Eu sabia que estava acontecendo alguma coisa quando recebi uma ligação do Monster. Não atendi, pois estava no meio de uma transmissão, mas minutos depois eu vi a chamada perdida. Tentei ligar logo em seguida, mas não consegui falar com ele; todas as minhas tentativas foram para a caixa postal, e isso se estendeu durante todo o dia.
Já estava imerso num poço de desespero quando - finalmente - recebi sua ligação à caminho do shopping. Eu esperava por uma notícia ruim, ou no caso, uma confirmação. E ela veio; ele queria falar sobre Dae, mas eu o cortei e preferi não ouvir o que já sabia. Desnorteado, segui por todos os cantos do shopping a procura das duas, mas o único que encontrei foi o carro da Em aberto no estacionamento escuro e vazio.
Eu surtei; eu gritei; eu me machuquei mesmo estando totalmente imóvel e silencioso ao lado do veículo. Interiormente morria aos poucos.
Durante as seguintes horas, me perguntei mentalmente inúmeras vezes de onde surgiu tanta força e autocontrole. Logo eu que surto por coisas pequenas, estava sem reação, sem expressão e nenhuma atitude. Na verdade, não sei dizer se isso é força ou fraqueza. Cadê o justiceiro que eu costumava ser? Justo agora eu tinha que ser assim?
Normalmente eu estaria movendo o céu e a terra por elas, mas por alguma razão eu não consigo sair do lugar. Algo dentro de mim diz que qualquer ação que eu tome será inútil, em vão. Talvez seja o medo por um desfecho ruim que esteja dizendo tais coisas.
Isso. O medo me paralisou.
Pelo o clima estar pesado e nossas expressões denunciarem todo a nossa aflição e nervosismo, minha avó decidiu levar as crianças para passear. Essa foi uma boa ideia. Eu já não aguentava mais ouvir os dois perguntarem pela Em e dizer que a queriam ali naquele exato momento.
Assisti os três saírem pela porta da frente e me dirigi até a cozinha. Me sentei em um dos bancos da ilha e me servi um pouco de café. Segurei o copo com as duas mãos e fechei meu olhos enquanto bebi pouco a pouco; senti a bebida me aquecer por dentro e com isso uma sensação de tranquilidade se manifestar. Suspiro. Relaxar por um segundo me faz pensar em algumas atitudes que posso tomar. O Monster está aqui e agora pode me ajudar a encontrá-las. Como? Eu não sei. Até os policiais, com toda a tecnologia e meios para rastrear uma pessoa, não conseguiram nada. Tenho que pensar em algo.
Voltando para a sala, meu olhar se encontra com o do Taehyung, que está com a cabeça repousada sobre os ombros do Hoseok. Seu rosto está umedecido pelas lágrimas, estas que ainda caem incessantemente. Me sento no sofá sem cortar o contato visual com ele, e nesse olhar encontro súplica por uma atitude minha. Sinto um peso cair sobre mim, então desvio o olhar. Ele sabe muito bem que estou com as mãos atadas e que por hora não posso fazer muita coisa. Eu quero fazer, mas o que-
__ Finalmente, finalmente. - um policial falou, chamando a minha atenção e cortando os meus pensamentos. - O sinal do celular da Sojin está vindo da estrada Roseville, sentido Lancaster.
__ Avisem todas as unidades e mandem um helicóptero também. Todos para lá, agora.
Esse é o meu momento! Saber a localização delas é mais do que o bastante para eu fazer alguma coisa.
__ Eu vou com vocês. - digo firme, me sentindo um pouco mais vivo e capaz. Sigo 4 policiais até a porta, mas um deles me segura pelo braço e me força a parar.
__ Não, é muito perigoso! Você tem que se acalmar e esperar aqui.
Nossa, isso é sério? Como ele pode pedir a minha calma e querer que eu espere aqui QUANDO EU SEI AONDE ELAS ESTÃO? eu fiquei até agora com os braços cruzados esperando que algum deles fizessem algo, mas agora é o momento de fazer as coisas com as minhas próprias mãos. Eu não aguento mais.
A raiva acumulada em mim se faz presente quando, ao tentar sair do aperto de um com uma certa rispidez, outro policial veio e me apertou com mais força. Idiotas! Eles não podem fazer isso.
__ EU NÃO POSSO SEGUIR ESPERANDO! EU NÃO AGUENTO MAIS ESPERAR POR UMA NOTÍCIA QUE NÃO VEM. - gritei, e me livrando dos dois, chutei a mesa de centro.
Me sinto tão impotente, tão inútil. E pela primeira vez no dia me permiti chorar. De raiva, desespero, raiva, medo, mais raiva...
__É a minha mãe e a minha namorada. E-eu preciso fazer alguma coisa. Deixe-me ir com vocês.
__ Yoongi, não podemos colocar outra pessoa em risco. Por favor, entenda.
Eles não tem ideia do quanto posso me cuidar e acabar com isso sozinho. EU MATEI PESSOAS e posso muito bem matar mais uma e resgatar outras duas. Tsc. Quem ficará em risco?
É um saco não poder dizer isso e me provar.
*
Taehyung subiu para o seu quarto e ainda não voltou. Isso já tem um tempo.
Quando os policiais que estavam em Lancaster ligaram dizendo que na cabana não havia ninguém, e sim apenas o celular da minha mãe, ele subiu enfurecido e ignorou os meus chamados. Sim, eu estava bravo e aflito tanto quanto ele, mas por estar um pouco mais controlado, quis tranquilizá-lo de alguma forma. Não funcionou. Ele me deixou de lado e até mandou o Hoseok ir. Bom, foi o que pareceu, já que o mais velho saiu sem dizer nada.
A polícia que ainda está aqui segue fazendo ligações e tentando inutilmente encontrar alguma pista. Puft, isso é vão. A única chance seria o sinal do celular da minha mãe, mas como já sabemos que isso foi um truque para perdermos tempo, agora não há outro meio. Eu queria muito que ele ligasse e pedisse dinheiro, sei lá, mas sei que isso está fora de cogitação. Ele quer nos torturar, quer brincar com a gente! Mas até quando? Já se passaram mais de 24 horas e não há uma mínima luz para nos guiar, para seguir. É agoniante esperar pelo nada.
Monster acabou de mandar uma mensagem. Ele estacionou no início da rua e está a espera de uma resposta minha para agirmos. Argh, eu não consigo pensar em nada. Vou conversar com o Tae, quem sabe algo surge.
Deixo a sala e sigo para a escada. Subo cada degrau com muito desânimo, e minhas mãos nervosas que parecem ter vida própria, puxam algum fios do meu cabelo afim de aliviar a minha tensão. Caminho pelo corredor e paro por um instante para responder o Mon.
__ Você deveria pensar em algo também. Me ajuda! Nessa situação nem consigo pensar.
Me aproximando do antigo quarto do Tae, o ouço falar ao telefone. Penso duas vezes antes de escutá-lo atrás da porta ( sei lá, pode ser o Hoseok), mas o seu choro e os seus passos me fazem parar ao lado da porta.
__ Aonde você está? - o ouço dizer.
Será que é Hoseok? Só pode! Ele saiu já faz um tempo e até agora não voltou...
__ Eu não vou.
Ao dizer isso, o escutei jogar o celular no chão. Pelo jeito eles brigaram...
Ameaço sair do lugar, mas ao ouvi-lo cair no chão, fico ereto e atento. Seu choro carregado de dor agora é a única coisa que ouço. Devo entrar e ajudá-lo? Conversar, talvez...?
__ Taehyung, você não pode contar para a polícia! Seja forte e acabe com isso. Salve as duas mesmo que isso custe a sua vida.
Me agarro a parede para não cair e tento assimilar o que ouvi. Não, não...não pode ser o que estou pensando. O que isso significa? E-ele falou com o maldito do Dae e vai até eles? E pretende não contar a ninguém? É isso mesmo? Esse moleque é idiota!
__ Eu vou acabar com isso. Eu vou. Não preciso ter medo daquele maldito.
Levo minhas mãos à boca e impeço que algum xingamento saia. Droga, ele vai fazer isso. E agora? O que eu faço?
__ Monster, o maldito entrou em contato com o Taehyung, e pelo jeito esse idiota irá atrás dele. Eu escutei tudo atrás da porta. O que eu faço?
__ Não fala nada. Vamos segui-lo.
__ E quanto a polícia? Não é melhor contar?
__ Se ele ligou somente para o Taehyung, é provável que o tenha ameaçado e dito para não avisá-los. Não vamos arriscar. Venha logo, a viatura que estava aqui acabou de sair.
Quando ouço barulho vindo da maçaneta, dou uns passos para trás. Alarme falso, ele não saiu. Respiro fundo e faço a minha melhor cara de tédio antes de voltar pra sala. Me sento ao lado do meu tio, que está quase cochilando, e espero Tae descer, o que não demora muito a acontecer.
Ele me olha com um certo desdém e segue rumo à entrada principal. Esse idiota disfarça tão bem quanto eu. Resolvo perguntar aonde ele vai, e com um tom carregado de desinteresse, diz que irá comprar analgésicos e tomar um ar. Mentiroso.
Assim que ele cruza a porta, não espero muito e vou também.
__ Vai aonde? - meu tio pergunta meio sonolento e aéreo.
__ O Tae vai na farmácia, vou pedir para que ele traga remédios para mim.
Ele dá de ombros, assim como os outros policiais, então saio da casa. Corro o máximo que posso quando o vejo montado na moto pronto para fechar os portões, e assim que o atravesso, Mon estaciona o carro e abre a porta pra mim.
__ Cadê ele? Para que lado ele foi? - pergunto afobado enquanto brigo com o cinto de segurança.
__ Ele virou a esquerda. Alguém notou alguma coisa?
__ Eu acho que não. Devem ter acreditado na desculpa dos dois.
__ O que o Taehyung disse?
__ Que ia na farmácia. Por favor Monster, acelera um pouco mais.
__ Já estou ultrapassando a velocidade permitida. Espere quando cairmos na rodovia.
Abracei o meu joelho e mantive o meu olhar fixo na moto preta que está um tanto a nossa frente. Vez ou outro o perdemos de vista por causa dos outros veículos, mas logo ele aparece no nosso campo de visão. Tae corre como um louco.
__ Você trouxe o seu celular? - pergunta sem tirar os olhos da estrada.
__ Não. É certo que eles iriam me rastrear também.
__ Que bom! Olha ai atrás; trouxe algumas armas, uma boa quantidade de balas, faca, um kit de primeiros socorros...
__ É provável que ele as tenha machucado. - digo mais pra mim do que pra ele. Cerro os punhos e tento não pensar no que aquele maldito fez a essa altura.
Como as coisas estão no banco de trás, começo a mexer em tudo e a colocar balas em algumas armas.
__ Não mexe nessa caixinha. Há duas granadas prontas.
__ Você é doido? Por que trouxe isso?
__ Quando tirarmos as duas de lá, prenderemos o infeliz na casa e deixaremos que ele exploda. É mais rápido.
__ É, pode ser. Mas temos que impedir Taehyung de encontrá-lo primeiro.
__ Não se preocupe, agora iremos voar.
Dito isso, saímos na rodovia e, como prometido, Monster acelera e segue a velocidade do Tae, que passou a correr mais também.
__ Será que ele está armando algo? Por que ele foi ligar a essa hora da noite?
__ Temos que ficar esperto.
Atentos em Taehyung, entramos na saída 23 sentido San Diego. Cansado de balançar minhas pernas e roer minhas unhas, ligo o rádio e tento me distrair com as músicas que tocam. Monster mantém o olhar fixo e o semblante tranquilo, diferente do meu que está carregado de aflição e nervosismo. Tapo meus olhos com as mãos por um momento e respiro fundo, sendo tomado pela adrenalina e ansiedade de acabar logo com isso. Eu vou poder fazer alguma coisa. Eu vou acabar com ele, finalmente.
Uns quilometros depois, uma placa iluminada bem mais a frente chama a minha atenção, e ver que Taehyung diminui a velocidade me põe alerta.
__ Ele deve estar indo comprar alguma coisa, ou então vai usar o banheiro.
Monster diz e diminui a velocidade na medida em que nos aproximamos. Ele para o carro numa distância segura, e Tae desce da moto e entra numa loja de conveniência.
__ Droga, chuva não.
Alguns pingos caem, mas nada muito forte ou que vá atrapalhar. Bom, pelo menos por enquanto.
Não demora nem 3 minutos para Tae voltar. Antes de subir na moto, ele olha pro céu e parece chorar.
Minha vontade é de correr até ele e abraçá-lo forte.
O que será que Dae disse a ele? O que o fez tomar essa decisão de vir sem dizer nada a ninguém? ELE NÃO CONFIOU EM MIM! Por que ele teve que ser tão imprudente? Ele não precisava carregar isso sozinho.
Voltamos para a estrada quando ele volta também. Para a nossa sorte, há vários carros na estrada, então é bem provável que ele não tenha desconfiado de nada. A hora passa, assim como a estrada e a paisagem que não muda. Eu conheço San Diego muito bem, mas essa estrada era desconhecida até então. Não tem muitas coisas além de árvores, pastos vazios e luzes de algumas residências bem distantes.
E finalmente chegamos a algum lugar. Tae novamente diminui a velocidade e parece pensar para qual estrada de terra seguir. Um carro entra no lado direito, e ele entra no lado esquerdo. Mon o segue, mas para em frente a uma casa bem no início da estrada.
__ Por que você parou? Iremos perdê-lo de vista!
__ Não se você correr. Seguir de carro levantaria suspeitas. Vamos!
Pego a mochila com algumas coisas e ele trava o carro. Começamos a correr floresta a dentro, sem pensar e olhar para outra coisa que não seja Tae em sua moto. O ruim é que a mata é muita fechada e há pouquíssima iluminação, o que complica muito.
__ Espera! Ele vai parar.
Nos escondemos ( não que seja necessário) atrás de uma árvore, eretos e silenciosos, vendo Tae desligar a moto e deixar o capacete nela. Ele passa a correr e isso causa um certo barulho, já que o chão está cheio de folhas secas, então caminhamos o mais sorrateiro e lento possível pelo mesmo caminho que ele faz. Ele para outra vez, e outra vez nos escondemos atrás de uma árvore. Apoio minha mão no tronco, mas pulo e tapo a minha boca com a outra quando sinto algo.
__ U-uma aranha, eu tenho certeza! L-liga a lanterna do seu celular e mata ela. Mata, mata!
Sim, eu tenho medo de aranha. Muito medo.
__ Ela já deve ter caído no chão do tanto que você chacoalhou esse braço. Agora vamos... - ele me puxa com tudo, tirando a minha atenção que estava toda depositada em ver se a aranha estava em outra parte do meu corpo. - Ele está olhando para aquela casinha! É ali onde todos estão. Vamos, Yoongi.
Inspirei e expirei várias vezes antes de voltar a caminhar. A cada passo que dou fica mais difícil de respirar e raciocinar. Pisco algumas vezes olhando para a pequena casa, e tiro da bolsa uma das armas carregadas.
Deixo Monster para trás e caminho até Taehyung, que está pensativo e temeroso parado em frente a porta. Estou surpreso com o quão distraído ele está para não ter notado a nossa presença até agora, principalmente de não ter notado que estou atrás dele. Quando sua mão ameaça tocar a maçaneta, tapo a boca dele e o arrasto para longe de uma janela. Ele se debate em meus braços, mas com um certo esforço consigo segurá-lo.
__ O que você pensa que está fazendo, seu idiota? - o jogo no chão e o vejo arregalar os olhos.
__ Co-como você...
__ Eu escutei a sua conversa, por sorte. Me diz o que você tem na cabeca de vir até aqui sem dizer nada a ninguém? - sussurro.
__ Você não entende! Ele disse que mataria a Em se eu contasse a alguém. Ele quer acabar comigo e com a nossa mãe. E-eu pensei que poderia me colocar no lugar das du-
__ E morrer? É isso? - digo mordendo os lábios. - Você é um idiota! Sequer pensou em mim e se colocou nessa situação. Você poderia morrer.
__ Eu pensei em você o tempo todo. - Tae se levanta e segura o meu ombro com força. - Eu pensei em não destruir a sua felicidade e não acabar com a oportunidade de viver com a Em e os meninos felizes por um bom tempo.
__ Você acha que seríamos felizes sem você e a nossa mãe?! Você pensou nisso? Aposto que não.
__ U-uma hora vocês esquecem e aprendem a viver sem nós. - respira fundo e impede que as lágrimas caiam. - Agora...eu preciso entrar e resolver isso. Vá embora! Se ele te ver, cumprirá com o que disse e matará as duas.
__ Não! Eu não vou deixar você ir. Eu tenho mais chances de resolver isso, então eu vou.
__ Você não v-
__ Eu vou e você não vai me impedir. - Monster surge atrás dele e o aperta como eu fiz a pouco. - Se necessário, o apague, amarre ele ou qualquer outra coisa, desde que não o machuque e que o faça ficar quieto. Eu vou lá.
__ Está com a arma?
__ Aqui. - levanto a minha camisa e a mostro. - Tae, eu vou voltar com as duas. Fica quieto, por favor, ok?! Eu já volto.
Monster passa uma fita na boca e nas mãos dele, o impedindo de falar e/ou fazer algo. Toco o seu rosto e limpo algumas lágrimas que caem, evitando olhar em seus olhos e encontrar ali súplicas para eu não fazer o que tem que ser feito.
O desespero tomou conta de mim e a sensatez foi embora quando eu vi em seus olhos determinação para ir até lá e morrer pela Em. Nunca, jamais poderia viver sem o Tae e conviver com o peso de poder ter mudado isso. Eu tenho mais chances que ele de acabar com tudo, afinal. Eu acredito e sei que nada irá acontecer.
Os deixo ali e sigo até a pequena porta branca e velha. Giro a maçaneta lentamente e abro a porta do mesmo jeito. Adentro a casa e me deparo com um cômodo sujo cheio de tralhas e ferros. Me esquivo das teias de aranha e seguro a arma com força, olhando para onde piso e para onde devo ir. Há uma porta mais a esquerda, uma à direita e uma escada no canto. Caminho até a porta mais próxima; a direita. Giro a maçaneta lentamente, mas não consigo abrir a porta. Trancada. Respiro fundo e caminho até a outra porta. Abriu. A primeira coisa que faço é passar a mão na parede a procura do disjuntor. Encontro. Pisco algumas vezes por causa da luz clara, e olho atentamente para cada objeto no cômodo - que é um quarto. Há uma cama de solteiro, uma cômoda vazia e um banquinho. Mais nada. Fecho a porta e fico alguns segundos escorado nela, olhando para a escada e para a escuridão que vem dali. Engulo seco e início meus passos, até colocar meu pé no primeiro degrau e recuar por causa do barulho que isso provocou. Tenho que tomar cuidado; os degraus então velhos e meio apodrecidos. Desço um por um, tentando inutilmente enxergar algo nesse breu, com a arma apontada para o nada. Quando chego ao chão, procuro novamente por um disjuntor. Acendo e vejo um amarelo fraco iluminar o ambiente. Quase caio pra trás quando meus olhos vagam por todo o espaço.
Duas mesas bem parecidas com as de um necrotério então no meio. Uma prateleira cheia de potes e objetos cortantes estão mais a direita, e num sofá velho há panos ensanguentados. Pensar que esse sangue pode ser das duas me deixa atordoado. Esse é um cenário perfeito para um desmembramento ou coisa parecida.
Não posso pensar nisso. Me nego.
Parado no meio do espaço, observo cada centímetro do lugar a procura de uma sala secreta ou um sinal das duas. Se elas não estão aqui, estão naquele cômodo que está trancado. Ou talvez ele tenha mentido para o Taehyung e não está aqui.
Mil vezes maldito.
Minha vontade é de destruir tudo isso aqui e descontar a minha raiva, mas como não posso perder tempo, subo para o espaço principal. Apoio as mãos no joelho e procuro tranquilizar a minha respiração descompassada. Tudo está girando. Deixo meu corpo tombar em uma das paredes, e sem forças, deixo meu corpo ir de encontro ao chão. Até que uma porta se abre.
Uma porta falsa.
De súbito, levanto e paraliso quando as encontro dentro do cômodo inteiramente branco.
__ Poxa, é bem curioso como você é parecido com o Yoongi, Taehyung. - o maldito diz sarcástico, mas eu o ignoro, apesar dele estar com a minha mãe ao seu lado.
Sem pensar, me atiro no chão, ao lado da Em, e procuro pulso em si. Ela respira, ela está...não ela não está bem. A olho de cima a baixo e encontro hematomas horríveis em todas as partes expostas. Seu rosto está num estado ainda pior; seus olhos estão inchados e com coloração variada de tão machucados.
__ Por que você fez isso? Por que foi tão cruel? - digo sem olhá-lo diretamente.
__ Ela é forte, por pouco não me deixou cego. Tome cuidado com ela, filho! - o sorriso dele quase me fez vomitar.
__ Ela.. - aponto para a minha mãe. Seu rosto também tem hematomas, mas são infinitamente inferiores que os da Em. Mas, há sangue saindo da sua cabeça. Eu vou matar esse maldito.
__ Não, ela não está morta. Ainda. Eu não posso matá-la sem o imundo do seu irmão. Aquele boca aberta teve que te contar, não é mesmo? Nunca foi capaz de resolver nada sozinho...
__ Não fala do meu irmão.
__ Meio irmão, você quer dizer. Assim não conta! Por que defender e se importar com alguém que não tem o mesmo sangue que você? Por que ele não tem, você não concorda? Ele é só filho dessa vad-
__ NÃO OUSE XINGAR A MINHA MÃE! - aponto a arma para ele.
__ Ei, abaixa isso, é perigoso. Se você apertar esse gatilho, ira desencadear uma seqüência de mortes; primeiro sou eu, mas antes mesmo de uma bala me atingir, eu irei colocar o máximo possível dentro dessa imunda. E então? Vamos lá, abaixa isso.
Temeroso, abaixo a arma e me aproximo outra vez da Em. Mantenho contato visual com o desgraçado e gradativamente sinto o ódio aumentar dentro de mim. Engulo seco e deposito a minha atenção nos machucados que há nas pequenas mãos da garota ao meu lado. A respiração dela está pesada e falha, e em intervalo de alguns segundos, seu corpo parece sofrer um pequeno choque. Eu preciso tirá-la daqui e levá-la ao hospital o mais rápido possível.
__ Por favor, deixe a minha mãe. Você não vai sobreviver se fizer algo a ela.
__ Desde que ela morra, poderei morrer em paz também. Tudo bem que o idiota do Taehyung ficará vivo, mas Sojin é melhor que nada. - balanço a cabeça em negação, descrente por ouvir essa baboseira. - O que? Por que você não tenta me entender? ELES DESTRUÍRAM A MINHA VIDA! Nada mais justo que eu faça o mesmo.
__ Não! Você não pod-
__ Filho, me entenda.
__ NÃO. ME. CHAMA. DE. FILHO. - grito pausadamente. Seguro a mão da Em para não surtar, e acabo despertando-a.
__ So-solta a mi-minha mão. Dói. - ela resmunga, então obedeço rapidamente. Por um instante ela parece não me reconhecer, mas não demora para cair a ficha, pois algumas lágrimas caem. -V-v-vai, ele vai te m-matar.
_Shiiiu, não fala. Eu não vou sem você. - ameaço acariciar seu rosto, mas deixo a minha mão no ar quando dou por mim que isso pode causar dor. - Iremos sair daqui.
__ Sim, vocês irão. Na verdade eu nem sei porque você ainda está aqui. Vá, e leve a Emily para um hospital.
__ Eu não vou sem a minha mãe.
__ Então os dois irão apodrecer aqui. - até agora ele dizia tudo num tom tranquilo e leve, mas essa última vez soou diabólico. Um calafrio percorreu todo o meu corpo.
__ Vamos, larga a minha mãe, agora.
__ Eu não vou fazer isso.
__ Então eu vou ter que te matar.
__ Yo-yoon...p-para...
__ Tudo bem, mas ela também irá morrer.
Mordo o meu lábio inferior com certa força e forço os meus dedos a apertarem o gatilho, mas ao mesmo tempo não tenho forças suficiente pra isso. Ele vai atirar nela se eu atirar, mas eu preciso arriscar. Aponto a arma pra cabeça dele e tento ignorar os resmungos da Emily. Eu preciso tentar. Respiro fundo, sentindo o meu coração bater mais rápido que o normal, e aperto o gatilho. Mas no momento exato alguém afastou o meu braço e o projétil atingiu a parede.
__ ELE DISSE QUE IRÁ MATÁ-LA, VOCÊ NÃO ENTENDEU?
Taehyung me sacudiu como um boneco, e imerso em lágrimas segurou o meu rosto com as duas mãos e olhou no fundo dos meus olhos.
__ Deixa isso comigo.
__ Isso, deixa. O assunto é com ele.
__ Cala a sua...
__ Por favor, vá. Por mim, pela Em, pelos meninos...
__ Eu não posso, não posso. - nego, me rendendo às lágrimas e ao desespero. Eu não posso permitir que ele faça isso. Deve haver outro meio.
__ Não há outro jeito.
Taehyung me empurra para o lado e toma a minha frente. Dae sorri e aponta a arma para ele. Sinto o ar sumir dos meus pulmões quando vejo seu dedo curvar pronto para apertar o gatilho e, sem raciocinar, coloco meu corpo na frente do meu irmão, sentindo no mesmo instante alguns pontos do meu corpo queimar como o inferno.
__ Não, Yoongi, n-não. -
Taehyung segura o meu corpo que pouco a pouco vai perdendo a força, incrédulo e desesperado. Fecho os olhos por um segundo quando ouço disparos. Por sentir que o Taehyung ainda está me segurando, abro os olhos e vejo Monster com a arma apontada na direção do Dae. Ele finalmente morreu??!
__ Por que você fez isso? Por que? - Tae dispara contra o meu rosto. - Meu Deus, ele acertou pontos vitais. Precisamos ir para um hospital agora. Por que, Yoongi?
__ E-eu prometi que sempre iria te prot-teger, lembra? - sorrio. Eu jurei isso aos 9 anos de idade. - Uma promessa como essa nunca pode ser quebrada.
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