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História Misfit - Presença


Escrita por: Doublefenix

Notas do Autor


OIEEEEEEE meus bebes <3

bom, sei que pra quem me segue no tt eu disse que postaria no Natal, PORÉM, eu sou alergica a camarão, comi num risotto sem saber que tinha e praticamente morri no hospital dia 24/25. Não se preocupem que agora eu estou bem. ^^

Como tinha passa o Natal e eu achei meio brochante postar dia 27, pensei "pq nao postar logo no ano novo?" então cá estou eu, no primeiro dia do ano atualizando Misfit!


Quero só deixar algo bem claro: esse cap não é muito grande e eu (pessoalmente) acho ele bem levezinho, pois é o que eu chamo de capitulo transitorio, que leva a algo maior, então não posso colocar muitas coisas. No proximo capitulo (pra quem se lembra, o titulo era "dominó") MAIS CONHECIDO COMO "CAPITULO DO CARRO" hehe, ai sim temos grandes coisas por vir! Até as notas finais


Boa leitura!

Capítulo 19 - Presença


 

 

 

"Aqui estou, encarando sua perfeição

Em meus braços, tão lindo

O céu está clareando, as estrelas estão se apagando

Alguém faça isso ir mais devagar

E quando a luz do dia chegar, eu vou ter que ir

Mas esta noite vou lhe abraçar forte

Porque no amanhecer estaremos por conta própria

Mas esta noite preciso lhe abraçar bem forte"

-Daylight, Maroon 5

 

 

 

 

 

Caminhávamos tranquilamente durante aquela véspera de natal.

 

Os tênis pisavam firmes na rua bem ocupada, tanto pelo branco quanto por pessoas. Estas, por sua vez, esbarravam vez ou outra em nossos corpos, mas tão apressadas que estavam, com suas sacolas e cotidiano, que nem ao menos se desculpavam.

 

Os flocos de neve caiam quase que orvalhando nossos rostos inexpressivos e lembro-me de pensar sobre quanto tempo já estávamos ali, por mais que não tivéssemos, de fato, dinheiro para nada.

 

Era árduo encarar uma realidade onde muitos entravam e saiam de lojas, carregados de presentes, e eu não podia comprar ao menos uma lembrancinha.

 

Só porque sinto que toda vez que a pobreza bate à porta, ninguém quer abrir.

 

Chanyeol agora pagava apenas as contas de casa, não comprava presentes ou móveis. E também não justificava o porquê disto.

 

Não que fosse uma exigência, talvez sua própria presença fosse um presente em minha vida, mas a data comemorativa era algo com certa importância para mim.

 

Meus olhos já tão cansados eram capazes de enxergar beleza naquilo que todos apenas viam como um dia para comprar e comprar e... Comprar.

 

Mas perante tantos postes iluminados, enfeites e lamparinas coloridas que reluziam todas suas tonalidades brilhantes nos orbes molhados dos transeuntes, eu tentava inutilmente enxergar mais.

 

Queria entender, compreender o porquê do despertar de tal comemoração, pois seu calor não aquecia meu peito afundado no tédio. Promovido tão rapidamente pelo dia a dia, quanto à velocidade que os pneus cantavam musicas de borracha na rua coberta por um fino gelo.

 

E aquela vida, em toda sua ironia natural, quanto mais vazia, mais pesava.

 

E quantas pessoas não pensavam o mesmo? Todas? Nenhuma? Não saberia. Tinha minhas dúvidas, e envolver Chanyeol dificultava a monocromia ainda mais.

 

Por tudo que fosse mais sagrado, não quero mentir ou parecer muito exigente, mas era tão difícil viver.

 

Tão difícil quando você espera fazer tanto, conhecer tanto, saber tanto, e concluir quem você é e quem você quer ser... Mas é te dado tão pouco tempo.

 

Como era difícil aprender perante tantos livros, aulas, conteúdos, mas que mais se assemelham a pilhas e pilhas de coisas não atrativas, que pouco definem quem você é.

 

E juntava meus trapos com alguém tão confuso quanto eu, tentando preencher esses profundos questionamentos.

 

Como todo mundo era capaz de respirar? Quando eles observam cada movimento, cada erro, e apontam tudo, envolvidos por regras, costumes, leis, rótulos, dizendo que devemos apenas ser nós mesmos.

 

Eu sei que pode ser pedir demais, mas achava tão difícil ser feliz quando temos que fazer o que nos é dito, mas o que fazemos é errado.

 

Achava tão difícil cumprir as tarefas que me eram dadas, precisava arranjar um emprego, por exemplo, mas não prestava, tinha gente mais competente e eu não tinha sonhos.

 

Tinha vontades, é claro, mas nem sabia se estas eram corretas, ou se lá iam dar em algo.

 

A verdade... É que é tão difícil viver quando você quer morrer.

 

Mas nas luzes, no brilho, meu desejo de dissipava, a noite me inundada e consumia os ruídos impostos por algum tipo de demônio interno, e tudo era algo tão diferente e tão bonito...

 

Por falar em bonito... Ele andava despreocupado, as pernas longas não faziam muita questão de serem educadas, tão rebeldes quanto sempre foram, as mãos dentro do agasalho pesado tremiam vez o outra e era atingido pelos pequenos flocos de neve que insistiam em cair, que eu suspirava apenas de observar aquela cena.

 

Fitava os cristais brancos, seguindo a rota que traçavam do céu noturno até as madeixas avermelhadas, pensando no quão lindo ele parecia em meio aquela imensidão nívea, tão mais lindo quanto qualquer um dos pedestres que passasse por nós.

 

Por vezes, parava o percurso, fitando-me de soslaio, talvez apenas por preocupação, talvez apenas por curiosidade, fazendo-me suspirar baixinho.

 

Fingia que não notava seus desvios oculares, mas aquele calor não característico formava-se no peito, ao dar-me conta de que o conhecia.

 

Não digo conhecê-lo ao íntimo, quando secava os cabelos com força, acordava de madrugada para ir ao banheiro ou ria sozinho de algo, sentado no sofá.

 

Mas apenas... Conhecê-lo.

 

Quantas daquelas pessoas passando entre nós eu poderia chegar a nunca conhecer? Centenas? Talvez milhares?

 

E como é interessante, andar em meio a esses oceanos escuros e encontrar um par de olhos conhecidos.

 

Par de olhos que já falou para você.

 

Que já chorou para você.

 

Que já riu para você.

 

Que já amou você.

 

Que já brigou com você.

 

Que já foi embora por você.

 

Um par de olhos que vai e que volta.

 

Às vezes nunca vai.

 

E às vezes... Nunca volta.

 

Mas que, acima de tudo, você conhece.

 

Sabe o nome, sabe os gostos, ouve a voz, conhece o calor.

 

Não é algo interessante?

 

E de todos os olhos que poderia encontrar nesses mares, acho que os de Chanyeol sempre seriam meus favoritos.

 

Podia não saber isso na época, e provavelmente, realmente não sabia. Mas quando ele fitava, seus olhos sorriam para mim.

 

E eu achava isso lindo.

 

Aquecia-me o peito de tal forma, que me questionava se estávamos realmente no inverno. Um inverno que consumia aquela sociedade vinte e quatro horas por dia.

 

Um inferno inverno interno.

 

E eu não sabia se aquele mundo estava esfriando-se pouco a pouco.

 

Ou se era eu que havia me tornado mais quente.

 

Lembro que minhas íris negras variavam entre o homem ao meu lado e a decoração brilhante da rua.

 

As casas e prédios eram cobertos pelas pequenas luzes, as quais captavam minha atenção, pintando de dourado todo o caminho.

 

Era uma sensação tão boa. Tão poderosa e efêmera.

 

O natal era uma data comemorativa onde praticamente todos os produtos do país tinham seus preços extremamente reduzidos, assim, todos iam às ruas e compravam presentes para si mesmos, como uma forma de "comemorar" o próximo ano.

 

Nunca cheguei a descobrir o porquê das luzes. Elas apenas sempre estavam ali na data, e ninguém justificava.

 

Fato importante eram os boatos que corriam a cidade naquela época, a forma que o presidente parecia estar perdendo seu poder, os protestos que pareciam tomar conta de cidade, mas nada que fosse de tão grande expectativa. Afinal, ninguém se importava com política.

 

Todo ano as pessoas faziam sempre as mesmas coisas, conversavam sobre os mesmos assuntos, os programas de televisão eram iguais e as comidas também. Até mesmo no Natal.

 

E era exatamente por isso que não conseguia entender qual era o motivo da comemoração. Mas sentia-me obrigado a agradecer... Nem sei pelo quê.Talvez apenas por estar vivo.

 

Mas era algo tão estranho de dizer "obrigado". Agradeceria pelo que, então?

 

Já não sabia mais se era bom ou ruim ter reencontrado Chanyeol, e embora vivêssemos brigando, era em momentos como aquele, que conseguíamos aproveitar a presença um do outro.

 

Apenas silenciados, que não eram necessárias palavras, sentindo os calçados afundarem-se na neve, e o som que o ato causava.

 

O vento gelado adentrava meus pulmões, enquanto minhas mãos carregavam, trêmulas, uma maçã do amor.

 

O doce era costume da data. Chanyeol havia comprado uma ao fitar meu olhar sobre uma barraquinha, por mais que ele não tivesse dinheiro pra isso.

 

E eu já me sentia estranho. Tudo estava tão certo. Quero dizer, estávamos juntos, ele estava ali ao meu lado, mesmo com uma esposa dentro de casa, sem brigas, sem problemas.

 

Naquela época eu já acreditava que, se meus dias estavam dando certo, era porque algo estava, definitivamente, errado.

 

Suspirei, sentindo o ar expelido transformar-se em fumaça, queimando levemente as narinas.

 

Era uma noite tão mágica. Algo difícil de ser descrito em palavras.

 

"Depois temos que arrumar a casa." O ruivo murmurou, e eu ergui o rosto, mesmo entre um monte de agasalhos, fitando o homem de pele levemente avermelhada devido à temperatura.

 

Ah sim, já havia contado que havíamos feito alguns objetos para decorar o interior do apartamento?

 

Eram todos brancos e feitos de papel, porém, esforcei-me ao máximo nos recortes, já colando alguns sob os móveis.

 

Maneei com a cabeça, abaixando com cuidado o cachecol branco com meus dedos pequenos.

 

Dei uma mordida no doce duro, coberto pela camada vermelha extremamente açucarada, mastigando silenciosamente aquele sabor tão diferenciado.

 

Apenas desejava que todas aquelas luzes inundassem nosso apartamento, como vagalumes tímidos, porém destemidos, e que levassem dali qualquer forma de escuridão.

 

"Eu gostaria de ter dinheiro pra isso." Respondi, triturando a fruta, sentindo aquele caramelo todo grudar em meus dentes retinhos.

 

Chanyeol riu baixo.

 

"Meu pai sempre disse que, se você quer se sentir rico, conte tudo àquilo que você tem e que o dinheiro não pode comprar..."

 

Pensei em suas palavras, tentando tritura-las juntamente a maçã, visando digeri-las e quem sabe, assim, compreendê-las.

 

Mas eram tão complicadas. Daquelas bem complicadas mesmo. Que apenas Chanyeol poderia pronunciar.

 

"Tem coisa que o dinheiro não pode comprar?" Perguntei-lhe, mordendo novamente meu doce.

 

Sorriu de leve, encarando-me com aqueles olhos grandes.

 

"Lógico que tem, o dinheiro não pode comprar sentimentos, nem saúde."

 

Refleti durante minutos, sentindo o sabor adocicado enquanto formulava uma possível resposta.

 

Realmente, eu compreendia suas palavras, apenas não concordei muito com elas.

 

Durante aqueles cinco anos vivendo do jeito que dava para viver, acabei por ficar muito mais magro e fraco.

 

E agora que ele estava comigo e pagava tudo, minha situação e meu corpo estavam muito melhores.

 

Então sim, o dinheiro não compra algumas coisas.

 

Mas a pobreza também não compra nada.

 

"E... Você se sente rico?"

 

Observava o homem alto escondido entre minhas malhas espaçosas, a maioria que, na verdade, pertencia a ele.

 

Aquilo era um problema.

 

Nunca podíamos dividir roupas.

 

E quando isso acontecia, eu pegava as dele, sentindo as mesmas extremamente largas.

 

Chanyeol era o tipo de pessoa que tinha coisas que o dinheiro não comprava?

 

Eu queria saber.

 

Um sorriso largo abriu-se entre os lábios levemente rachados.

 

"Claro que sim."

 

Franzi o cenho de leve, dando uma nova mordida na maçã.

 

O que será que ele teria que o dinheiro não comprava?

 

Dei de ombros, como sempre fazia, continuando nosso percurso sem destino, passando entre os transeuntes animados.

 

Por incrível que pareça, eu sempre gostei do natal, mesmo que este fosse completamente previsível.

 

Aquele seria o primeiro natal que passaria com Chanyeol. Não sabia o que esperar. Só sei que esperava alguma coisa.

 

Senti seus olhos tencionarem rapidamente e o ruivo aproximou-se de mim ao cruzarmos com a entrada de um shopping, de onde saiam muitos consumidores frenéticos.

 

Controlei a vontade absurda de embrenhar meus dedos gélidos naquela mão que agora repousava para fora dos bolsos, atenta. Mas apenas continuei a caminhar, forçando passagem entre aquelas pessoas, sentindo a mistura de cheiros que, ao meu ver, era incômoda.

 

Fui empurrado por um deles, fechando os olhos com o impacto forte, enquanto sentia meu doce escapar dentre meus dedos, caindo no chão.

 

Suspirei chateado. Era só o que faltava!

 

Chanyeol levou os olhos até a maçã estourada na calçada coberta pela neve, e virou-se rapidamente, indo atrás do desconhecido.

 

"Ei você!" Arregalei os olhos abruptamente com aquele tom de voz bravo, procurando meu namorado.

 

Olhei ao redor e a eram apenas rostos e rostos desconhecidos.

 

Não.

 

Ele não podia estar comprando briga por aquilo.

 

Onde estava Chanyeol?

 

Eu não queria me perder, não em meio a tantas pessoas. Só conseguia ouvir a discussão, mas nada de Chanyeol.

 

Comecei a me desesperar, já sentindo aquele aperto no peito.

 

"Chanyeol?!" Olhava para os lados, parado em meio aquela rua, sendo apertado entre os pedestres.

 

Eu queria sair dali! Estava tudo tão lotado, e cheio.

 

As pessoas indo e vindo, me empurrando.

 

Eu estava passando mal.

 

Até que, enfim, encontrei as madeixas vermelhas.

 

"Com licença." Passei entre todos os transeuntes, aproximando-me de Chanyeol e pegando em seu casaco, suspirando aliviado.

 

Encarei a discussão que ele parecia ter com um outro homem.

 

"Chanyeol! Para com isso."

 

Ele virou-se irritado.

 

Não se intromete." Fechei os olhos com aquilo, ficando irritado com sua atitude.

 

"Me desculpe por isso." Fitei o garoto desconhecido, puxando meu ruivo pelo braço "Deixa Chanyeol!"

 

Por que ele precisava causar no meio da rua?

 

"Eu vou resolver isso!!"

 

Continuava a puxá-lo, atravessando a rua com pressa, obrigando os carros a pararem, buzinando, enquanto algumas pessoas encaravam a cena, curiosas.

 

Que show.

 

Ah, por que ele tinha que ter feito aquilo?

 

"Deixa Channie!" Já estávamos na outra calçada e ele ainda tentava se soltar, fazendo-me revirar os olhos com toda aquela teimosia.

 

"Como deixar?! Ah não, me solta!"

 

"Chanyeol! Tá tudo bem." Apertei mais forte meus dedos em torno do casaco acinzentado, segurando-o, pois precisava acalmá-lo.

 

O ruivo apenas tentou desvencilhar-se de mim por mais algumas vezes, suspirando logo em seguida.

 

Chanyeol cruzou os braços, aquietando-se, enquanto ainda encarava (com toda aquela sua altura) o provável desconhecido do outro lado da rua.

 

Acariciei seu braço com cuidado, pois internamente estava feliz pela sua pequena "crise". Eram raros os momentos em que Chanyeol demonstrava algum sentimento como àquele por mim.

 

Ele estalou a língua, olhando para qualquer lugar que não fosse meus olhos.

 

"Ei grandão, tá tudo bem." Sorri brevemente, embora ele ainda parecesse emburrado.

 

 "Vamos sair aqui, tem muita gente." Concordei com ele, afinal, não era bom que demonstrássemos afeto assim no meio da rua.

 

Ah, como era triste... Não poder mostrar ao mundo que a gente ama.

 

Segui o ruivo e seu conhecimento sobre praticamente todos os lugares naquela cidade, entrando em uma das ruas onde o comércio parecia menos movimentado.

 

 O local frio e mal iluminado aparentava levar a outras ruas ainda menores, com chão de paralelepípedos, que exalavam um odor forte e levemente pútrido.

 

Quase quis grudar-me ao homem ao lado de mim, tencionado pelo lugar de aura completamente distinta da tão brilhante e animada véspera de natal.

 

Continuávamos a caminhar sozinhos pelo local isolado, onde boa parte das lojas já estava fechada.  Lembro-me que não havia mais pessoas ali, apenas nós dois. E se estivesse sozinho ali, fugiria de medo.

 

Quero dizer, primeiramente, eu não estaria sozinho ali. Mas se eu estivesse...

 

"Você devia ter me deixado ir atrás dele."  Chanyeol ainda permanecia com os braços cruzados e eu apenas revirei os olhos, aproximando meu corpo ao dele.

 

"Para com isso, eu não ligo." Encostei os ombros, empurrando-o de levinho.

 

"Eu só ia fazer ele pedir desculpa-"

 

"Não Chanyeol, você ia bater nele."

 

Ele fitou-me incrédulo, suspirando logo em seguida, movendo o rosto de um lado para o outro.

 

E eu ri, querendo abraçá-lo, pois naquele dia não sabia se era eu, ou se era ele, ou se não era nenhum dos dois, mas eu encontrava-me... Feliz?

 

Não sei bem explicar.

 

Deve ser porque não se explica, apenas se sente.

 

E eu nunca poderia descrever com meras palavras nem metade de tudo que sentia naquela época.

 

"Vamos parar com isso, ok? Era só uma maçã."

 

"Não era só uma maçã, era a sua maçã, fora que eu fui eu que comprei." Ele fez um bico nos lábios rachados, coisa que eu não via há anos, apenas podendo contemplar aqueles pedaços de carne juntinhos em nossa adolescência.

 

Tão incrivelmente irresistível.

 

O ruivo descruzou os braços, e eu precisei controlar minha vontade de pegar em sua mão. Por mais que estivéssemos sozinhos, qualquer toque já podia ser motivo de risco.

 

"Você compra outra coisa, tá bom?"

 

Ele bufou uma última vez, enquanto continuávamos a percorrer a rua abandonada, onde pouquíssimas luzes iluminavam as árvores secas, cobertas pelo branco da neve, criando um ambiente insalubre.

 

Passamos em frente a uma lojinha, ainda parcialmente ligada, como se fosse qualquer outra ali. Mas meus olhos instantaneamente pousaram sobre um pequeno objeto na vitrine.

 

Aliás, um não, dois.

 

Nunca havia visto igual. E lembro dos mesmos em todos os detalhes, lembro

 

 Eram pingentes, feitos em prata, simples para qualquer um que visse, mas não para mim.

 

Aquele tom de prateado era exatamente da cor dos olhos da pessoa que eu mais amava no mundo.

 

Exatamente igual. Do mesmo tom.

 

Levei a visão até Chanyeol, que ainda parecia avoado em meio à rua. Sim, a cor era igual! Eu estava fascinado. Completamente fascinado com aquilo.

 

Era lindo!

 

Sob o metal, estavam aqueles dizeres em vermelho, um vermelho fogo, vivo.

 

Aqueles malditos dizeres.

 

Jamais poderia me esquecer da primeira vez que encontrei-me com aquela frase.

 

Jamais.

 

"Für Immer Und Ewig"

 

Lembro-me das palavras desconhecidas rondando afoitas às margens de minha língua, implorando para serem pronunciadas.

 

Mas eu não sabia falar aquilo.

 

"Grandão, olha isso!" Peguei em seu moletom, enquanto Chanyeol parecia ter "acordado" de seus devaneios, aproximando-se de mim, fitando o objeto por detrás do vidro.

 

Observei seu semblante levemente confuso, enquanto os olhos cor da peça movimentavam-se, provavelmente lendo a frase estampada na prata, de um vermelho extremamente forte, carmesim.

 

"O que tá escrito?"

 

Chanyeol refletiu durante minutos, e no final, apenas suspirou.

 

"Eu não sei... Mas eu acho que é alemão."

 

"O que é alemão?"

 

Ele abriu a boca algumas vezes, mas parecia ainda mais perdido que eu.

 

"É... Era um povo antigo, eu não sei direito..."

 

Sorri de leve, sem preocupar-me com sua falta de conhecimento, tornando a observar o pingente.

 

Nunca havia visto tamanha perfeição!

 

Aquele prateado idêntico aos olhos de Chanyeol. E aquele vermelho sangue, combinando maravilhosamente com a prata.

 

As pontas de meus dedos formigavam para tocá-lo.

 

Levei meus olhos até a entrada da loja, encontrando a mesma "aberta".

 

Sorri com aquilo, caminhando lentamente até a porta.

 

"Baek, eu não acho que seja uma boa-"

 

Nem ouvi Chanyeol. Adentrei o local, sentindo um cheiro levemente empoeirado penetrar-me o olfato, enquanto o som do sino da porta soou em todo o ambiente.

 

 As paredes eram altas, feitas de madeira, e muitas coisas estavam cobertas por panos brancos e grandes.

 

 Questionei-me se aquele lugar assombroso estava realmente em funcionamento, ouvindo os estalos que meu peso causava no taco velho.

 

 Dentro da loja haviam alguns objetos aos quais eu nunca havia visto antes, apenas por histórias.

 

Eu estava deslumbrado. Eram tantos móveis. Tantas bugigangas.Tanta poluição visual.

 

Completamente diferente de tudo que já havia visto antes.

 

Podia escutar os passos de Chanyeol logo atrás de mim, enquanto ele também encarava o local com o cenho franzido, parecendo surpreso.

 

Seria ali a loja de objetos censurados? Então ela existia mesmo? Não passava de uma lenda?

 

Inacreditável!

 

"Bem vindos"

 

Assustei-me com uma voz feminina desconhecida, correndo para os braços do ruivo, que, desajeitadamente, acomodou-me entre seu corpo.

 

Procuramos com os olhos a fonte, encontrando uma garota baixa, de cabelo curtos numa tonalidade azulada.

 

Nunca me esqueceria daqueles cabelos ou de seus olhos.

 

Um roxo e outro verde.

 

Li rapidamente seu crachá "Sunny", estranhando o nome.

 

Após o choque, e ainda fascinado pelos olhos coloridos, balbuciei algumas palavras soltas.

 

"É-é, oi." Foi o máximo que pude falar, envergonhado por entrar na loja sem mais nem menos.

 

Ela fitou-nos de cima a baixo e sorriu logo em seguida. Nos entreolhamos, afastando-nos lentamente pois era errado ficar abraçado daquela forma.

 

Novamente aquelas íris tão diferenciadas pousaram em mim, fazendo minhas pernas ficarem bambas pelo nervoso de estar sendo avaliado.

 

Sorriu.

 

E então, ela levou os olhos até Chanyeol, e para minha surpresa, tornou-se séria.

 

Virei a face lentamente, apenas encarando aquela expressão vaga no rosto do ruivo ao meu lado.

 

Eles continuavam se encarando, durante temerosos segundos.E eu precisei de um controle absurdo, pois senti o ciúme subindo-me o corpo.

 

Mas se não tivesse sido tão possessivo, teria percebido algo. A forma em que Chanyeol encarava aquela garota.

 

E não era algo nem um pouco amável.

 

Era um olhar misterioso, carregado de mensagens que nunca poderia compreender.

 

Traguei saliva com aquela troca de olhares de ambos, apenas saindo de meu estado perplexo quando sua voz atingiu-me novamente.

 

"Bom." suspirou "Estão à procura de algo?" Ouvi a pergunta, relutando em falar ou não sobre aqueles pingentes tão maravilhosos.

 

E por fim, apenas dei de ombros.

 

O que eu tinha a perder?

 

"Ah sim, eu gostei do pingente lá... Lá fora." Apontei para a vitrine e ela arregalou as sobrancelhas, ainda sorrindo.

 

Seus olhos voltaram até nós, e era como se o roxo fitasse-me e o verde fitasse a Chanyeol.

 

"Aquele é um pingente muito especial." Senti meu interior aquecer-se com aquilo.

 

Muito especial?

 

Eu queria algo muito especial!

 

Ah, agradecia aos céus por ter pisado na loja. Era exatamente o que eu procurava, algo "muito especial"!

 

"É?" Perguntei sorridente, aproximando-me do balcão.

 

Ela afirmou com a cabeça.

 

"É o pingente alemão do amor eterno"

 

Arregalei os olhos.

 

Então aquilo era realmente alemão?

 

Chanyeol era tão inteligente!

 

 Ignorei o fato da jovem ter falado levemente animada "Amor eterno", tornando meus olhos para o ruivo.

 

"Olha, é algo muito especial." Sorri para ele, segurando em sua blusa e ele continuou levemente escondido atrás de mim, inquieto.

 

Não sabia o que ele tinha, e também não iria saber, estava ocupado demais com o pingente.

 

"Você sabe o que tá escrito neles?" Tornei a falar com a vendedora, e ela ainda mantinha o sorriso misterioso nos lábios avermelhados, encarando-nos profundamente.

 

"Para sempre e sempre."

 

Suspirei internamente com a tradução, aquilo era perfeito!

 

Perfeito!

 

Levei meus orbes até Chanyeol, sorrindo com aquele significado.

 

Mas ele parecia ainda aleatório, encarando a vendedora. Franzi o cenho, irritado com sua falta de consideração.

 

"Channie"  O chamei, e ele permanecia distraído, como se minhas palavras não entrassem em seus tímpanos.

 

Mas antes que pudesse falar qualquer coisa, a voz feminina cortou-me os pensamentos.

 

"Quer que eu pegue?"

 

Pensei por alguns poucos segundos.

 

Aqueles pingentes eram tão extremamente lindos! Nunca havia visto nada igual. Não queria sair dali sem eles.

 

"Por favor"

 

Ela sorriu, saindo de trás do balcão.

 

E minha surpresa não pode ser maior quando meus olhos encontraram-se com sua perna.

 

Ou melhor, com a falta uma delas.

 

Quase gritei, assustado demais. Ela não tinha uma perna!

 

Chanyeol também parecia levemente chocado, arregalando os olhos prateados.

 

Prendi o oxigênio quando ela sorriu para nós, apoiando-se nos móveis para não cair.

 

A jovem foi caminhando aos tropeços até a vitrine, enquanto meus pulmões expeliam todo aquele ar guardado dentro de mim.

 

Suspirei, acalmando-me. Não era nada demais, havia sido apenas um choque inicial.

 

Senti o ruivo aproximar-se, sussurrando em meus ouvidos.

 

"Baek, eu acho melhor irmos embora..."

 

Franzi o cenho com suas palavras, sem entender o porquê daquilo.Apenas por que a vendedora não tinha uma perna?Que absurdo!

 

Como Chanyeol podia pensar uma coisa daquelas?

 

"Por quê? Ela é super simpática e os pingentes são a coisa mais linda que eu já vi, eu quero aquilo de presente Chanyeol."

 

Ele soltou um som baixinho que mais se parecia com um choro, fitando-me.

 

Os olhos prateados encontraram-se com os meus, secando-me a garganta.

 

Ele estava com... Medo?

 

Sim, definitivamente, ele estava com medo, eu conhecia bem Chanyeol.

 

Mas, por quê?

 

Medo do que?

 

"Channi-"

 

"Aqui está."

 

A jovem entrou em nosso radar de visão, segurando o pequeno pingente em formato arredondado nas mãos, colocando o mesmo sob o balcão logo em seguida.

 

Encarei a joia abandonada ali, como se visse a coisa mais linda do mundo.

 

"Ah, que lindos!" Aproximei-me tímido do objeto, enquanto Chanyeol permanecia afastado, segurando na pontinha de meu casaco.

 

"Pode pegar."

 

Com sua autorização, toquei na peça, sentindo a textura da prata, passando minhas digitais sobre a frase marcada.

 

"Para sempre e sempre"

 

Eu estava surtando.

 

Nunca havia encontrado algo que combinasse tanto comigo quanto aquilo.

 

"Tente quebrar os dois."

 

Forcei o pingente, com medo dos atos, e quase gritei quando o mesmo separou-se em duas partes, cada qual com sua frase.

 

Eu estava completamente animado naquela noite, e ao menos notei as preocupações evidentes de meu namorado.

 

"Meu Deus! Tão legal! Olha isso Chanyeol!"

 

O ruivo sorriu de leve, ainda recuado, mas nem importei-me, puxei o mesmo pela mão, o trazendo para perto.

 

"Não é lindo?!"

 

E para minha surpresa, Chanyeol puxou o braço com rapidez, praticamente fugindo de meus toques.

 

"É-é bonito sim"

 

Traguei saliva.

 

O que ele tinha?

 

"Vocês são amigos?" A jovem apoiou-se no balcão, aproximando-se, e fora impossível não reparar naqueles olhos de cores tão diferentes.

 

Apenas Chanyeol e Sehun possuíam olhos como aqueles.

 

"É..." Fitei o ruivo, e ele parecia tão constrangido quanto eu.

 

"Somos bem amigos" "Não muito"

 

Arregalei os orbes com aquelas palavras. Como assim "Não muito"?

 

Fuzilei Chanyeol e ele apenas desviou os olhos para o chão.

 

"Entendi" Ela riu.

 

"Baek, compra isso logo."

 

Não era ele que iria comprar?

 

"Você não vai comprar pra mim?"

 

Ele suspirou, colocando a mão no bolso da calça com pressa, tirando uma quantia de dinheiro razoável.

 

 E eu já aproximava-me dele para pegar as notas,quando Sunny novamente tornou a falar.

 

"Ah não, podem ficar."

 

Paramos os movimentos com aquelas palavras, ambos encarando levemente confusos a garota de cabelos azulados.

 

O ruivo rapidamente guardou o dinheiro, e curvando-se de leve, abandonou a loja. Assim, em poucos segundos.

 

Estalei a língua.

 

Por que ele estava daquele jeito?

 

Ainda incrédulo, pois tudo aquilo acontecera tão rápido, permaneci parado ali, ouvindo risos baixos saírem por entre os lábios cobertos pelo gloss cor de rosa.

 

Traguei a saliva que parecia entalar em minha garganta, acanhado de falar com a vendedora.

 

"B-bom... Obrigado... Muito obrigado." Virei-me para a jovem que permanecia apoiada no balcão, com o rosto sob as mãos.

 

Ela riu alto, movimentando aqueles cabelos tão azuis.

 

"Por nada... E feliz natal!" Ela era tão simpática que senti vergonha por Chanyeol ter feito aquele show.

 

Nunca conseguiria entender o porquê de seus surtos.Pelo menos, naquela época não.

 

"Para você também!" Puis-me a ir em direção à saída, resmungando internamente pela falta de educação do ruivo.

 

Ainda havíamos ganhado aquilo de graça!

 

O que era de graça nos dias de hoje? Exato, nada.

 

Quando meus dedos já haviam alcançado a maçaneta enferrujada, a voz aguda chamou novamente minha atenção, causando-me calafrios.

 

"Vocês são mesmo amigos?" Engoli seco, sentindo um nervosismo me atingir.

 

Por que ela queria saber sobre aquilo?

 

"S-somos" Respondi sem ao menos virar-me. As mãos já tremiam, suando sobre maçaneta.

 

Ela riu baixo, arrepiando-me cada fio de cabelo. E então... Aquele aviso.

 

"Tomem cuidado, muito cuidado."

 

Arregalei os olhos, mas quando fui levar os olhos até ela, já não havia mais ninguém!

 

Como aquilo era possível?!

 

Lembro-me de ter tragado saliva, consumido pelo medo, abrindo em um estrondo aquela porta, saindo do local com pressa. Chanyeol esperava-me já do lado de fora, fitando a calçada coberta pela neve.

 

Meu coração ainda pulsava acelerado pelas falas da vendedora.Digo, tomar cuidado com o quê?Eu estava tão confuso e assustado. E por que aquele tom de voz?

 

Tanto medo, querendo entrar em mim, manchar-me e preocupar-me o pensamento.

 

Não.

 

Devia ter sido apenas um mal entendido.

 

"Vamos pra casa pequeno, eu quero tomar um banho." Mal pude me aproximar do ruivo que sua voz já alcançou-me os ouvidos.

 

Suspirei cansado, sabendo que não conseguiria tirar nenhuma informação dele sem causar uma possível briga.

 

Coisa que eu realmente não queria causar.

 

Não agora que estávamos tão bem, tão ajustados. Pela primeira vez em meses.

 

Guardei ambos os pingentes no bolso no casaco, enrolando-os em meus dedos gelados.

 

E novamente aquela aflição contaminava todo meu corpo, como um veneno poderoso.

 

Um veneno que não possuía antídoto.

 

Afinal, cuidado com o que?

 

 

 

X

 

 

 

 

 

Eu suspirava cansado, ainda com toda aquela historia da vendedora esquisita em minha mente, enquanto colocava nossas roupas para lavar.

 

Chanyeol estava tomando banho, coisa que costumávamos fazer juntos.

 

Mas que já não fazíamos mais.

 

Como poderia explicar para vocês?

 

Tentarei.

 

Naquela época, por mais que estivéssemos "bem" não significava que estávamos "ótimos", nossa rotina não havia voltado ao normal e o ruivo continuava a aparecer raras vezes. A diferença era que não brigávamos mais.

 

Em nossos sonhos meio vazios, nossas portas meio abertas e nossos sentimentos meio cansados, Chanyeol tentava ser muito bom e compreensível, mas algumas coisas simplesmente não haviam sido recuperadas, infelizmente.

 

Eu estava acostumando-me também. Acostumando-me com algo que sempre acreditara ser impossível de tornar-se rotineiro.

 

A comer o prato já frio, a dormir na cama já gelada, a tomar banho na água já morna.

 

Fazia parte daquele "meio" que nos separava.

 

Meio toque.

 

Meio beijo.

 

Meio olhar.

 

Meio sentimento.

 

Meio amor.

 

Meio eu.

 

Meio ele.

 

Meio nós.

 

Em meio a um relacionamento que eu já sabia que seria como um texto, onde é obrigatório um desfecho.

 

Creio que já iniciamos relações segurando essas canetas e disputando para ver quem coloca o ponto final antes de quem.

 

E no nosso caso?

 

Eu acho que era uma luta bem acirrada, porém, acho também, que estava um pequeno passo a frente.

 

Pois eu já havia me conformado a viver daquela maneira, naquele afasto, naquele buraco, nos momentos em que olhávamos um para o outro e céus, eu tinha certeza que estava vivendo com um estranho, um estranho muito distante de mim. Mas que a verdade seja dita: Distancia nunca foi motivo pra não amar.

 

E amando, ou pelo menos, preso pela ilusão deste, procurei amor naqueles "meios”,  deixei de esperar, deixei de crer e de querer, de desejar, talvez até de ser. Desprendendo-me daquela minha essência, da crença de que talvez doesse muito perder alguém. E acreditaria que essa é, de fato, a pior dor do mundo.

 

Até conhecer a dor de perder a si mesmo.

 

O que, cedo ou tarde, acontecerá com todos.  Sim, todos.

 

Eu só não imaginava que viria tão cedo, muito menos que não existiria ninguém ao meu lado para apoiar as terríveis decisões que minha mente tomava sem nem ao menos consultar. Ninguém capaz de me dar um conselho, uma mão amiga, e embora eu não quisesse crer no ditado que “cada criatura viva irá morrer sozinha”, abrangia em meu coração milhares de tempestades que ninguém era capaz de escutar. Todo mundo só aparecia quando a chuva já havia caído. E eu também.

 

"É... Que vida..." Resmungava comigo mesmo, enquanto socava as roupas na máquina.

 

Utensílio ao qual já havia me acostumado, e era extremamente mais prático que lavar as peças nas mãos.

 

Até que algo chamou minha atenção.

 

Pisquei algumas vezes, encarando o tecido branco da camisa que não era minha.

 

Um fio de cabelo. Um fio de cabelo verde.

 

Verde.

 

"Mas o que...?" As palavras escapuliram, atordoadas, e juro que pude sentir meu coração falhar, cessando o pulso durante segundos.

 

De quem era aquilo? E o que aquilo estava fazendo na blusa de Chanyeol?!

 

Um fio... Que não era meu, nem dele.

 

Um fio verde.

 

Verde.

 

Então...

 

Não.

 

Não.

 

Não.

 

Não podia ser.

 

"Ah, que frio." Aquela voz grave adentrou meus ouvidos, enquanto eu permanecia com meus lábios bem abertos, incrédulo.

 

Chanyeol entrou em meu campo de visão, secando os cabelos com uma toalha, já bem agasalhado pelo frio da noite.

 

Se fosse em outro momento, teria corrido até ele, abraçando seu corpo grande, sentindo aquele seu cheiro tão gostoso misturado ao sabonete.

 

Se fosse em outro momento.

 

"Vamos arrumar a árvore, pequeno?" Ele sorriu abertamente e eu comecei a me desesperar.

 

Havia prometido não ter mais crises, mas estava impossível.Impossível com aquele fio verde, bem na minha frente, nos meus olhos.

 

Um fio desconhecido, na roupa do meu namorado!

 

Como vocês esperariam que eu lidasse com aquilo?

 

"Pequeno?" Ele tornou a chamar, mas eu apenas peguei com as mãos já tremendo aquele cabelo esverdeado, caminhando lentamente até ele.

 

O ar começando a faltar, aquele desespero subindo.

 

Tão típico... Tão Baekhyun.

 

Eu era silencioso em cada mera investigação do que acontecia em minha vida, e cada caso machucava um pouco mais, mas dá pra acreditar? Amava aquela dor, a dor estampada na face de uma pessoa que apenas queria insistir naquilo que ela nunca poderia ter.

 

Insistindo naquilo que ela apenas acreditava que tinha, porque, é claro, a gente não costuma sofrer pelo presente, é o passado que atormenta nosso sono.

 

Ergui o fio no ar, bem em frente ao seu rosto, praticamente colando aquilo na sua face e o ruivo franziu o cenho.

 

Traguei saliva, sentindo a voz ameaçar falha, e naquele momento me esfaqueei dezenas de vezes, culpado por parecer procurar coisas as quais sempre sabia que iriam explodir.

 

"O que é isso Chanyeol?!" Questionei em bom tom.

 

Ele fitou-me confuso. Mas confuso estava eu. Eu estava confuso faziam-se muitos e muitos anos.

 

A verdade era: Eu sabia que a resposta para todas as minhas dúvidas seria algo que tiraria Chanyeol de mim.

 

Então eu preferia ficar ali, ouvindo mentira atrás de mentira, apenas para poder ter o privilégio de sentir seu cheiro à noite.

 

"Um cabelo?" Franziu o cenho e eu ri, soprando aquele ar quente próximo a seu peito.

 

Ele se fazia de tonto. Eu me fazia de tonto. Já não sabia distinguir mais qual de nós conseguia ser pior nessa atuação. Nesse jogo de máscaras que havíamos construído.

 

Mas na vida, nenhuma máscara dura para sempre, e agora, todas caíam, uma a uma.

 

Em frente ao nossos olhos.

 

"Isso, um cabelo, agora tá vendo a cor dele? Me diz se alguém nessa casa tem cabelo verde, me diz!"A voz já tornando-se irritada, porque eu estava tornando-me irritado.

 

E como uma chaleira, aquilo apenas ficaria cada vez mais alto, cada vez pior e desesperador.

 

Ele apenas arregalou de leve os olhos, para então, desviar as esferas prateadas ao chão. E nada disse.

 

Como sempre. Aquele silêncio.

 

Olhei para ele, olhei para o chão, suspirei perante o teto e sabe por que doía?

 

Porque aquela falta de palavras vinha de ninguém mais ninguém menos que o dono da voz que eu mais amava no mundo.

 

Aquela traição toda doía, doía demais, porque não vinha de um inimigo, um desconhecido, e sim, do homem que morava comigo!

 

Comia comigo, dormia na mesma cama! O homem que gemia no meu ouvido a noite, que me beijava! Como ser indiferente a isso?

 

"Deixa eu adivinhar." Ri com escárnio, colando os corpos, enquanto ele se afastava. Um. Dois. Três passos. E eu apenas apressei-me. Quatro passos e lá estávamos nós "Você vai falar que não é da minha conta né?! Que eu não preciso saber!"

 

"Ba-baek-" Aquela voz baixa, aflita, apenas causou-me uma forte vontade de desaparecer. Eu estava farto. Farto. Não existiam forças nem para discutir mais.

 

Eu não queria discutir.

 

Ele era uma decepção completa.

 

Não conseguia nem olhar em seus olhos mais, sem sentir a necessidade de dizer que estava decepcionado e que nada que fizesse seria capaz de corrigir seus erros.

 

"Sai daqui, vai Chanyeol."

 

Ele ergueu o rosto, chocado com minhas palavras, enquanto eu apontava meu indicador para a porta.

 

Meu braço tremia, pois eu sabia que não queria que ele saísse. Não queria que ele fosse embora, mas precisava ser forte e acabar com tudo aquilo.

 

Sempre. Sempre cedendo. Dizendo que "tudo bem". Sempre dependendo dele. Eu não podia mais ser daquela forma, tão patética.

 

E naquele momento sentia que estava matando mais um Baekhyun.

 

Jogaria seu cadáver nas mesmas trilhas abandonadas, as quais outros também estavam mortos. Apodrecendo dentro de mim.

 

A começar pelo garotinho Byun, que nunca havia ido à diretoria. Até conhecer o encrenqueiro Park Chanyeol. E por algo que, gostava de chamar de azar, aceitara sua aposta. E já se fora um.

 

Cada decisão feita seja por impulso ou não, eu apenas esfaqueava-os, mais e mais.

 

E o que sobraria de mim? Eu, que havia alimentado tanto meus sonhos e expectativas, que agora já não conseguiam passar mais pelas portas da verdadeira realidade.

 

"Mas olha, sai, e por favor, não volta mais."

 

"Não! Baek deix-"

 

"Não tem explicação!" Eu comecei a rir, já sentindo as lágrimas queimarem nos olhos.

 

Chorar não. Eu não podia chorar Então apenas fitei o teto, pedindo ajuda, ajuda para qualquer coisa, para uma força maior.

 

Por que não podia dar certo?

 

Por que não podia dar certo para a gente?Por que sempre tudo repetia-se sem nunca findar-se, e eu permanecia ali, de casa e coração abertos para ele.

 

Que entrava, bagunçava tudo, e depois ia embora?

 

Não dava mais para aguentar aquela história. Aquelas desculpas.

 

Já não dava mais.

 

"Sai da minha frente logo!!" Comecei a gritar, pois não queria que ele me visse chorando.

 

Ele não era digno disso. Não mais.

 

"Não! Baekhyun, por favor, vamos-" Fitei aqueles braços longos virem em minha direção, tentando me tocar, mas consegui desviar.

 

"Chanyeol!! Para!! Para com isso meu Deus!!" Ele calou-se, ainda mantendo os olhos arregalados "Para!!"

 

Senti as primeiras lágrimas escorrerem, e fora necessária uma bela tragada de ar, por mais que este parecesse faltar.

 

Uma vez fraco, sempre fraco.

 

Parecia que as coisas funcionavam assim na minha vida. Eu nunca conseguiria ser um predador. Sempre uma presa.

 

Fraca e indefesa.  E não importava.

 

Eu poderia treinar milhões de vezes, mas na hora de ter que colocar tudo aquilo pra fora, eu sabia que não sairia o que eu queria falar.

 

Porque, no fundo, a armadura que havia envolvido-me, estava repleta de rachaduras.

 

"Olha só o que você faz comigo!! Você só me faz sofrer! Eu não ligo se é pelo "meu bem" que você esconde tudo isso, eu só sei que eu não aguento mais!! Por favor, para de me machucar assim!" Precisava botar para fora aquilo que, na maioria das vezes, sempre colocava, e ele nem dava ouvidos.

 

Queria saber como ele sentia-se.

 

Ignorando-me daquela forma.

 

Ele permanecia parado, sem mover-se do corredor.

 

"Sai Chanyeol... Por favor, eu já não aguento mais isso." Sentei-me no sofá, chorando baixo, limpando aquelas lágrimas com força, fungando as mesmas.

 

Eu não aguentava mais chorar. E eu não queria chorar. Eu só chorava e chorava, quase todos os dias da minha vida.

 

Daquela minha vida que só havia ganhando cor após aquele homem aparecer e que simultaneamente parecia tão extremamente diferente do que era na nossa adolescência.

 

Fazendo pensar-me se aquele Baekhyun teria orgulho da pessoa que havia tornado-se. Chorava quando ele estava ali. E quando não estava também.

 

Ouvi seus passos lentos, esses, apenas cobertos por meias, caminharam temerosamente em minha direção. Ele parou bem em frente aos meus pés cobertos pelas meias branquinhas, encostando apenas a ponta de ambos.

 

Ergui o rosto, encontrando-me com aquela face levemente desesperada, as sobrancelhas franzidas, os lábios apertados, e o nariz avermelhado, exatamente como sempre acontecia quando ele ia chorar.

 

Não. Por que ele tinha que me olhar daquele jeito? Há quanto tempo já estávamos sofrendo com aquilo?

 

Eu já nem sabia mais.

 

"Pe-pequeno..."

 

Pronto. E tudo, tudo aquilo que tentava jogar para fora de mim, voltava-me, em forma de culpa.

 

Ele tinha essa mania chata, de com poucas palavras, conseguir fazer-me sentir culpado por tudo.

 

Como se ele fosse uma eterna vitima.

 

"Sem pequeno Chanyeol" Movi o rosto para os lados "Sem pequeno e sem grandão também, nada disso existe mais... E-eu não consigo mais, viver essa mentira entende? Não precisa, sabe?"  Funguei de leve, fitando o teto, até sorrindo fraco. "Não precisa me contar, eu já nem quero saber mais, só vai embora, por favor... E-eu não sei porque a gente tá insistindo nisso, eu não sei porque você voltou."

 

Chanyeol franziu o cenho, irritado, esfregando o rosto com as mãos grandes, bagunçando aqueles cabelos vermelhos. Abriu e fechou a boca diversas vezes, desejando falar algo, mas apenas desejando.

 

"Não vamos brigar hoje, por favor!"

 

E faríamos o que então? Adiar tudo aquilo? Só porque era natal?

 

Uma hora ou outra aquilo ia chegar, ia chegar pra mim e ia chegar pra ele.

 

Não era possível fugir dos problemas para sempre e ele parecia simplesmente ignorar isso.

 

"Brigo sim! Ah pelo amor de Deus Chanyeol, até quando você pretende me enganar?! Meu deus do céu! Toda vez é uma história diferente!"

 

Comecei a gritar por mais que chorasse e ele apenas retribuiu o tom.

 

"Porra, isso é importante!! Será que dá pra você parar de se importar só com você?!!" 

 

Não me contava nada. Nada.

 

"Eu?! Chanyeol! Eu significo tão pouco pra você que não mereço nem devidas explicações?! Eu não vou julgar você!! Me conta logo."

 

Ele puxou os cabelos, extremamente irritado.

 

"Não é assim que funciona!!"

 

"Ah não é?!! Então me diz como que é!! Com quem você tá saindo!! Me diz agora caralho!! Me diz quem é!!" Levantei-me daquele sofá, impondo meu um e setenta centímetros, que não eram nada comparados a si, fitando-o face a face.

 

"Eu não to saindo com ninguém!!" Ele gritava como um trovão, quebrando em pedaços pequenos tudo aquilo que havia sobrado de mim.

 

Mas eu precisava ter coragem.

 

"Não, lóóóóógico que não, e eu sou palhaço né!!" Ri com escárnio.

 

E aquele cabelo?! De quem era aquele cabelo?! Nem justificativas ele havia dado!

 

"Eu não to com ninguém Baekhyun!!"

 

Eu estava tão bravo, mas tão bravo, que meus dedos tremiam querendo bater nele como eu sempre fazia.

 

Dito e feito.

 

"Não mente pra mim!!" O tapa estalado acertou seu rosto fortemente, machucando minha própria mão com o contato.

 

"Eu não to mentindo!!" Os olhos prateados pareciam piscinas cristalinas, onde toda aquela água transbordava, carregada de sentimentos que ainda não haviam aprendido a nadar.

 

"Você só mente Chanyeol!! Eu devia fazer como você, e ficar saindo com outras pessoas né!!"

 

Aquele sentimento consumindo-me, e eu sabia que iria me arrepender futuramente, dali poucos minutos.

 

Mas eu precisava.

 

"Eu nunca sai com ninguém!!" Ele chorava, deixando as lágrimas escorrerem, chorava alto mesmo, desesperado, gritando tudo aquilo que, para mim, entrava por um ouvido e saía pelo outro.

 

"Fala a verdade porra!!"

 

Outro tapa. Dessa vez ainda mais forte.

 

E ele mantinha-se impassível, sem erguer um dedo. Sem fazer nada contra mim.

 

"Essa é a verdade!!"

 

"Não é!!" Comecei a chorar de novo, sentindo o par de lágrimas escorrerem desesperadas pelas laterais de minhas bochechas.

 

E então aquelas palavras incertas, abandonando meus lábios que tremiam, machucando a carne.

 

"Você nunca gostou de mim!"

 

Pude apenas fitar as esferas prateadas bem arregaladas, antes daquilo. Sua resposta fora em atos, os quais eu nunca me esqueceria.

 

Aquele punho forte, acertando-me tão subitamente na bochecha, tornando minha mente um branco.

 

Cambaleei para trás, tendo de me apoiar na parede.

 

Permaneci encarando o chão, sentindo o gosto de sangue em minha boca, perdido. Completamente perdido.

 

Aquilo não podia ser possível.

 

Ergui o rosto bem lentamente, completamente chocado, e Chanyeol encarava-me perplexo, tampando a boca com as mãos.

 

Não. Eu não conseguia acreditar. Ele havia batido em mim?

 

Não. Não podia ser.

 

"Pequeno..."  Aquela voz tão calma e tímida, querendo minha atenção, mas eu permanecia entorpecido.

 

Meus lábios permaneciam abertos, evidenciando meu choque. Eu simplesmente não conseguia crer.

 

 Chanyeol... Havia batido em mim...

 

Batido em mim!

 

Ele havia feito isso apenas uma vez durante nossa adolescência, mas não era nada que pudesse ser comparado com aquele soco.

 

Nada.

 

Fitei o ruivo aproximar-me lentamente, com o arrependimento evidente nos olhos prateados.

 

Aquela mão grande e trêmula tentou alcançar-me, talvez de maneiras muito mais profundas que apenas no toque.

 

Mas nunca iria permitir aquilo.

 

"Não encosta em mim!!" Gritei aquilo em meio ao choro, sentindo a voz sair aguda e cortada.

 

Chanyeol arregalou os olhos, agachando-se na minha frente.

 

E então aquilo. Lembro-me até hoje dessa cena.

 

O homem ajoelhado, de olhos fechados.

 

"Pode bater em mim."

 

O quê? Ouvi aquele pedido sem acreditar nas palavras.

 

Bater... Nele?

 

"Pode bater em mim Baekhyun!" Ele falava aquilo tão desesperado.

 

E eu não sabia o que fazer.

 

Uma parte minha permanecia chocada. Enquanto outra já iniciava aquele processo de raiva.

 

Como ele havia ousado descer a mão em mim? Eu estava tão bravo, tão bravo e incrédulo.

 

"Bate em mim, bate em mim, bate em mim."

 

E ele permanecia repetindo e repetindo aquilo.

 

O que eu faria?

 

Não sabia mais em que ponto da loucura havíamos alcançado. Completamente loucos e descontrolados.

 

Só sei que rebaixei-me até ficar em sua altura.

 

E com toda a força que possuía em meu corpo pequeno, acertei um soco em seu rosto.

 

Chanyeol nada disse, apenas fechou os olhos, permanecendo de cabeça baixa, esperando por mais agressões.

 

E essas continuaram a vir de minha parte.

 

Como ele havia conseguido me bater? Bater em mim!

 

Acertei um tapa em sua face, como se aquilo conseguisse livrar-me de todas as dores.

 

Mas quanto mais eu batia nele, pior eu me sentia. As coisas estavam dando errado, e não era só pra mim.

 

Mas acho que era algo tão caótico quanto aquilo tudo.

 

Não havia meios de curar aquela dor, que não fosse com a própria dor.

 

Já havia perdido a conta de quantas vezes havia batido nele, minha mão queimava muito, e ele permanecia ali, sem demonstrar emoção nenhuma.

 

E eu queria que ele falasse! Que me impedisse de continuar aquilo!

 

Ele queria o quê?! Que eu batesse em si, até ele desmaiar?

 

Eu não tinha tal poder. Fraco.

 

Era isso que eu era, sempre fui, até os dias de hoje.

 

A mão acertava, mas já não era tão mais pesada.

 

As lágrimas caiam e já não eram tão rápidas.

 

Tudo ia enfraquecendo-se.

 

Meu pulmão, falhando em respirar direito, em meio aquele choro compulsivo.

 

Apenas peguei em seu rosto já extremamente vermelho, marcado pelos meus próprios toques, levando as mãos novamente até ali.

 

Pronto para acertá-lo.

 

Porém, pois sempre existiria um porém entre nós, ele abriu os olhos, encarando-me com aquelas esferas prateadas, marejadas pelas lágrimas.

 

E por maior que fosse meu ódio, meu choque, minha indignação.

 

Aqueles olhos... Eu nunca conseguia resistir a eles.

 

Eu tentava e tentava, com uma força, e no fim, quanto mais desejava sair, mais preso ficava.

 

Quanto mais tentava esquecê-lo, mais o desejava para mim.

 

Loucura.

 

Eu sei.

 

Mas acho que só vivíamos disso.

 

Da nossa loucura.

 

Girando em círculos.Naqueles caminhos escuros e tortos.

 

E confesso que, agora, gostaria de falar um pouco sobre o abismo. Quero dizer, cada um de nós tem seus próprios abismos, e eu não era ninguém para julgar o de Chanyeol, mas quantas vezes, mesmo, já havia saltado ali? Acho que nem era mais humano, fusão de homem com bicho, quimera pronta para realizar seus desejos e cair nas armadilhas de seus jogos, pois era preciso ter asas quando se ama um abismo.

 

E naquele momento eu já não pude aguentar mais.  Envolvi sua face machucada em meus braços, trazendo- a para meu peito que subia e descia desesperado. Claro, existiam turbulências, pesadelos e ansiedade, no meu peito e fora dele, mas se eu morresse, era de amor, e se eu caísse, era em seu abismo.

 

"Me desculpa." Pronunciar aquilo fora algo tão involuntário. Eu simplesmente não conseguia machucar Chanyeol.

 

Se ele conseguia me machucar? Ótimo, que machucasse.

 

Mas doía fazer aquilo de propósito com ele, era impossível bater nele daquela forma. Não  pelo menos quando ele me fitava com aqueles olhos que mais pareciam a mais fina das pratas sendo derretida.

 

E eu, tolo, ansiava tocar essa prata, porém, ela era tão quente e eu não possuía luvas, nem técnica. Queria ser profissional nele, mas não era, essa só mais um sonso apaixonado.

 

"Desculpa Chanyeol." Murmurei.

 

Envolveu-me a cintura, enquanto eu afagava os cabelos vermelhos, e posso ensinar uma lição? Se a distancia fere e a saudade pede abrigo, todo o limite que elas ocupam, acaba-se no primeiro abraço.

 

Existe um limite para o quanto podemos ser idiotas nessa vida?

 

Porque se sim, já havia ultrapassado o mesmo fazia muito tempo, tempo talvez já suficiente para ele fugir para sempre. Mas acredito que só amamos aquilo que podemos perder e se não corresse sempre tal risco perante a si, talvez nem quisesse mais seu.

 

Ficamos naquilo durante minutos, e eu podia sentir seu choro tocando minha barriga, apertando-me e molhando o tecido. Suas costas que subiam e desciam, em soluços, em pedidos de "desculpa" abafados pelo meu casaco.

 

Afastei-me lentamente dele, fitando suas mãos ainda agarradas em minha roupa, sentando ambos no sofá.

 

Encarei aquele rosto já tão avermelhado, de olhos inchados, enquanto ele soluçava compulsivamente, também chorando.

 

Suspirei, tragando o ar, cessando minhas lágrimas durante poucos minutos.

 

Eu precisava me acalmar, por nós dois, quando só queria passar o recado, ao homem à beira de seus trinta, para que nunca se esquecesse de me olhar bem nos olhos, bem a fundo, e lembrar-se de sempre enfiar seus problemas dentro dos meus, sua vala dentro da minha vala, e sua dor dentro de minha dor.

 

"Vamos parar com isso, tá bom?" Minha voz era calma, tão calma que nem conseguia acreditar que era minha.

 

Às vezes ficamos tão acostumados com nossas partes ruins que quando as boas aparecem, a gente até estranha, perguntando onde as mesmas estavam durante esse tempo todo.

 

"Eu não vou mais bater em você, eu prometo..."

 

Fiz a promessa que sabia que iria cumprir, eu iria.

 

Não ia mais bater nele.

 

Chega. Só queria pedir desculpas por ser tal bomba relógio, pronta para explodir a qualquer momento, hoje ou talvez amanhã.

 

O ruivo apenas suspirou, tentando conter a água, limpando com os dedos as gotas que deslizavam rosto abaixo.

 

"Me desculpa, por favor, eu não queria Baek- "

 

"Shh, agora já foi." Peguei em suas mãos, ambas trêmulas, sorrindo com tanta dor no coração "Eu gosto muito de você Chanyeol, e eu acho que você sabe disso."

 

Ele maneou com a cabeça de leve, ainda perdido, fitando o chão.

 

"É só que não dá mais, sabe? Eu quero que façamos isso como adultos agora, tá bom?" Fez que sim, fungando, sem desviar os olhos daquele piso "Eu quero que a gente termine Chanyeol, e eu não quero que você volte mais aqui enquanto tudo estiver desse jeito, entendeu?"

 

Minha voz trêmula, saindo de forma complicada. E eu engolia a saliva, para impedir qualquer surto.

 

O ruivo apenas concordava, sem falar uma palavra sequer. Deixando-me naquele silêncio torturante.

 

E eu não sabia se ele realmente concordava, ou se estava falando aquilo apenas por falar.

 

"Não to dizendo que é pra sempre... Mas... Durante algum tempo, e-eu preciso de um tempinho pra mim, sabe? E eu acho que você também precisa pra você... Vamos acabar com isso da melhor forma possível, uh? O que você me diz?"

 

Ele suspirou, sem saber muito que dizer. Desviou os olhos do chão, encarando-me lentamente.

 

As lágrimas presas nas laterais dos olhos, e eu já não chorava mais.

 

"Me deixa passar essa noite com você, só essa noite, por favor."

 

Ri baixinho. Então era isso? Ele não iria me questionar? Não iria brigar? Ou tentar discutir sobre aquilo?

 

 Não fora amor a primeira vista, sim, sabia disso, mas sabia também que havíamos insistido no olhar, e que agora tinha a total consciência de que ele não me amava tanto quanto antes, mas céus, o que eu não daria para que pudéssemos ter aquele amor jovem de novo, ao invés de dois homens cansados e perdidos.

 

Mas não me preocuparia muito, afinal, quem não está perdido?

 

Ele havia realmente aceitado ir embora? E por que eu estava me importando com aquilo?

 

Afinal, quem mesmo queria que ele fosse embora? Precisei respirar fundo com aquele pedido.

 

Mas afinal, o que eu teria a perder?

 

Eu já nem era mais nada.

 

Apenas um ninguém.

 

Ninguém gosta.

 

Ninguém se importa.

 

Ninguém vê.

 

Ninguém ouve.

 

Ninguém quer.

 

Ninguém ama.

 

Para mim já estava claro. Chanyeol aparecia ali às vezes apenas por nada mais nada menos que dó.

 

Perguntava-me se era fácil.

 

Se era tão fácil assim, entrar na casa de alguém sem bater na porta, bagunçar toda a mobília e depois simplesmente ir embora levando as chaves.

 

Não sei. Mas devia ser algo bem fácil, quando não é com você. Quando é você que faz isso com os outros.

 

Como descrever?

 

Minha vida ali. Chata.

 

E então, em meio a todas essas pessoas tão chatas e sem graça, "ele" aparecera.

 

Não apenas isso.

 

"Ele" falou comigo. "Ele" tocou em mim. "Ele" beijou-me. "Ele" me fez seu.  E agora... "ele" ia embora.

 

Será que Chanyeol ainda era "ele"?

 

Ou será que Chanyeol era apenas "e", apenas "le", talvez?

 

Talvez Chanyeol já não fosse mais nada.

 

"Tá, tá, só essa noite." Suspirei, sem forças para lutar. Sem forças para argumentar.

 

Para mais nada.

 

Estava tão cansado que nem troquei de roupa, joguei-me com as peças ainda frias sob o colchão, sentindo o estofado macio receber meu peso, que não era muito.

 

Puxei as cobertas, pensando em como aquela noite de véspera de natal estava igual todas as outras.

 

Tão triste e melancólica.

 

Mesmo com sua presença.

 

Porém, seria a última noite que passaríamos juntos. E eu não fazia a menor ideia de como seria meu amanhã.

 

Acho que era tempo de mudanças. E precisava tirá-lo da minha vida, arranjar um emprego, conhecer novas pessoas, enfim, viver.

 

Deixar com que o tempo passasse e levasse com ele tudo àquilo que um dia já pude chamar de "nós".

 

"Me deixa dormir com você." Ouvi sua voz grave, enquanto o corpo grande aproximava-se, também trajando a roupa pós-banho, o moletom e a calça jeans de lavagem escura.

 

Não, eu definitivamente não queria fazer nada.  Não naquela noite.

 

"Chanyeol, eu não estou me sentindo bem para essas coisas."

 

Ele franziu o cenho.

 

"E quem disse que eu quero fazer algo? Eu só quero deitar com você."

 

Encarei aquele olhar profundo, mas não o sustentei, apenas pude suspirar, virando-me para o lado, deixando a outra metade do colchão para ele.

 

Não sabia por que ele queria tornar as coisas ainda mais difíceis. Não só para mim, mas para ele também.

 

Deitarmos juntos iria apenas me fazer pensar no quanto era gostoso dormir com ele, e vice e versa.

 

Não devíamos estar fazendo aquilo.

 

Senti o colchão afundar-se, e aquele cheiro tão conhecido chegar até mim, enquanto os edredons eram levantados, deixando o frio entrar ali.

 

Um frio que eu tinha certeza que se dissiparia da cama, entrando no meu coração.

 

Fechei os olhos com pressa. Precisava dormir. Dormir e ignorar que ele estava ali. E que seria a última vez que estaria.

 

Felizmente.

 

Conseguia escutar, em meio aquele silêncio da noite, sua respiração, e o quão próximo ela estava.

 

 E por mais que fosse difícil de acreditar, e eu não quisesse admitir, nas vezes que ele dormia comigo era quando eu conseguia ter o melhor sono.

 

Eu sentia-me calmo, com uma paz interior, uma segurança, como me sentira há tanto anos atrás, na primeira noite em que dormimos juntos.  E era tão bom... Apenas duas ou três noites por mês, mas já era o suficiente.

 

Droga! Eu não podia pensar nisso. Eu não podia me importar com aquilo.

 

Não podia mais importar-me com ele. Aquela rua sem saída que era Park Chanyeol.

 

Nem queria saber mais sobre seus segredos, era tempo de mudar, e eu mesmo estava me impedindo. Ao ponto de que era algo tão incrivelmente... Triste.  Me sentia vazio, era isso que eu sentia.

 

Sentia-me com um vazio no peito enorme.

 

Acho que ele estava tentando levar consigo todas as coisas que havia deixado ali dentro de mim.

 

Mas tudo que éramos já havia sido tão misturado... Era como se arrancassem uma parte gigantesca de mim.

 

Eu.

 

Que já era metade. Da metade. Da metade. Daquilo que ninguém quer.

 

 Eu.

 

 Que não andava, mas tropeçava pelos caminhos da vida.

 

Eu.

 

Que mesmo sem conseguir levantar. Mesmo sem forças.

 

Obrigava-me a ficar de pé e empurrar Chanyeol também.

 

Chanyeol, que já não era "ele".

 

Baekhyun, que já não era "eu".

 

Sentimento, que já não era "nós".

 

Não sabia como faria dali pra frente, ou se é que existia um "para frente", pois acredito que nunca aprendi de fato a dar passos sem a ajuda daquelas mãos grandes.

 

Em minha mente, desenvolviam-se flashs, de todos aqueles anos, de todos os momentos, todas as noites, os sorrisos.

 

E eu comecei a ponderar se estava mais apaixonado pelas memórias do que pelo homem deitado ao meu lado.

 

Martelei e martelei aquilo em minha mente, e no fim, nada conclui.

 

Abri os olhos, sentindo todo meu corpo entrar em choque quando aquela cabeça aproximou-se, encostando-se em minhas costas.

 

O cheiro de shampoo, e meus dedos tremendo, as pernas bambas. Aquela sensação, como se o colchão já não estivesse mais ali, e tudo parecesse flutuar.

 

Será que ele não havia entendido? Eu não queria mais contato.

 

Eu não queria sentir aquilo.

 

Pois sabia que iria ceder.

 

Ah! Que injusto. Morremos milhares de vezes nessa vida, para ainda ficarmos no fundo do poço fazendo questão de insistir em nosso vazio, ouvindo os vinis arranhados, bebendo a água pousada de noite, dançando mesmo sem saber que não existem pernas, nem musica.

 

E então... Aquelas mãos. Deslizando lentamente pelo meu corpo.

 

Primeiro apenas a ponta dos dedos, dedilhando minhas coxas, depois os quatro dedos, gélidos, entrando no pequeno pedacinho de pele que o moletom havia deixado escapar.

 

E os espasmos que aquilo causava. Como se queimassem onde tocavam, arrepiando-me.

 

Eu queria chorar. Por que ele estava fazendo aquilo?

 

Mas meus lábios não se partiam. Eu não falava.

 

Eu permanecia apenas ali, com os olhos bem abertos. Fitando a parede branca, mas sem prestar atenção nenhuma na mesma.

 

Eu permitia tudo aquilo.

 

Permiti com que aqueles braços deslizassem calmos, delicados, envolvendo-me o torso. Permiti que me apertasse as coxas, a tez, o coração, e quando dei por mim, seu corpo já estava colado ao meu.

 

Seu calor já era meu calor. Sua respiração misturava-se a minha. E seus batimentos cardíacos pareciam tão meus, éramos tão opostos que nos tornávamos similares quando juntos.

 

Seu caos ainda era meu cais.

 

Droga!

 

Naquele momento desejei nunca ter conhecido Chanyeol, assim nunca seria tão difícil de dizer um mero "adeus".

 

Hoje penso que isso é algo tão precioso. Termos algo na vida tão importante, que torna um "adeus" uma palavra mais que qualquer.

 

Uma palavra dolorida, cortante, uma palavra com vida.

 

Virei-me lentamente, mas bem lentamente mesmo, pois nem queria acreditar que estava virando.  Já empurrando o ruivo, pois precisava afastá-lo de mim. Não queria seus toques, muito menos sentir aquela carga de sentimentos que aquilo me proporcionava.

 

Mas acabei por encontrar com aquelas íris prateada e o brilho que adquiriam a noite.

 

Um brilho tão injusto.  Como tudo que acontecia comigo. Injusto.

 

Fiquei levemente perdido durante meros segundos. Perdido naquele seu olhar.

 

Um olhar que eu poderia passar dias e noites descrevendo para vocês, mas apenas eu poderia saber o que eram, de fato, aqueles planetas acinzentados e a forma em que brilhavam em seu próprio universo.

 

Quando voltei a mim, o que não demorou tanto, logo tornei a espalmar as mãos em seu torso, afastando-o.

 

Ou pelo menos, tentando.

 

"Chanyeol, eu não acho que seja-"

 

"É a última noite, certo? Então deixa eu te tocar... Uma última vez."

 

Uma última vez...

 

As três palavras costurando-se em minha mente.

 

A última vez que veria Chanyeol.

 

Que sentiria seu cheiro. O calor de seus toques.

 

Ah, aquilo era cruel.

 

Meu coração pulsando acelerado, e aquele bolo na garganta. Em que momento da vida eu havia me tornado tão fraco?

 

Eu precisava e queria que ele saísse da minha vida. O problema, ou melhor, um dos problemas, era que eu não falava o que pensava, nem fazia o que queria.

 

Minhas ações não condiziam com meus pensamentos, mas que atire a primeira pedra quem nunca relevou! Quem nunca chorou por alguma bobagem, sentou na calçada e mesmo com tantos pedestres indo e vindo, só deu espaço para você e sua tristeza. Quem nunca, nessa vida, olhou pra algo e mesmo sem motivo ficou ali, meio caído, meio pela metade, sem saber e sem querer saber. E enfim, eu era tão patético quanto todos, para desejar novamente aquele nosso inverno.

 

Mesmo sabendo que nenhum inverno é igual ao outro.

 

"Tá..." Suspirei, permitindo que aqueles braços envolvessem-me, e ele envolveram-me tão cuidadosamente e tão de pouco em pouco, tentado segurar cada parte de mim.

 

A temperatura daquele corpo grande era completamente irresistível, abraçá-lo era sempre algo surreal.

 

Por que era preciso uma despedida?

 

Foi o que comecei a questionar-me, mesmo que soubesse todas as razões, todos os motivos.

 

Eu sabia que aquela pouca felicidade que sentia, era momentânea, e quando acordasse, encontrando aquela casa vazia, tudo desabaria novamente.

 

Era uma coisa que talvez precisasse ser superada com apenas o poder do tempo, aquela dependência patética que possuía de Chanyeol.  Eu não iria morrer se ele não estivesse comigo, era só eu passar o dia inteiro fazendo as mais diversas atividades, com as mais diversas pessoas.

 

Mas quem queria enganar? No final, quando fosse deitar, ele ainda seria a primeira coisa a vir na mente.

 

Encolhi meus braços pequenos em seu torso, segurando o moletom negro e escondendo meu rosto naquele pescoço já tão conhecido. Num aquele cheiro já decorado,  a primeira coisa que senti após a energia densa que eram seus olhos prateados.

 

O cheiro amadeirado, penetrante e marcante, mas nem um pouco enjoativo. Seus dedos acariciavam minhas costas de baixo para cima, como ele sempre gostara de fazer, enquanto apreciava aquele seu perfume.

 

Deslizei minha mão até as madeixas macias, sentindo aquela textura conhecida.

 

Exatamente como gostava de fazer.

 

As respirações eram calmas, porque, bem, estávamos calmos.

 

Possuíamos essa capacidade, de conseguir acalmar um ao outro.

 

Da mesma forma em que conseguíamos nos enlouquecer.

 

Que fluxo terrível.

 

Foi o que pude pensar, enquanto acariciava seus cabelos em cafunés delicados, e qualquer um que visse a cena nunca iria acreditar que horas antes estávamos espancando-nos.

 

Sua voz grave soou contra meus tímpanos e eu desejei desaparecer.

 

"Ficar assim... É tão bom."

 

Só fique para sempre então.

 

Tive vontade de falar aquilo.

 

O que nunca aconteceria.

 

Apenas mais uma frase, mais um desejo, uma vontade, um sonho, esquecidos naquele pé atrás.

 

Esse pé atrás que, involuntariamente, sempre empurra a gente pra frente.

 

Maneei com a cabeça, esfregando minha face naquela tez quente do seu pescoço, porque concordava com ele, mas ao mesmo tempo sentia uma vontade enorme de gritar o quanto odiava aquilo.  O quanto odiava o fato de ele ter aceitado tão facilmente nosso fim, de não ter lutado por nós.

 

O senti afastar-se, soltando-me, e praticamente agarrei em sua roupa, não querendo quebrar o contato.

 

Patético, eu sei.

 

"Vem cá."

 

Chanyeol levantou-se do colchão, puxando-me pela mão.

 

"O que foi?" Permaneci confuso, levemente tonto por ter de sair da cama sem mais nem menos, enquanto ele nos levava até a entrada da casa, calçando seus tênis.

 

"Põe os seus também."  Franzi o cenho, colocando os calçados, enquanto o ruivo pegava uma touca na mesa, colocando a mesma em minha cabeça com cuidado.

 

Suspirei, esperando terminar de agasalhar-me. A porta foi destrancada e ele permanecia sem explicar-me aquilo tudo, fechando o apartamento logo em seguida.

 

Entramos nas escadarias e Chanyeol começou a puxar-me para cima, mas eu apenas recuei o braço, preocupado.

 

"Ficou louco? Ali é o terraço."

 

"Exato." Ele sussurrou, em meio aquela escada escura e insalubre "Já que isso vai terminar, vamos terminar onde começamos, no terraço."

 

Respirei profundamente com aquelas palavras.

 

Terminar.

 

Terminar.

 

Droga!

 

Era apenas uma palavra, ela não devia deixar-me aflito.

 

Esse é o problema dos sentimentos.

 

Eles dão significados às palavras.

 

E aí parece que elas deixam de serem apenas palavras e passam a virar outra coisa.

 

Algo muito maior do que eu ou ele poderíamos compreender ou nomear.

 

E já estava pronto para contrariá-lo sobre toda aquela loucura, quando o mesmo começou a subir os lances sem ao menos me esperar.

 

"Chanyeol!" Comecei a correr pelos degraus, tropeçando, tentando alcançá-lo, e quando vi a porta de ferro branca já fazia presente.

 

Meus dedos tocaram trêmulos a maçaneta enferrujada, tomando cuidado com o barulho, abrindo a estrutura pesada.

 

O vento gelado foi a primeira coisa que senti quando me vi naquele terraço amplo, sem grades, exibindo toda a cidade noturna ao nosso redor. Uma paisagem escura, pintada pelos pontos distantes, colorindo tudo, em todos os lados, distribuindo aquele espírito natalino.

 

Respirei afoito, fazendo com que aquele vapor escapasse entre meus lábios, enquanto eu caminhava lentamente em direção à figura já sentada tão mais a frente. A cada passo dado meu peito apertava-se mais, trazendo-me flashs dos anos no colégio.

 

Quando eu corria apressado para aquele lugar gelado, em busca de Chanyeol.

 

De seus toques. De seus beijos.

 

E agora lá estávamos nós, colocando um ponto final em toda nossa historia.

 

Não, eu não podia me arrepender.

 

Sentei-me ao seu lado, quando finalmente vi-me ali, permitindo que meus olhos observassem toda aquela cidade iluminada, as luzes coloridas espalhando seus brilhos mágicos, refletindo as lamparinas rosa perante minhas íris.

 

Suspirei, inundado pelo sentimento bom que a paisagem trazia, a magia nada mágica que vinha carregando o dia de amanhã.

 

Levei de soslaio os olhos até o ruivo ao meu lado, encontrando aqueles orbes prateados já fixos em mim, como se mirassem as profundezas de minha alma.

 

Engoli seco, voltando meus olhos para o os prédios longínquos.

 

Ficamos em silêncio, durante muito e muitos minutos. Apenas sentindo o vento gelado que batia contra nossos corpos e os flocos de neve que caíam do céu estrelado.

 

Será que dali, não sabia, duas semanas, estaria novamente naquele terraço, só que dessa vez, só?

 

Será que deitaria naquela cama, sempre sozinho?

 

Jantaria sozinho? Mesmo sabendo que tinha apenas dois pratos?

 

Iria ao bar sozinho? Causando piedade nos garçons?

 

"Eu queria que amanhã nunca chegasse..."  A voz pronunciada naquele silêncio, em meio ao vento gelado, era tão semelhante a de nove anos antes.Tão igual.

 

Não lhe respondi, pois não queria saber se aquilo estava sendo difícil para si, mais do que já estava sendo para mim.

 

 E a única coisa que precisávamos fazer era aceitar.

 

Aceitar que existiam coisas que não queríamos que acontecessem. Mas elas aconteciam.

 

Era só que... Ele já segurava muito de mim. E eu segurava muito dele.

 

Como duas bebidas distintas em apenas um copo só, já não eram mais distintas.

 

Aquilo era uma despedida, uma verdadeira despedida e eu nunca pensaria passar a véspera de natal despedindo-me de ninguém mais, ninguém menos, que ele.

 

O homem que eu amava, mas acima de tudo, meu melhor amigo.

 

E acho que isso era o que mais doía. Pensar em minha vida sem ele ali. Por mais que o visse apenas duas vezes por mês.

 

E naquela... Falta.

 

Porque, no fundo, eu não queria me despedir. E eu sabia que ele também não. Mas havíamos chego a tal ponto que "adeus" era a única saída para nós.

 

Eu ainda gostava muito dele. De verdade, eu realmente gostava dele.

 

E era por isso que precisávamos terminar aquilo enquanto ainda gostávamos um do outro., enquanto ainda nutríamos certa afeição e estávamos presos aos bons momentos.

 

Pois seria pior se continuássemos com algo que certamente sairíamos odiando um ao outro, apenas reclamando sobre o que já nos fez sorrir durante muitos anos.

 

Quem sabe nosso “amor” apenas não estivesse preparado para o presente.

 

Talvez Chanyeol não estivesse pronto para mim, muito menos eu para ele.

 

Mas quem sabe no futuro estivéssemos? Quem sabe... Bem lá, anos depois de tudo aquilo, nós não pudéssemos ficar juntos?

 

O que ele pensava disso?

 

Encarei toda aquela cidade grande, toda a metrópole que não fazia ideia da cena que protagonizávamos, tragando saliva.

 

"Promete que se tudo mudar, você volta pra casa?" Soltei a pergunta no ar, apertando com pouca força as beiradas de meu casaco, sentindo o vento gelado adentrar minha pele por debaixo dos tecidos.

 

Ele fitou-me de soslaio, suspirando, mas antes que o ruivo pudesse falar qualquer coisa, cortei-lhe.

 

"Mas só promete se for cumprir." Ele estalou levemente a língua, tornando os olhos para mim.

 

"Não posso prometer o que não sei se posso cumprir..."

 

Suspirei.  Pelo menos ele fora sincero...

 

E então o silêncio reinou novamente.

 

Possessivo, apossando-se de nós, impedindo qualquer som durante bons minutos.

 

Eu estava com sono, querendo voltar para os edredons, de onde não devíamos ter saído, mas precisava ficar acordado, bem acordado, aproveitando até o ultimo segundo que possuía ao seu lado.

 

"Baekhyun..." Ouvi meu nome ser chamado pela voz calma e grave, sem saber o que pensar, o que dizer, nem como agir.

 

"Sim?" Virei o rosto, encontrando sua face tão próxima a minha, que fora necessário um leve recuo de minha parte.

 

Mas ele me impediu, segurando em minha mão com malacia.

 

E as palavras suaves.

 

"Eu vou te beijar."

 

Arregalei os olhos com aquilo, mas quando dei por mim, seus lábios já estavam nos meus.

 

Não era um pedido.

 

Após mera reflexão e reluta ao que estava acontecendo ali, apenas suspirei internamente, decidindo ceder.

 

Seria nosso ultimo beijo, que mal haveria?

 

Deslizei meus dedos pelo agasalho, traçando um caminho até os cabelos avermelhados, embrenhando os membros finos ali, sentindo a maciez eterna dos mesmos.

 

Adorava segurar em seus cabelos, lembrava-me que ele realmente estava ali.

 

Sua língua envolveu a minha lentamente, quase que a convidando para o ósculo, enquanto podia sentir os lábios levemente rachados moldando-se aos meus, pressionando as carnes avermelhadas.

 

Era tão incrivelmente perfeita a forma que sua boca moldava-se a minha, abraçando-se naquela forma sublime.

 

Aquele calor característico aqueceu-me o peito, enquanto pude sentir sua mão caminhar até minhas costas, repousando ali.

 

E a forma que repousou, em um pedido mudo.

 

Segurei-o mais fortemente pelas madeixas, puxando-as entre meus dedos, sentindo o órgão quente e molhado explorar minha cavidade úmida a procura de um lar, causando-me espasmos.

 

A língua sempre macia, e o seu sabor, que era o mesmo há anos.

 

Mas eu gostava.

 

Minha mão livre formigava, ansiando tocá-lo, mas não podíamos. Eu não podia, eu devia me controlar. Céus, eu era um homem, e acredito que só um homem é capaz de entender a forma bárbara que tocamos as coisas, a profundidade imensurável e impetuosa que nos envolvemos em um toque.

 

Rompi o contato lentamente, como se sua boca desprendesse-se em temerosos segundos da minha, causando um estalo no silêncio natalino.

 

Fitei aqueles orbes prateados semicerrados, como se aquele brilho que emitiam apenas em momentos como aquele, pudesse ser salpicado pelo colorido das luzes distantes, e droga, seu rosto de sobrancelha franzidas, seus lábios de suspiros nada contidos... Droga.

 

Fechei novamente minhas pálpebras, como se as fechasse pela eternidade, enquanto arrepiava-me com seu toque quente em meu pescoço, unindo as bocas em um pequeno selo, em uma mordida, antes de finalmente moldar ambas ao nosso modo.

 

Com a mão que segurava em seus cabelos, apenas apertei ainda mais forte as madeixas, agressivo, enquanto a outra semelhante deslizava até sua coxa intacta, apossando-se do local, provocando seu corpo quente.

 

Nossos rostos tombando, movimentando-se sem ritmo ou coreografia, enquanto as línguas abraçavam-se confidentes daquela cena lamentável que se protagonizava, explorando um pouquinho mais das bocas, um pouquinho mais de nós.

 

Um pouquinho que na verdade era um montão.

 

Queria guardar seu sabor e quem sabe assim, poder um dia acreditar que aquele gosto adocicado tornaria a invadir meu paladar, aguçando o terceiro sentido.

 

Fora sua vez de separar as bocas, respirando sôfrego, enquanto eu fincava as unhas em sua perna, ansiando por mais contato, pelo seu corpo, pelos seus toques.

 

Lamentavelmente.

 

Ele fitou-me entre aqueles poucos centímetros que afastavam nossos rostos iluminados pela luz dourada, como de brincássemos de ciclope entre o roçar dos narizes, perante toda aquela capital movimentada, iluminada, cúmplice de nossas atitudes moldadas em meias coragens.

 

"Vem cá." Ele abriu os braços, e eu apenas fiz que não, pois sabia que não teria coragem para negar aquilo em voz.

 

O fato era que, olhando-lhe cara a cara, era impossível dizer que não o amava.

 

"Deixa eu te tocar..." Aquela voz sussurrando aquilo, naquele tom, naquela situação. Deslizando as mãos por toda a extensão de minhas costas.

 

Eu queria desaparecer.

 

"Não..." Murmurei a palavra maquiada, sem desviar os olhos, sem hesitar, e quanto mais aqueles lábios roçavam-se aos meus, e a respiração masculina pesada batia soprada contra meu rosto, mais eu desejava-o.

 

Apenas para mim.

 

E então... Aquele jogo sujo...

 

Tudo aquilo que eu menos desejava, pois vivia a cair em seus encantos...

 

"Eu te conheço mais que qualquer um..." Aqueles lábios escapando fugitivos até meu pescoço, selando a pele com ternura, obrigando-me a prender todo aquele ar dentro de mim.

 

Meu ponto fraco. Mas e o dele?

 

Os dedos embrenhados nos fios cor de sangue escorregaram até a nuca desprotegida, arranhando com as unhas bem cortadas toda a tez, observando seus olhos fecharem-se, atordoados, levemente excitados.

 

Ele podia até conhecer-me muito bem.

 

Mas eu também o conhecia.

 

Prendemos os olhos um ao outro, naquela troca de pupilas lenta e torturante, como se nada mais acontecesse ao nosso redor.

 

“Você é meu.” Ditei firme.

 

Ele piscou inocente apenas duas vezes, pude contar, fitando as bolsinhas moldadas em seus orbes, e então os comprimiu, levou sua mão grande até minha cintura, envolveu a carne em sua palma e me puxou com força para si.

 

E naturalmente, porque a vontade já era extremamente absurda, subi em suas pernas, sentindo suas seus dedos acomodarem-me ali.

 

Que vergonha eu teria?

 

Todos os meus sentimentos mais patéticos.

 

Ele já havia saboreado cada bombom daquela caixinha que eu era.

 

Ele abraçou-me e eu passei meus braços pelo pescoço magro, enquanto meus olhos ainda buscavam as luzes da cidade decorada.

 

Joguei as pernas para o lado, sentindo o vento gelado atingi-las, eriçando os pelos.

 

Apenas querendo fitar aquela imensidão cor de rosa, alaranjada, que talvez fosse para fingir que nada daquilo estava acontecendo.

 

Sentia seu coração pulsando ritmado ao meu, fungando aquele cheiro que só ele possuía, sem ao menos lembrar-me de que seria a última vez que o sentiria.

 

Aquilo tudo parecia tão... Surreal. Senti seus braços apertarem-me forte, como se segurassem algo de valor.

 

Algo que o dinheiro não compra...

 

E o jeito que fazia aquilo, a maneira em que as mãos tocavam, era algo completamente prazeroso.

 

Não queria emocionar-me ali. Mas estava tornando-se impossível.

 

"Eu gosto tanto de você... Tanto." Aquelas palavras murmuradas tão delicadamente, enquanto me embalava rente a seu peito.

 

Céus! Eu sentia que poderia morrer ali mesmo.

 

Apenas com aquela frase provavelmente pronta, eu já nem sabia mais.

 

Só sabia que eu era fraco e gostava disso. Desvencilhei-me de si, ainda com suas mãos possessivas em minha cintura, e coloquei a mão no bolso, tirando de lá os colares.

 

Já era natal.

 

"Aqui, eu acho que eles merecem ser usados." Murmurei.

 

"Mas estamos-"

 

"Eu sei que estamos terminando, só quero que guarde o seu e eu vou guardar o meu."

 

Chanyeol pensou durante breves instantes, enquanto eu erguia os dois pingentes com as correntes, em frente as nossas faces.

 

Ele maneou com a cabeça, pegando nos dedos um deles, abrindo com cuidado a correntinha.

 

Deixei com que ele, lentamente, passasse a mesma pelo meu pescoço, tardando em fechá-la.

 

Era algo levemente engraçado, porém, tão triste.

 

"Parece até que estamos nos casando."

 

Ele riu baixo e eu fiz o mesmo, enquanto colocava o colar nele, encarando aquele pingente da cor de seus olhos.

 

E aquele vermelho carmesim, maravilhoso.

 

Estava lindo.

 

Combinava com ele.

 

"Eu gostaria de ter me casado com você... Pena que você escolheu outro caminho..." A voz saindo num fio e sua expressão fechando-se.

 

Ficamos em silêncio até eu tornar a esconder meu rosto na curvatura de seu pescoço, desejando que os minutos passassem mais lentamente.

 

Que pudesse apenas voltar o horário, os ponteiros do relógio.

 

Aquele era realmente nosso ultimo dia juntos?

 

Surreal era a palavra certa.

 

O por do sol já nascia.

 

Sim, era natal.

 

E meu presente era nossa separação.

 

Não. Não podia realmente ser.

 

"Você não vai embora amanhã, não é?"  Minha voz era baixinha, carregada pelo cansaço, ainda tentando fazer presente o sentimento reprimido.

 

Mas ele nada disse.

 

"Você vai ficar aqui comigo, certo?"

 

Silêncio, e pensei ouvir aquela voz grave sussurrar baixinho.

 

"Eu vou."

 

Não sabia o que dizer, apenas sentia o sono pesado abater, acreditando naquela brincadeira.

 

Fui fechando os olhos, e fechando, ainda com a mão em seu moletom quentinho.

 

E a única coisa que lembro era de ter visto o sol ao longe e me perguntar o porquê do esquecer.

 

Por que esquecemos que o sol nasceu para se por?

 

Que os flocos de neve são feitos para derreter?

 

E que borboletas morrem?

 

Que balões explodem.

 

Que nuvens se dissipam.

 

Que chicletes perdem o gosto.

 

E no fundo, bem no fundo, nada dura para sempre.

 

Não sei.

 

Às vezes eu ficava feliz.

 

Às vezes eu ficava triste.

 

E quando adormeci no calor dos seus braços, sentia-me dois ao mesmo tempo.

 

Tristemente feliz? Ou feliz tristemente?

 

Não sei.

 

Nunca saberia.

 

Como sempre...

 

Eu nunca saberia.

 

 

 

 

 

X

 

 

 

 

 

Lembro que quando fui abrir os olhos lentamente, na manhã do dia seguinte já os arregalei de cara. Assustando-me ao ver que estava deitado no colchão.

 

Mas logo a calma apoderou-se do corpo ao lembrar-me da noite anterior, dos momentos compartilhados no terraço.

 

Provavelmente ele havia me carregado até ali.

 

Sentei-me sob o estofado, espreguiçando animado, procurando o ruivo com os olhos, mas não achando o mesmo.

 

Devia estar no banheiro, como era costume de manhã, escovando os dentes ou tomando uma ducha rápida.

 

Podia sentir seu cheiro nas almofadas, tão gostoso...

 

Ainda sorrindo, peguei entre os dedos o colar que repousava sob meu agasalho, preso ao pescoço.

 

Tão extremamente bonito... Vermelho e prateado... Tão Chanyeol.

 

Ah, eu estava completamente animado, queria sair correndo para abraçá-lo.

 

"Grandão! Hoje é natal!" Pulei do estofado animado, tropeçando em alguns tênis jogados, indo em direção a cozinha, mas ao adentrar a mesma, não vi nenhum sinal de Chanyeol.

 

Fechei os lábios.

 

Estranho.

 

Muito estranho.

 

"Grandão?" Caminhei por ali, indo ao banheiro logo em seguida.

 

Vazio. Onde ele havia se metido?

 

Arregalei os olhos ao passar pela mesa, fitando uma folinha dobrada.

 

Meus dedos trêmulos alcançaram o pequeno papelzinho branco ali, desembrulhando o mesmo.

 

Um... Bilhete?

 

Li seu conteúdo.

 

E preciso dizer que aquele homem me matou duas vezes, na primeira, quando disse "eu te amo", e na segunda, quando disse "adeus", para que em meio ao natal, fosse-me ao chão.

 

Compreendendo uma das coisas que o dinheiro jamais poderia comprar...

 

A presença.

 

 

 

"Quero que seja livre pequeno, principalmente de mim."

-Chanyeol

 

 

 

 

"A vezes você precisa se afastar das pessoas que você ama.

Mas isso não quer dizer  que você as ame menos

As vezes quer dizer você as ama ainda mais"

-The Last Song

 

 


Notas Finais


eai pessoal? Gostaram?

só passando pra dizer que cap que vem tem ALTAS TRETAS, é enoooorme, e não prometo atualizar rápido :3 hehe

por fim, quero desejar um feliz natal! para todos os leitores e leitoras, vocês são incriveis, as vezes, chego até mesmo a pensar que vocês são tudo que eu tenho, muito, muito obrigada por terem me apoiado durante todo esse tempo, terem comentado, dado seu esforço mesmo que seja para um "gostei", vocês são incriveis e são a força que move cada dedo que digita essas palavras. MUITO OBRIGADA, espero que em 2016 todos nós possamos ter um ano melhor, repleto de risadas, piadas cancerigenas de kpop, sucesso, dinheiro, amor, crushs, e mais fanfics! AMO MUITO CADA UM DE VOCÊS <33

Até o próximo.

~Moon


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