Eu lembro que naquela tarde especial de outubro, era a quinta vez que ele ia na minha casa com aquela desculpa de amizade – e deve ser por isso que minha mãe gosta mais dele do que de mim. Sicheng mexia no meu computador que nem um louco, e eu só observava de canto de olho enquanto tocava algumas cordas do meu violão velho, aquele mesmo violão que ele quase quebrou semanas depois, e comprou um monte de palhetas coloridas e uma barra enorme de chocolate meio amargo como desculpa. Foi ai que eu descobri o quanto eu o odeio.
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– Eu acho que ninguém nesse mundo se sente do jeito que eu me sinto sobre você. – ele disse perdendo o foco do teto de madeira do meu quarto e olhando pra mim. Estávamos deitados no tapete felpudo, depois de um trilhão de discussões sobre qual é o melhor álbum do Michael Jackson, mesmo sabendo que a gente nunca vai chegar num acordo. Eu olhei pra ele e me segurei pra não vomitar toda a preciosa comida vegana que eu tinha ingerido hoje.
– Parafraseando Oasis? Assim, na cara dura? – eu comecei falando e ele começou a dar risada, fechando aqueles olhinhos preciosos e enchendo o cômodo com aquele som angelical que era a risada dele. Eu cheguei mais perto e continuei. – Se eu soubesse que a gente ia ficar assim, com você falando essas coisas, desse jeito, logo aqui no meu aconchego, eu não tinha nem te dado uma chance, você sabe o quanto eu odeio Oasis.
Ele continuou rindo, mas dessa vez parou pra me olhar e riu de novo, e eu quase me pela centésima, milésima, sei lá, já perdi a conta.
– Talvez você seja aquele que vai me salvar – ele falou me puxando pra perto, encostando o nariz no meu, fazendo um carinho singelo e intimo. – Tem muitas coisas que eu queria te falar, mas eu não sei como. – Eu sorri mesmo com a confissão idiota e roubada da música mais clichê do mundo. Ele encostou os lábios nos meus ouvidos e continuou falando com aquela voz grossa, que insistia em me deixar todo fraco mesmo depois de anos. – Eu disse que, talvez você seja aquele que vai me salvar.
– Não aguento mais você, viu? – falei tentando me afastar da tentação com cheiro de menta e vinho tinto que estava grudado em mim, recitando Wonderwall. Ele riu da minha cara mais uma vez naquela noite, e me puxou pra perto juntando nossos lábios. Sicheng tinha gosto de menta e coca cola. Ficamos ali, apenas com os lábios colados, sem legitimar aquele beijo, só aproveitando as sensações.
– Kun. – gemeu meu nome após partir o beijo. Foi a primeira coisa que ele disse que não era uma letra do Oasis.
– Sicheng. – eu respondi, olhando-o nos olhos com toda sinceridade que o meu amor por ele pode ter.
– You’re my wonderwall.
– Eu te odeio. – e o beijei novamente, cansado de fingir que o fogo no meu coração tinha apagado.
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