História Minhas Duas Doses de Você - Dando o Primeiro Passo

Ao sair da casa de Tiffany minha mente se encontrava um tanto perturbada, por isso resolvi ir na casa de Yuri, precisava conversar com alguém que não fosse me encher de conselhos vazios. Dirigi com uma tranquilidade que não me pertencia e até me assustava, era como se meu corpo tivesse recebido uma anestesia que não me permitia entrar em estado de paranoia. Foram muitas informações, muitas. Eu tinha meus próprios dilemas: meus pais, minha aceitação, meu corpo, minha perda. E agora que eu estava começando a achar um caminho me deparo com uma situação que me sufoca: Tiffany ter feridas iguais ou mais profundas que as minhas. Minha humanidade pede para que eu a deixe em paz, para que eu não me torne mais uma de suas muitas feridas. Mas minha alma suplica e meu coração implora para que eu não desista. É como se eu estivesse no deserto por muito tempo e a vida me emprestasse um gole de água ... Mas eu conseguiria lidar com o fardo de saber que a estou usando, de que a qualquer momento ela pode descobrir sobre as minhas reais intenções? 

- AAAAAAAAAAAHHHHHHHHHH... – grito dentro do carro tamanha minha frustração.- O que eu faço? Hum?! -  falo mirando o volante. 

Continuo dirigindo e ao chegar no prédio de Yuri, ligo para ela já avisando que vem tempestade no caminho e que ela preparasse duas doses fortes de whisky porque a noite seria longa. 

- Taeyeon ...– falou abrindo a porta, não esperei ela terminar de falar. 

- Yuri ela tem uma filha... ela tem uma filha e  foi iludida por um cara, que é o pai da criança, quase perdeu o bebê por que apanhou dele quando foi dar a notícia, sofre preconceito e é julgada desde então- falei em um folego só já me sentando no sofá e pegando a dose de bebida, que desceu rasgando a garganta, do jeito que eu gostava. 

- Nossa ...- foi tudo o que Yuri conseguiu dizer. 

- Pois é... 

- Agora você vai desistir né?... Você vai desistir não é Kim Taeyeon? Continuar é no mínimo ... insano. Não que não fosse desde o começo, mas agora é pior- perguntou mais incisiva. 

- Não sei Yuri, eu realmente não sei.- nunca fui tão sincera como estava sendo naquele momento. 

- O quê?  Tae ... eu nem sei o que falar, depois de tudo o que ela passou, você ainda vai querer continuar. Tá na cara que um dia, se a Tiffany ficar com você, algum dia ela vai descobrir desse seu plano. E isso vai ser pior do que tudo Tae, quando ela souber que você a usou e que mesmo depois do que você descobriu hoje, e não ter recuado, vai ser uma ferida maior do que você possa imaginar. Ela não merece isso Taeyeon, pelo que vi no restaurante ela é uma pessoa muito boa de coração. Você sabe que eu sempre tenho dois pés atrás quando se trata de pessoas novas em meu círculo de convivência. Mas sei lá, com ela foi diferente. Eu já disse o que eu acho sobre esse seu plano , desde o início , mas agora ... agora é pior. Além do mais, não é só com a  Tiffany que você vai ter que lidar, tem a filha dela também. 

- Eu sei Yuri, eu sei ... 

- Pois não parece, sei que você é teimosa, mas não sabia que você era insana e sem coração Taeyeon. Eu desejo do fundo do meu coração que, se caso você continuar com essa merda de conquista, no final você acabe se apaixonando de verdade por ela e que ela te dê um belo pé na bunda. Só para você saber como dói ser usada e enganada. - yuri falou aquilo e pude sentir a dor em cada palavra, Yuri melhor do que ninguém sabia o peso de cada palavra dita. 

- Não seja tola Yuri. Eu só amei uma pessoa nessa vida. Não tem a menor chance disso acontecer de novo.- falei encarando a garrafa em minha frente.- Tiffany é legal, eu sei disso, mais se apaixonar já é outro assunto e eu não sei se quero tocar nele agora. Quanto a filha ... Bem, é um fator surpresa. - Bufei com essa nova informação sobre Tiffany e todo o copilado ao seu redor. 

Passamos um tempo em silêncio e eu já estava preparando uma segunda dose de whisky para mim. Depois do falatório de Yuri tudo o que eu queria era virar uma garrafa goela à baixo e só me acordar no outro dia, para assim poder pensar no que iria fazer.  

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Acordei com a cabeça latejando, pelo visto tinha valido a pena toda a bebida ingerida na noite anterior, apaguei e não sei como, mas me encontrava em meu quarto. Ao olhar para meu criado-mudo percebi um papel: 

“ Você estava tão bêbada que não vai lembrar que eu te levei pra casa, juízo. 

Yuri.” 

Certo, Yuri me deixou em casa. Olhei para o relógio e quase dei um pulo da cama. Eram 10 horas da manhã, em resumo, eu tava atrasadíssima pro trabalho. Me arrumei em tempo record, tinha muitas coisas para resolver na Century e não seria uma ressaca que iria me derrubar. Quando peguei a chave do carro foi que me lembrei que hoje era sábado, portanto, não teria expediente na empresa, logo eu tinha o dia livre. Caí no sofá afim de curtir minha ressaca com um belo sono, não gosto de tomar remédios, sempre tive dificuldade em ingerir essas drogas, então quando eu tinha uma ressaca preferia dormir. 

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Ao me levantar, olhei diretamente para meu pulso em busca de meu relógio, só para constatar que já passavam das 17 horas, passei a tarde toda dormindo, o que foi bom , já que não sentia mais nenhum efeito da bebedeira da noite passada. Estava com fome e nem um pouco entusiasmada com a comida congelada que tinha em casa, Yura, a  menina que me auxiliava nas tarefas da casa, sempre congelava a comida para que eu pudesse me manter durante a semana, mas hoje não estava com ânimo. Resolvi ir no shopping, fazia tempo que não saía e bem ... seria bom sair. Mas antes de tudo resolvi passar no santuário, precisava renovar as minhas forças. Rumei para o quarto já abrindo a porta e entrando em busca de um alívio que só aquele lugar me transmitia ... 

- Você não sabe a surpresa que eu tive ontem amor...- falei já de frente para o quadro.- Ela tem uma história bem complicada Stephie, mas eu não consigo pensar em me afastar dela, eu não consigo me afastar da pessoa que vai me trazer você de volta ... Às vezes eu me acho uma imunda por estar fazendo isso, a Yul me falou o quão errado está sendo minha atitude, mas tudo o que eu enxergo é você, é querer te ter novamente.- eu já estava aos soluços.- Isso não pode ser tão errado assim, certo? Quero dizer, como posso deixar passar essa chance?! Não posso... não foi fácil te perder e Tiffany está sendo minha melhor opção. Não posso deixar escapar assim tão fácil ... 

Fiquei mais um tempo naquele quarto, até minha barriga roncar na verdade. Tranquei tudo e fui para meu quarto me arrumar. Como não iria encontrar ninguém resolvi colocar uma roupa simples: calça jeans, blusa de manga comprida branca e colada no corpo, um sapato também branco e um rabo de cavalo no cabelo, como não era fã de maquiagem, não me importei em colocar. Havia muito tempo que não me vestia tão confortavelmente, a empresa sempre me pedia um código de vestimenta à altura e em toda minha vida, devido a minha condição, roupas sempre foram uma questão pra mim. Meus pais que o digam ... Humf ... se é que eles poderiam ser chamados de pais. 

Sem querer pensar muito naquele assunto Segui para o estacionamento entrei no meu carro sem demora. Dirigi o mais tranquila possível, mas por dentro minha mente não parava de raciocinar: Tiiffany, Century, filha de Tiffany, continuar ou recuar, Stephie... Tudo isso contribuía para minha tempestade interior. Demorei cerca de 45 minutos pra chegar no shopping e depois de acertar o estacionamento fui me dirigindo para um restaurante que eu gostava no local. Mas antes de chegar ao meu destino eu me deparei com uma loja de brinquedos e dentro dela um urso bege claro enorme com a letra I, em tom verde esmeralda,  no meio de sua barriga me chamou a atenção. Por impulso entrei na loja e fiquei olhando os brinquedos, mas o urso me chamou atenção demasiada. Logo um dos vendedores veio me atender. 

- Olá, em que posso lhe ajudar? ... Percebi que estava olhando o ursinho da vitrine, é para seu filho ou filha? - O rapaz com pingente de nome Key se aproximou. 

-N-não , na verdade eu só estou olhando.- falei um pouco constrangida. 

- Oh me desculpe! Você tem cara de ser mãe, então logo deduzi que era para seu filho. 

-Ok ... mesmo assim, obrigada. -  Ri um pouco desconfortável com a percepção dele ... há alguns anos atrás ele não diria isso ... balancei a cabeça e me apressei em sair da loja tentando me lembrar do por quê de ter ido no shopping, prontamente me despedi do rapaz e continuei meu trajeto até o restaurante. 

Durante minha refeição eu só ficava pensando no maldito urso e na letra I que ele carregava em sua barriga. Terminei de pagar a conta e fui andando para a loja de brinquedos novamente. 

- Eu não acredito que tô fazendo isso... Kim Taeyeon isso é loucura -suspirei, pesadamente, entrando na loja e já avistando o vendedor que me atendeu anteriormente. O encarei e acenei com a cabeça indicando para que ele se aproximasse. 

- Olá! 

- Olá , Key não é?! 

- Sim, a senhora tem interesse em algum brinquedo? 

- O urso, por favor. E não, eu não tenho interesse em mais nada.- falei antes que ele me enchesse de brinquedos nos quais eu não teria o menor interesse. 

Saí da loja com um embrulho quase do meu tamanho e pedindo aos céus que coubesse no porta-malas do meu carro. Quando consegui colocar o urso , fui no meu GPS e redirecionei o endereço. Agora a torcida era pra ela estar em casa e que gostasse da surpresa. 

Nunca fiquei tão nervosa. Assim que parei na frente da casa de Tiffany, fiquei me perguntando porque eu havia comprado ursinho, por que eu estava nervosa... droga. Juntei minha coragem, desci do carro, peguei o maldito urso e me posicionei de frente pra sua casa. Bati na porta e por um momento torci para que ela não estivesse em casa... mas logo ouvi passos vindo em minha direção. 

- Taeyeon ...?- uma Tiffany de microshort e blusinha de alça me atendeu com uma cara de não entendimento. 

- E-eu comprei uma coisa ... – vi ela estreitar os olhos- para sua filha.- O espanto de Tiffany só não se comparava à minha falta de compreensão por mim mesma ter comprado aquele brinquedo. Indiquei com a cabeça o urso enorme ao meu lado, e só então Tiffany percebeu o presente em sua varanda. 

- Eu não esperava por isso.- ela me presenteou com um lindo sorriso e eu me perdi.- Mas por que você não entrega o presente pessoalmente .. - falou um pouco envergonhada 

O quê? Espera... Tiffany estava me convidando para entrar em sua casa e conhecer pessoalmente a sua filha?! 

- Você não se incomodaria? - ao mesmo tempo que senti uma ansiedade sem explicação tomar conta de mim, qual é Taeyeon?! 

- Não Taeyeon, esse é o primeiro presente que ela recebe de uma pessoa que não seja próxima. Mas se você não quiser eu entrego mesmo assim... 

- Eu quero.- as palavras saíram da minha boca num rompante. Até me espantei pela minha determinação. 

Tiffany girou nos calcanhares antes de olhar pra mim sobre os ombros e me chamar. Só me restou apanhar o urso e entrar na casa. Quando entrei na sala, pude notar a simplicidade ao mesmo tempo que via a organização de Tiffany, notei, também ,alguns brinquedinhos espalhados pela casa como um aviso de criança no recinto. Fui olhando alguns detalhes a mais, como o fato de que quase tudo era na cor rosa e suas tonalidades, assim como cores neutras que acompanhavam o tom rosa. Em resumo uma casa simples da periferia de Seoul, mas que era muito bem cuidada. Foi no meio dessa análise da casa de Tiffany que eu escutei um resmungo. Parei para ver de quem se tratava e quase perdi as forças ao encarar o bebê mais lindo do mundo. Ela era linda. 

- Uto, uto ... omma !- ela esperneava nos braços de Tiffany, sinalizando que queria descer. 

Tiffany a colocou no chão e a pequena veio correndo, mas parou bem em minha frente me olhando como se estivesse pedindo permissão para poder tocar no embrulho transparente que denunciava o tal urso, assim como uma pergunta de quem eu era. Me ajoelhei em sua frente e peguei em sua mãozinha, ao mesmo tempo que uma onda de proteção, carinho e afeto me assolavam ... Ao mesmo tempo que era estranho, era natural, recíproco. Eu estava encantada por ela, era como se aquela criança fosse a resposta para alguma pergunta incompreendida pelo meu subconsciente. 

- Oi ... meu nome é Taeyeon, eu sei que é comprido pra uma menininha da sua idade, então pode me chamar de Tae.- falei. Nunca tive muito contato com crianças para não dizer zero, mas aquela menina era naturalmente e inexplicadamente fácil de lidar, eu só sabia o que e como tratá-la.  Ela  então se virou para a mãe, ainda com uma das mãozinhas nas minhas, como se para pedir permissão à mãe para dizer o seu nome. Assim que Tiffany assentiu ela se virou para mim com um sorrisinho de quebrar qualquer coração. 

- Oi ...  meu nome é Iene.- Foi impossível conter uma risada com tamanha pronúncia. 

Olhei para Tiffany e a vi soletrar um Irene para mim. Assenti e me voltei para aquele bolinho. 

- Eu fiquei sabendo que uma mocinha linda mora nessa casa. Você sabe quem é? 

- E-eu tia, eu!- falou uma Irene saltitante com uma das mãos levantadas para sinalizar que a tal menina era ela mesma. 

- Ah é você? 

- TIMMMM !– Ela estava empolgadíssima. 

- Olha eu trouxe um presente pra você - falei aproximando o urso dela. 

- É gande! – os olhinhos estavam espantados. 

- Sim e é todo seu.- pronto foi eu falar isso que ela praticamente se jogou no urso, que por ser enorme, a acolheu por inteiro. 

- Deixa só eu tirar o plástico pra você.- falei a pegando com delicadeza, qual não foi minha surpresa quando ela me abraçou e encostou a cabecinha em meu pescoço. Seu cheirinho me invadiu e eu só pude abraça-la ao mesmo tempo em que fechei meus olhos apreciando o contato. 

- Obigada ...- falou levantando seu olhar para mim. 

Com ela no colo, sentei no chão da sala e desembrulhei o urso. Foi um festa de novo. Ela se jogou em cima do urso que mais uma vez a acolheu. Quando me virei para olhar onde Tiffany estava  a encontrei enxugando algumas lágrimas. Suspirei, e a chamei para se juntar a nós. Pude decifrar o quanto aquela mulher tinha sofrido pra proteger aquela criança e meu coração se apertou com o vislumbre de futuramente ser eu o motivo dessas lágrimas ao mesmo tempo que me lembrei das minhas noites sombrias ... enquanto isso Irene brincava alheia aos meus dilemas com o ursinho como se não houvesse amanhã.  

Tiffany resolveu entrar na brincadeira com o urso e eu fiquei a admirar a cena. 

Se por um lado eu tinha total noção do perigo e da ferida que eu poderia causar nelas caso tudo fosse descoberto ... Por outro lado eu poderia suprir as deficiências financeiras daquela casa ... seria uma troca justa, certo?! ... 

Espero que sim ...