

- Você está zombando da minha cara? – Ele se levantou, se mostrando maior do que aparentava.

- N... Não. – Falei rapidamente. – É que... Nós... – Respirei fundo. – Nós estamos fazendo uma despedida antes que ele se case! – Apontei para Fernando. – E nessa lista de desejos feito por ele, fazer uma tatuagem é o próximo item. Por favor, nós prometemos que não será um desenho complicado para não tomar o seu tempo. Nós só queremos fazer toda essa lista antes do dia acabar.

               Ele continuou nos encarando e por um instante pensei que ele gritaria e nos mandaria embora, até que ele suspirou e escorou-se ao balcão, colocando um palito na boca.

- Está bem.

               Olhei animada para Fernando e ele sorriu.

- Qual tipo de tatuagem ele quer fazer?

- Ainda não escolhemos. Podemos dar uma rápida olhada nas suas dicas?

               Ele tirou uma pasta de dentro do balcão e a jogou sobre a mesa.

- Olhe. – Falei para Fernando e ele se aproximou do balcão, abrindo a pasta.

- Eu não faço idéia de qual escolher.

- Do que você gosta?

- Como assim?

- Não sei... Algum desenho que goste, que ache interessante.

- Não sei... – Ele olhou para a pasta, folheando-a. – O que está escrito nessa aqui? – Ele apontou para uma das tatuagens em árabe.

- Eu não sei... Não falo árabe. – O tatuador respondeu fazendo pouco caso.

- Acho melhor você só fazer um desenho. – Sugeri.

- É. – Fernando sorriu. – Acho que já sei o que quero.

- Ótimo. – O homem abriu uma parte do balcão. – Venham por aqui.

               Adentramos o local, e o lado de dentro não parecia tão assustador como o de fora. Tudo estava muito bem organizado, e parecia um local extremamente limpo. Fernando me olhou e eu sorri tranqüilizando-o.

- Sente-se aí. – Ele apontou para a cadeira e Fernando sentou-se. – Vai ser aonde?

- Aqui. – Ele apontou para o braço.

               Me sentei em um banco próxima à ele e esperei que tudo fosse preparado. Fernando escolheu um desenho cujo o significado ele já havia pesquisado um tempo atrás, quando teve a idéia de fazer uma tatuagem, mas sem coragem. O tatuador começou o seu trabalho, e eu sorri empolgada olhando para Fernando.

- Se você for chorar me avise, eu quero filmar. – Brinquei.

- Não vou chorar. – Ele riu. – Não é tão ruim assim.

- O que significa? – Perguntei sobre o desenho.

- É o ciclo da vida. – O tatuador respondeu antes de Fernando. – Significa que a vida está em constante mudança.

- É isso. – Fernando sorriu.

- Que profundo. – Falei.

- Esse cara deve estar cheio de escolhas para fazer na vida. – Ele riu e Fernando apenas me olhou.

- É, deve estar. – O olhei divertida.

               Não demorou muito tempo para que a tatuagem ficasse pronta. O traçado era simples e ela não era grande, ou Fernando teria tido um troço. Por fim ele a admirou no espelho e sorriu satisfeito com o que viu.

- E então? – Perguntei animada. – O que achou da sua primeira tatuagem?

- Acho que já quero fazer mais. – Ele riu.

- Da próxima marcaremos um horário.

- E você? – O tatuador perguntou. – Não vai querer fazer?

- Eu não sei...

- Você prometeu. – Fernando me olhou.

- Mas eu não sei o que eu faço.

- Não faz nem idéia de uma tatuagem que gostaria de fazer?

               Eu o olhei pensativa.

- Bom... Tem uma...

- Então, faça.

- Qual seria? E a onde seria? – O tatuador perguntou.

- Uma âncora. Aqui. – Apontei para o meu pulso. – Bem pequena e delicada.

- Ah... Âncora. Significa certeza, convicção...

- Sim.

- Combina muito com voce. – Fernando sorriu.

- Então... Sente-se aqui. – O homem disse apontando para a cadeira.

 

 

 

                                            ----------------------------------

 

 

 

               Eu não conseguia parar de olhar para a minha nova tatuagem. Realmente havia ficado do jeito que eu queria, e eu estava satisfeita por ter aceitado fazê-la.

- E então... – Fernando me olhou. – Vamos para o próximo item?

- Na verdade eu queria muito comer alguma coisa antes.

- Tem razão. Estou morrendo de fome.

- Eu também!

- Quando não está?

               Eu ri.

- Tem razão. Sabe onde tem um bom restaurante por aqui?

- Item cinco.

               Olhei para a lista.

- Ah... Comer em um restaurante desconhecido. – Sorri. – Entendi. Bom... Deve ter algum por aqui, não é?

- Que tal aquele ali? – Fernando apontou para o outro lado da rua.

- Hum... Parece simples e bom. Eu topo!

- Então vamos!

               Atravessamos a rua e seguimos para o restaurante. Logo quando abrimos a porta, várias pessoas nos olharam, e notando os balões e uma enorme faixa de “feliz aniversário”, percebemos que o restaurante já estava ocupado.

- Oi! – Um rapaz se aproximou com um copo em sua mão. – Nós nos conhecemos?

- É melhor procurarmos outro restaurante... – Fernando segurou minha mão para sairmos, mas eu o olhei.

- É o próximo item. – Sussurrei. – Entrar em uma festa de penetra.

- Mas não era assim!

- Deixa de ser bobo!

- Com licença? – O rapaz voltou a perguntar e eu o olhei.

- Eu não acredito que não está lembrando da gente! – Falei cruzando os braços.

- Desculpe... – Ele sorriu sem jeito. – Não estou.

               Olhei para o nome na faixa.

- Diego! Somos nós! Fernando e Lety! – Exclamei parecendo ofendida. – Nós estudamos juntos!

- Eu realmente não consigo me lembrar...

- Pelo visto voce já bebeu demais. – Falei rindo e ele sorriu.

- É... Um pouco.

- Mas tudo bem, já tem um tempo que não nos vemos. Mas o pessoal falou que voce faria seu aniversário aqui hoje e resolvemos fazer uma surpresa.

- Quer saber? Acho que estou me lembrando de vocês! – Ele disse animado. – Realmente tem muito tempo!

- Demais! – Exclamei.

- Poxa... Que bom vê-los!

- Nem me diga. Você está tão... Alto. – Sorri e ele riu.

- É verdade! Eu costumava ser bem baixinho.

- Muito!

- Mas que bom que estão aqui! Venham! A galera vai gostar de revê-los.

               Olhei para Fernando e ele revirou os olhos, me acompanhando enquanto eu seguia o tal Diego pelo restaurante.

- Galera, olha quem veio! – Ele disse animado se aproximando de um grupo de pessoas que estava à mesa. – A Lety e o Fernando!

               Todos nos olharam confusos.

- Eles não se lembram também, Fernando. – Falei fingindo estar desapontada. – Galera... Eu estou muito chateada com vocês!

- Ai meu Deus! – Uma das mulheres se levantou e eu a olhei assustada. – Lety? É você?

               Por um momento pensei que ela realmente me conhecia, mas logo depois todos começaram a fazer o mesmo.

- Meu Deus! Você mudou tanto!

- Quanto tempo, cara!

               Todos começaram a se levantar e vir nos cumprimentar. Tentei ao máximo continuar fingindo, prendendo a vontade de rir da cara de todos eles. Eram todos falsos!

- Agora a festa pode realmente começar! – Diego falou ligando o som.

               Uma musica de rock começou a tocar e todos comemoraram.

- Vamos encher os copos! – Um deles gritou.

- Toma. – Diego nos entregou um copo de cerveja. – Precisamos comemorar o reencontro.

- Com certeza! – Falei animada. – Ao Diego! – Gritei erguendo o copo.

- Ao Diego! – Todos fizeram o mesmo.

 

 

 

                                                           ---------------------------------

 

 

               Definitivamente aquela era a festa mais animada que eu já havia participado. Depois de várias cervejas e histórias inventadas por mim, já estávamos nos sentindo como parte da turma. Fernando deixou a tensão e vergonha de lado e também se entrosou na diversão. Aquelas pessoas realmente pareciam nos conhecer, e por várias vezes pensei se realmente conheciam e eu não me lembrava. Depois de muita musica, pizza e diversão, um dos convidados deu idéia de fazer um karaokê. Todos se animaram, e nos divertimos com cada um que subia à um pequeno palco destinado à shows para cantar. Cada um pior do que o outro, mas não nos importávamos. Estávamos nos divertindo e era isso que importava.

- Você é péssimo! – Diego gritou para um amigo que estava cantando “Queen.”

- Freddie Mercury está se revirando no tumulo. – Comentei e todos gargalharam.

- É isso mesmo! Desce daí!

- Vocês não sabem o que é musica. – O cara que estava no palco comentou virando um copo de cerveja.

- Muito bem, quem é o próximo? – Diego perguntou.

- A Lety! – Uma das garotas apontou para mim e todos me olharam.

- O que? – Perguntei tensa.

- Você não tinha uma banda na época da escola? Cara, os seus shows eram muito bons! Inclusive ainda não entendo como vocês não fizeram sucesso.

- É verdade! Eu me lembro! – Diego concordou. – Sua voz é ótima, Lety!

               Fernando me olhou e colocou a mão à boca, prendendo o riso.

- Eu... Não canto faz um tempo. – Falei tensa. – É melhor não arriscar.

- Ah, qual é Lety! – A garota insistiu. – Aposto que vai ser a melhor de todos nós!

- É Lety! Vai lá! – Fernando disse e eu o fuzilei com o olhar. – Não fique com vergonha!

- É! Não fique com vergonha!

- Acho que ela precisa de um incentivo, pessoal! – Fernando disse se divertindo com a situação.

               De repente todos os convidados começaram a gritar pelo meu nome. Eu tive vontade de matar Fernando naquele momento, mas achei melhor aceitar antes que a situação piorasse.

- Tudo bem! – Bati à mesa me levantando. – Eu vou cantar!

               Todos aplaudiram comemorando.

- Você me paga. – Sussurrei para Fernando.

- É melhor virar isso. – Ele riu me entregando o copo de cerveja.

               Tomei de sua mão com raiva e o virei de uma vez, seguindo em direção ao pequeno palco. Para a minha sorte, a cerveja já começava a fazer efeito, o que não me deixaria com tanta vergonha. Peguei o microfone e Diego me ajudou a escolher uma música. Escolhi a melhor que havia ali, e a única em inglês que eu sabia cantar. Should i stay or should i go. Segui para o centro do palco e olhei para Fernando, que estava visivelmente se divertindo com aquilo. A música começou e eu tomei fôlego para começar a cantar. Tentei imaginar que estava no banheiro do meu apartamento, sozinha em casa, e cantei como se não tivesse ninguém ali. Para a minha surpresa, o pessoal pareceu gostar, e começou a cantar junto. De repente eu me senti extremamente animada, como se estivesse fazendo um show de verdade. Me empolguei um pouco demais e me entreguei ao pequeno palco. Fernando não parava de sorrir enquanto me olhava, e aquilo me animou ainda mais.

               No fim da música, joguei o microfone no chão mesmo sem saber exatamente porque fiz aquilo. Todos aplaudiram e assobiaram, e eu fiz uma reverencia como agradecimento. Diego veio ao meu encontro e me ajudou a descer do palco, me parabenizando pelo “show”.

- Foi incrível! – Ele disse me dando outro copo de cerveja.

- Você realmente não deveria ter acabado com a banda! – A garota que sugeriu que eu cantasse disse animada.

- Obrigada!

- Agora depois dessa acho que ninguém mais vai ter coragem de cantar, não é? Vamos voltar com a musica!

               Quando a musica começou a tocar, caminhei em direção à Fernando e ele se levantou.

- Acho que voce já recebeu um ótimo incentivo para criar uma banda. – Ele riu.

- Eu te odeio por isso. – Bati em seu ombro.

- Você foi ótima! Realmente se entregou ao palco.

- Graças à cerveja!

               Ele riu e eu peguei o seu pulso, olhando para seu relógio.

- Já estamos aqui há três horas! Precisamos continuar com os itens.

- Por mim passaríamos o resto da festa aqui. – Ele riu. – Esta é a festa mais animada que já estive.

- Eu penso o mesmo. Mas, precisamos continuar. O próximo item é... Um show! Podemos pedir uma indicação, não acha?

- Sim!

- Ei! Diego! – Gritei e ele me olhou, caminhando em nossa direção. – Você sabe de algum show que vai ter hoje? Estávamos querendo... Curtir um pouco mais.

- Que bom que perguntou! Íamos falar exatamente sobre isso com vocês. Vai ter um show de uma banda que é pouco conhecida, mas os caras arrasam! Nós estamos indo para lá. Vocês topam?

- Claro que sim! – Olhei animada para Fernando e ele sorriu.

- Fechou! Aí pessoal! Eles toparam ir ao show! – Ele gritou e todos aplaudiram.

- Eu estou me sentindo uma celebridade. – Cochichei para Fernando.

- Bom... Estrela de rock voce já sabe que pode ser. – Ele riu e eu bati de leve em seu ombro.

 

 

 

                                                           ---------------------------------

 

 

               Para a surpresa ficar ainda maior, descobrimos que a turma estava dividida em duas vans para ir ao show. É claro que Fernando e eu aceitamos a carona, e durante o percurso, a animação estava ainda maior. Ao chegarmos ao local do show, estava mais cheio do que esperávamos, e toda a turma estava empolgada.

- Vamos ficar mais perto do palco! – Diego disse e todos concordaram.

- Será que eles são bons? – Fernando me perguntou enquanto os seguíamos.

- Só vamos saber depois. – Falei rindo. – Então... Faltam só mais dois itens da lista, e acho que um deles podemos fazer aqui.

- O primeiro?

- Sim!

- Acho que sim. – Ele sorriu.

- Ótimo! Vamos procurar um bar aqui perto e...

- Lety... – Ele segurou em meu braço e eu o olhei. – Eu queria te agradecer por hoje.

- Pelo que?

- Por tudo. Por ter aceitado vir comigo, por estar fazendo tudo isso comigo. Eu não me sentia assim há... Muito, muito tempo.

- Não precisa me agradecer. – Sorri. – Eu também estou me divertindo.

- Não existe nenhuma outra pessoa no mundo com quem eu queria estar agora. – Ele disse olhando em meus olhos, e senti meu coração disparar. – E eu queria que esse dia não terminasse mais.

               Olhei em seus olhos e tive a mesma sensação que senti quando estávamos em meu apartamento. Por um segundo pensei que iria vacilar, e jogaria tudo para o alto, sem me importar com o casamento e com todo o resto. Mas, quando estávamos com os rostos próximos um do outro, o barulho do microfone nos chamou a atenção, e eu rapidamente desviei o rosto.

- É melhor começarmos o item um logo. Não sabemos se vamos agüentar. – Falei mudando de assunto.

- É claro. – Ele olhou em volta. – Ali. Naquele bar deve ter!

- Vamos lá.

               Caminhamos em silencio em direção ao bar, um pouco mais distante do pessoal. Quando nos aproximamos, logo vi uma fileira de vodka de todos os sabores na prateleira.

- É aqui mesmo! – Falei sorrindo.

- Tem certeza que quer fazer isso? E se você passar mal?

- Acho que voce que deveria se preocupar com isso, Senhor “não bebo cerveja há muito tempo”.

- É, tem razão. – Ele riu.

- Vamos começar logo com isso! – Me aproximei do balcão. – Com licença!

- Posso ajudá-la? – O vendedor me olhou.

- Nós gostaríamos de duas doses de cada vodka que o Senhor tem.

- De... Cada uma?

- Sim!

               Ele nos olhou como se fossemos loucos.

- Tudo bem... É pra já.

               Olhei animada para Fernando e ele sorriu. A banda subiu ao palco e todos começaram a comemorar, no mesmo instante que o Senhor colocou dois copos em cima do balcão.

- Vou começar pela normal. – Ele disse enchendo os dois copos. – Sinceramente, nunca vi alguém fazer isso.

- Sempre tem uma primeira vez pra tudo. – Fernando disse pegando o copo.

               A música começou, e de fato a banda não era ruim, pelo contrário. Peguei o copo sobre o balcão e o ergui na direção de Fernando.

- Então... À sua lista de desejos!

               Ele riu, brindando seu copo ao meu. Viramos a vodka de uma vez, e Fernando fez uma careta, colocando o copo de volta sobre o balcão.

- Vai ser mole! – Falei fazendo o mesmo.

- Vão querer mesmo continuar? – O Senhor perguntou. – Vou passar para a de morango.

- Vamos! – Falei animada. – Vamos chegar até a ultima!

               Nós rimos.

 

 

                                            ----------------------------------

 

 

 

               Eu não estava sentindo o meu próprio corpo. Conseguimos chegar à ultima vodka, mas eu já não tinha noção nenhuma de onde eu estava. Fernando e eu aproveitamos o show, que de fato estava ótimo, mas ele me lembrou que ainda tínhamos um item na lista. Fernando não parecia tão alterado como eu, mas estava notavelmente animado, e isso me deixou feliz. Caminhamos pelas ruas próximas ao show, e ainda conseguíamos ouvir o barulho da musica e do publico gritando. Fernando se abraçou à mim para que eu não me desequilibrasse no meio da rua, e de repente eu comecei a gargalhar.

- Do que está rindo? – Ele perguntou também rindo.

- Eu não acredito que realizamos todos os itens da lista!

- Ainda falta um.

- Mas esse vai ser o mais fácil.

- Onde podemos fazer isso?

               Parei de andar e olhei em volta, localizando um colégio logo em nossa frente.

- Aqui! – Abri os braços olhando para a entrada do colégio.

- Ficou louca? Isso é um colégio!

- Exatamente! Quem vigia um colégio à noite?

- Eu não sei! Mas e se nos envolvermos em problema?

- Então nós acrescentaríamos um item a mais na sua lista. – O olhei rindo. – Vamos dar a volta, o muro do outro lado não deve ser tão alto.

               Fernando me acompanhou pela rua escura e deserta até chegarmos ao muro dos fundos do colégio. Realmente não era tão alto, mas precisaríamos de algo para nos apoiarmos.

- Pegue esses caixotes! – Falei para Fernando, apontando para alguns caixotes que havia próximos à uma árvore.

               Ele os pegou e colocou um em cima do outro próximos ao muro.

- Acha que consegue? – Perguntou.

- Meu querido, eu sou profissional. Já invadi vários colégios antes.

- É mesmo?

- Não, mas já invadi a casa da minha vizinha quando era criança. Não deve ser tão diferente.

               Ele riu.

- Me ajuda aqui. – Subi nos caixotes e ficando na ponta dos pés consegui ver o outro lado do colégio, com uma piscina olímpica enorme no centro. – É o lugar perfeito!

- Você acha que vai dar certo?

- Vamos ter que pular do outro lado. É mais alto do que aqui.

- Você vai primeiro e joga os caixotes para mim. Não vou precisar.

- Desculpe se eu não tenho mais de um metro e noventa!

               Ele gargalhou.

- Tudo bem. Eu vou pular.

               Segurei no muro e Fernando segurou em minha cintura, me impulsionando para cima. Consegui me sentar ao muro e coloquei as pernas para o lado de dentro. Criei coragem e respirei fundo antes de pular do outro lado. Era um pouco mais alto do que eu esperava, mas mesmo me desequilibrando e caindo no chão, consegui sobreviver.

- Lety? – Fernando sussurrou. – Você está bem?

- Sim! – Me levantei, limpando minha roupa. – Jogue os caixotes!

- Cuidado, se afaste!

- Pode jogar!

               No mesmo instante, Fernando jogou os caixotes e eu me desviei deles, rindo logo depois.

- Te acertei?

- Não. Você não tem a mira tão boa. Vem logo! – Olhei em volta, me certificando de que não tinha ninguém ali.

               Esperei ansiosa por Fernando, e em poucos segundos ele se debruçou sobre o muro, olhando para mim logo depois.

- Você fica um gato olhando daqui de baixo! – Sussurrei e ele riu.

- Não brinque, Lety.

- Não estou brincando! Pula logo!

               Fernando tomou impulso e pulou, e diferente de mim, conseguiu cair de pé.

 - Viu só? Não foi tão ruim.

- Eu quero ver como vamos sair daqui.

- Nos preocupamos com isso depois. Agora vem, está começando a fazer frio!

               Caminhei em direção à piscina e Fernando me seguiu. Pelo visto estávamos mesmo a sós ali, o que deixava tudo ainda melhor. Assim que nos aproximamos, comecei a tirar meu sapato e o meu celular do bolso e Fernando me olhou.

- O que foi? – Perguntei olhando-o.

- Você não vai fazer o que eu estou pensando, não é?

- E por que não? Precisamos fazer algo para concretizar a invasão.

- Mas nadar? Você ficou louca? E se alguém nos ouvir?

- Não tem ninguém aqui, gênio. E não seja tão medroso!

- Nós já fizemos o item, Lety. Vamos embora, por favor.

- Não! – Exclamei. – Vamos encerrar a noite assim. Além do mais, estamos bêbados. Precisamos de água fria para melhorar.

- Pode fazer isso no banho.

- Mas não vai ser tão divertido. – Sorri animada e pulei na piscina no mesmo instante.

               A água estava congelando, mas eu estava alterada demais para sentir isso. Depois de mergulhar, olhei para Fernando e ele continuou parado me encarando.

- Não vai mesmo entrar?

- Não. – Respondeu sério.

               Revirei os olhos e continuei olhando-o.

- Ai! Meu Deus! – Exclamei.

- O que foi? – Ele perguntou preocupado.

- Acho que estou com câimbra. Não... Consigo mexer a minha perna... Ai droga! – A água começou a me cobrir por eu não conseguir ficar em pé, e Fernando se desesperou. – Fernando! – Bati os braços tentando não afogar, mas em poucos segundos eu estava esperneando dentro da piscina, sem conseguir respirar.

               Imediatamente Fernando tirou sua jaqueta e sua camisa e pulou na piscina, nadando em minha direção.

- Eu te peguei! – Ele disse segurando em minha cintura, me olhando preocupado. – Lety! Está tudo bem?

               Olhei para ele e sorri vitoriosa.

- Está tudo ótimo.

- Eu não acredito, Letícia! – Ele exclamou irritado me soltando. – Você me assustou!

- Precisava fazer isso para você entrar! Viu só? Não foi tão ruim!

- Isso não é brincadeira, eu fiquei preocupado! – Respondeu nervoso passando as mãos em seu cabelo molhado.

- Eu sei, e foi muito fofo. – Respondi divertida. – Não fique com raiva de mim, Fernando! Pelo menos vai ser uma noite inesquecível.

               Ele me olhou emburrado.

- Não vai me obrigar a afogá-lo... – Me aproximei.

               Fernando continuou de cara fechada, até que eu pulei sobre seus ombros, tentando afundá-lo. Mas, obviamente foi impossível, e ele começou a rir com a minha frustrante tentativa.

- Por que você é tão alto? – Reclamei.

- Você que é pequena demais. – Ele riu segurando em minha cintura. – Agora vai pagar por isso!

- Não! – Gritei e ele me carregou em seus braços, mergulhando comigo logo depois.

               Não demorou muito tempo para voltarmos à superfície, e quando isso aconteceu, eu bati em seu ombro.

- Eu poderia ter afogado!

- Não se afoga duas vezes no mesmo dia. – Ele riu ainda me segurando.

- Eu te odeio!

- Não odeia nada!

- Odeio sim!

- Então vou ter que mergulhar de novo.

- Não! Por favor!

               De repente estávamos gargalhando, jogando água um no outro. Fernando não me largou em nenhum momento, e em meio às gargalhadas, nossos olhares se cruzaram. As gargalhadas diminuíram e continuamos nos olhando. Uma das mãos de Fernando estava em volta da minha cintura, e a outra segurando minhas pernas. Eram diversas sensações que me dominaram naquele momento, e tudo o que eu queria era encerrar aquele dia com um beijo. Estávamos molhados, bêbados, e com a adrenalina explodindo. Nada me deixaria mais feliz do que beijá-lo naquele instante.

- Sua blusa...

- O que é que tem? – Perguntei olhando para seus lábios.

- Está... Transparente.

               Olhei para baixo e me lembrei de que estava com uma camiseta branca. Não costumava usar sutiã quando estava com ela, e me arrependi amargamente por isso.

- Ai meu Deus! – Exclamei abraçando ao meu próprio corpo, me afastando de Fernando.

               Ele riu enquanto me olhava, e eu senti meu rosto corar.

- Você pode fingir que não viu isso. – Falei.

- Por quê? – Ele continuou rindo.

- Porque sim, oras!

               Ainda me olhando, ele voltou a se aproximar.

- Desculpe a minha sinceridade, e se isso te deixar envergonhada, pode colocar a culpa na bebida.

- Mas...?

- Mas... Você está muito sexy.

- Fernando! – Joguei água nele, rindo.

- Desculpe, mas está.

- Você não deveria ter visto isso.

- Ainda bem que eu vi, e vai ser difícil esquecer.

               Continuei olhando-o à medida que ele se aproximava.

- Assim como vai ser difícil esquecer... Aquele beijo. – Ele olhou para os meus lábios, assim como olhei para os dele. – E sinceramente, Lety, não há um momento em que eu esteja ao seu lado que eu não queira beijá-la.

- Não diga isso, Fernando... Por favor...

- Eu consegui me segurar hoje, mas... É difícil... Porque cada vez que eu olho para você, eu tenho vontade de beijá-la.

               Minha respiração ficou ofegante e meus batimentos se aceleraram.

- Eu poderia inclusive fazer isso... Nesse instante. – Ele aproximou seu rosto do meu, e eu pude sentir sua respiração.

               Estava prestes a me entregar e beijá-lo, como quis fazer durante todo o dia que passamos juntos. Eu já conseguia sentir os seus lábios próximos ao meu, quando ouvimos um barulho de algo caindo. Olhamos assustados para a direção do barulho, e por pouco pensei que estávamos perdidos, e que tínhamos sido pegos. Mas depois de um tempo, um gato correu em nossa frente, saindo do lugar de onde tinha acontecido o barulho. Respiramos aliviados e voltamos a nos olhar.

- Melhor irmos... – Falei tremendo. – Já está muito frio.

- É... Vamos.

               Eu agradeci mentalmente por não ter fraquejado e beijado Fernando. Eu teria me arrependido por isso, e ele também. Não era o certo a se fazer em uma situação como aquela, e as coisas poderiam piorar como antes. E justo agora que tudo estava se resolvendo entre nós dois, eu não queria estragar tudo. Fernando me ajudou a sair da piscina, e logo depois saiu. Balancei a minha blusa na tentativa frustrante de não deixá-la tão transparente, mas foi impossível.

- Toma. – Ele me entregou sua jaqueta. – Pode colocar por cima.

- Obrigada. – Falei pegando-a e colocando-a logo depois.

               Torci as pontas do meu cabelo tirando o excesso da água e olhei para Fernando, assim como ele também me olhou.

- Vamos embora. – Desviei o olhar.

- Vamos.

               Caminhamos em direção ao muro, e novamente Fernando ajeitou os caixotes. Fiz o mesmo que fizemos quando entramos, e mais uma vez ele me ajudou a escalar o muro. Pulei do outro lado, dessa vez sem cair, e esperei por Fernando. Não demorou para que ele fizesse o mesmo, e quando estávamos do outro lado, olhamos um para o outro e começamos a rir.

- Encerramos a noite com chave de ouro. – Ele disse rindo.

- Sim! E nem fomos presos.

- Que sorte a nossa!

               Mais uma vez nos olhamos, mas antes que pudesse pintar um clima, ouvimos um carro se aproximar. Ao apertar os olhos para conseguir enxergar, percebi que era uma das vans do pessoal que estávamos juntos, e assim que nos viram, eles gritaram e comemoraram, parando a van em nossa frente.

- Vocês dois sumidos! – Diego gritou colocando a cabeça para fora da janela. – Para onde estão indo?

- Estávamos indo embora. – Falei.

- Entra aí! Nós damos uma carona para vocês!

               Olhei para Fernando e ele sorriu, concordando. Entramos na van com o pessoal e eles continuavam tão animados quanto antes. Mas, dessa vez, Fernando e eu estávamos em silencio. Não por vergonha, mas porque sabíamos que por pouco não tínhamos nos beijado novamente. Não demorou muito para que chegássemos no hotel, e Fernando desceu para me acompanhar.

- Obrigada, pessoal! – Falei acenando para eles. – E feliz aniversario, Diego!

- O melhor de todos, Lety! – Ele riu. – Nos vemos depois! Vê se não desaparecem de novo!

- Não vamos! – Fernando sorriu. – Até logo!

               Todo mundo se despediu e a van se afastou.

- Pessoas legais, mas completamente loucos. – Fernando riu.

- Sim! Eles realmente acham que nos conhecem. – Respondi divertida.

- Às vezes acho que eles entraram no jogo e não quiseram nos desmascarar.

- De qualquer maneira, foi ótimo.

- Foi. – Ele sorriu colocando as mãos no bolso. – Foi o melhor dia que já tive, e fico feliz que tenha sido com você.

               Sorri, mas logo a história do casamento me perturbou. Passamos um dia inteiro sem falar sobre isso, mas de repente, a realidade voltou à tona.

- E amanhã será o ensaio...

               O sorriso de Fernando diminuiu.

- É...

- Falta pouco.

               Ele não respondeu.

- De qualquer maneira, foi uma ótima despedida. – Toquei em seu braço sorrindo.

- Eu só queria que não fosse uma despedida.

               Não soube o que responder. Eu tinha que me lembrar que Fernando continuava sem dizer o que estava acontecendo, e enquanto isso continuasse, eu não poderia criar esperança alguma.

- Ali está um táxi! – Apontei para o carro que se aproximou. – Melhor você se apressar. Nunca se sabe quando vai passar outro.

- Tudo bem. – Fernando colocou as mãos no bolso.

- Nós nos vemos amanhã. – Me aproximei, beijando seu rosto. Ele me olhou por um tempo até que dei um passo atrás, me afastando. – Foi um dia maravilhoso.

- Obrigado por tudo, Lety.

- Não precisa agradecer. Sou sua madrinha. – Sorri triste, mas ele não fez questão de sorrir.

               Me virei caminhando até a entrada do hotel, e antes de entrar, acenei para ele. Ele retribuiu o aceno triste e continuou parado na calçada me olhando. Entrei no hotel com uma sensação maravilhosa, mas ao mesmo tempo com o coração apertado. Faltavam apenas dois dias para Fernando se casar, e se ele não mudasse de idéia até lá, aquele dia ficaria apenas nas lembranças do melhor dia da minha vida. 



Gostou da Fanfic? Compartilhe!

Gostou? Deixe seu Comentário!

Muitos usuários deixam de postar por falta de comentários, estimule o trabalho deles, deixando um comentário.

Para comentar e incentivar o autor, Cadastre-se ou Acesse sua Conta.


Carregando...