Pov. Tobias (Quatro)
Na mesa de jantar, todos parecem animados. É como se minha existência praticamente inútil os deixasse felizes. Me desculpem o linguajar culto, mas é minha natureza ver a vida com essa perspectiva literária.
Melissa come rapidamente, deixando até cair algumas ervilhas do seu prato. Nita come conosco, mas em seu silêncio contido. Penso em escrever uma cena assim.
- Como anda a vida Tobias? – Jeanine pergunta.
- Bem... – Dou de ombros. – Ela vai andando normal. Não tenho escrito muito.
- Que pena. – Ela diz desapontada. – Nita, Tobias é um escritor.
Nita parece ficar admirada.
- Ah, é mesmo?
- É. – Digo sem graça.
- Que estranho, nunca vi seu nome em nenhum livro...
Não quero entregar meu jogo de bandeja, quero fazer um ar de mistério. Também não sou de falar sobre minhas manifestações literárias abertamente.
Continuamos a refeição em silêncio. Nem toda aquela animação de antes continua no local. Parece que alguma coisa aconteceu sem exatamente acontecer, isso é confuso.
Volto a pensar naquela figura que vi pela janela. Cabelos escuros, neve se apoderando de suas roupas, meu livro em suas mãos. Não sei o que pensar exatamente, mas meu orgulho masculino não resistiu a essa cena.
Reparo novamente na mesa quando Melissa deixa cair seu suco. O líquido escorre sobre a mesa e cai na blusa branca de Nita.
- Olha o que você fez! – Nita berra.
Melissa a olha com fúria.
- Bem feito. – Ela diz divertida.
Nita semicerra os olhos.
- Peste.
Minha mãe abre a boca. Jeanine fica sem graça e volta a encarar a comida. Meu pai simplesmente a encara sem dó nem piedade.
Christina se levanta irritada.
- Do que você chamou minha filha? – Ela diz irritada.
Nita sorri.
- P-E-S-T-E – Ela soletra.
Christina fecha os punhos.
- Você não tem direito de falar assim dela!
- Mas é isso que ela é. – Nita cruza os braços. – Uma pestinha sem educação, a mãe nem presta para ensinar bons modos.
Desta vez sou eu quem fica chocado. Isso foi golpe baixo. Não acho que Chris mereça ouvir isso, mas por um lado... Melissa é bem mal criada.
- Já chega! – Christina berra – Quero que você vá embora daqui, agora.
Jeanine se levanta e segura o ombro de Nita.
- Nita eu acho melhor você...
Melissa que antes estava em silêncio, resolve se pronunciar.
- Mentirosa! – Ela aponta para a Nita. – Eu vi você com o ...
- Shhh! – Nita diz sem graça.
- O que foi, meu amor, o que essa bruxa fez? – Christina pergunta.
- Veja lá como fala de mim! – Nita bate o pé no chão.
Me levanto da cadeira.
- Nita, creio que não preciso mais dos seus serviços. – Jeanine diz.
- Como?
- Você desrespeitou nossa família. – Ela diz num tom condescendente. – Não queremos mais você por aqui.
Minha mãe concorda com a cabeça.
- Por favor. – Marcus complementa.
Nita assente, ainda chocada.
- Está bem. – Um sorriso se forma nos seus lábios.
Nita se dirige a porta de entrada, com passos firmes e precisos. Decido ir atrás dela e pedir desculpas, mas sem saber exatamente porquê.
Ela passa pela porta e eu a sigo correndo. Antes que pise na rua, coberta de neve, Seguro seus ombros. Ela praticamente me fulmina com o olhar, mas depois, sua expressão se suaviza.
- Tobias...
- Eu queria me desculpar. – Tiro minha mão de seus ombros e coço a nuca. – Bem, não acho que você esteja errada.
Ela sorri.
- Concorda quando eu digo que aquela criança é uma peste? – Ela pergunta.
Agora chego num empasse. Bem, concordar eu até concordo, mas... Não foi muito educado da parte dela falar isso. Decido apenas passar um pano quente sobre o assunto.
- Sim.
- Ainda bem que não sou só eu que pensa isso. – Ela cruza os braços.
- Sem querer ser intrometido, mas o que você fazia com a Jeanine?
- Eu ajudava ela com as roupas que ela costurava. – Uma pausa. – Eu entendo um pouco de costura também.
- Isso parece ser legal. – Digo sem graça.
- E é. – Ela afirma.
Um silêncio constrangedor paira sobre nós.
Ela esfrega os braços com frio. Não é à toa. Estamos aqui fora, no meio da neve, e ela está somente com sua camisa de manga curta.
Rapidamente, tiro meu casaco e ofereço a ela.
- Não, obrigada. – Ela diz educadamente. – Acho que não posso aceitar.
- Não vou deixar você voltar para sua casa assim. Até lá, pode morrer de frio.
Relutantemente ela pega e o coloca sobre o corpo.
- Obrigada.
- De nada.
- Então... nos vemos por aí. – Ela diz se afastando.
- Até. – Dou um leve aceno.
Não que eu esteja interessado, mas... Tá eu fiquei interessado. Ela é bonita e eu tenho olhos.
Espero com certeza a ver novamente.
Entro em casa e fecho a porta.
- Você foi atrás dela? – Christina pergunta brava.
- Eu somente pedi desculpas. – Digo.
- Ah, pediu desculpas? – Ela diz irônica. – Por que caralhos você fez isso Tobias? Ela não é uma pessoa confiável, ela é extremamente perigosa. Parece uma cobra.
- Christina, acho que você está a julgando precipitadamente. – Digo sincero.
- Não tem nada de precipitado em meu julgamento. Eu a conheço há anos. Você só voltou para casa hoje, não sabe nada.
A abomino mentalmente por estar me tratando assim. Ela não devia ter jogado isso na minha cara.
Evito contato físico com ela ao passar pelo corredor e subir as escadas.
Mal voltei aqui e já causei problemas. Um pouco de vergonha se apodera de mim neste momento.
Não tenho nada para escrever.
Me deito na cama. Meus pés ficam pendentes do lado de fora da cama.
Desde quando minha vida ficou tão bagunçada assim?
Uma meia hora depois, ouço batidas na minha porta. Minha mãe abre a porta botando para o lado de dentro a cabeça.
- Tobias?
- O que foi? – Pergunto.
Ela entra e fecha a porta.
- Acho que você devia se desculpar com a Chris. – Ela diz calma.
Levanto levemente a cabeça.
- Por que diz isso?
- Ela não disse aquilo por mal, só ficou irritada de você defender a Nita.
- Mas a questão é essa. E se a Nita não for desse jeito? – Questiono.
Minha mãe suspira.
- Bem, se ela realmente não fosse assim, não teria feito aquele escândalo. – Ela diz distante.
Concordo mentalmente.
- Bom, mas a questão aqui não é ela. – Conclui. – Será que você pode fazer isso, por mim?
- Claro. – Digo.
- Ótimo. – Ela sorri. Evelyn se aproxima de mim e deposita um beijo na minha testa. – Boa noite.
- Boa noite.
A porta se fecha novamente. Decido falar com Christina amanhã.
Recosto minha cabeça no travesseiro e caio no sono na mesma hora.
Pov. Beatrice (Tris)
Ajeito meu travesseiro na cama. Puxo meus lençóis e me cubro ao deitar.
Amanhã é segunda – feira. Dia de ver meus amigos no asilo.
Eles praticamente são minha única família. Todos idosos, muito bem humorados e gentis. Não ganho nada em troca de ajudá-los. Isso é uma das poucas coisas que me fazem feliz, portanto, não vou me privar de fazer.
Meu dia não foi tão cheio, apenas mais do mesmo.
Leitura de “Feitos de ouro”, desenhos de roupas, projetos de caridade e pequenas voltas pelo quintal coberto de neve.
Repasso mentalmente meu cronograma de amanhã.
Trabalho, visita aos idosos...
Percebo que tenho o resto do meu dia livre. Decido fazer o mesmo de sempre. Se eu estiver viva amanhã, irei planejar mais. Se não, aí eu irei descobrir o que acontecerá.
Desligo o abajur de concha ao lado da minha cama e durmo.
Pov. Tobias (Quatro)
De manhã, bem cedo, sou acordado por um barulho estrondoso.
Me levanto assustado e abro a porta para olhar para fora. Não tem nada e nem ninguém.
De repente, Marcus abre a porta de seu quarto com a mesma expressão assustada.
- O que foi isso? – Ele pergunta sonolento.
- Também não sei...
Christina sobe as escadas do andar correndo.
- Parece que aconteceu um acidente aqui na rua... – Ela diz ofegante. – Um... carro... uma... árvore... neve...
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