Madrugada, aquela noite fazia mais frio que o normal, puxei o gorro da minha blusa de frio e cobri minha cabeça.
As ruas estavam vazias, um cachorro amarelo rasgava sacolas de lixo com voracidade, nenhum carro passava e apenas o posto de gasolina estava aberto.
Se tenho medo de andar sozinha? Não tenho, trabalhar de garçonete foi a melhor coisa que consegui depois que meu marido morreu e infelizmente era o horário que tinha, era isso ou nada, então aceitei a chance. Pelo menos eu tinha direito a um lanche todos os dias o que garantia meu café.
Me garantiu 5 quilos a mais também.
Não me importava mais com minha aparência, então engordar para mim era indiferente.
Subi as escadarias de onde morava, era um prédio velho, tijolos vermelhos, vizinhos barulhentos e que queriam a senha do meu Wi-fi. Mimi veio me receber se enroscando em minhas pernas, era uma gata grande, branca e excessivamente peluda.
- Não tenho bacon dessa vez.
Ela miou como resposta. Sim, ela me respondia as vezes.
Tirei meu tênis velho e surrado, sentei no sofá e agradeci a Deus por ter chegado sã e salva em casa, agradeci por ter um apartamento – ainda que ele precisava de uma reforma – agradeci por Miguel Caolho ter me dado uma gorjeta e pelo meu chefe sempre me acompanhar até a esquina.
Me espreguicei no sofá, sentindo todo o peso do dia em meus ombros.
Dormi.
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- Vagabundo! Safado!
Acordei assustada, meu coração acelerou e eu me sentei. Ainda estava zonza do sono.
- Sem vergonha! Pilantra!
Eram os vizinhos do lado, Marcos era conhecido no prédio inteiro por ser bastante infiel e pelo visto a esposa descobriu. Fiquei com pena da filha deles e fui até lá, como a porta estava aberta pude ver a cena: a mulher gritando, o marido sentado no sofá tampando o rosto e Michele com seus 4 anos parada na porta da cozinha olhando tudo.
Eles nem perceberam que eu entrei e nem notaram quando peguei a criança em meus braços. Passei rapidamente em casa para pegar minha bolsa e descer.
A medida que me afastava os gritos ficavam mais intensos, barulho de coisas se quebrando e se chocando.
Respirei fundo, a menina se agarrou ao meu pescoço com força.
- Quer um sorvete?
Ela fez que sim com a cabeça. Havia uma pracinha perto de casa com diversas barracas de quitutes, comprei uma casquinha para ela e um copo de café para mim.
O semblante dela já estava menos triste, porém, ela parecia confusa.
- Porque mamãe está brava?
Crianças e suas perguntas, pensei bem nas palavras antes de responder.
- Mamãe está brava com papai.
- Papai vai embora de novo?
Opa, dessa eu não sabia! Mas como nunca gostei de mentiras, nem as convencionais olhei bem para ela, ajeitei seus cachos castanhos atrás da orelha e dei o maior sorriso que poderia ser dado numa quarta-feira que você é acordada com gritos:
- A titia não sabe, mas a titia sabe de uma coisa.
- Qual? - ela mordia a casca com fome.
- Titia vai estar com você, está bem?
Ela sorriu e eu me senti uma massa gelada derretendo no Sol escaldante do meio dia.
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