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História Misfit - Capítulo 16- Ambiguidades


Escrita por: Doublefenix

Notas do Autor


oiee gente!

demorei, demorei, mas voltei (sempre volto, nao se preocupem, vcs n vao se livrar de mim tão cedo!) euheuehuehueh bom, o motivo foi pq eu mal cheguei no br e já sai de novo, só q dessa vez com o meu pai,meus pais sao separados, entao...

muitas pessoas reclamam da demora de Misfit, eu quero esclarecer gente que os capitulos sao enormes e equivalem a 2/3 pequenos, entao é normal que eu demore um pouco mais, é como se eu estivesse escrevendo 3 caps e nao apenas um, certo? entao deem um desconto <3

bom, sem mais delongas, Misfit!

ps. sem capa pois estou postando pelo celular, qualquer erro é culpa do meu corretor u______u

Capítulo 16 - Capítulo 16- Ambiguidades


 

Capítulo 16- Ambiguidades

 

 

"Quando as coisas se quebram, não é o ato de quebrar em si que impede que elas se refaçam.

É porque sempre um pedacinho se perde, as duas bordas que restam não se encaixam, mesmo que queiram.

A forma inteira mudou."

-Will & Will

 

 

Suspiros exaustos esvaziavam meus pulmões naquela segunda feira de algum mês qualquer.

 

Digo mês qualquer, pois como já mencionei, não possuía conhecimento de qual data me encontrava. 

 

Não compensava contar mais, os dias eram por vezes extensos, por vezes corridos, apenas importava que passassem, passavam e eu nem me dava conta.

 

Após todo aquele drama que contei para vocês, minhas horas retornaram a nostalgia adolescente, aquela perquisição impregnada na alma, pois eu sempre seria consumido com aquele "O que estou fazendo aqui?".

 

Olhava ao redor, a população branca era plena atividade, iam para lá é para cá, sempre planejando, trabalhando, comemorando, matando, sofrendo, só indo e vindo sem parar. 

 

Mas eu parava ali no meio.

 

E era soterrado por tantas notícias, sem interrupções, era moldado em exigências, opiniões, concordar, discordar. 

 

Ok. Eu possuía um emprego, um apartamento, "amigos", vivia na cidade assim como todos os outros, talvez realmente não pudesse "pedir por mais". 

 

E por quê? Digo, o que nos faz olhar para alguém e nos considerar dignos de dizer "Ela tem uma casa na praia, dois filhos, um corpão, um emprego estável e um carro quitado, o que pode pedir mais?" Ou então "Ele é lindo, casado com uma moça prendada, tem três cachorros e uma empresa famosa, por que ainda reclama?".

 

Mas era exatamente isso aí mesmo, eu queria mais, tinha vinte e três anos e não me permitia conformismos, no âmago pelo menos não.

 

Acordava de manhã determinado a mudar o mundo e ter pelo menos um momento bom no meu dia, duas coisas que nunca aconteciam.

 

E algo que realmente nunca consegui compreender era que já não tinha mais idade para isto. 

 

Pensem comigo, cedo ou tarde, durante a adolescência, você vai ter aquele sentimento de não ser daqui, não pertencer a este planeta, a esta galáxia. Qualquer poeta ou escritor vai jurar de pés juntos em suas obras que talvez tenha estacionado sua nave espacial por aí, apenas não se lembra do local.

 

Em música procuramos falar sobre isso também, dizer que não pensamos como todo mundo, sonhamos mais alto ou enxergamos além do básico. 

 

Conclui, após anos de observação, que os adolescentes tendem a gostar daquilo que quebra padrões ou regras. Pode parecer bobagem, mas note com atenção que perceberá tratar-se da verdade, as histórias com sociedades problemáticas, meio de vida fechados e futuro estereotipados, onde um casal fora das regras batalha para quebrar todo esse ciclo.

 

Pode não ser clichê, mas é algo que já existe a mais tempo do que eu, ou você, poderíamos contar. 

 

E por que será que histórias tão diferentes, mas ao mesmo tempo de trama igual, chamam tanta atenção e capitólio? 

 

Porque durante a adolescência todo mundo tende a se achar um pouco deslocado. 

 

Eu mesmo, vocês sabem, durante meus dias de juventude, me achava tão esquisito, mas tão esquisito que jurava que a qualquer instante seria abduzido e levado de volta para meu planeta, porque talvez extraterrestres fossem mais simpáticos que meus próprios pais.

 

Acontece comigo, com você, seus primos, amigos, etc, é de escapar do que vivemos diariamente e passar a acreditar naquilo que desejamos viver no futuro, a fim de tentar criar nossa própria personalidade, seja esta boa ou ruim.

 

Eu havia criado uma personalidade que não conseguia compreender, não sabia o que acontecia comigo todo dia que acordava, ia para o trabalho e trocava de roupa no banheiro pequeno e mal arrumado do local, assim como naquela exata manhã.

 

Lembro-me que noite anterior estava tão cansado que se tornava árduo colocar o avental negro e a gravata de mesma cor, os dedos quase que deslizando preguiçosos.

 

Vesti aquilo ainda sem vontade, sentindo meus braços doloridos e as costas molestadas por tantas noites sem uma cama, dormindo nas beiradas duras de um sofá.

 

Fitei-me no espelho ao finalizar o ato, bufando desgostoso, os cabelos ressecados, finos elânguidos, que só conheciam de pente meus dedos.

 

As olheiras profundas, pequena esferas roxas ao redor dos olhos, revelando as madrugadas em claro, as noites de esmola.

 

Lábios rachados, brancos e pálidos como a pele ressecada, esta, por sua vez, envelhecida, seca, sem vitaminas.

 

E os olhos... Opacos, foscos... Vazios.

 

Eu estava morto, cada dia que se passava eu definhava mais e mais.

 

E nem ao menos notava essa pequena mudança dentro e fora de mim, que chegava de pouco a pouco e apenas em momentos como aquele, em que podia observar meu reflexo, questionava-me:

 

Em qual desses espelhos da vida havia ficado o antigo Byun?

 

Eu não era mais o mesmo e consequentemente tudo ao meu redor também mudava, para pior.

 

Era difícil respirar, comer, dormir, todas as atividades básicas de um ser humano.

 

Nunca imaginei que fosse chegar a esse ponto, onde pegar no sono era mais difícil que acordar de manhã.

 

Gostaria, de verdade, de dizer que havia superado, que estava revigorado e que os anos haviam curado qualquer toque de certas mãos que um dia já haviam encostado-se a mim.

 

Mas seria mentira muito mal contada, havia perdido a conta de quantos banhos tomara e aquele cheiro ainda parecia impregnado em minhas narinas, aquele calor.

 

Sentia-me estranho, sempre com um vazio incontornável no peito, como se fosse hospede de meus ossos. Já se sentiu assim? Questiono-me quem já conseguiu se sentir em casa dentro de si mesmo!

 

Que atire a primeira pedra todos que nunca reclamaram, mesmo que um pouquinho, das paredes que lhes fazem.

 

Sabia exatamente o porquê do padecimento dentro de mim, ele possuía nome, idade e um par de olhos maravilhosos.

 

E se eu tivesse esperado mais? Vocês sabem a o que me refiro, a aquela velha decisão de ter contado que não iria me casar com Taeyon, de sair de casa, de tentar ser alguém.

 

"E se" o que isso significa? Talvez ambas as palavras carreguem mais significado do que posso tentar dizer.

 

Em algum momento perdido de nossas vidas, e simultaneamente a todo instante, existem certas coisas que poderiam ter acontecido, mas que não aconteceram.

 

Arrependia-me de centenas de coisas e passara a viver coberto em uma manta de "e se"'s destruidores e corrosivos, mas nosso amor era vaso caro, daqueles que apenas uma rachadura dá início a um fio de água, que futuramente ninguém seria capaz de controlar a enxurrada.

 

E eu mesmo não percebi que todos aqueles sentimentos babélicos e mágicos poderiam causar algum prejuízo no final das contas, nunca percebi que um dia poderiam existir goteiras em nosso teto.

 

Reconhecemos o amor cromático, mas enxergando apenas o colorido e nunca suas sombras.

 

"Vai logo com isso!" A voz de um dos funcionários do bar soava irritada do lado de fora do banheiro.

 

Suspirei como se fosse possível expulsar aquela dor para fora de mim, abri a porta e tratei de sair logo dali, sentindo o corpo pesado do homem bater contra o meu.

 

Obviamente, nenhum de nós pediu desculpas.

 

Entrei naquele salão relativamente pequeno, sentindo a essência de bebida que exalava.

 

As paredes altas e brancas possuíam de decoração alguns posters com propagandas de drinks, e muitos quadrinhos cômicos dos programas mais conhecidos das redes televisivas.

 

No teto, apenas um lustre grande iluminava todas as mesas, e ele era, talvez, a única coisa que eu gostava ali.

 

Era grande, mas na medida certa, arredondado e brilhante, exibindo luzes douradas que me faziam questionar o porquê de estar acordado, e não entregue aos poucos sonhos que vez ou outra ainda tinha.

 

Acordara triste e isto não era novidade na época, acordava sempre assim, porém aquela manhã estava pior.

 

 Triste daquele modo não tão intenso, uma infelicidade que não te impede de fazer as coisas, mas você fica na cama alguns minutos a mais que o normal, vendo os poucos feixes de manhã entrando pela janela, suspirando e piscando lento, o que você tem? 

 

Também gostaria de saber o que eu tinha, o ano estava apenas no começo que já podia contar nos dedos quantas vezes desejara me jogar pela janela, questionando-me sincero do verdadeiro porque de permanecer vivo. 

 

Cada respiração dada enquanto meus pés caminhavam até o balcão era árdua, e percorria cada centímetro de meu corpo antes de finalmente alcançar os pulmões.

 

Havia envelhecido uns sete anos naquela última semana.

 

Encarei o ambiente, já ouvindo risadas altas dos fregueses frequentes e aqueles que apareciam ali apenas para um café simplório, todos riam, todos se divertiam e eu não conseguia ver graça em nada.

 

Sempre sério, de mau humor, uma carranca pendendo funda no rosto, era assim que eu era conhecido agora entre os funcionários. 

 

Mal podiam eles, imaginar, que um dia aquele homem antipático já havia sido o garoto mais feliz do mundo.

 

Trabalhar como garçom tratava-se do quinto bico do mês e o que estava durando mais, embora precisasse manter outros dois no período da manhã, entregador de jornal e lavador de carros.

 

E essa carga de serviço atrás de serviço estava tornando-se desgastante. 

 

Desgastante demais.

 

Andava tão atarefado que sabia que seria preciso pelo menos um mês para colocar em dia todo o choro acumulado.

 

"Bom dia Baekhyun, como foi a noite? O minha foi boa.” Um dos garçons do local, YiXing,  aproximou-se de mim com sua bandeja nas mãos.

 

Sorridente como sempre.

 

Feliz como sempre.

 

Alegre como sempre.

 

"Por que seria um bom dia?" Revirei os olhos, pegando minha própria bandeja negra, já fitando a clientela por cima do balcão.

 

"Eu aprendi a imitar a voz do Peterson, quer ver?" Encarei Lay, como ele gostava de ser chamado, de cima a baixo, descrente, não sabia quantos anos ele tinha, mas se o número fosse próximo ao meu, vinte e dois anos era uma idade onde eu já esperava mais maturidade.

 

"Não, não quero ver”. Murmurei irritado e ele riu, começando a imitar a voz do rato irritante.

 

Caminhei para longe de braços cruzados, a verdade é que o moreno percebia minha situação, sabia que eu estava triste, sempre vazio, e não entendia como tentar mudar minhas feições. 

 

Ele não entendia.

 

Só via que não existia um sorriso em meu rosto como existia no de todos, e por isso tentava usar aquelas antiquadas táticas. 

 

Quem nunca, não é mesmo? Se você aparecer meio chateado perto dos seus amigos, dos seus pais, eles logo virão com aquelas frases de "lava esse rosto", dizendo que você não tem motivo para toda essa tristeza, que existem pessoas em situações muito piores, que é melhor você colocar uma música animada, uma roupa simples e sair por aí para caminhar.

 

E todos eles vão fazer isso porque gostam de você, mas não só isso, no fundo, eles não querem ver ninguém triste. É uma regra. Uma lei do século, uma das verdades do mundo.

 

Sempre fiquei curioso sobre isso porque, vira e mexe, me batia uma tristeza sem motivo e logo menos já vinha minha mãe se preocupar, como se aquele oco fosse uma doença contagiosa ou uma bomba relógio prestes a explodir dentro de mim. 

 

Estar feliz sempre vai ser bem melhor que estar triste, mas ficar triste é normal, aprendi nessa vida, e obviamente, ficando muitas vezes triste, que a tristeza é um sentimento tão legítimo quanto qualquer outro, e que merece seu espaço dentro de nós, mesmo que por pouco tempo.

 

A diferença se dava no fato de eu não estar apenas triste, era um buraco avassalador me devorando por dentro, e por fora, e pelos lados, e por todo canto, que nem sabia como não havia sumido ainda. 

 

O problema não é estar triste, é ser triste.

 

“Se mata logo cara.” Foi o que disse a aquele pobre garoto, enquanto tampava os ouvidos, irritado.

 

Se aquele pedido fosse feito há anos antes eu poderia ter aceitado, iria dar risada da voz do rato e talvez até tentasse imitar, mas naquela época de minha vida... Eu já não via mais nada de especial.

 

Digo, faz parte da existência isso, quando somos pequenos cada novo detalhe é tesouro, ficamos curiosos sobre tudo, questionamos ao mundo e a nós mesmos.

 

E conforme o tempo vai passando, em algum período de nossa puberdade, não sei dizer bem qual, essas pequenas coisas dão espaço a outras.

 

Talvez menos bonitas, talvez menos singulares, mas dadas como importantes.

 

E eu não sei ao certo quando isso acontece, mas é em algum estagio depois da infância e antes da vida adulta.

 

Em que tudo vai perdendo seu significado, sua originalidade, e quando você vê, já perdeu totalmente a graça.

 

Creio que minha alma e certo garoto haviam ficado perdidos nessa estrada... Ou eu mesmo os abandonei lá.

 

Só sei, na vida, tudo é mudança, tudo é aventura, a gente muda a cada segundo, a cada dia, a cada ano, nossos gostos, nossos sonhos, nossas manias, nossos namoros, nossos amigos, nossas ideias, nossos pontos de vista.

 

Definir a vida é notar que esta, por sua vez, não possui definição alguma e que ninguém sabe ao certo o que quer ou por quanto tempo quer

 

E quando descobre, já passou e a gente já nem lembra mais.

 

Meus olhos cansados encontraram a mão erguida de um cliente sentado em uma mesa distante.

 

Fitei o moreno ao meu lado e ele parecia ocupado demais encarando os próprios dedos, então apenas dei de ombros, indo em direção do homem.

 

"Boa noite, meu nome é Baekhyun e eu ficarei responsável pela mesa de vocês, o que desejam pedir?" Sorri, oferecendo minha melhor cara de idiota.

 

Pior do que não estar feliz, é não estar feliz e ter que fingir que está.

 

Porque, perante a sociedade somos condicionados a demonstrar sempre um sorriso, uma simpatia inabalável que nem o ser mais poderoso do planeta sente vinte e quatro horas por dia.

 

Sempre vai chegar uma hora, e isso eu, você, e qualquer um, por mais tímido ou teimoso que seja, que vamos ter que nos abrir, soltar aquele "cansei", avisar que seu coração saiu de férias e que nem sabe se volta mais.

 

Eu também queria tirar férias, mas antes precisamos passar por esse casulo, essa reclusão, admitir que se esteja triste e pensar consigo mesmo o que fazer para mudar isso. Você pode pedir conselhos, mas, no final, a decisão ainda é sua.

 

Batemos com a mão no peito diariamente para proteger nossa felicidade e esquecemos-nos de proteger nossa infelicidade.

 

Eu protegia, sempre fui assim, protegia talvez até demais. Variava, tinha dia que jogava cartas com tristeza, gostava do seu jeito, ela deitava nos meus braços e contava coisas poéticas.

 

A tristeza na verdade é uma incrível escritora e artista, gosta de falar, nossa! Como se comunica, mas aí ela vem chegando e chegando, e você se envolve porque ela te protege.

 

Levado por essa guardiã você no final, que acreditava estar coberto, vira escudo, constantemente judiado.

 

Tinha dias que a odiava, e aquela manhã não seria diferente, conviver com centenas de "eu", fazia parte do que era crescer, o que na verdade, nunca acontece.

 

A gente nunca cresce, só aprende como agir em público.

 

Os homens sentados discutiram entre si sobre os tipos de bebida durante uns cinco minutos, obviamente todos feitos com maçã, e realizaram o pedido, enquanto eu já suspirava desgostoso com toda aquela lentidão.

 

"Bom, então ficou três sucos de com vodka e um licor?" Questionei e eles confirmaram, enquanto eu anotava o pedido no pequeno bloquinho entre minhas mãos.

 

"Mais alguma coisa?"

 

"Ah sim! Só um instante..."

 

 Um deles virou-se para os outros e começou a discutir sobre outra bebida e eu tive vontade de matar todos eles.

 

As pessoas deveriam escolher o que querem antes de chamar um garçom.

 

Será que eles não percebiam o quanto estavam sendo inconvenientes?

 

"Bom, traz uma água também." Falou, por fim.

 

"Com ou sem gás?" Questionei, e os homens entreolharam-se, dando de ombros logo em seguida.

 

"Sem eu acho..." Um deles murmurou e eu revirei os olhos.

 

Como assim "eu acho"? Ou é com gás ou é sem gás, tá bebendo o negócio sem saber?

 

Eu vivia num mundo onde as pessoas nem sabia o que pedir.

 

"Ok, daqui a uns minutinhos já trago pra vocês." Sorri sem jeito "Algo mais?"

 

"Não, só isso." Afirmei, dando de costas para a mesa, podendo, enfim, sair dali.

 

Se não fosse por um corpo bater-se conta o meu com força, deixando que o pequeno conjunto de papéis caísse no chão.

 

Nem fitei quem fora, apenas agachei irritado para pegar aquilo, percebendo que o estranho fazia o mesmo, tentando me ajudar, sendo que eu não queria ajuda de ninguém.

 

Sua mão tocou a minha, ambas indo em direção do bloquinho de forma afoita.

 

Mas existia um “porém”.

 

Meus pelos eriçaram-se com o contato das tezes e quase de forma automática meus olhos correram em direção ao homem agachado frente a mim.

 

Dando de cara com aqueles olhos.

 

Aqueles olhos prateados.

 

Ah, recordo-me com tal precisão de como minhas pálpebras abriram-se como nunca antes e minha boca ficou perdida em algum lugar.

 

Ele encarou-me com os lábios tombados e estáticos, imerso naqueles olhos cinzas praticamente saindo do rosto.

 

"Cha-chanyeol..." "Ba-baekhyun...."

 

Os nomes flutuaram ritmados entre nossos rostos, apenas confirmando aquilo que eu não conseguia acreditar.

 

Era Chanyeol.

 

Era ele.

 

Ali, na minha frente.

 

Não, não podia ser real.

 

Eu estava chocado, completamente chocado.

 

Estava tão atordoado que não me vinha nada a mente, eu era moldado em branco, em minha própria confusão.

 

Era Chanyeol!

 

Deus!Faziam-se tantos anos desde a última vez que havíamos nos visto, faziam-se tantos dias, meses, tantos momentos que eu não podia compreender nada ao meu redor.

 

As mãos ainda estavam encostadas, mas eu não conseguia despregar os olhos dele.

 

Não podia ser real.

 

Aquilo não podia estar acontecendo.

 

"Ei, tá tudo bem ai?" Um dos homens da mesa ao lado pronunciou-se, provavelmente estranhando a cena.

 

Porém aquela áurea fantástica ainda estava estalada entre nós, o ar faltando entre eu é aquele homem na minha frente.

 

O garoto que havia me abandonado há tantos anos atrás, agora estava ali, bem ali, a centímetros de minha presença.

 

Minha mente era inundada por flashs e flashs de minha adolescência, desde o dia em que pichara a parede, passando pelo primeiro beijo, pela noite juntos, até o baile de formatura.

 

As mãos começaram a tremer.

 

Aquele bolo formando-se na garganta.

 

As laterais oculares desejando queimar involuntárias.

 

Era Chanyeol!

 

Eu havia pedido tantas e tantas noites para encontrar ele.

 

E agora ele estava ali.

 

"E-eu..." Tentei erguer-me rapidamente, mas estava tão boquiaberto, tão estupefato, que quase cai, tropeçando na mesa.

 

Se não fosse por um par de braços.

 

Um par de braços aos quais eu conhecia muito bem.

 

Seu toque ainda era quente e forte, como antigamente, levemente sem jeito, mas intenso em seus gestos. 

 

Segurei em seu colarinho, sentindo suas mãos queimarem em minhas costas, arrastando-se pelo tecido de minha camisa social.

 

Minha mente girava em meio às sensações, o ar já parecia nem existir com aquele rosto próximo ao meu.

 

E aquele cheiro. Deus, meu deus, aquele cheiro!

 

Era o mesmo cheiro da época do colégio. A mesma merda de fragrância.

 

Meu deus!

 

Era Chanyeol.

 

Chanyeol.

 

Quantas vezes terei de repetir este nome?

 

O homem que eu passei oito anos da minha vida apaixonado.

 

Que sumira.

 

E agora ele estava ali.

 

Eu não consegui acreditar!

 

Sabe? Eu havia sonhado tantas e tantas vezes com um reencontro e agora... Agora tudo era confusão.

 

Soltei seu colarinho, aquele tecido escapando lentamente de meus dedos finos e minhas digitais foram apressados em direção de seu rosto, tocando a tez.

 

Eu precisava comprovar que aquilo era verdade.

 

Um choque percorreu todo meu corpo quando minhas mãos magras seguraram sua face gelada.

 

Ele era real, eu não conseguia acreditar, não tratava-se de uma ilusão, uma miragem, algum delírio.

 

E aquelas luas fitavam-me tão profundamente, os orbes correndo por toda a minha face.

 

Uma face tão feia e abatida, tão destruída e triturada pelo tempo, pelas tentativas fracassadas e por um passado esquecido.

 

Que fora quase como... Como se todos os momentos de anos antes me atingissem feito ondas fortes, submergindo tudo que eu poderia ser.

 

É nesse dilúvio, fiquei tantos segundos perdido em seu rosto, tamanha era a fundura que sentia de gravar em mim aquele novo Chanyeol.

 

Os traços estavam mais fortes, mais marcantes, como um homem adulto, e não como o garoto de dezessete anos que eu conhecia.

 

Meu polegar tardou em sua mandíbula levemente mais protuberante, contornando o queixo, sentindo a reação caótica que atravessava meu corpo.

 

O ar liberado em socos garganta a cima, e ele engoliu seco meus toques, o pomo de Adão subindo e descendo como se quisesse literalmente revelar em fotografias todos os momentos em que meus lábios estiveram colados contra seu pescoço.

 

 Os cabelos ainda eram vermelhos, uma de suas marcas registradas, tão bonitos, tão brilhantes, agora curtos, penteados para trás com gel, em um topete que valorizava apenas mais toda a simetria de sua mascara. 

 

As orelhas, que continuavam grandes, engraçadas, e se pudesse teria rasgado um sorriso em meio a elas, mas não fui capaz, pois a cada segundo que percebia que era ele ali, rasgava apenas sentimentos, rasgava meu coração, naquele buraco e dor inarredável.

 

Por falar em grande, ele havia conseguido ficar ainda maior, agora o topo de minha cabeça batia em seu ombro, ou até menos.

 

Não conseguia acreditar naquilo.

 

Não apenas na altura, seu corpo todo parecia mais forte, as costas eram largas, bem desenhadas, já não podia me contentar em chamá-lo de destrambelhado, de bagunçado, ele parecia tão correto, tão diferente.

 

Mas aqueles olhos.

 

Aqueles olhos prateados.

 

Eu nunca me esqueceria deles.

 

Os olhos mais lindos do mundo.

 

Meus dedos tocaram ali, sentindo a pele fina e ele fechou as pálpebras com o contato que qualquer um julgaria muito estranho.

 

Mas eu ainda estava tão chocado, tão afetado, e ele parecia nutrir o mesmo, suas mãos me apertaram, e ele suspirou tão forte que seu hálito quente batera contra meu rosto, atordoando-me com aquele calor que já havia estado entre meu paladar tantas vezes.

 

E tais vezes ficaram marcadas como se marca a ferro, mas no lado esquerdo do peito, de forma que ninguém precisaria ser canhoto para compreender.  

 

E agora essa cicatriz abrasada manifestava-se para mim, avisando que eu era um infeliz por estar daquele modo, pasmo, simplesmente bobo por ele.

 

Ah, e quem não ficaria? Era ridículo, patético o modo que eu travava, que consolidava aquele sentimento, apenas fortificando e fortificando o prateado dentro de mim.

 

"Vocês se conhecem?"

 

Chanyeol desviou seu olhar do meu por breves segundos, encarando o homem na mesa, que havia nos questionado ações.

 

Mas nada disse, apenas voltou a encarar-me com aqueles olhos grandes, as bolsinhas bem marcadas e o brilho que carregavam...

 

E deus!

 

O meu coração rachou-se como nunca antes.

 

Ele parecia tão feliz, tão saudável, tão lindo, tão jovem.

 

E eu?

 

Eu parecia sozinho.

 

Suas mãos grandes apertaram meus ombros magros, provocando contrações internas onde tocavam, talvez ele quisesse confirmar algo, quem sabe saber se eu estava ali mesmo.

 

Mas que resposta seria capaz de dar? Não estava. Não plenamente, uma boa parte de mim havia ficado abandonada ainda entre aqueles sapatos que não calçavam direito, aquele mingau que não tinha gosto, aquele terraço que não tinha cor.

 

E naquela separação sem igualdade de bens, eu fiquei com a pior parte: eu.

 

Ainda mantinha minhas mãos em seu rosto, aquilo não podia ser real.

 

Eu não conseguia acreditar.

 

E meu deus!

 

Quando ele se aproximou mais, se é que isso era possível, passando aquelas mãos ombro abaixo, contornando minha cintura, para subir novamente, enlaçando minha espinha...

 

Eu queria abraçá-lo.

 

Beijá-lo.

 

Mergulhar meus dedos em seus fios vermelhos e me jogar em seus toques, tudo ao mesmo tempo.

 

Como?

 

Toda aquela trincheira que eu havia construído contra Park Chanyeol estava sendo destruída de uma só vez.

 

Todos os anos o amaldiçoando, o odiando, tendo asco e nojo daqueles olhos, para que quantos estes me ameaçassem já deixasse tombar a socapa, a carapaça dura que havia me encolhido, me protegido.

 

E eu não podia.

 

Eu não podia ser fraco a esse ponto.

 

Todas as lágrimas derramadas, implorando para que ele passasse pela janela e salvasse-me da vida.

 

Todas as noites mal dormidas, pelos barulhos, pelos pesadelos, mas especialmente, pela sua falta.

 

Todas as tentativas de suicídio, porque eu achava que nunca ia acostumar-me a ser aquele nada.

 

A causa estava bem ali à frente de meus olhos.

 

"Vo-você deve estar me confundindo com alguém...” Ainda atordoado, espalmei as mãos em seu torso, empurrando-o, tirando seus braços de meu contorno.

 

E me despi de seus toques de tal forma que doeu, doeu sentir cada pontinha de suas digitais deslizando por minha tez enquanto eu lhe expulsava.

 

Mas doeu mais porque, entre seus braços, era um dos primeiros lugares que eu havia aprendido a chamar de lar, e agora, bom... Era hora de mudanças.

 

Eu não queria retornar para sua casa, pois sentia-me traído por seus portões, sentia que já havia sido expulso, jogado na calçada há muito tempo, e que após perambular as esquinas e becos sujos de meus coração, aquela entrada alta novamente se abriu, e eu? Eu não queria mais entrar.

 

“Baekhyun...” Ele abriu os lábios para falar algo, suas sobrancelhas estavam franzidas, mas eu fui rápido o suficiente para virar-me e sair, literalmente, correndo dali.

 

Ignorei os questionamentos de Lay, ou um cliente ao qual esbarrei, empurrando tudo que estivesse no meu caminho, apenas corria e corria em direção ao banheiro, desejando sumir, desaparecer.

 

Fitei a porta branca, abrindo-a com toda a velocidade possível e fechando-a ainda mais rapidamente.

 

Tranquei-me ali, deixando com que minhas costas deslizassem pela madeira, sentando meu corpo no piso frio.

 

A respiração afobada cortava-me a garganta, enquanto eu encarava os azulejos níveos com os olhos arregalados.

 

Chanyeol.

 

Chanyeol estava ali, a poucos metros de mim.

 

Meu deus.

 

Como aquilo era possível?

 

Eu estava surtando! Meus ossos se reviravam por debaixo da pele, incômodos, meu estômago doía, minha cabeça girava.

 

E ele havia tocado em mim, suas mãos tão nostálgicas haviam se metido por entre meus ombros como se desejassem rever todas as páginas de nossa adolescência, páginas já tão queimadas e esquecidas.

 

Ele se lembrava do meu nome, algo que talvez nem eu mesmo lembrasse, e eu queria ser tolo e me deixar acreditar que Chanyeol recordava-se de tudo que, um dia, eu signifiquei para si.

 

Se dissesse a vocês que não sentia mais nada por ele, estaria mentindo.

 

Aquele coração que eu acreditava que havia parado de funcionar, agora pulsava tão forte, tão desesperado.

 

Era como se cada pulsar recuperasse o sentimento que existia em mim quando nos encontrávamos secretamente, quando nos beijávamos, quando dormíamos juntos.

 

Quando éramos algo.

 

Traguei saliva, jogando a cabeça contra a porta atrás de mim, suspirando, ainda descrente.

 

Era mesmo Chanyeol?

 

Não.

 

Só existia um par de olhos prateados no mundo.

 

Era ele.

 

Era realmente ele.

 

Deus! Era ele ali.

 

"Meu deus..."

 

E sem mais nem menos.

 

Lá estavam as lágrimas, escorrendo pelas laterais dos olhos, deslizando bochecha abaixo sem nenhum tipo de permissão ou convite.

 

Meus cabelos secos foram puxados com pouca força, exibindo entre dedos, a descrença em tudo aquilo.

 

As lágrimas começaram a vazar e diziam-me que não cessariam tão cedo.

 

E eu não conseguia crer.

 

Eu estava tão confuso.

 

Passageiro em uma montanha russa de sentimentos, os quais eu nem sabia ao certo quais eram.

 

Primeiramente, aquela surpresa, aquela afobação, aquele choque em crer que era realmente ele ali.

 

Pois céus! Quantos anos não havia esperado por aquilo? Ainda acreditava que poderíamos nos encontrar em um futuro muito longínquo, mas querem saber? Era uma crença patética, uma crença mal crida, ridícula a tal ponto.

 

Não o esquecia por achar que não devia fazê-lo, que os olhos prateados carregavam muito de mim para simplesmente serem abandonados, mas nesse "não abandonar" acabei me abandonando mais do que qualquer um. 

 

Acreditava que voltaríamos a nos encontrar, apenas não esperava por isso.

 

Depois de todo o choque, aquele aperto no peito mais que conhecido, as pernas bambas, o vazio no estômago, tudo me dominou, me botou onde eu nunca quis estar, onde eu havia jurado para mim mesmo que nunca estaria.

 

Sob seu controle.

 

E era incrível sentir aquelas borboletas tão presentes em minha adolescência, sentir o seco da garganta, os arrepios, aquele rebuliço interno, como se uma própria festa se desenhasse em seu âmago.

 

E eu amaria dizer que fora uma experiência fantástica, narrar que me levantei do chão, sorrindo, abri a porta e corri até os braços do ruivo, ele me girou no alto e me beijou em frente a todos, e então vivemos felizes para sempre.

 

Mas como você pode ter percebido, isso não é um conto de fadas, a voz que confessa essas memórias não se assemelha nem um pouco com a de uma princesa e Chanyeol, ah, maldito Chanyeol, ele nunca seria um príncipe.

 

A tristeza que me abateu, quando parei para pensar em todos os flashs juvenis, todas as lembranças vindo a tona, subindo até a margem,todo o iceberg que eu escondia estava se revelando, fora uma tristeza muito grande.

 

Aquela dor que vinha carregada de memórias, aquele abandono, aquele pleno e completo sentimento de vazio, de buraco, de falta.

 

Durante cinco anos!

 

Mil oitocentos e vinte e cinco dias!

 

Sem seu cheiro.

 

Sem seus sorrisos.

 

Sem seus beijos.

 

Sem seu toque.

 

Sem sua amizade.

 

E agora... Agora ele simplesmente aparecia assim, sem mais nem menos, no meu emprego, me pegando desprevenido, desarmado, fraco, cansado. 

 

Eu não queria que ele me visse daquela forma. Eu não queria que ele notasse o quão destruído eu me encontrava. 

 

Pois assim seria capaz de existir aquele espelho, aquela balança, aquele contraste entre ele e eu, entre sua vida sem mim e a minha vida sem ele. 

 

E todos nós já sabemos quem sairia ganhando.

 

Limpei as lágrimas, arrastando as  almas pelas bochechas, ciente de que devia estar apenas delirando.

 

"Calma Baekhyun, você está louco...". Respirei fundo, mandando ar até meus sentimentos mais profundos.

 

Levantei com cuidado, sentindo cada parte do meu corpo tremer, estava tão nervoso, mas tão nervoso, que nunca havia visto minhas mãos tremerem tanto.

 

Elas suavam, incapazes de ficarem paradas, enquanto meu estômago desaparecia e o coração dançava contra a gaiola de costelas.

 

Não estava reencontrando apenas Chanyeol.

 

Estava reencontrando um Baekhyun que há muitos, muitos anos havia sido esquecido dentro de mim.

 

E eu não queria ficar frente a frente com nenhum dos dois.

 

Novamente o ruivo estava ali e eu também, pela primeira vez o contraste de nossas mudanças se fazia presente, e era como se estivéssemos revivendo o passado, porém, de forma errada.

 

De forma errada, pois já não existiam mais laços entre nós, eu não sabia quem era aquele homem alto e ele não fazia ideia do que eu havia me tornado, alguém extremamente diferente do garoto que ele um dia chamara melhor amigo.

 

Meus dedos tocaram afoitos a maçaneta, e eu apenas coloquei a cabeça para fora, tendo um vislumbre de algo que não queria.

 

Sim, era ele.

 

Realmente era ele.

 

Chanyeol estava andando de um lado para o outro no bar, seus olhos procuravam por algo que nem precisava questionar-me o que era.

 

Sabia que era eu.

 

O ruivo aproximou-se de Lay, e eles começaram a conversar, e apenas aquela aproximação... Aquele sentimento ruim que nutria por Sandara voltou-me o peito, inundando-me naquele ciúme nojento.

 

Queria poder não sentir nada, céus! Como eu desejei não sentir nada!

 

Meu colega de trabalho mostrava-se assustado, óbvio, sua diferença de altura para Chanyeol não era tão grande quando a nossa, mas o ruivo parecia simplesmente gritar com ele.

 

O moreno, por sua vez, mexia com as mãos, gesticulando para, após um tempo, apontar em minha direção.

 

Os olhos prateados seguiram em linha reta o caminho indicado e quando se encontraram com os meus, eu já havia fechado a porta.

 

Virei a fechadura três vezes, apenas para confirmar que estava trancada.

 

Dois, três, passos distanciavam-me da porta branca, enquanto ia para trás meus olhos pregavam-se naquela maçaneta.

 

Eu sabia que ele viria até ali, e forçaria a porta, não era bobo de achar que todo o fuzuê feito por si levaria a caminho algum, Park Chanyeol conhecia suas rotas e sempre se esforçava para que não existissem pontos de fuga nas mesmas.

 

Droga, ele era tão forte, aquilo não iria aguentar, a porta iria cair.

 

Comecei a chorar mais desesperado.

 

Não apenas pelo fato de ter que pagar por outra porta, mas por ter que ficar frente a frente com ele.

 

E eu não queria aquilo.

 

Tratava-se de um capítulo passado, rasgado de minha vida, algo que estava decidido a esquecer.

 

Já achava que nada poderia acontecer, quando a mesma girou, falhando em abrir, arregalei os olhos e aquilo se repetiu durante várias vezes, cada vez com mais brutalidade.

 

Meu coração pulsava disparado com medo de que uma hora ou outra a porta traísse-me, encostei-me na mesma, forçando para que continuasse fechada.

 

Uma hora ou outra ele iria desistir, não é possível que seria incapaz de notar que eu não possuía intenções de abandonar o banheiro.

 

"Baekhyun... Eu sei que você tá aí, por favor, abre a porta!"

 

Aquela voz.

 

Aquela voz ainda mais grave, finalmente definida e firme.

 

Lembrava-me dela, de todos os momentos, lembrava-me daquele timbre chamando-me de pequeno ou como tornava-se quando chorava, a forma que gemia em meus ouvidos.

 

Sua risada.

 

E através desse tobogã de lembranças seu sorriso veio-me mente, aquele garoto jogando os cabelos vermelhos contra o vento do terraço, vocês conseguem imaginar isso? 

 

Venham, não se acanhem, tentem focar nos olhos prateados, no sorriso grande e no jeito petulante, cheio de si, infantil e rebelde.

 

Onde estava esse garoto?

 

Orbes queimaram, enchendo-se de lágrimas novamente, estas que impedi, fungando com força.

 

Força, pois precisava ser forte, precisava mostrar que de nada havia me afetado seu retorno, e nesse mesmo nada, nenhuma palavra escapou de meus lábios.

 

Fingi que aquilo não era comigo.

 

"Por favor, Baekhyun, vamos conversar!"

 

Conversar? Eu não queria conversar com ele, eu não queria ver Park Chanyeol.

 

Deus!

 

Estava vivendo tão normalmente, tão usual e já me misturando aquelas massas de preto e branco que encontrava nas ruas, já estava esquecendo-me de sua existência.

 

Por quê?

 

Por que ele precisava aparecer tão de repente?

 

Continuei em silêncio.

 

"Baekhyun, abre a porta! Eu sei que você não quer me ver... Ma-mas, por favor, vamos conversar!"

 

Estava enganado.

 

Eu queria tanto, mas tanto vê-lo, que minhas mãos chegavam a doer para abrir a maçaneta e poder toca-lo, dizer que, meu deus! Eu senti sua falta, eu quero você.

 

Mas como?

 

Como tirar a raiva de dentro de mim?

 

Ele havia prometido, havia prometido voltar e nunca voltou.

 

Abandonou-me sem pensar duas vezes e quando eu mais precisava, sumiu sem deixar vestígios e eu apenas fiquei abandonado pelas ruas cheias de pessoas, sozinho, totalmente sozinho.

 

Nunca apareceu e agora precisava "conversar"?

 

Pelo amor de deus...

 

"Eu não tenho nada pra conversar com você!!"

 

Praticamente gritei aquilo, porque a mistura de sentimentos era tanta que tornava-se complicado falar.

 

Recebi um silêncio profundo durante minutos, e já achava que o ruivo tinha ido embora.

 

Mas eu estava enganado.

 

"A gente tem muito o quê conversar, você sabe que temos, por favor, abre a porta!".

 

Droga!

 

Era obvio que tínhamos.

 

Quem foi que me largou sozinho no mundo durante cinco anos? Quem mentiu da pior forma possível? 

 

"Não! Sai daqui!" Gritei com todos os pulmões, fechando os olhos que queimavam.

 

Silêncio.

 

A maçaneta girou com força, tanta força que fiquei achando que era agora, ele iria arrombar aquela porta.

 

Tentei segurar, mas era impossível, senti um soco forte, mas continuei segurando a distancia que separava-nos, o muro que era muito, muito mais que apenas uma porta.

 

"Porra Baekhyun, eu quero te ver!!" Gritou amuado com aquela raiva que eu já havia me deparado antes, uma raiva que eu havia aprendido a conter.

 

Meus olhos arregalaram-se com aquelas palavras.

 

Queria... Me ver?

 

Como assim queria me ver?

 

E por que antes não queria?!

 

Por que só depois de cinco anos queria me ver?!

 

"Mas eu não quero te ver! Sai daqui!!"

 

Ele não podia simplesmente ir embora?

 

Não aguentava mais aquilo.

 

Deixar-me em paz, com a minha vida comum, com o meu dia a dia normal, eu não queria mudanças.

 

Ainda mais quando estas eram causadas por alguém que me fizera sofrer tanto.

 

"Baekhyun! Eu não vou embora!!" Revidou e suspirei com suas palavras.

 

Ele ira desistir.

 

Uma hora ou outra ele iria desistir.

 

Até porque, o bar tinha horário para fechar, a cidade tinha toque de recolher, tinha inspetores, existiam centenas de coisas que o impediam de insistir em algo que... No que ele insistia? Por que ele queria me ver?

 

Deslizei contra a porta, sentando ali mesmo no chão, imaginando um Chanyeol apoiado do outro lado, provavelmente desesperado.

 

Ri baixinho daquela desgraça toda.

 

Pelo visto ele continuava persistente.

 

Perguntava-me onde fora parar essa persistência toda há cinco anos.

 

Por que ele não insistiu na gente?

 

Por que não insistiu em não se casar?

 

Poderíamos ter dado um jeito.

 

O Sr.Kim havia conseguido não havia?

 

Então por que não com a gente?

 

Era tão fácil assim desistir de mim?

 

Será que eu não valia a pena?

 

O pior era sumir da minha vida sem nem ao menos dizer o porquê, fazia parecer que eu não era digno nem de uma justificativa.

 

E por que agora ele aparecia com essa história de que queria me ver?

 

Eu esperei dois meses, dois longos meses por ele! E nada, nenhuma mensagem, nada chegou até mim.

 

Eu chorava tão alto, mordendo os lábios, pois já era um costume tentar fingir que não chorava, que não queria incomodar ninguém.

 

"Para de chorar e abre a porta... Vamos conversar Baek...” Aquela voz grave soava abafada pela madeira.

 

Baek...

 

Ninguém nunca mais havia me chamado por aquele apelido.

 

O timbre calmo, como era seu costume em momentos como aquele, fazia-me refletir no quanto ainda ficava mexido com ele.

 

Muito mexido.

 

Era impressionante!

 

Cinco anos de ódio acumulado, para acontecer uma coisa dessas um apenas alguns minutos.

 

Acho que não importava o quanto Chanyeol havia me feito sofrer.

 

Eu sempre me lembraria do quanto ele havia me feito sorrir.

 

“Eu ainda estou aqui... fala comigo Baek.”

 

Comecei a chorar mais e mais com aquilo.

 

Não queria ouvir, sua voz, o jeito que falava comigo, como se tudo fosse igual há anos atrás, como se suas palavras fossem beijos sendo distribuídos contra meus machucados, como se eu ainda fosse seu.

 

“Baek...”

 

“Cala a boca!!”

 

Minha voz cortou estridente a garganta, enquanto escondia o rosto entre minhas pernas, molhando os joelhos.

 

"Cala a porra da sua boca!!"

 

Eu não conseguia.

 

Pior de tudo era aquele sentimento de desorientação.

 

De confusão.

 

Eu não sabia o que sentir, o que falar, tantos e tantos dias chorando por ele, desejando-o do meu lado e agora com sua presença repentina.

 

Era impossível de superar aquilo.

 

Recordo-me que passei muito tempo chorando, zonzo, esquecido em mim mesmo e desejando para que tudo não passasse de um terrível pesadelo.

 

Quando dei por mim, notei que não ouvia sua voz durante bons minutos, teria ele ido embora? Não sabia, mas permaneci no banheiro com o cansaço abatendo-me.

 

Já devia ser bem tarde quando ouvi batidas na porta.

 

"Baekhyun a gente vai fechar o lugar e tals, sai dai cara..."

 

Abri os olhos lentamente, sentido dor com o ato, enquanto as lágrimas secas resplandeciam em minha bochecha e o nariz avermelhado fungava.

 

Era YiXing, para minha felicidade.

 

Suspirei, pedindo aos céus para nunca mais ver Chanyeol, nem sentir seu toque, ou tudo que causava em mim, era como se seus dedos ainda queimassem em meus ombros, seus olhos ainda estivessem fixos aos meus.

 

Dizem que o tempo cura a dor, as mágoas, as memórias.

 

Mas eu não conseguia acreditar nisso.

 

A dor verdadeira não passa, apenas aprendemos a conviver da melhor forma com ela.

 

Levantei-me do piso gelado sentindo tontura, ainda receoso em abrir a porta e encontrar aquele par de luas acinzentadas.

 

"E-ele tá ai?"

 

"Ele quem?!"

 

Tolo achar, pela minha parte, que Lay saberia a quem eu me referia, é porque para mim sempre que alguém pronunciasse a palavra "ele", automaticamente Chanyeol surgiria nas beiradas da memória. 

 

"O homem ruivo." Murmurei.

 

"Ah... Aquele cara? Não, o Suho expulsou ele já, foi faz tempo..."

 

Ri baixinho.

 

"Eu não vou embora"

 

Uma vez mentiroso, sempre mentiroso.

 

Eu devia valer nada mesmo.

 

Era a segunda vez que ele me abandonava sem mais nem menos.

 

Mas dessa vez eu deveria até agradecer, torcer para que nunca mais mostrasse as caras ou tocasse em mim.

 

Girei a maçaneta, abrindo a porta e fitando de perto aquele jovem sorriso de covinhas.

 

Um suspiro aliviado abandonou-me os lábios quando conclui que Chanyeol realmente não estava mais lá.

 

Mas ao mesmo tempo... Eu me sentia mal, quero dizer, não que eu esperasse algo dele.

 

Aprendi que Chanyeol era a pessoa que eu menos podia esperar algo, até porque, eu havia o mandando ir embora.

 

Mas não sei... Ele havia dito que não iria, certo?

 

Naquele momento notei que mesmo após tantos anos eu ainda conseguia ser inteiramente consumido pelos sentimentos contraditórios que ele causava em mim.

 

"Quem era aquele cara? Você o conhecia?" 

 

Lay questionava e eu o encarei por poucos segundos, já indo até minha bolsa com o intuito de me trocar, ir para casa, jogar-me no sofá e não sair dali nunca mais.

 

E aquela pergunta me chocou levemente, pensei no passado, nas manhãs no terraço, mas noites juntas, na face que eu sabia de cor, e que agora era tão diferente.

 

"Nã-não... Não conhecia..."

 

Sim.

 

Eu precisava esquecê-lo.

 

Eu precisava ficar tão forte ao ponto de olhar para Chanyeol e não sentir nada.

 

O que acontecera naquela noite havia sido apenas uma péssima coincidência do destino, nada mais, nada menos que isso.

 

Direcionei-me até atrás da cozinha, pegando meus pertencentes no armário branco.

 

Troquei o avental e a gravata negros pelos agasalhos pesados, já que o frio consumia toda a cidade.

 

Achava que conseguia ficar ainda mais feio debaixo de toda aquela roupa, o cachecol até metade do meu rosto, a touca cobrindo os cabelos e apenas meus olhos se mostrando entre os tecidos.

 

Entre suspiros, arrumei as peças, pronto para ir embora. Não me despedi de Lay, nem de nenhum dos funcionários, aquela noite já havia sido suficiente para acabar com meu bom humor por meses, se é que ainda existia algum bom humor em mim.

 

Fui em direção da porta de madeira, ouvindo o sino soar na pontinha da mesma enquanto eu encerrava mais uma noite no emprego desgostoso.

 

Pus os pés para fora do local, sentindo o vento gelado invadir-me as narinas, queimando meus pulmões, começando a caminhar em direção de casa, ou pelo menos, tentando.

 

Quase fui ao chão ao tropeçar em algo, ou no caso, alguém. 

 

Olhei para baixo, encarando um Chanyeol recém-acordado, os olhos prateados abriram-se lentamente, fitando-me, seu terno simples e fino parecia não aquecer-o, já que seus lábios tremiam levemente roxos.

 

Ha quanto tempo ele estava lá fora na neve?

 

"O que você quer?!" Afastei-me, já irritado, continuando a pisar no chão coberto por branco.

 

"Baekhyun, por favor, vamos conversar!" Seu corpo, antes encolhido, ergueu-se rapidamente, de forma bruta.

 

Ignorei seu pedido, continuando a andar rápido, afundando o tênis na neve.

 

Eu não queria.

 

Não queria conversar, não queria ouvir justificativas, embora meu coração pulsasse afirmando o contrário. 

 

Era impossível dizer que aquele sentimento havia acabado. Eu não tinha certeza se ainda gostava de Chanyeol, só sabia que, havia algo sobre ele que eu não conseguia deixar ir embora.

 

Ainda existia tanto de nós dentro de mim.

 

"Já falei que não quero conversar com você!!"

 

A rua escura e vazia recebia minha voz já irritada, enquanto Chanyeol seguia-me afoito.

 

Comecei a correr dele, mas sua mão agarrou-me o braço, virando-me frente a si.

 

“O que você quer?! Que merda!” Gritei.

 

Ele fitou-me de cima a baixo, suspirando, enquanto tentava falar algo.

 

"É sério, como amigos, por favor, vamos esquecer o que aconteceu."

 

Esquecer o que aconteceu?

 

É, parecia que aquilo era muito fácil para ele, esquecer anos de amizade, dias e dias juntos, esquecer todas as piadas, os toques, esquecer o jeito que fodiamos no banheiro da escola.

 

Ri sem graça, mais irônico do que tudo, se era assim para ele, então seria para mim também.

 

Era isso, ele queria conversar como dois desconhecidos?

 

Então ok.

 

Também iria fingir que não o conhecia mais.

 

"Tá, o que você quer?"

 

Tornei a andar, soltando-me de seu toque, reduzindo a velocidade e fitando seu corpo ainda mais alto caminhar ao meu lado.

 

Chanyeol ficou em silêncio durante minutos, ambos de nós calados e apenas o ruído dos sapatos afundando contra a neve.

 

"Faz tantos anos... E-eu só queria saber como você tá..." Murmurou.

 

Ri baixo, atravessando a rua sem avisar, percebendo sua confusão em me seguir.

 

Então agora ele queria saber como eu estava?

 

"Pra ser sincero, uma merda, e você?"

 

Ele ficou mudo por segundos e eu já avistava o ponto de ônibus a certa distância de nós.

 

"Baekhyun, deixa que eu te levo pra casa." Murmurou ao notar minhas intenções.

 

Virei-me para ele com o cenho franzido.

 

Como assim me levar pra casa?

 

Pra sua casa?

 

"Quê?" Fitei-lhe incrédulo.

 

Chanyeol suspirou, fazendo com que sua respiração tornasse-se uma fumaça esbranquiçada no ar.

 

"Tá frio e tarde... E... Eu to de carro..."

 

Encarei aqueles olhos prateados de maneira desconfiada, arqueando uma das sobrancelhas.

 

Se eu deixaria Chanyeol me levar para casa?

 

“Não, obrigada.”

 

Por que eu entraria num carro com ele?

 

Meu coração palpitava fortemente, gritando para eu aceitar aquele pedido, enquanto minha mente apenas falava para eu continuar para ali no ponto.

 

Travavam uma batalha como nunca vi antes, o peito insistia para ouvir justificativas, ouvir o seu porque de ter me abandonado, de nunca ter voltado, a cabeça, por outro lado, só fazia questão de lembrar que, independente da desculpa, ele nunca seria capaz de conquistar meu perdão.

 

“Por favor, eu só quero te levar pra casa.” 

 

Fechei os olhos, como se suas palavras fossem pequenas flechas.

 

Porque, na verdade, eram.

 

Ele que não era capaz de ver o que causava dentro e fora de mim.

 

Mesmo após tantos anos, aqueles sons que abandonavam os lábios de Chanyeol eram desafinados, ensurdecedores, confusos.

 

Cogitei aquilo.

 

Eu já não era mais criança, não cairia nos encantos de Chanyeol, se é que ele ainda possuía algum encanto.

 

O que eu poderia perder?

 

Nada, minha vida estava um lixo completo.

 

"Tá."

 

Congelei quando um sorriso grande abriu-se em seus lábios levemente roxos pelo frio.

 

Foi como se até o ultimo pedacinho de mim tivesse se derretido com aquilo.

 

“Por aqui.” Ele virou-se, andando a frente de mim, em direção ao carro.

 

Ficamos em silêncio, aquele silêncio torturante que me fazia desacreditar que estava ali, ao lado de Chanyeol depois de tantos anos.

 

"E respondendo sua pergunta...e-eu estou vivendo..."

 

Revirei os olhos.

 

Agora ele estava todo triste e chateado?

 

Quem devia estar daquela maneira era eu.

 

Não ele, que me abandonou sem mais nem menos e quando eu mais precisei.

 

“Infelizmente.” Não deixei de completar maldoso, fitando seu corpo travar durante poucos segundos.

 

Sim, aquilo havia doído muito nele.

 

Mas eu já não me importava mais, tinha que doer mesmo.

 

Chegamos a um carro preto, e ele destrancou as travas rapidamente com a chave.

 

Fiquei durante alguns minutos com a mão na porta.

 

Eu estava realmente entrando num carro com Chanyeol?

 

Aquilo era inacreditável.

 

Suspirei, fechando os olhos, e antes que decidisse fugir dali, entrei no veiculo de uma só vez.

 

Recordo-me de sentir aquele calor interno do automóvel, questionando-me quando havia sido a última vez que havia entrado em um carro.

 

Chanyeol estava colocando o cinto e eu observei seus atos, percebendo o quanto eu odiava a maneira em que ele fazia aquilo.

 

Tão... Bonito.

 

Senti vontade de chorar, era injustiça demais ter ele ali daquela maneira, ao meu lado.

 

Virei meu rosto para a janela camuflada, afundando-me nos agasalhos quentes, mas que não me protegiam do mais importante.

 

"Onde você mora?" Fitei-o de soslaio, sentindo as lágrimas acumuladas na lateral dos olhos.

 

Ele também me encarou, ainda com as mãos no volante e fora preciso mais de um minuto em silêncio para o ruivo tornar a falar.

 

E ele era tão bonito, mas tão bonito.

 

As vezes olhava para ele e era como se estivesse a observar uma estrela distante. Era ofuscaste, mas sua luz nascia de centenas e centenas de anos antes.

 

Uma estrela que talvez nem existisse mais, mas de brilho que parecia tão real a mim do que qualquer outra coisa.

 

Aqueles olhos prateados, as expressões, os cabelos cor de fogo, nada havia mudado.

 

Gosto do questionamento da palavra mudança, pois este pode significar tantas coisas. As pessoas mudam, tudo muda. Às vezes me perguntava se eu havia mudado também, se nem se quer percebi que já era outro alguém e só ali, com sua cabeça tombada contra meu ombro, que sentia a necessidade de explicar que Byun Baekhyun já não era mais Byun Baekhyun.

 

"Baekhyun?"

 

Suspirei, tentando me acalmar, antes que eu começasse a chorar ali mesmo.

 

Era como se talvez eu tivesse o amado por muito mais, de forma rápida, porem com marca profunda. 

 

Feito uma queimadura.

 

Uma queimadura que arrancara cada parte de minha tez, substituindo-a por sua pele, que me fizera crescer e ressurgir através das cinzas de alguém a quem eu nem mesmo possuía, e naquele momento eu não saberia concretizar uma solução para escama-lo e criar uma nova pele.

 

Deveria ter mantido ambos de nós dentro de meu coração, mas acredito que minha alma só poderia amar um único corpo. 

 

E ela decidiu por não amar o meu.

 

"Po-pode virar a direita..." Apontei para a beirada da janela e ele tragou saliva, ligando carro.

 

"Deixa só esquentar um pouco." Murmurou e não sabia se ele falava do motor ou se falava da gente.

 

E aquela ambiguidade ficou no ar, obstruindo ainda mais meus pensamentos.

 

Levei meus olhos até Chanyeol e ele fez o mesmo.

 

Ficamos encarando um ao outro durante longos segundos.

 

Um sorriso sutil surgiu em seus lábios, mas eu não sorri de volta, apenas desviei o olhar, fitando o vidro escuro.

 

Ele tinha um carro, estava vestindo um terno, provavelmente sua condição financeira era muito, muito melhor que a minha.

 

Chanyeol sempre fora melhor que eu.

 

Ficamos em silêncio no carro escuro, que após um tempo começou a movimentar-se.

 

"Trabalha aí há quanto tempo?" Sua pergunta sem nexo fez-me morder os lábios ao pensar que estava conversando com Chanyeol.

 

Apenas conversando, enquanto ele dirigia.

 

E ele parecia tão diferente.

 

Tão adulto.

 

Talvez porque naquele momento eu percebi que eu já não o conhecia mais.

 

Faziam-se tantos e tantos anos, ele havia mudado e eu havia mudado também.

 

Eu já não sabia mais quais eram suas preferências, as coisas que gostava, as músicas que ouvia.

 

Naquele momento quis chorar novamente, pois percebi que a única coisa que ainda tinha em comum com Chanyeol... Era o passado.

 

"U-uma se-semana mais ou menos...” E para piorar eu não conseguia parar de gaguejar.

 

Ele deixava-me tão nervoso, as mãos suadas, as pernas trêmulas, o coração disparado.

 

"Entendi..." Sussurrou.

 

"Po-pode virar ali." Apontei para o local, sentindo a saliva descer acumulada pela minha garganta.

 

Estava com medo.

 

Mas medo do que?

 

Esperava que algo fosse acontecer ali?

 

"E os estudos? E medicina?" 

 

Fitei-lhe surpreso, ele ainda lembrava da profissão que havia sonhado em cursar um dia?

 

Medicina... Um cargo tão alto, estaria vivendo tão bem, ainda teria minha família, uma esposa, talvez filhos, um bom emprego, uma casa, uma cama, comida no armário.

 

Tantas coisas.

 

Mas havia abandonado tudo, pois achava que ele iria vir me buscar.

 

E no final, ele abandonou-me também.

 

"Acho que isso não vai acontecer..." Suspirei em desanimo.

 

E não iria mesmo, não tinha dinheiro nem pra comer direito, quem diria fazer medicina.

 

Eu estava quebrado.

 

Em todos os sentidos.

 

Mas às vezes quebrar-se é bom.

 

A gente percebe do que é feito.

 

"Por que não?" Conversava comigo sem tirar os olhos do caminho.

 

"Você acha que alguém que trabalha de garçom tem condição de fazer medicina?" Arqueei uma das sobrancelhas.

 

Silêncio.

 

Era isso que eu queria.

 

Que ele visse minha situação, não para sentir pena. Não. Eu queria que ele visse o que havia causado em mim.

 

"Por que saiu de casa?" Questionou após um tempo e eu franzi o cenho.

 

Como assim por que sai de casa?

 

"Eu não sai, fui expulso."

 

Senti seus olhos sobre mim, talvez confusos.

 

"Diferente de certo alguém, eu não me casei... Então já viu né... Mas tudo bem, o braço quebrado foi a parte melhor..."

 

Ele suspirou, virando o volante para a direção ordenada.

 

"Olha...eu sei que você provavelme-"

 

"Vira ali." Cortei-o, pois não queria que ele errasse o caminho.

 

Era só o que faltava, ficar mais tempo ali com Chanyeol.

 

Aquela conversa, aquela pessoa, tudo, pela primeira vez na vida, estava sendo desagradável ao lado dele.

 

"Olha, eu sei que você provavelmente vai rejeitar... Mas eu sei de um amigo que trabalha numa empresa de marketing e ele precisa de um atendente... E-"

 

"Você tá me oferecendo um emprego?" Fitei-lhe sério.

 

Quer dizer que ele estava com dó de mim agora?

 

"Não, é só-"

 

"Eu não quero nada seu."

 

Aquela frase maquiada de verdade saiu cortante pelas paredes de minha garganta.

 

Chanyeol fechou os olhos, suspirando sofrido.

 

Meu peito encolheu-se devagarzinho, mas doendo tanto.

 

Era aquilo que eu queria certo?

 

Vê-lo sofrer.

 

Mas então por que doía? O ruivo parecia tão frágil.

 

Eu queria abraça-lo, meus dedos tremiam para isso, minhas mãos suavam em busca se seus toques, de sua pele.

 

Mas ao mesmo tempo eu sentia tanta raiva dele.

 

Tanto ódio, eu me sentia tão traído, eu não podia perdoa-lo.

 

"Baekhyun..."

 

"O que você quer Chanyeol?!" Virei brutalmente, jogando as cartas, precisava acabar com tudo aquilo.

 

Se ele queria pedir desculpas, que pedisse de uma vez e sumisse de minha vida.

 

Eu não queria mais nada com ele.

 

O ruivo suspirou, sorrindo de leve em seguida.

 

"Ei, eu quero que sejamos amigos, ok? O que passou, passou."

 

Ah, sim.

 

Amigos.

 

"O que me diz?" Aquele sorriso bonito em seus lábios, dançando com as palavras, meu peito doendo, as pernas fraquejando, sentia que ia chorar ali mesmo.

 

Sorri para ele.

 

"Sim, vamos ser amigos."

 

Nunca havia mentido tanto na minha vida!

 

Amigos? Amigos o inferno!

 

Fazia-se cinco anos que eu não o via, e enquanto eu estava ali, passando mal, ele vinha com esse papo de amizade?

 

O ruivo, por sua vez, sorriu, desviando a atenção para o caminho e eu fiz o mesmo.

 

"É aquele prédio ali." Apontei para o lugar simples, antigo e sem atrativos.

 

Chanyeol fitou de cima a baixo o local e eu me senti um fracassado.

 

Ele devia morar numa casa grande, bonita e cara, enquanto eu estava ali, sem ter onde cair morto.

 

Suspirei ainda tão atordoado, aquele era o momento em que eu iria sair daquele carro para nunca mais voltar.

 

"Bom, então é isso...” Murmurei aquilo de forma desconfortável, fitando o homem ao meu lado.

 

Ele se virou de leve, apoiando um dos braços sob o volante e o outro entre os bancos.

 

Seus olhos prateados brilhavam, contracenando com as sombras da noite que cobriam parcialmente seu rosto.

 

"Baekhyun... E-eu... A gente pode se ver de novo?" As palavras escaparam de sua boca e tive de me afastar quando senti seu torso aproximar-se de mansinho.

 

"Eu acho melhor não..." Virei minha face, fugindo de seus olhos penetrantes, encarando aquele porta luvas negro.

 

Ele aproximou-se ainda mais, e meu coração batia tão forte que chegava a doer.

 

Traguei saliva apenas quando seu corpo grande já estava praticamente sob o meu, envolvo por moletons.

 

Sua mão larga ergueu-se próxima de minha face, seus dedos tocaram a pele como se tocasse porcelana fina e frágil, com todo o cuidado do mundo, e entre arrepios eu fechei os olhos.

 

Eles deslizaram pelo meu rosto, causando espasmos em meus poros.

 

Primeiro pelas bochechas, dedilhando com cuidado aqueles pelinhos invisíveis, enquanto meus dedos apertavam com força o banco de couro.

 

Os quatro dedos maiores embrenhando-se de mansinho em minha nuca, acariciando os cabelos, enquanto minha garganta tornava-se ainda mais seca.

 

Aquele calor escapou de fininho até meu pescoço, arrepiando meus pelos.

 

E então tocando a mandíbula bem lentamente, como se me desenhasse naquelas mãos de calor conhecido.

 

O polegar passando suavemente em meus lábios trêmulos, apertando a carne que flagelava perante a força de sua respiração quente contra meu rosto.

 

E eu apenas queria desaparecer, tentava me esquivar sem saída, apertado pela porta.

 

Ele aproximou-se mais, relando os narizes, ainda mantendo a carne de meus lábios em suas mãos.

 

"Cha-chanyeol..." Murmurei trêmulo.

 

"Só uns segundos, por favor."

 

Droga.

 

Por que sua voz tinha que soar tão calma e profunda?

 

Quanto mais eu tentava me afastar dele, mais eu o desejava para mim.

 

E era ele.

 

Chanyeol.

 

Ali.

 

Seu corpo ainda mais perto, o joelho entre minhas pernas, as afastando levemente, superando os limites seguros do carro e do meu coração.

 

"Pa-para..." Toquei em seu peito coberto pelo terno, tentando empurra-lo.

 

Mas sua mão pousada sobre o volante agarrou a minha que tentava inutilmente afasta-lo, embrenhando os dedos, enquanto eu ainda insistia em lutar contra aquilo.

 

Levou ambas unidas, para o vidro da janela atrás de mim e um suspiro abandonou-me os lábios quando as costas de minha mão tocaram a vidraça gelada.

 

Seu rosto roçou de leve no meu, as bochechas encostaram-se e eu não conseguia crer que após tantos anos ele estava tão perto de mim.

 

Aquela sua fragrância inebriante fez-me afundar ainda mais no banco macio.

 

Senti-o fungar meu pescoço, acariciando a pele com seu nariz, de cima para baixo tão... Mas tão lentamente.

 

Os segundos eram congelantes enquanto exibia pateticamente meu pescoço, deixando livre o caminho para o quer que desejasse fazer.

 

“Você ainda tem... O mesmo cheiro...” O sopro de suas palavras encontrou-se com meus poros e o coração despedaçou-se com aquilo, então não tardou.

 

As lágrimas acumularam-se ferventes, e em um piscar de pálpebras escorreram bochecha abaixo, deslizando entre ambas as faces.

 

Novamente tentei tira-lo de perto de mim, mas sua mão apertou a minha ainda mais forte contra o vidro.

 

"Eu vou ir te ver amanhã."

 

Aquela voz grave soou abafada em minha pele, e eu fiquei tão atordoado com aqueles lábios movimentando-se em meu pescoço.

 

"Cha-chanyeol." O timbre embargado pelo choro.

 

Meu coração parecia traçar uma rota direta para minha boca, e o odiava a maneira em que ele falava aquilo, tão calmo.

 

"Eu sei onde você trabalha, eu vou ir te ver."

 

Seu rosto saiu do contorno de meus ombros, mantendo-se próximo ao meu, relando as pontas nos narizes.

 

Observei aqueles orbes prateados colados aos meus, como se brincassem de ciclope, mas minha visão era borrada pelas tristezas.

 

Sua mão soltou a minha, e ambas as palmas grandes uniram-se ao redor de meu rosto.

 

Os polegares secando as lágrimas simultaneamente, com calma, como se pudessem tirar de mim aquela dor, aquela saudade.

 

Aquelas luas platinadas as quais passara noites pensando, ali, fixas as minhas castanhas, durante tanto tempo em silêncio, respirando o mesmo ar.

 

Eu odiava aquelas íris, e a maneira que olhavam para mim.

 

Tudo começou a ficar mais molhado e molhado, e quente, até chegar a um soluço alto pela minha parte.

 

Por que ele fazia aquilo comigo?

 

Depois de tantos anos...

 

E agora ele simplesmente achava que podia aparecer assim.

 

Eu... Eu estava tão fraco, tão despregarão para tudo aquilo e ele aproveitando-se disso.

 

Como ele podia chegar a esse ponto?!

 

"E-eu te odeio!!” Gritei aquilo repentinamente, o empurrando para longe, querendo que Chanyeol simplesmente desaparecesse.

 

Mas não adiantaria.

 

Não adiantaria.

 

Chanyeol era como uma melodia em meu ouvido, uma melodia que nunca cessava. 

 

Eu não podia pausar, pular, desligar ou voltar.

 

Poderia esquecer seu ritmo, seus acordes, a batida, as notas.

 

Mas nunca a letra por trás de tudo aquilo.

 

Aquele toque que me prendia à si, calor costumeiro que não adiantava fingir que não gostava.

 

Aquele cheiro que nunca sairia de minhas narinas, nenhum perfume ou sabonete, era um cheio seu.

 

Aquele mormaço que queimava a pele mesmo em dias gelados.

 

Aquela porção de pequenas coisas que ele era.

 

Cada pedacinho meu que continha um pedacinho dele.

 

Todos em mim.

 

Cravados na alma.

 

"Sai de pe-perto de mim!!" Ele mantinha os olhos arregalados, e minha voz saía cortada pelo choro.

 

Virei-me com pressa, tentando abrir a porta, mas esta estava trancada.

 

"Baek..." Murmurou assustado.

 

"Abre isso!! Abre isso agora!!"

 

Ele destrancou rapidamente o botão, e quase caí na calçada de tanta que era a minha pressa.

 

Estava desesperado, chorando quando pisei na rua fria e escura, mesmo assim ele segurou-me pelo pulso.

 

"Baekhyun!"

 

"Me solta!!" Puxava o braço, mas como o imaginado, ele era muito mais forte.

 

"Eu não vou te perder de novo!"

 

"Me solta porra!!" Consegui me liberar do toque bruto e sem esperar mais nenhum segundo, saí correndo em direção ao prédio.

 

Recordo-me de abrir o portão com as mãos trêmulas, apenas desejava  fugir e me esconder.

 

Esconder dele, de mim, de tudo aquilo, dos fantasmas do passado que haviam ressurgido para me assombrar.

 

Subi aquelas escadas estreitas tropeçando, sem olhar para trás nenhuma só vez.

 

Os andares passavam e, infelizmente, o meu era o último.

 

Quase gritei de alegria quando vi a porta marcada pelo setenta e um, procurando as chaves que já estavam em meu bolso e destrancando a porta.

 

Tudo isso durou no máximo apenas dois minutos, fora rápido, um choque, uma precipitação e minha respiração afoita denunciava os sintomas terríveis quando tranquei a casa novamente.

 

Uma sala escura e praticamente vazia recebeu-me fria, tardei em me movimentar, parado diante ao cômodo evasivo e ao ar saindo e entrando por meus pulmões fracos.

 

Alguns passos lentos até o sofá, e as lágrimas iam escorrendo singelas.

 

Maldito Park Chanyeol.

 

Céus! Eu via naquele momento o quanto eu o odiava.

 

Tudo.

 

O jeito que ele falava, sempre sendo experiente em seus trejeitos, acostumado as perguntas, protegido por uma armadura de respostas sempre a ponta da língua.

 

Odiava sua voz, sua amargurada voz que só parecia estar mais grave, mais aveludada, mais impactante.

 

Odiava o jeito que dirigia, que olhava, aquelas orelhas desproporcionais, aqueles lábios pequenos, mas ainda assim carnudos, cheinhos em baixo.

 

Odiava seu sorriso grande, rasgado naquela carne avermelhada, alcançando as beiradas das orelhas, sempre de dentes retinhos e brancos.

 

Odiava o fato de ele agir como se nada tivesse acontecido.

 

Odiava seus olhos e a maneira que mesmo após tantos e tantos anos eu ainda sentia aquele frio na barriga, aquela palpitação no peito.

 

Mas eu odiava ainda mais o fato de não conseguir odiar ele.

 

Nem por um segundo.

 

Nem um pouquinho.

 

Nem de verdade.

 

"Por quê? Por que você tinha que voltar?! Por quê?!!" Comecei a gritar sozinho no cômodo níveo que ecoava minha voz.

 

Joguei-me no sofá duro, e era como se eu pudesse sentir aquele cheiro, aquela fragrância emadeirada!

 

E deus, aquela saudade arrebatadora.

 

Saudade das noites, dos dias, das tardes que passamos juntos.

 

De seus braços ao redor de mim, esquentando-me e me dando colo.

 

De seu coração batendo contra meus ouvidos.

 

Saudade da maneira que falava.

 

Saudade do jeito que ria.

 

Saudade dele.

 

Muita saudade dele.

 

Pois não acredito que existe saudade apenas das coisas que já aconteceram. Um dos piores tipos de saudade é aquele que se sente de tudo que poderia ter acontecido e não se realizou, daquilo que se perdeu em algum lugar da estrada por falta de combustível.

 

Aquelas lembranças de um passado feliz, porra, como éramos ridículos e felizes! Como era divertido aquele jeito adolescente de levar a vida, eu dependendo dele e ele dependendo de mim, tentando agradar nos pequenos detalhes, brigando às vezes, discutindo e trocando uns tapas, trocando uns beijos.

 

Mas a recordação de felicidade nem sempre é felicidade.

 

E quanto mais eu lembrava, mais eu mergulhava naquele mar de tristezas, naquela cesta floresta de saudades.

 

Encolhi-me ali, abraçando uma almofada velha, chorando alto contra ela.

 

Eu chorava tanto que ficava mudo em certos momentos, o ar faltava-me.

 

Vocês já choraram assim?

 

Tão dolorosamente que até a voz some?

 

Até o peito dói.

 

Como se faltasse algo, aquela ausência, aquela dor, aquele desespero, um vazio crônico.

 

Nem na saudade Chanyeol conseguia ficar ausente.

 

Ele estava em tudo que eu era.

 

Já se encontraram nesta situação? Implorando em meio à noite para que os minutos passem logo, rezando para um deus que você nunca viu para que os pássaros iniciem seu piar, e que a manhã chegue de uma vez, pois aí não pareceria tão estranho o fato de você estar completamente sozinho na cama?

 

Por mais que passasse os dias aquela maneira, naquele vai e vem, vivendo os momentos do jeito que dava para viver.

 

Rindo às vezes, resmungando outras, para no final deitar sozinho do quarto e vomitar tudo aquilo que gravava dentro de mim.

 

Por um mundo onde chorar na rua mesmo não fosse sinal de vergonha.

 

Chorar... Nos torna humanos...

 

"Channie..."

 

As frestas da janela permitiam que aquele vento frio fizesse meus pelos arrepiarem pelo contato congelante.

 

Meu peito doía tanto, e eu estava sozinho naquela sala.

 

Tão, mas tão sozinho...

 

A ausência dele era insuportável.

 

Como eu podia sentir aquilo?

 

Ele havia me abandonado sem fazer questão de nada.

 

Como se eu não tivesse significado em sua vida.

 

Ele nunca havia sido meu.

 

Nunca.

 

E mesmo assim... Era uma saudade daquilo que não era meu.

 

Mas principalmente daquilo que eu queria que fosse.

 

Eu era patético.

 

Fraco.

 

Tanto tempo construindo aquela barreira ao meu redor, tanto tempo conseguindo aguentar de pé, sem chorar, apenas ocupando minha mente com coisas aleatórias.

 

E agora tudo desabava.

 

Eu não havia entregado a chave daquela cela para ele, então como?

 

Como ele conseguira destrancar todas as minhas fechaduras?

 

Eu não era mais criança, já tinha vinte e dois anos, até quando aquilo doeria em mim?

 

Talvez eu só tivesse amado Chanyeol como Ícaro amou o sol. Muito perto. Muito profundamente. Demais. 

 

Acho que saudade é parecida com fome, não com machucado.

 

Machucado dói, mas cicatriza e então já não dói mais.

 

Agora fome, só passa depois de alimentar-se.

 

E eu precisava alimentar-me da presença de Chanyeol, de seus toques, de sua voz.

 

Eu queria matar a sede em sua saliva, brincar de pega-pega em seus braços, fundir-me em seu corpo, respirar seus suspiros.

 

Ser o que ele era.

 

E assim, permanecer naquele que já ocupava praticamente tudo dentro de mim.

 

Aquela noite eu pensei no quanto estava perdido.

 

Perdido no mundo, na vida, dentro de mim.

 

Dizem que a gente tem medo do que não entende.

 

E eu sentia medo de tudo.

 

"Eu não vou te perder de novo."

 

Aquelas palavras rondavam as beiradas curiosas de minha mente, e eu não conseguia compreende-las.

 

Chanyeol não havia me perdido.

 

Eu que perdera ele.

 

Depois disso, ai que ele me perdeu.

 

Ou pelo menos eu achava que sim.

 

Até reencontra-lo e descobrir que tudo o que eu sentia estava tão vivo quando um certo alguém.

 

Mas acho que era uma coisa bem complicada.

 

Quanto mais ele me perdia.

 

Mais ele me ganhava.

 

 

 

X

 

 

 

Na terça não fui ao trabalho noturno, nem na quarta, ou na quinta.

 

"Eu vou ir te ver"

 

Aquelas palavras ainda mantinham-se fixas em minha mente, como se sua voz estivesse prestes a sussurrar um pouco mais perante meus ouvidos.

 

Quem aquele infeliz pensava que era? Como se eu fosse capaz de me entregar sem mais nem menos, após tudo que ele havia feito.

 

Para piorar, naqueles três fatídicos dias, as íris prateadas não saiam de minha mente, talvez fossem as paredes peroladas sempre causadoras de um adultério com seu proprietário, mas eu pouco acreditava.

 

Sabe, o que mais me irritava não era Chanyeol.

 

Não, realmente não era ele, ou suas manias, seus jeitos, seus gostos, se é que estes ainda permaneciam os mesmos.

 

Era tudo aquilo que ele havia prometido e não havia cumprido.

 

Especialmente a promessa de que iria voltar. 

 

Digo, eu ainda o amava, isso estava extremamente claro, o jeito que meu coração pulsava, que ninjas pernas fraquejavam, eram sintomas de uma doença já conhecida.

 

Mas nosso amor era do tipo esquisito, pois ele nem era meu para início de conversa, ele pertencia a outra pessoa.

 

Seria capaz de existir outro modo para que eu me sentisse mais idiota?

 

Morrendo de amores por alguém que sumira e me fizera sofrer por tantos anos, e ainda por cima casado.

 

Não, as coisas não funcionariam assim.

 

Se ele queria ser amigos, ótimo, seriamos amigos, mas se ele ousasse colocar um dedo em mim eu já cortaria toda aquela história.

 

Na sexta feira eu precisei aparecer no bar ou seria demitido, e depois de tantos anos para tentar “subir” na vida, não poderia perder meu emprego.

 

Recordo-me do vazio de sinais do ruivo quando cheguei ali, tocando o sino enferrujado da porta, procurando involuntariamente com meus olhos castanhos.

 

Passei reto por Lay e demorei longos minutos para trocar de roupa, guardando as peças com força, pois estava irritado comigo mesmo, não sabia se ficava feliz por ele não ter aparecido, ou se ficava chateado pelo mesmo motivo.

 

E era demais para minha mente, não devia me importar com aquilo.

 

A saudade que sentia de Chanyeol era como essas porcarias que guardamos no quarto.

 

Sabemos que nunca serão usadas, mas por algum motivo desconhecido, apenas as guardamos.

 

Tinha consciência total de que ele possuía seus compromissos, que não tinha nenhuma obrigação de mostrar as caras onde quer que eu estivesse, mas... Eu estava ali, pensando sobre ele e notando como sentia sua falta.

 

Eu nunca quis que aquilo tivesse acontecido conosco, que ele sumisse ou que eu me tornasse alguém completamente diferente, acho que mesmo após tantos anos ainda possuía aquele choque interno, inconformado em acreditar que não estávamos mais juntos, que os dias no terraço estavam distantes.

 

Às vezes olhava para o relógio do bar, os ponteiros brincando com a minha paciência, e acreditava que ele já estava por aparecer, que se dirigia ao caminho do estabelecimento, anunciando sua chegada ao toque do sino.

 

Era tão patético o modo que apenas algumas visitas já eram capazes de se maquiarem de rotina, como se houvesse alguma dignidade, alguma honra em esperar por seus olhos prateados dia a pós dia. 

 

Eu realmente sentia sua falta.

 

Era alguém que estava completamente morto e devastado por dentro, mas que mesmo assim possuía uma pequena esperança de que algo incrível poderia acontecer. 

 

Talvez o pior tipo de humano, aquele que sabe que tudo é uma merda, mas que espera que, talvez, um dia, não seja mais.

 

Fitei-me uma última vez naquele espelho encardido, contemplando minha feiura, que conseguia ficar maior a cada dia, suspirando.

 

"Você só está cansado." Murmurei a mim mesmo, querendo acreditar que a velhice não chegava.

 

Tornei ao balcão, observando rapidamente as mesas e percebendo que as mesmas estavam todas vazias.

 

Suspirei, só faltava perder o emprego por falta de clientela.

 

"Baekhyun... Quem era aquele cara?"

 

Desviei minha atenção para o moreno, que estava com o rosto apoiado sobre as mãos, portando uma expressão de tédio.

 

"Que cara?" Franzi o cenho e ele suspirou.

 

"Aquele ruivo lá... Com olho esquisito."

 

Olho esquisito?

 

Mas então arregalei os orbes.

 

"Ei! O olho dele não é esquisito!!"

 

Lay afastou-se de leve, provavelmente assustado com meu grito.

 

Droga.

 

Eu estava defendendo Chanyeol?

 

Patético.

 

"De-desculpa..." Murmurei como se aquilo pudesse diminuir a culpa.

 

Não a de ter gritado, mas a de ter defendido o ruivo.

 

"Tá... Mas quem era? Ele veio aqui todos esses dias, eu não aguento mais."

 

O garçom bocejava como se estivesse falando da coisa mais desinteressante possível.

 

"Ele veio?!!" De novo a voz alta obrigando-me a tossir para disfarçar.

 

Mas eu estava tão eufórico, ele havia me procurado então!

 

"Quero dizer... Ele veio?" Os orbes castanhos fitaram-me confusos e sonolentos.

 

"Veio, ele entrava aqui e falava "ai, não sei o que, me chama o Baekhyun" ai eu falava "ele não veio senhor" ai ele falava "você tá mentindo, cade ele?" Ai eu falava "to mentindo não senhor" ai ele falava "ta mentindo sim, onde ele ta escondido? No banheiro?" Ai eu falava assim né "escuta senhor, tu não pode passar, ele não ta aqui não senhor" ai não sei Baekhyun, ele me acusava e falava "para de mentir" e eu quis chorar porque eu não tava mentindo, ai o padrão podia achar que eu tava ne, ai eu soltei um dia pra ele "eu to mentindo mesmo senhor, minto muito senhor, menti ontem pro meu pai, mas por favor, não denuncia, eu preciso desse emprego senhor" ai ele falou que não me entendia...ai,  mas esse cara deu um trabalho..."

 

Noventa e cinco por cento de sua fala ficou rondando em minha mente durante minutos até eu conseguir compreender tudo.

 

O moreno tinha um jeito estranho de falar, mas nem me importei com isso, queria mesmo era saber sobre Chanyeol.

 

"E o que mais? Ele disse mais alguma coisa?" Me aproximava levemente eufórico. 

 

Lay revirou os olhos.

 

"Ah, já falei, ele veio, falou isso, depois veio e falou de novo e depois de novo, serio quem é esse cara?"

 

Suspirei, desistindo de tirar mais informações do meu colega de trabalho.

 

"Era um amigo meu da escola, não faço a mínima ideia do que ele quer..." Dei de ombros, esperando que Lay não prolongasse o assunto, o que, para minha felicidade, ele não fez.

 

O som do sino soou à distância, e nós levamos os olhos até lá.

 

YiXing bufou.

 

E eu?

 

Eu fiquei petrificado.

 

Aqueles olhos cinzas citados há minutos atrás pousaram em mim, e ele foi andando em passos lentos em minha direção.

 

Sua roupa estava diferente, agora apenas usava roupas comuns, de estampa xadrez, com moletom pesado, evidenciando o frio que fazia do lado de fora.

 

A cada passo dado, minhas pernas ficavam ainda mais bambas, a garganta mais seca, as mãos mais suadas.

 

O ar me faltou como se aquela figura o tivesse roubado inteiro apenas para si.

 

Chanyeol sentou-se em uma das cadeiras na minha frente e eu sentia que ia desmaiar.

 

Ele parecia sério, talvez até levemente irritado.

 

"Tá vendo senhor, eu falei pro senhor, ele tá aqui ó, eu não sou mentiroso, tá vendo." A voz sonolenta do moreno ao meu lado soou naquele silêncio tenso estabelecido entre nós.

 

Chanyeol desviou o olhar durante breves segundos, fitando Lay e eu tentei respirar durante aquilo.

 

"Desculpa ter te chamado de mentiroso." E então os orbes cinzas voltaram-se aos meus.

 

Eu já sabia o que ele queria.

 

E aquele assunto só podia ficar entre nós dois.

 

"La-lay, saia daqui um instante."

 

Sentia que aquele ambiente não era certo para meu colega estar.

 

"Por quê?"

 

"Porque sim, só saia." Fitei-lhe irritado e ele retribuiu o semblante.

 

"Por quê?!"

 

"Vai logo ou eu vou falar pro Junmyeon que você tá sendo irritante e mentiroso!"

 

Era só citar o nome do chefe que ele já ficava afetado.

 

"Ma-mas eu! Baekhyun não faz isso comigo!" Abriu a boca, incrédulo, e um riso baixo escapou dos lábios de Chanyeol, entrando feito uma melodia gostosa e nostálgica em meus ouvidos.

 

"Então xispa daqui!"

 

Ele abaixou a cabeça, olhando feio para nós dois e saiu de braços cruzados dali, fazendo-me revirar os olhos.

 

"Não lembrava que você era tão malvado com as pessoas."

 

Fitei Chanyeol, que possuía um singelo sorriso nos lábios, obviamente até o meu manifestar.

 

"Aprendi com você." Arqueei uma das sobrancelhas, exibindo um traço de sorriso malvado.

 

Eu sempre o odiei por ser tão frio e tão duro, mas fora quando me abandonou ali, sozinho, que notei o quão mais fácil é ser frio. 

 

Pois ser quente queimava demais, e eu já havia carbonizado há muito tempo.

 

Seu rosto tornou-se sério, e o sorriso morreu, enquanto meus dedos já iam à busca de maçãs a serem cortadas.

 

Procurava as frutas, enquanto ouvia sua voz.

 

"Por que faltou esses dias?"

 

Sorri de leve ao encontrar as maçãs no cesto, colocando-as sobre a pia.

 

"Porque você falou que ia vir me ver."

 

Sim, forte Baekhyun.

 

Você precisava ser forte.

 

Ele suspirou, apoiando os braços sob o balcão, e me encarando com aqueles orbes grandes e levemente pidões e eu ainda surtava internamente, mas precisava manter-me impassível.

 

Observar ele daquela maneira fazia-me quebrar em pedacinhos, embora fosse eu mesmo que causasse tudo aquilo.

 

Eu o machucava porque queria machucar, mas então por que meu feitiço parecia voltar contra mim?

 

"Baekhyun..."

 

"Eu vou atender aquela mesa, já volto." Sai dali rapidamente, indo em direção de uma das mesas onde novos clientes já estavam sentados.

 

Droga.

 

Eu não queria ouvir o que ele tinha a falar, pois sabia que aquilo doeria tanto, nada poderia ser comparado aqueles cinco anos sem sua presença.  

 

Nunca, jamais perdoaria Chanyeol por ter me abandonado daquela maneira.

 

Era irônico fato de que minhas paredes de concreto, aquelas que eu trabalhara tão duro para construir, caíram no instante que ele rasgou um pequeno e singelo sorriso.

 

E daquela mesa fui para outra, e mais outra, e mais outra, evitando o olhar que eu sentia pesar sob mim, o modo que me observava de longe.

 

Minha memória poderia insistir em falhar toda vez que me deparava com aqueles olhos penetrantes, mas minhas veias e lábios lembravam-se de todas as suas mentiras.

 

E assim passou-se a noite, ia de mesa em mesa, muito mais atencioso que o normal, apenas para não voltar ali e ter de falar com ele.

 

O bar ia esvaziando-se e todas as vezes que me virava ele ainda estava lá, sentado no balcão.

 

Suspirei cansado, o ruivo tinha que desistir, não era possível.

 

"Baekhyun... Que que ele tem?" Lay aproximou-se calmo de mim, enquanto eu limpava uma das mesas, agora todas já desocupadas.

 

"Como assim?" Era só o que faltava, alguém preocupado com Chanyeol.

 

"Sei lá... Ele parece meio acabado né...? Sentou ali a noite inteira e não pediu nada."

 

Acabado estava eu.

 

Que precisava trabalhar em três empregos para sobreviver, dormir num sofá velho, sem nem ter o que comer direito.

 

"Cale a sua boca Lay." Murmurei.

 

Ele cruzou os braços confuso, e deu de ombros logo em seguida.

 

"Eu ein, tá sempre de mau humor, que isso."

 

"Vai, vai, sai daqui." Expulsei-o logo em seguida, jogando o pano sujo em seu rosto, rindo de leve.

 

Por incrível que pareça eu achava sua companhia boa, recordo os dias em que podia ver aquele sorriso de covinhas.

 

 Quero dizer, era talvez a única companhia que eu possuía, e era engraçado rir dele às vezes.

 

Mas voltando ao jovem de olhos prateados, que a esse ponto da história não está mais tão jovem assim.

 

Eu suspirei, desejando que houvesse mais mesas a ser limpas, assim eu poderia evitar uma conversa com o dito cujo.

 

"Vá embora, já vamos fechar." Passei próximo a ele, indo em direção do banheiro.

 

"Eu preciso falar com você." Meus olhos fecharam em desgosto, céus! Ele não me deixava em paz.

 

Entrei no pequeno local, tardando em trocar de roupa, mas era impossível, sabia que ele não sairia dali.

 

Arrumei o agasalho, pensando em possíveis falas, enquanto fechava o zíper do mesmo.

 

Coloquei tudo no armário de ferro branco, e sai em passos lentos, vendo que Lay já segurava nas mãos a chave do lugar.

 

"Boa sorte lá... Com o que quer que seja..." Ele murmurou e eu maneei com a cabeça, indo em direção de Chanyeol.

 

"Já mandei você ir embora." Passei reto por ele, desejando que não viesse atrás de mim.

 

"E eu já falei que quero falar com você." Seus dedos pegaram no meu braço com brutalidade e o moreno ao lado de nós encarou a cena assustado.

 

"Vamos falar disso lá fora." Murmurei e ele me soltou.

 

"Até amanhã pessoal!" O garoto sorriu, após trancar a porta, e tratou de correr até um ônibus já parado na esquina.

 

Xinguei-o mentalmente pois agora era apenas eu e ele.

 

Eu e Chanyeol.

 

Frente a frente na rua escura e vazia.

 

Silêncio.

 

A quietude e calma resplandeceram em meio ao ambiente, esfriando meu coração e talvez o dele também.

 

Levei os olhos até si, e aquelas luas prateadas adquiriam um brilho tão mágico quando anoitecia, e eu não pude deixar de perceber em como sentia falta daquele brilho.

 

"Baek..."

 

Apenas de ouvir meu apelido dito por aqueles lábios tão conhecidos por maciez, agora moldado em uma voz grave e madura, já fora suficiente para saber que aquilo precisava acabar ali.

 

De uma vez por todas.

 

"Olha, você mesmo disse que o que passou, passou, né? Então não vamos falar mais de nada do que aconteceu, ok?" Gesticulei, abrindo o jogo e ele franziu o cenho, chateado.

 

"Sim, mas eu..."

 

"Chanyeol, não vou dizer que queria ter te encontrado porque não queria, mas já que isso, infelizmente, aconteceu, e você não quer sair do meu pé... Vamos fingir que nada daquela época existiu."

 

 Suspirou, fechando os olhos prateados durante bons segundos.

 

"Não... Eu... E-eu... Tá, vamos fazer isso então." 

 

A cada palavra trocada meu peito doía ainda mais, como um machado de cabo de madeira que corta a árvore, eu mesmo machucava-me.

 

E agora eu precisava aceitar era apenas um "conhecido" na vida do homem que amei.

 

Dormi.

 

Transei.

 

Chorei.

 

Abracei.

 

Chamei de "grandão".

 

Troquei mensagens.

 

E muita saliva também.

 

E doía tanto.

 

Precisava aceitar que nada disso havia acontecido.

 

E se havia, já não aconteceria mais.

 

Gostaria de ter pausado o mundo no giro daquela noite, confessar para ele que durante eles anos eu necessitei se sua presença como nunca antes.

 

Que quando a lua já brilhava sadia no céu, não sei de onde e não sei como, mas batia uma vontade desesperadora de ligar para ele, ouvir sua voz.

 

Ninguém deseja atender ao telefone as quatro da manhã, mas queria escutar o timbre pesado e lento, o "oi" que talvez fosse dizer, enquanto eu pateticamente torcia para que não fosse grosso nem seco comigo.

 

Gostaria de ligar e contar sobre cada um dos fantasmas que andavam a me assombrar, cada coisa que vinha me tirando do sério, só para que minha voz se fizesse de sonsa, eu desse uma risada baixinha em meio ao seu silêncio e depois a ligação seria preenchida por ele com pouca paciência me pedindo para repetir, e minha voz soaria rápida demais, entre gaguejos. 

 

Tinha medo de ligar, tinha medo até mesmo de segurar o celular. Medo de ele rir da minha cara, medo de que ele dissesse que era para ligar outro dia, pois agora não dava, medo dele não atender de propósito, medo dele atender e me mandar não ligar mais. 

 

Só queria saber como ele estava, se ainda possuía os mesmos costumes, se dormia com os olhos levemente entreabertos e roncava mais alto do que eu acreditava suportar. Queria saber se seu emprego novo estava lhe deixando feliz e se o casamento ia bem, foda-se o que eu queria saber. Eu só queria saber. 

 

Queria ter a honra de entender seus pensamentos de madrugada, aqueles que não contamos a ninguém, e contar que eu já nem pensava mais, que pesadelos sobre ele iam e vinham.

 

Sonhava que estávamos novamente no terraço, ele sorria bonito e eu tentava sorrir como tal, minhas mãos estavam frias, arroxeadas, lembro que ele erguia levemente o moletom e eu infiltrava meus dedos por seu peitoral quente e magro, sentindo seu calor. Acordava a noite assustado, queria contar disto, e procurava seu torso para enfiar minhas mãos, mas quem disse que encontrava? 

 

Queria ligar pra ele e saber como Sandara era, se ela trocava ideias ou se, talvez, ele tinha arranjado outra pessoa para conversar. 

 

Queria saber se ele era afetado pela mesma paleta de cores que me afetavam, se ele acordava a noite num preto tão escuro é tão vasto, proclamador da saudade, se amanhecia envolto ao azul abandonado e resto daquilo que sentira horas antes.

 

Entardecia-se laranja, meio enjoado de tudo, querendo acordar da vida, assim como eu. Queria telefonar e questionar tudo isso e mais um pouco.

 

E adiantava te ligar, Chanyeol? 

 

Minha coragem era linha muda.

 

"Bom, eu preciso ir pra casa agora...” Meus olhos estavam perdidos no chão, fitando nossos tênis.

 

"Deixa que eu te levo." As palavras saíram atropeladas de sua boca.

 

Não.

 

Eu não queria ir de novo com ele.

 

As cenas da primeira vez estavam vivas em minha mente.

 

Seus lábios em meu pescoço.

 

As mãos nas minhas.

 

Aquela voz sussurrando lembranças em meus ouvidos, aquele sentimento de querer derreter entre suas mãos, entre seus dedos conhecidos.

 

"Eu... Eu acho melhor não..." Murmurei.

 

"Eu não to de carro."

 

Franzi o cenho, ele havia vindo a pé?

 

"Vamos... Nós podemos pegar um ônibus..."

 

Nós.

 

Quase chorei com aquela palavra.

 

Já não existia mais "nós" então porque falava aquilo?

 

E porque aquelas três letras mexiam tanto comigo?

 

"Eu posso ir sozinho..." Tremi levemente, escondendo-me entre o cachecol grande.

 

Ficar parado ali no frio estava tornando-se insuportável.

 

"Não quero te deixar sozinho a essas horas... Se acontecer alguma coisa com você eu nunca vou me perdoar."

 

Idiota. Maldito idiota.

 

Quem ligava?

 

Ninguém se importava comigo.

 

Ele tinha que ser igual.

 

Não ficar pagando de bonzinho, de que sentia ainda algo por mim.

 

"Olha, ali tem um." Fitei o ônibus parar do outro lado da rua e sem que eu percebesse sua mão embrenhou-se a minha sem autorização.

 

Quando dei por mim, Chanyeol já puxava-nos em direção ao ônibus branco.

 

Obviamente não correspondi ao toque, deixando a mão levemente imóvel, enquanto ele continuava a me levar até o automóvel.

 

Entramos rapidamente ali, passando pela catraca, enquanto eu tentava normalizar a respiração sofrida dos pulmões sedentários.

 

O ar rarefeito e sorrateiro envolveu-me os pulmões contaminado com uma fumaça de lembranças do passado, quando eu me esforçava para correr entre lugares desconhecidos.

 

Aquele flashback perambulou minha mente de forma que observei o mais alto sentindo falta do garoto de anos antes, de seus trajes negros e sua alma aventureira.

 

Nós havíamos nos apaixonado tão jovens e imaturos, que nem se quer pensamos nas consequências que beijos na parede de trás de um terraço poderiam nos causar. 

 

Eu não sabia se aquela afeição, ou o que quer que exista entre mim e ele, conseguiria segurar mais um pouco, era como se nossa corda já estivesse frouxa há muito tempo. Mas sendo sincero? 

 

Não queria admitir naquela época, mas iria até o sol e voltaria apenas se ele precisasse de um pouco de luz.

 

Meus olhos vagaram por todas as cadeiras e meu coração começou a pulsar ainda mais rapidamente quando conclui que, tirando o motorista, estávamos sozinhos ali.

 

Chanyeol me levou, ainda com os dedos nos meus, até as últimas cadeiras da fileira esquerda, parando em frente às mesmas.

 

"Pode sentar." Fitei seu rosto por um tempo, antes de sentar no banco próximo a janela.

 

E para minha desgraça, Chanyeol sentou ao meu lado, colando os ombros.

 

Meu coração traidor dançava no peito, evidenciando aquelas sentimentos aos quais queria expulsar.

 

Fechei os olhos, embora o ambiente já estivesse escuro por si só e escondi as mãos no bolso, tentando disfarçar meus dedos trêmulos por estar ao seu lado.

 

Eu estava tão nervoso.

 

Aquilo era impossível de se acreditar, que eu estava no ônibus, ao lado dele.

 

Depois de cinco malditos anos.

 

O silencio instalou-se entre nós, e apenas o barulho desconfortável dos pneus contra o piche da rua era ouvido.

 

Levei os olhos de soslaio para o homem ao meu lado, fitando o rosto sombreado pela noite.

 

Ele olhava para frente, mantendo as mãos sob as coxas cobertas pelo jeans claro.

 

Tão bonito.

 

Chanyeol era um grande idiota.

 

Mas eu era mais.

 

Suspirei profundamente, virando o rosto para a janela, tentando acalmar-me.

 

As ruas escuras receberam minha visão, notando os solitários postes que ainda insistiam em iluminar fracos aquele mar escuro.

 

Era uma visão, de fato, assustadora e sempre me causava medo pegar aquele ônibus vazio e escuro, que se movimentava com brutalidade.

 

Mas agora, com ele ali do meu lado... Tudo parecia tão seguro.

 

Aquela segurança que Chanyeol passava-me era algo anormal.

 

Mas minha mente estava um verdadeiro caos, e eu afundava-me nesse caos sem saber nadar.

 

Recordo-me hoje de com comecei a respirar pesado, de tal que era meu nervosismo, enquanto mantinha os olhos voltados para a janela que, no final, apenas servia para mostrar o cenário de fora.

 

O sentimento de estar ao seu lado após tantos anos era doentio e confuso, acalmava o tornado dentro de mim, mas era como se ainda existisse um pequeno redemoinho que me impedia de estar pleno.

 

Tirei as mãos suadas do bolso, esfregando-as nos joelhos, eu precisava ficar mais calmo.

 

Como era possível aquilo?

 

Chanyeol ao meu lado.

 

Ninguém mais, ninguém menos que ele.

 

Impressionante, acho que ficará tanto tempo com a ilusão de sua presença que quando finalmente aconteceu, eu simplesmente não conseguia crer.

 

Eu nem sabia se aquele ônibus era o certo, mas não queria manifestar-me, porque não queria falar com ele, nem ouvir sua voz.

 

Aquela voz tão... Maravilhosa.

 

Meus olhos arregalaram-se com uma movimentação ao meu lado, e meus pensamentos tornaram-se corrompidos.

 

Levei os mesmos orbes até as mãos grandes que agora deslizavam lentamente entre aqueles pequenos centímetros que ainda separavam-nos.

 

Ai, não.

 

Aqueles dedos tímidos tocaram tão demoradamente os meus, trêmulos, sob a perna.

 

E eu fitava tudo, sem impedir nada.

 

A garganta seca, não sabia se guardava a palma para mim, ou se apenas permitia aquilo.

 

Mas quando vi, havia tardado tanto na duvida que a chance passou.

 

As mãos já estavam unidas, seus dedos já estavam apertados aos meus.

 

O ar faltou de tal maneira que quando lembrei como se respirava, um suspiro alto escapou por entre os lábios freneticamente mordidos, audível e terrivelmente patético.

 

Fechei os olhos, amaldiçoando-me por aquilo.

 

Ele estava tão calmo e eu tremia de tanto nervosismo, nem ao menos sabia no que dedicar minha atenção.

 

Sua perna estava colada à minha, aquele cheiro, tão próximo, o calor que seu corpo emanava.

 

Eu estava passando mal.

 

Os dedos unidos aos meus.

 

Nem lembrava há quantos anos não segurava em suas mãos.

 

Apenas silenciados, no escuro, sentindo aquela energia fluir entre os corpos.

 

Quero que pare e desenhe a lembrança comigo, traduza para o idioma nativo de sua alma cada parcela de gestos proferidos por estes dois personagens imaturos, a iluminação precária que mudava a cada esquina, o balançar do ônibus.

 

Apenas imagine o modo em que sentia aqueles batimentos acelerados em nossas mãos, pulsando no enlaço, e que parecia não ser meus.

 

Seriam dele?

 

Nunca soube.

 

Mas disse a mim mesmo que eram.

 

Só para dar aquela pequena esperança.

 

Só para insistir naquele botão ao qual jamais desabrochariam flores.

 

Insistindo e insistindo naquilo.

 

Mas esperar por ele era como esperar por nada.

 

Eu precisava desistir.

 

Mas parecia algo superestimado.

 

E achei que se eu ainda não havia desistido, era porque, de uma forma muito triste, eu ainda queria acreditar.

 

Um suspiro daqueles abandonados saiu pesado de dentro de mim.

 

Era lamentável ter de admitir aquilo.

 

Mas eu o amava mesmo.

 

Era difícil de disfarçar, complicado de esconder e impossível de mudar.

 

Era ele ali, afinal.

 

Não haveria outras mãos.

 

Alias essas, existiriam, obviamente.

 

Mas independente de quantos apertos de mão a gente encontrasse, desencontrasse, voltasse e fugisse, conhecesse e até mesmo esquece-se.

 

Apenas o nosso valeria a pena.

 

Naquela noite desejei que meus olhos fossem como câmeras, e que eu pudesse fotografar cada um daqueles momentos aos quais eu sabia que uma hora ou outra seriam esquecidos.

 

E aí eu sentiria saudade deles.

 

Assim como sentia de tudo que passava rápido demais pela minha vida.

 

E eu possuía essas pequeninas saudades de tantas coisas que no final, unidas, tornavam-se uma só.

 

Eu sentia falta dele, e sabe o que era pior? Fora sua vinda repentina que me pegou desprevenido.

 

Nem notava os momentos triviais em que me encontrava a sua procura, que observava algo curioso e sentia a necessidade de partilhar com ele, sem nenhuma razão, apenas pela força de hábito. 

 

Abria meus lábios para clamar seu nome, mas então percebia que ele não estava mais ali, que apenas o vazio permanecia ao meu lado. E eu juro que cada vez, cada santa vez, as lágrimas escorriam como balas em minha camisa.

 

E eu queria tantas explicações.

 

Por que ele havia desaparecido?

 

Por que nunca havia me procurado?

 

Eu precisava perguntar isso para ele, precisava sanar aquelas dúvidas.

 

"Chanyeol..."

 

Mas minhas palavras pusilânimes morreram antes mesmo de tornarem-se voz ao sentir um peso em meu ombro.

 

Virei apenas o rosto, encontrando um Chanyeol adormecido, boca levemente aberta, pálpebras bem fechadas, respiração pesada.

 

E dormindo em mim.

 

Chanyeol.

 

Dormindo em mim.

 

Antes mesmo que pudesse sair daquele estágio estático, meus olhos já queimavam.

 

Tive de olhar para o teto, respirando fundo, tragando o ar com força, mordendo os lábios.

 

Eu não podia chorar.

 

Eu não queria chorar.

 

Mas era... Era tão difícil.

 

Como ele conseguia causar aquilo em mim?

 

Sentia-me um lixo, um completo lixo, depois de sofrer tanto, lá estava eu, de mãos dadas com aquele cara dormindo em mim, apenas desejava ter minha vida de volta.

 

Não aquele Baekhyun feliz, ao lado de seu melhor amigo, fantasiando sobre um mundo perfeito.

 

Desejava voltar ao Baekhyun que nem ao menos conhecia Chanyeol, impedir que ele ficasse na escola até tarde, assim ele nunca conheceria o garoto ruivo de olhos prateados.

 

E eu ainda tinha tanta raiva dele.

 

Como tinha sido capaz de fazer aquilo comigo?

 

E o pior era saber que, no intimo, faziam-se anos que eu não me sentia tão bem quanto me sentia ali, com sua cabeça sob meu ombro.

 

Quando revelei para todos que "já havia superado", o que eu realmente quis dizer era que ele ainda conseguia me derreter com um sorriso, que ainda existiam pequenos risos vazando pelas laterais de meus lábios toda vez que ele contava uma piada, que eu ainda aguardava para algum tipo de explicação.  

 

Quis dizer que chorava quase toda noite quando pensava o que havíamos vivido, o que estávamos vivendo e o que eu queria que vivêssemos no futuro.

 

Quis dizer que sentia sua falta mais do que palavras poderiam descrever, que me culpava mentalmente e me odiava toda noite por ser tão fraco.

 

Quando contei até mesmo para vocês que já havia superado, contei também que sonhava acordado em meio ao trabalho, eu tentava me distrair, mas sempre que os minutos sobravam era ele quem vinha me assombrar.

 

Que ainda significava tudo para mim o caso que tivemos durante nossa juventude inconsequente, mesmo que para ele não significasse nada.

 

Quando revelei para todos que "já havia superado", o que eu realmente quis dizer era que céus! Eu não havia superado.

 

Eu o amava.

 

Que droga!

 

Eu o amava.

 

A que ponto você havia chegado ein Baekhyun...

 

Fitei a rua, tentando me acalmar, e arregalei os olhos.

 

Já era o ponto!

 

"Chanyeol!" O sacudi sem o menor cuidado, fitando sua face confusa e sonolenta "Chanyeol, chegamos! Acorda!"

 

Ele suspirou e ainda meio perdido e pôs-se de pé, naquela expressão sonolenta... Os olhos inchados, tão fofo.

 

Seria pecado abraça-lo ali mesmo?

 

E ele apenas ficou parado como um poste no meio do ônibus escuro, e eu não tardei em empurrá-lo pelos ombros.

 

“Anda Chanyeol, seu coiso!” Ele franziu o cenho irritado.

 

“Já entendi, já entendi.”

 

Desci na rua, sentindo aquele vendo gelado atingir-me o rosto, congelando a pele e me aproximei do endereço ao qual não tinha orgulho de possuir, já tirando as chaves do bolso.

 

Virei para trás apenas para encarar o ruivo bocejando, enquanto esfregava os olhos.

 

E eu o achava tão indefeso daquela forma.

 

"Obrigada por me trazer até aqui." Murmurei ao chegar próximo ao portão negro.

 

Ele, que já parecia mais acordado, sorriu, fazendo minhas pernas ficarem bambas.

 

"De nada."

 

Novamente aquele silêncio incômodo.

 

Eu fitava o chão.

 

E ele também fitava o chão.

 

Às vezes sentia pena do solo.

 

Quero dizer, ninguém encara o chão simplesmente por encarar, ele sempre é usado para algo maior, mas que, no fundo, nunca seria ele mesmo.

 

Assim como eu.

 

"Então tá... É... Bo-boa noite." Ele pronunciou levemente perdido, levando aqueles olhos prateados até mim.

 

Embora eu não tivesse respondido.

 

Não queria dizer boa noite.

 

Porque não queria que ele fosse embora.

 

Eu estava cansado de passar noites e mais noites chorando num sofá qualquer.

 

Era fraqueza da minha parte?

 

Então que fosse fraqueza.

 

Era impossível ter ele ali, a frente dos meus olhos, e não poder toca-lo, não poder sentir seus lábios, queria gritar para ele ficar ali comigo, mas eu nunca teria aquela coragem.

 

Porque eu não passava de um fraco.

 

Um fraco que, infelizmente, sentia coisas de mais.

 

E eu preferia ficar quieto e tirar conclusões normalmente precipitadas, sobre tudo e qualquer coisa que me afetasse.

 

Meu desejo por ele era egoísta, era uma troca injusta, pois ele havia pagado por um objeto quebrado e sem troca. Chanyeol merecia muito mais que um homem com olhos cansados, roupas largas demais e alma abandonada. 

 

Mas eu insistia em perturbá-lo mesmo que indiretamente, pois quando estava com ele, eu me sentia amado.

 

Eu me sentia como nunca havia me sentido antes.

 

"Bo-boa noite..."

 

Seus olhos estavam presos aos meus, e minhas mãos apertavam nervosas sua própria carne.

 

Aqueles poucos metros que nos separavam pareciam quilômetros tão grandes que seria impossível percorrê-los.

 

De que adiantava energia, se minhas pernas eram bambas?

 

Eu não sabia como dizer a ele que estava inteiramente despedaçado, eu queria, mas não sabia fazê-lo sem parecer necessitado.

 

Eu não sabia me abrir, desabafar ou simplesmente mostrar para ele onde doía sem achar que seria julgado por isso.

 

Eu não sabia como chorar em frente a si toda santa vez que meu coração, intoxicado por seus sorrisos, fazia nascerem lágrimas ácidas.

 

Só desejava que ele fosse capaz de compreender, que abrisse o jogo e abandonasse as máscaras de uma vez por todas. Que fosse capaz de perceber que eu estava machucado sem que eu contasse a ele, que minhas dores estavam escorrendo de minha boca, que eu estava me desfazendo e só possuía a esperança de que ele me costurasse uma ultima vez.

 

Que ele me enxergasse uma ultima vez.

 

E eu fiquei ali, desejando soltar aquelas três palavras.

 

Ele sorriu triste uma última vez, como se esperasse por algo.

 

Quem aguarda por reconciliações em meio ao escuro vazio de uma periferia gelada?

 

Eu precisava falar.

 

Seu corpo grande virou-se, anunciando sua saída.

 

Eu precisava falar.

 

Mas eram palavras daquelas tão complicadas de saírem pelos lábios que apenas decidem calar-se em nós.

 

Porque não sabemos como serão ditas ou ouvidas.

 

Então a gente prefere simplesmente engolir essas frases afiadas e se cortar por dentro.

 

Droga.

 

Eu precisava de coragem.

 

Ele estava indo embora.

 

Vai Baekhyun!

 

Era ele, Chanyeol.

 

E se ele sumisse novamente?

 

Precisava fazer minhas escolhas, e por céus! Como odiava isto, era sofrimento, pois talvez eu fosse o único capaz de perceber que se dizemos "sim" para um lado e "não" para o outro, alguma perda vai haver.

 

Aquela distância, não apenas externa, havia tornado-se um abismo.

 

E eu ia cair!

 

Eu ia cair e continuava correndo até lá!

 

Mas e quando seguir seu coração significava abandonar sua mente?

 

Nem que fosse para morrer pela milésima vez naquela noite, eu iria me jogar.

 

Fechei os olhos, explodindo de uma só vez.

 

"Eu te amo."

 

As palavras bagunçadas escapuliram carregadas de sentimentos fugitivos, conflitos e congestionados.

 

Mas fora uma explosão tão baixinha e muda.

 

Bomba fraca que era para combinar com o terrorista.

 

"Que?" Ele virou, encarando-me.

 

E tentei descobrir se havia entendido ou não, mergulhando no brilho de seus olhos.

 

Mas a água estava tão gelada que não fui capaz de concluir nada.

 

E então a vergonha e a culpa de repetir aquilo tomaram conta de mim.

 

"Quê?" Perguntei de volta.

 

"Você... Você falou alguma coisa?"

 

Franzi o cenho de propósito.

 

"Não."

 

Ele deu de ombros.

 

"Então tá."

 

Um, dois, três, quatro passos, e cada vez mais ele ia afastando-se e eu sentia aquele bolo formar-se em minha garganta.

 

Eu precisava chorar.

 

E foi por isso que saí correndo, como um animal medroso, abrindo aquele maldito portão enferrujado, subindo escadaria acima, tropeçando duas ou três vezes.

 

E que se danassem os vizinhos!

 

O coração de Byun Baekhyun precisava chorar!

 

Destranquei a porta com rapidez falha, terrivelmente apressado e corri em direção ao sofá velho, jogando-me ali sem pensar duas vezes.

 

Encolhido e assustado perante minhas próprias desventuras, soube entre o cheiro mofado do tecido gasto que se trataria apenas de mais uma noite com diversos convidados, a tristeza, a solidão, a dor, o medo, o ódio, o arrependimento, o amor.

 

E mais tantos outros que tocariam a campainha trazendo com oferta todo tipo de lembrança.

 

Mas nenhum par de olhos prateados passaria por aquela porta tão cedo, sabia que não, pois percebera no brilho de seu olhar que recuara sentimentos como se receasse em sua tentativa de aproximação.

 

Como se desistisse de vez de mim.

 

Talvez andasse a perceber muito,  o que era de fato ruim. Sinto que quando a gente percebe muito acaba ficando meio louco.

 

Não sei. Só acho.

 

E nesses perceberes da vida, notei naquela noite, depois de ser vencido pelo cansaço, que aquele fogo, que me queimava, só podia apagar-se com aquele fogo que invadia-me.

 

Já sabiam disso?

 

Eu também.

 

Só havia me esquecido de avisar.

 

Belo mundo ambíguo onde a vida é eterna e a existência não.

 

 

 

X

 

 

 

Sábado Chanyeol não aparecera no bar.

 

Não que eu esperasse sua presença, mas havia tornado-se um costume, durante o mês que passara nesta fatídica historia, encontrar aqueles fios vermelhos nem que fossem representantes fieis de um mero e não recíproco sorriso.

 

Enquanto atendia as diversas mesas cheias, meus olhos voltavam vez ou outra à porta, apenas esperando que aquelas madeixas vermelhas passassem por ali.

 

Mas no final, nem sinal dele.

 

Meu peito doía, eu estava acostumado com suas idas e vindas por mais que o expulsasse frequentemente, por mais que sempre o mandasse ir embora.

 

Não sabia qual era o feitiço que Chanyeol havia jogava em cima de mim, mas tinha certeza tratar-se de algo irreversível.

 

Alias, feitiço não.

 

Uma bela de uma maldição.

 

Toda noite passava martelando-me sobre quanto odiava Chanyeol, e que aquele amor era algo ao qual eu apenas definharia mais e mais.

 

Só que era impossível escapar daquele jogo sem vencedores.

 

Acho que... Principalmente, porque eu não queria escapar.

 

Digo, toda vez que pensava que estava esquecendo ele, que estava perdendo essas emoções.

 

Era como se algo quebrasse dentro de mim, então eu apenas agarrava-me mais e mais a esses sentimentos, porque eles eram a única coisa que eu conseguia sentir.

 

E acabei ficando dependente deles, nem que fosse pra guardar no fundinho de minhas gavetas, para vestir só de vez em quando.

 

Mas eles precisavam estar ali.

 

Empoeirados? Sim. Rasgados Talvez.

 

Mas meus.

 

E eu não doaria tão cedo.

 

Eles tornavam-me diferente.

 

E as coisas que tornavam-me diferente, eram as coisas que tornavam-me.

 

Eu levava uma vida tão incrivelmente vazia e nem sabia disso até Chanyeol aparecer e ensinar-me a sentir aquilo que eu nunca havia sentido antes.

 

Não digo só amor, ele ensinou-me dor, felicidade, saudade, raiva, ciúmes. Ok, muito ciúmes.

 

Tantos e tantos sentimentos e que estavam preenchendo-me até as bordas.

 

 Eles eram parte de mim agora, e sem eles eu ficaria tão sozinho, mais do que já estava. E o que seria de mim, sem Chanyeol e sem aqueles sentimentos?

 

Um corpo sem alma talvez.

 

"Baekhyun, isso aqui é pra você." Fui interrompido de devanear pela voz de certo moreno.

 

Tranquei o armário, já preparado para ir embora, fitando uma folha de papel dobrada em suas mãos.

 

Revirei os olhos, devia ser mais um desenho do Peterson.

 

"Larga aí, eu já leio."

 

Com certeza era algum papel do meu chefe, ou alguma piadinha do Lay.

 

Tranquei o armário, ainda com Chanyeol em minha mente, indo em direção do bilhete.

 

Desdobrei entediado aquilo, sentindo o papel áspero em contado com meus dedos.

 

Mas quando meus olhos encontraram-se com aquela caligrafia.

 

As pernas ficaram bambas.

 

O peito apertou-se.

 

As mãos tornaram-se trêmulas.

 

E meus joelhos foram de encontro ao chão.

 

Enquanto as lágrimas teimosas escorriam pelos olhos.

 

Naquele momento lembro-me que vi que já não tinha mais jeito.

 

O passado fazia-se no presente.

 

O que era ainda era.

 

O que queria ainda queria.

 

O que desejava ainda desejava.

 

O que amava ainda amava.

 

E o recíproco ainda era recíproco.

 

"Eu também te amo."

-Grandão

 

 

 

X

 

 

 

"Cada um que passa em nossa vida,

passa sozinho, pois cada pessoa é única

e nenhuma substitui outra.

Cada um que passa em nossa vida,

passa sozinho, mas não vai só

nem nos deixa sós.

Deixa um pouco de si,

Leva um pouco de nós.

Há os que levam muito,

e há os que não levam nada.

Essa é a maior responsabilidade de nossa vida.

E a prova de que duas almas

não se encontram ao acaso."

-Antoine de Saint-Exupéry

 

 

 


Notas Finais


eai? gostaram? vou tentar postar a capa ainda hoje, mas nao prometo nada <3

minhas aulas comecam semana q vem T^T ~chorosa~ mas espero q a escola nova seja legal! boa volta as aulas/curso, para todos voces e MUUUUITO obrigada por apoiarem misfit e por terem paciencia comigo, obrigada obrigada obrigada > <

se cuidem~

~Moon


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