História No Ritmo do Coração - Sete: Desejo de Lutar

Ayumi foi embora. Dois dias após discutirmos sobre o meu pai, descobri pela diretora da escola que ela foi para o Japão acompanhada de sua mãe. Ela simplesmente fora sem despedir-se de mim.

O pior de tudo é que ela se tornou o assunto mais comentado da escola e boatos passaram a circular pelos corredores, o que fazia minha cabeça rodar mais e mais sem chegar a nenhuma conclusão. Ela ficou tão furiosa comigo ao ponto de nem me avisar? Será que aconteceu algo a além da nossa discussão?

Com o passar dos dias, senti falta dela. Muita falta. Seu sorriso, sua voz, seus lábios, seu carisma... Céus, ela nunca mais irá retornar?

Eu amo demais a Ayumi. Como pude tratá-la de modo tão rude aquele dia? Como deixei ela partir sem nem ao menos saber o porquê ou para dizer adeus? Essas dúvidas estão me matando aos poucos.

O que eu fiz?

...Dias Atuais...

Quando estava prestes a dormir, Tsuchiya escutou o som de seu celular vibrar freneticamente próximo de si. Franziu o cenho, intrigada. Quem estaria lhe ligando a essa hora, tão tarde? Será o Kentin? Pensou.

Atendeu o aparelho rapidamente em sinal de curiosidade, sem nem ao menos olhar o número que discava.

–Pois não? –perguntou.

–Tsuchiya, você está ocupada...? –não era seu namorado. A voz de Ayumi se fez presente do outro lado, o que fez sua amiga questionar-se o que estava acontecendo.

–O que houve, Ayumi? E que voz é essa, está chorando?

Permaneceu um silêncio durante a ligação, o que fez Tsuchiya preocupar-se com sua amiga. Porém, ao escutar um soluço baixo vindo do outro lado do telefone, a mulher de cabelo azulado ficou de pé e disse, decidida:

–Estou indo para sua casa.

~X~

Não demorou para que Tsuchiya chegasse, juntamente com Kisa, à casa de Ayumi. Como a porta estava entreaberta, entraram sem cerimônia e deram de cara com o absoluto breu –o que as fizeram ficar mais preocupadas ainda. Por breves segundos, elas perguntaram-se internamente o que diabos estava acontecendo e onde estava Ayumi no meio dessa escuridão.

Kisa procurou pelo interruptor do local e logo tratou de ligá-lo, deparando-se com uma silhueta bastante familiar sentada na poltrona entre soluços. Ayumi estava com o rosto inchado e as bochechas vermelhas, coberto de lágrimas.

–Ayumi?! –Kisa perguntou num susto, aproximando-se da amiga para ficar ao seu lado. Ela tirou os fios brancos dela do rosto, como forma de acamá-la. –O que houve para você ficar desse jeito?

Ainda com dificuldade para falar devido ao choro e a vergonha, Ayumi disse num fio de voz:

–O Nath... ele...

–Nathaniel esteve aqui? –quando ela afirmou com a cabeça, Tsuchiya prosseguiu: –Ele disse algo para você?

–Ele me... b-beijou...

Kisa e Tsuchiya arregalaram seus olhos ao extremo, em choque. Um misto de curiosidade e incredulidade atingiu as duas, que permaneciam imóveis sem saber como falar ou agir. Haviam escutado direito? Céus!

–Como assim?! –esbravejou Tsuchiya, indignada. –Ele beijou você à força ou algo do tipo? Pior que isso: ele lhe beijou tendo uma namorada?! Nathaniel não pensa nas consequências?!

–Ele terminou com ela –Ayumi murmurou, fazendo as duas arregalarem seus olhos novamente. Ainda envergonhada, prosseguiu: –E-Eu também disse isso à ele: que tinha uma namorada e não podia fazer isso com ela. Logo depois ele me confirmou que havia terminado com a Melody.

Agora eu entendo o porquê ela quase ter arrancado minha cabeça naquele dia que me ameaçara. Pensou, mas preferiu deixar esse comentário em mente. Ela passou a mão pelos olhos para secar os vestígios de lágrimas, mesmo que suas bochechas estivessem completamente vermelhas.

–Ok... agora eu fiquei completamente confusa agora –Kisa complementou com uma expressão pensativa. –Se ele terminou com a Melody e lhe beijou, isso significa que o Nathaniel ainda gosta de você. Então por que está assim, já que você nunca deixou de amá-lo?

–Eu não posso ficar com ele, Kisa! –Ayumi dissera, reprimindo a vontade de chorar. –Mesmo o amando, minha história com Nathaniel é passado. Eu não sou mais aquela adolescente por qual ele se apaixonou, então seria uma questão de tempo para ele me largar. Eu já perdi Nath uma vez e logo depois os meus pais, não quero sentir aquela dor nunca mais.

Um silêncio tomou conta do local, Ayumi sentiu seu coração voltar a doer daquela forma torturante de minutos atrás. Graças a Deus ficaria apenas três meses –apenas para resolver papeladas e documentações da casa dos seus pais e logo voltaria para o Japão. Havia vindo à França apenas por esse motivo.

Ou era o que pensava.

Foi só bater os olhos novamente naquele maldito loiro que toda sua armadura caiu: num passe de mágica. Conseguia esconder esse sentimento e enganar a si mesma de longe, mas estando tão próxima dele... Era praticamente impossível. E no momento em que ele a beijou, fora o suficiente para fazer seu coração bater da mesma forma de anos atrás.

Ainda amava perdidamente Nathaniel. Durante esses oito anos que passou, nunca havia conseguido ter um relacionamento duradouro demais com nenhum rapaz –ele sempre vinha em sua memória para lhe atormentar. E agora está aí: a praticamente um passo para conseguir tê-lo de volta.

Mas não o teria.

–Ayumi, você tem certeza disso? –Tsuchiya perguntou calmamente, colocando sua mão sobre o ombro da mesma como se tivesse lido seus pensamentos inquietos em sua mente. –Se o Nathaniel terminou com a Melody é porque ele realmente sente algo por você. Não acha que vale a pena dar uma chance para sua felicidade?

Encarou suas amigas de respectivos cabelos azuis e brancos, que esperavam ansiosas pela sua resposta. Com o coração despedaçado, mas decidida, respondeu:

–Eu não sou mais aquela Ayumi do Ensino Médio –deu um sorriso triste ao dizer tais palavras. –Eu não tenho mais forças para lutar contra Melody e os pais de Nathaniel, eles me odeiam e farão de tudo para terminar com nosso relacionamento, assim como tentaram fazer anos atrás. O melhor a se fazer é esquecê-lo. Posso demorar dez ou vinte anos, mas eu definitivamente deixarei de amar o Nath.

~X~

O dia seguinte ocorreu de forma tranquila na empresa, Nathaniel e Ayumi nem sequer conversaram: estavam ocupados demais com o trabalho. Os deuses pareciam ter escutado suas preces, assim suas mentes estariam entaladas o suficiente para não ter tempo de pensar um no outro.

Até mesmo quando ficaram a sós no escritório do loiro, conversaram apenas sobre as papeladas e organização do ambiente. Tudo no maior profissionalismo e sem constrangimento, ainda bem.

Durante o dia, Nathaniel tentou mandar inúmeras mensagens para Melody e telefonar para a mesma, porém ela se encontrara irredutível. Devia explicações e uma conversa direito com ela, mas a morena estava dificultando –de propósito. Estaria ela “adiando”, como se quisesse viver numa falsa realidade que o loiro correria atrás de si e lhe pediria em casamento? Inúmeros pensamentos vieram em sua mente, mas de uma coisa tivera certeza: com certeza resolveria isso de forma sincera com Melody.

–Bem, já estou de saída –comentou Ayumi no fim da tarde gentilmente com os demais funcionários. Agindo de modo simpático, ela sorriu de forma graciosa para despedir-se de todos. –Até amanhã.

Não pôde deixar de dar uma última olhada na sala no ex-representante, que se encontrava focado em algum serviço e nem notara sua saída. Talvez fosse melhor assim, não queria incomodá-lo. Quando percebeu, já se encontrava dentro do elevador em direção a saída do local.

Sabe quando ela pensou que os deuses haviam escutado suas preces? Então, fora um equívoco. No instante em que o elevador abriu no primeiro andar, deu de cara com o dono da empresa. Mas não Nathaniel, e sim do pai dele: Francis. Ambos se entreolharam com os olhos arregalados e surpresos.

A maior parte da empresa é comandada pelo Nathaniel, já que o mesmo será o futuro herdeiro e seu pai está prestes a se aposentar. Mas que azar tivera em se esbarrar com ele justo hoje!

–Ayumi? –ele a chamou pelo nome, quase de forma acusadora. Infelizmente, ele se lembra de si. –O que está fazendo na minha empresa? Você veio atrás do Nathaniel?!

–E-Estou trabalhando aqui –tentou responder de forma ríspida.

–Como? Não me diga que o idiota do meu filho te contratou? –Ayumi teve vontade de abrir os lábios para xingá-lo, mas preferiu ficar quieta. Céus, ele continuava sendo o maldito velho babaca que pensa em controlar o Nathaniel como uma marionete. –Está tentando tirá-lo dos eixos novamente, garota?

Sentindo o sangue ferver mais rápido pelas suas veias, Ayumi não conseguiu permanecer calada diante de tamanhas acusações.

–Estou trabalhando temporariamente aqui, senhor. Após resolver todas as documentações da casa dos meus pais, voltarei para o Japão. Não tenho mais nenhum contato com seu filho senão o profissional.

–E porque de tantas empresas, teve que trabalhar justo nessa? –o tom de voz dele soou ameaçador, o que fez Ayumi preferir não retrucar. Com um olhar fuzilante, Francis disse por fim: –Conheço o seu tipo interesseira. Não se meta mais na vida do meu filho, escutou? Ele não precisa de uma garota como você.

Então, o homem entrou no elevador e desapareceu de seu campo de visão quando o mesmo fechou. Ayumi permaneceu imóvel por breves segundos, absorvendo tudo que escutara: ele realmente lhe chamou de interesseira? Um calor percorreu pelo corpo da mesma, o que a fez cerrar os punhos de raiva.

A sensação que estava crescendo dentro de si não aparecia há anos: aquela sensação juvenil de bater de frente e lutar por Nathaniel. Não era mais aquela adolescente, então porque estava agindo desse modo? Primeiro Melody vindo com aquela chantagem barata, agora Francis lhe tratando como uma vadia ambiciosa. Quem eles pensam que são para lhe tratarem desse modo?! Céus, poderia estar louca por pensar nisso, mas não deixaria barato.

E assim o desejo de brigar por Nathaniel cresceu novamente em seu coração.