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História Note To Self. - What Do I Know?


Escrita por: GorjessSpazzer e Lobertor

Notas do Autor


Se virem um capítulo muito parecido com esse por aí, denunciem -q

Capítulo 8 - What Do I Know?


Fanfic / Fanfiction Note To Self. - What Do I Know?

- Jessica unnie!

A primeira coisa que ouvi quando saí do ônibus foi meu nome. Olhei na direção do som e lá vinha Seo Juhyun. Como eu, ela também vinha de fretado, mas de direção oposta. Nem sempre nos encontrávamos, era bem raro o horário coincidir, mas, neste dia, não foi o caso.

- Bom dia. – Cumprimentei-a com um sorriso e dei um passo para o lado, para não obstruir a saída dos alunos.

- Encontrei um garoto muito parecido contigo! – Ela correu até mim com o celular em evidência. Eu quis revirar os olhos, mas era um pouco engraçado. Encontrar pessoas parecidas comigo não era apenas habilidade de Seohyun. Eunji já havia topado com uma e Kris, uma vez, me mandou mensagem para ter certeza que a garota no ônibus não era eu. Agora, garoto era a primeira vez.

- De novo?! – Eu exagerei na surpresa e Seohyun assentiu, com pressa.

- É, mas ele saiu do ônibus antes de mim e eu não consegui correr tão rápido. – Seohyun me mostrou a foto do garoto. Tinha cara de novinho, cabelo ondulado e, admito, nossos olhos eram um pouco similares. – É que tá de perfil, mas é igualzinho!

- Ele é bonito. – Eu brinquei e ela empurrou meu ombro de leve. – O que ele faz?

- Não sei. Em um ano é a primeira vez que eu vejo esse ser. – Eu ri do jeito que Seohyun disse e a acompanhei quando passou a andar em direção à entrada da universidade. – Tem aula agora?

- Só daqui a pouco, como sempre. – Respondi e Seohyun assentiu.

- Então tem uma hora para ficar de olho nas crushes de Direito? – Seohyun sorriu de canto e eu a encarei. Não consegui me lembrar do que ela falava. – A crush é sua e eu que lembro. A ruivinha que você falava.

- Ah... – Eu ri ao me lembrar. – Continua sendo crush, ou seja, basta servir para bonito.

- Aish, por que você nunca faz nada? – Seohyun bufou pelo nariz. Ela tinha uns gestos adoráveis, como este.

- Eu descobri o curso. – Ergui as sobrancelhas.

- Tinha uma balança bordada na mochila dela. – Seohyun me mostrou a língua e eu ergui os braços, em rendição.

- Esse é o nível “bonito para olhar”, apenas. Nem sei se ela curte. – Dei de ombros. Eu tendo a não ser superficial nesse caso. Beleza contava vários pontos, mas não bastava para me fazer sentir que uma aproximação valesse a pena. Mesmo se você tem cabelos ruivos, olhos claros e visual Tumblr. – Eu acho que tenho mais uma.

- Outra?! – Eu não trataria tão bem do assunto com outra pessoa, se não Seohyun. Mesmo que por enquanto o discurso fosse “simples crush”. – A Jiyeon?

- Supere a Jiyeon. – Eu dei risada.

- Ah, vocês seriam bonitinhas juntas. – Seohyun deu de ombros. Ela se sentou em um dos bancos do pátio aberto e eu me aloquei ao seu lado. – Quem é, então?

- Yuri. – Desviei o olhar para o chão. Eu sou horrível para tratar desse tipo de assunto, quando não se trata de brincadeira. – A que eu te disse que minha amiga de veterinária me apresentou.

- Eu lembrei do nome. – Seohyun começou. – Olha, dessa vez você falou com uma delas, temos uma evolução. – Riu ao fim de sua fala.

- É, acho que evoluí bastante nesse sentido. – Ri fraco e Seohyun me olhou com curiosidade. – Ela meio que me beijou na semana passada, no dia do jogo.

- Sério?! E então? – Seohyun estava divertida em sua mistura de surpresa e vontade de saber mais.

- Então continuou quase a mesma coisa. Quer dizer, foi estranho na segunda, Yuri evitou certas brincadeiras, mas acho que já voltamos ao de sempre. – Expliquei da forma mais resumida que pude. Seohyun logo teria aula.

- Você gosta mesmo dela? – O tom de Seohyun foi mais sério dessa vez. Eu cheguei a balbuciar alguma coisa, mas vi Yuri caminhar com certa dúvida em nossa direção.

- Me cobre a resposta depois, o assunto chegou. – Eu tentei disfarçar ao máximo e Seohyun olhou para Yuri nesse momento, suponho.

- É aquela ali? – Ela perguntou com os olhos de volta em mim. Eu murmurei que sim. – Ela é bonita, unnie! Pode beijar ela de novo, eu aprovo o casal, esqueci a ex-crush.

- Vai para a sua aula! – Eu resmunguei e empurrei Seohyun por seus ombros. Ela deu risada, mas se levantou.

- Até qualquer hora. – Seohyun se despediu de mim e observei os primeiros passos que deu rumo ao bloco da universidade onde estudava. Acredito que era no Gates...

- Bom dia. – Yuri me cumprimentou não muito depois, sentando ao lado oposto ao que antes Seohyun estava. – Preparada para mais provas?

- Preparada sim, mas não com saco pra isso. – Respondi com sinceridade e Yuri concordou com um sorriso. – E você?

- Ninguém nunca está a fim de fazer prova. – Yuri disse e bateu em suas próprias coxas, para chamar atenção. – Já tomou café? – A respondi negativamente. – Vem, então.

Como era de se esperar, a cafeteria estava vazia, se não por uma ou duas pessoas além de nós. Yuri pediu um de seus favoritos: refrigerante de cola e croissant. Eu fiquei com cappuccino e um sanduíche. Pela maior parte do tempo, comemos em silêncio. Yuri me ofereceu uma mordida do seu. Fazia tempo que eu não comia nada com tanto chocolate.

- Hm. – Yuri resmungou ao terminar de mastigar. – Hoje começam os treinos.

- Depois da aula? – Eu perguntei e ela aquiesceu. À propósito, Yuri havia feito o teste para o time de “futebol com os pés” depois daquele dia, na semana seguinte, para ser mais exata. Recebeu os uniformes e o resultado no dia subsequente.

- Sim. Se a Tiffany voltar primeiro do que eu, pode mandar ela ir embora. – Yuri falou e eu concordei com um aceno de cabeça. Pensei em talvez passar pela quadra, antes de ir embora...

Nós não tivemos pressa alguma a terminar o nosso desjejum. Yuri decidiu, depois disso, me acompanhar até a sala de aula. Suas aulas eram em outro bloco, mas ela usaria este para cortar caminho por dentro. Seria mais rápido, se não estivéssemos andando como duas tartarugas ao fazer contas sobre o quanto precisaríamos para passar direto, sem mais uma cansativa semana dupla de provas. Nos despedimos em frente à minha sala e eu puxei uma caneta da bolsa ao me sentar no lugar de sempre. Estava pronta para terminar aquilo o mais rápido possível.

 

...

 

Eu não teria coragem de faltar a um dia de provas por conta de uma gripe, mas descobri que Sunny havia o feito assim que me encontrei com Tiffany e Sooyoung no refeitório. De qualquer forma, esperava que Sunny se recuperasse rápido, ouvia dizer que os professores não pegavam leve em avaliações substitutivas.

- Semana que vem é aniversário da Yuri. – Tiffany comentou assim que nosso assunto sobre provas acabou.

- Puts, é verdade! – Era bom saber que eu não era a única esquecida com datas. Lembretes no calendário do celular me eram muito úteis, talvez eu devesse dar essa dica à Sooyoung.

- Que dia da semana? – Eu perguntei. Me lembrava da data numérica, não me julgue.

- Segunda. Estava pensando em fazer algo. Tipo, comprar um bolo e trazer. – Eu vi que Sooyoung tinha aprovado a ideia de Tiffany só pelo brilho em seus olhos.

- E onde você vai deixar o bolo? – Perguntei. Achei que o ar-condicionado do carro não seria refrigeração suficiente.

- Até lá eu comunico a alguém das lanchonetes. Eles guardam o bolo, nós compramos o restante deles. – Era uma boa ideia, admito.

- Agora fiquem quietinhas que a trouxa está vindo. – Sooyoung avisou. Yuri se aproximava com sua bandeja. – Então, amiga, é hoje que você começa o suicídio? – Perguntou quando Yuri se sentou ao meu lado.

- Não é suicídio, eu sei jogar. – Yuri se defendeu. – Só faz tempo que não pratico nada, mas já fiz coisa mais pesada que futebol.

- Veremos. Aposto que volta mancando amanhã. – Sooyoung lançou o desafio e Yuri usou o dedo médio para comunicar o que queria dizer e não podia, por sua boca estar cheia de comida. Eu olhei para Tiffany e ela revirou os olhos antes de me juntar às risadas.

 

...

 

Era bem raro eu passar em frente ao ginásio da universidade, o que só ocorria nas minhas tours pelo campus quando estava entediada, coisa que tem se tornado rara. O meu descaso pelo local se dava a dois motivos: não era o meu negócio e era barulhento. Gosto tanto de barulho quanto gosto de exercícios físicos. Prova disso é que, durante o ensino médio, eu, Kris e uns amigos fugíamos para a biblioteca depois de marcar presença nas aulas de educação física. No terceiro ano, quando a aula passou a ser aos sábados, eu consegui um atestado do curso para não ter que participar, mesmo que os horários não fossem compatíveis. Dança é a única coisa que me impede de passar a vida inteira no sofá, três vezes na semana.

A única vez que entrei na quadra poliesportiva foi no primeiro dia, quando fizeram um passeio com os calouros. Como não estava acostumada, foi como conhecer o local depois de dois anos. Era maior do que eu imaginava e o piso era de madeira, que reluzia com a claridade dos refletores. Fui à arquibancada e não me sentei muito acima do nível da quadra, na segunda fileira.

Yuri só me notou ali quando terminou seus aquecimentos junto ao resto do time. Ela estranhou, à princípio, mas logo me direcionou um sorriso ao qual eu retribuí. Estava com o uniforme de treino, camisa vermelha e shorts brancos, e tinha o cabelo amarrado em um coque. Também tinha chuteiras de solas sem travas nos pés.

A treinadora apitou para anunciar o início do treinamento. Algumas coisas relacionadas ao controle da bola e passe, algumas manobras com cones e chutes a gol e, por último, um jogo amistoso.

Eu poderia estar ali para acompanhar Yuri, mas isso não quer dizer que esportes capturem cem por cento de minha atenção. Por isso, peguei o laptop da mochila, apoiei sobre as pernas e fui fazer algum “trabalho”. Minha atenção ia do editor de texto ao jogo, me distraindo ali para então voltar para o computador com uma ideia fresca.

Uma coisa que me surpreendeu foi Yuri jogar na zaga. Ela parece mais do tipo que gosta de apontar para si depois de marcar um gol. Yuri também não ficava muito atrás em relação a desempenho, comparado com as garotas que treinavam há mais tempo. Na verdade, ela até era corajosa de mais em suas interceptações e carrinhos. A primeira coisa que eu faria, se a bola viesse com aquela força em minha direção, seria me abaixar e cobrir a cabeça. Por isso eu fico no sofá.

O time de Yuri não ganhou, mas o placar foi apertado. Tanto que ela pareceu menos irritada do que eu imaginava, ou era só porque eu estava ali, sei lá. Quando a treinadora liberou o time, Yuri pegou sua bolsa sobre o banco de madeira, que ficava além dos limites da quadra, e então veio até mim, dessa vez com um sorriso discreto.

- Não disse que viria. – Yuri disse ao se sentar ao meu lado. Meu computador já havia sido devolvido à mochila.

- Surpresa. – Sorri e Yuri riu baixo. – Vim ver se você torcia mesmo o pé.

- Ficou preocupada? – Yuri sorriu de canto.

- Alguém tinha que chamar os paramédicos. – Brinquei e ela acertou meu braço com o cotovelo. – Isso aí vai ficar roxo. – Disse ao apontar para as suas pernas. Tinha bastante marca vermelha perto das canelas.

- Dá nada. – Yuri balançou os ombros e eu ri de seu aparente desleixo.

- Não precisa se fazer de forte. – Disse apenas para provocá-la. Funcionou.

- Sem graça. Você que é fraquinha. – Ela me mostrou a língua e eu a respondi de igual forma. – Você sabe o que dizem sobre quem fica mostrando a língua para os  outros...

- Você começou. – Me defendi e Yuri sorriu.

- Talvez eu queira... – Eu sabia que aquilo era meio brincadeira e, talvez,  meio verdade. Era a primeira vez que uma de nós retornava ao assunto desde sexta, pelo menos de forma tão direta assim. – Você também -

- Yuri? – A treinadora chamou ao sair da quadra. Yuri desviou o olhar para ela. – Amanhã no mesmo horário.

- Certo. – Yuri falou. Eu fui salva de lhe dar uma resposta, se é que eu fosse fazer alguma coisa além de rir sem graça. – Vou ter surpresa amanhã também?

- Se eu contar, acabo com a graça. – Empurrei meus ombros contra os dela. – Vai tomar um banho ou Tiffany não te deixa entrar no carro. – Yuri brincou ao cheirar sob os seus braços.

- Estou cheirosa ainda. – Yuri se levantou logo em seguida. – Quer vir me ajudar?

- Suas mãos não estão amarradas. – Foi difícil segurar a risada com minha resposta. – Anda, ou eu não te espero.

- Chata. – Yuri estalou a língua. – Eu vou lá, mas antes... – Foi a vez dela me irritar com um abraço esmagador.

- Você tá toda suada! – Eu bati em seu ombro e tentei lhe afastar. Só não pareci séria por conta de minhas risadas insistentes.

- Tá, tá. Já vou. – Yuri se afastou e levantou os braços. Aproveitei quando ela se dirigiu ao vestiário para mandar uma mensagem à Sooyoung, dizendo para ela segurar Tiffany, caso esta chegasse, por mais uns cinco ou dez minutos.

 

...

 

Dezembro começou bem frio. Passei o primeiro dia do meu fim de semana na casa de minha avó paterna. Ela morava na rua de trás. Como minha casa era de esquina e a dela também, morávamos a menos de um quarteirão de distância.

Como meu pai estava trabalhando – ele passa a metade do dia fora de casa -, fui acompanhada apenas por minha mãe e Krystal. Como a família por parte de mãe ficava, em sua maior parte, em Los Angeles, eu sempre fui mais próxima ao lado paterno. Aposto também que a figura de minha “avó de São Francisco” era quase que como uma substituta materna para minha mãe. Eu meio que fui criada pelas duas.

Por conta disso, creio que me sinto ainda mais a vontade do que qualquer neto já se sente na casa de suas avós. Nem todos têm coragem de ocupar um sofá inteiro ao se deitar, logo depois de dizer oi. Minha vó pouco ligava, acredito que ache até engraçado. Como qualquer neto, eu e Krystal também somos bem mimadas, com comidas oferecidas a todo instante. Minha sorte é que ela faz as melhores receitas, sempre algo diferente. As tortas são as minhas favoritas. Era difícil sairmos de lá sem nada no estômago. Dessa vez foram pães, bolo e café. Confesso que só não bebo isso todos os dias para conseguir dormir à noite.

A única coisa ruim da casa de minha avó era a falta de sinal de internet. Era como um pequeno triângulo das bermudas no bairro, que afetava aquele pedaço. Em resumo, pouco consegui falar com Yuri e as garotas durante o sábado.

Esse problema foi resolvido no domingo. Eu fiquei o dia todo em casa. Estudei para a prova do dia seguinte, joguei e escrevi em meu tão querido computador, não fiz nada além de ouvir música e cantar, deitada em minha cama e, pelo fim da tarde, decidi tirar a guitarra do case.

Andei de um lado para o outro do quarto. Fechei janelas e portas para isolar o cômodo acusticamente, liguei o amplificador em uma das tomadas, a fonte do pedal em outra, interliguei o instrumento com o acessório e o amplificador por meio de cabos e precisei ainda do afinador e uma ferramenta para girar as tarraxas. Elas estavam cada vez mais duras, e eu não tinha grana para trocar. Também tinha os captadores, que não me agradavam tanto. Acho que não vale a pena gastar tanto assim nela com esses pequenos upgrades, considerando o resto dos materiais. Era uma Les Paul linda e eu gostava dela como minha primeira guitarra, mas era de marca barata. A bem da verdade, há muito tempo eu tenho desejado uma Telecaster original. Juntarei dinheiro para, um dia, ter uma dessas.

Fiz o esquema de sempre: tocar uma música, responder Yuri. Também me gravei tocando os solos da música mais recente que havia aprendido, para ter certeza de que estava fazendo do jeito certo. Infelizmente, fiquei sem saber quanto ao final. A “mizinha” estourou quando eu tentei fazer um bend de um tom e meio.

- Merda. – Xinguei, irritada e sem razão. Eu tinha o péssimo hábito de trocar as cordas apenas quando elas se partiam. Som opaco e ferrugem? Quem se importa com isso desde que estejam inteiras?

O resultado disso foi que eu fiz a maior bagunça no quarto. Revirei as embalagens com cordas antigas – que eu chamo de reservas -, a procura da primeira corda do mesmo calibre. Eu esperava que não estivesse quebrada. E não estava. O problema é que a ponta não distorcia por nada e, quando consegui deixa-la reta, estava curta de mais para se manter presa no lugar. Eu gastei quase uma hora nessa brincadeira, fora o tempo que levei para arrumar toda a bagunça e passar um pano nas cordas que sobraram.

Justifiquei minha ausência demorada a Yuri com uma foto da guitarra aleijada, lamentando sobre o fato, e da bagunça que eu havia feito, antes desta ser arrumada. Tanto andar de um lado para o outro, levantando peso, enrolando fio – odeio fios -, foi quase uma academia para mim. Tirei o casaco de moletom e fiquei apenas com a camiseta. Tive a impressão que precisaria de um banho se tivesse de levantar mais alguma coisa com mais de cinco quilos em tão pouco tempo.

Minha carteira não deveria pesar muito. Minha condição financeira não era das melhores, mas eu tinha o suficiente para um conjunto novo de cordas. Como o notebook também era leve, foi com ele sobre a barriga que eu passei o resto do dia, ou noite. Escrevendo, vendo vídeos aleatórios e ouvindo músicas nos intervalos para procrastinar. Recebi uma mensagem de Tiffany pouco antes do jantar.

“Que horas você chega mesmo?”

Eu entendi aí quais eram os planos dela.

“Bem cedo, mas vai precisar de sorte. Yuri chega alguns minutos depois de mim.”

“Ai, manda essa garota dormir. É aniversário dela!”

Eu ri da resposta de Tiffany. Ela continuou a digitar.

“Tem como você comprar Doritos?”

Franzi a testa.

“Doritos?”

“Não sabe o que é? Kk Compre uns três pacotes, deve bastar.”

Doritos ao invés de outros salgados? Era um jeito preguiçoso de se fazer uma festa. Meu jeito.

“Saindo, então.”

Fechei o computador, vesti o casaco novamente, coloquei as calças e os sapatos e fui checar a carteira mais uma vez. Por sorte, eu tinha o necessário para um conjunto de cordas e uns pacotes de salgadinho.

Sair num frio desses e com o estômago roncando de fome... Eu deveria mesmo estar gostando de Yuri.

A loja de conveniências mais próxima ficava há duas quadras. Ali dentro era quente e nem estava cheio. A maioria das pessoas estava próxima às geladeiras, grande parte delas eram solteiros procurando por pizzas congeladas e similares. Eu fui para a prateleira dos salgados, direto para os que me interessavam. Fiquei indecisa quanto ao tipo. Sei que Yuri gosta de coisas apimentadas, mas eu não sei que uso Tiffany daria àquilo, então fiquei em dúvida quanto a qual escolher. Optei pelo tradicional.

Minha mãe não iria acreditar que eu tinha comprado aquilo para eu mesma comer. Se dependessem de mim, ficariam um tempo guardados até eu terminar tudo, isso se Krystal não comesse, e eu vi que ela ficou de olho quando passei pela sala. Então expliquei a ela a situação: era para o aniversário de uma amiga. Pedi a minha mãe que deixasse em um local fácil, ou seja, que a baixinha da casa alcançasse, e que me lembrasse de colocar na bolsa na manhã seguinte. Era capaz de eu esquecer até que seria aniversário de alguém.

 

...

 

Eu não acreditaria se visse Tiffany e Sooyoung chegarem primeiro do que eu em qualquer outro dia, ainda mais Sooyoung, que costumava chegar em cima do horário. Tiffany tinha uma caixa em mãos, supus que o bolo estivesse dentro dela. A mochila de Sooyoung também parecia mais cheia do que o comum.

- Conseguiu acertar? – Perguntei ao me aproximar das duas. Tiffany assentiu com um sorriso.

- Vamos, antes que a trouxa chegue. – Sooyoung falou.

Tiffany liderou o caminho até o refeitório. Foi a primeira vez que eu ultrapassei os limites do balcão de uma das lanchonetes, não que isso seja um grande feito. Tiffany já deixou pagas umas latas de refrigerante e elas se mandaram para outro lado quando tudo estava guardado. E, caso esteja se perguntando, Sooyoung tinha trazido chocolates em barra e uns potinhos de molho.

De início, precisávamos fazer tudo parecer como um dia qualquer. Eu fiquei no refeitório mexendo no celular até ela chegar. Não demorou muito. Yuri tinha um largo sorriso nos lábios e uma aura de aniversariante ao redor dela. Só faltava o chapéu pontudo.

- Soube que alguém deixa de ser criança hoje. – Brinquei ao me levantar e ela deu risada.

- Quero abraço e beijinho de presente. – Yuri exigiu, abrindo os braços.

- Só hoje. – Abri aquela exceção a contatos físicos e iniciei o abraço. Yuri retribuiu o contato, eu deixei um beijo na bochecha e lhe desejei os parabéns.

- Ah, assim é sem graça. – Yuri riu e apertou um pouco mais o abraço.

- Vou babar sua bochecha no próximo. – Ameacei beijar novamente, e duvido que Yuri fosse desviar de mim se eu não tivesse interrompido minha ação.

- Se fizer isso vai ter troco. – Yuri respondeu e eu desfiz o abraço aos poucos.  Eu evitei olhar de mais para ela, seria um pouco constrangedor, com essa proximidade. – Sabe, às vezes Tiffany tem razão nas brincadeiras. Isso foi bem casalzinho, pelo menos pra quem vê de fora.

- Um bem meloso, para dizer a verdade. – Concordei e voltei a sentar onde estava, mas Yuri não me acompanhou.

- Vai querer alguma coisa? – Perguntou e eu respondi negando a cabeça. – Já volto, nem pense em fugir. – Avisou antes de se afastar e eu ri baixo. Ouvi o celular vibrar contra a mesa e vi que se tratava de uma mensagem de Tiffany.

“Saia antes de a aula terminar e encontre a gente no refeitório para organizar as coisas. Beijinhos.”

Confirmei a mensagem e olhei sobre meus ombros, em direção a onde Yuri comprava o seu café da manhã. Que o plano de Tiffany desse certo, fosse o que fosse.

 

...

 

O almoço foi como sempre. Quer dizer, Yuri ganhou abraços de Tiffany, que dizia coisas como “meu bebê cresceu”, Sunny, que teve sua gripe curada tão rápido quanto contraiu, e Sooyoung. A shikshin não ficou contente com o abraço e tentou puxar as orelhas de Yuri, dar os dezoito pescotapas e outras coisas que aniversariantes têm que aguentar. Eu também brinquei bastante, mas não cheguei a partir para a agressão.

Conseguimos, com sucesso, fazer com que tudo parecesse como um dia comum. Claro que Yuri ganhava atenção especial, ela gostando disso ou não. Voltamos para as aulas da tarde e eu saí da última dez minutos antes do seu fim, como Tiffany não havia especificado a hora. Encontrei as no refeitório, no lugar de sempre. Tiffany arrumava o bolo no centro da mesa, Sunny fazia o mesmo com os salgadinhos, em uma travessa.

- Parece que está bom. – Mencionei o bolo. Morango, chocolate e coco.

- Não pode comer antes da aniversariante. – Tiffany me repreendeu e eu ergui os braços para longe.

– Não querendo ser chata, mas essa vela não está meio torta? – Perguntei. Em relação a um relógio, a vela estaria apontando para as duas horas.

- Adivinha quem foi que colocou? Pedi para Sooyoung comprar vela, e ela me vem com uma. – Tiffany revirou os olhos. Sooyoung deve ter percebido que falávamos dela, já que logo apareceu com uns potinhos cheios de chocolate derretido.

- Você falou vela, não colocou plural. – Sooyoung se defendeu, retorcendo o rosto por algum motivo. – Ajuda aqui, amiga, essa merda tá queimando meu dedo. – Eu peguei dois dos potinhos e ajudei Sooyoung a deixa-los em espaços reservados entre os Doritos. Yuri tem uns hábitos alimentares estranhos, apesar de ser fresca com comida na mesma medida.

- Você podia ter colocado pelo menos no meio do bolo, amor. – Sunny deu risada e eu a acompanhei. A vela estava mais próxima da borda, um local meio esquisito para ser deixado. Sunny tentou concertar ao colocar um morango por cima do buraco e reposicionar a vela num lugar melhor.

- Ninguém vai comer a vela mesmo, pra que se importar onde fica? – Sooyoung deu de ombros e molhou um dos salgadinhos no chocolate. Fez careta por ter queimado a língua, mas molhou mais uma vez e me ofereceu. Fiz careta ao negar com a cabeça.

- Não é pra comer agora... – Tiffany deixou seus ombros caírem ao brigar com Sooyoung, que sorriu com os dentes sujos de chocolate.

- Mudando de assunto, a Jessica vai deixar a gente usar o nome dela no “Com Quem Será?”? – Sooyoung sorriu torto para mim e eu vi as outras fazerem o mesmo.

- Vai se ferrar. – Ignorei as risadas. Era difícil ter que lidar com isso sozinha, sem poder mudar de lado para zoar Yuri.

- Gente, enquanto a Yuri não vem. – Tiffany chamou nossa atenção. A mesa já estava arrumada. Ela tirou o celular do bolso e abriu no aplicativo de fotos, mostrando as ações de quem havia interagido com ela nos últimos minutos. – Postei uma foto durante a aula, e adivinha quem foi a primeira pessoa que curtiu?

Taeyeon.

- Esquece ela. – Fiz careta para a foto de perfil da baixinha de engenharia.

- Eu tento, mas ela insiste em bater na mesma tecla. Não faço ideia do que ela quer com isso. – Não sei dizer se Tiffany era ou se fazia de inocente, mas, de uma forma ou de outra, se iludia ao pensar que Taeyeon teria boas intenções com ela.

- Concordo com a Sica. – Sooyoung começou a falar. Estava mastigando, mesmo com o impedimento de Tiffany. – Taeyeon quer colocar você na filinha dela, sai dessa, Fany.

- Eu não me importo com ela. – Disse Tiffany, na defensiva. Eu duvidava que ainda não se importava, nem se não fosse um pouquinho. Caso contrário, não anunciaria cada vez que Taeyeon interagia com ela dessa ou de outras formas indiretas.

- Vamos esquecer esse clima de velório, antes que a Yuri chegue. – Eu disse, para interromper a sessão de lamentos. Tiffany poderia deixar isso para mais tarde.

- Melhor mesmo, ela está vindo. – Sunny avisou a todas. Olhei para a entrada do refeitório e vi Yuri com a maior cara de confusa. Sooyoung não pensou duas vezes antes de correr até ela com um chapéu de aniversário. Foi bem cômico quando ela puxou a canção dos parabéns enquanto Yuri desviava de suas tentativas de lhe vestir o chapéu. Sorte que o refeitório estava vazio e a vergonha alheia não foi generalizada.

Tiffany acendeu a única vela nesse meio tempo, Sunny e eu batíamos as palmas. Quando Yuri chegou a mesa, Sooyoung ainda insistia no chapéu. Yuri desistiu e segurou o objeto na cabeça, mas não passou o elástico, como Sooyoung queria, e se curvou para assoprar a vela que faiscava.

- Faça um pedido! – Disse Tiffany, sorridente.

- A Jessica! – Sooyoung gritou em seguida e Sunny a acertou com uma cotovelada. Nunca fui tão grata à baixinha. Yuri ignorou as duas e assoprou a vela antes que ela se apagasse sozinha. Mais uma salva de palmas e então Tiffany passou a espátula para Yuri cortar o bolo, depois de retirar a vela usada.

- Nem sei pra quem vai ser o primeiro pedaço. – Tiffany riu e a brincadeira foi ignorada mais uma vez. Eu achei graça quando Yuri cortou a primeira fatia e puxou para o seu próprio lado.

- Claro que é meu. Eu que faço aniversário aqui. – Eu ri abafado com a resposta. – Me passa mais pratinhos, vou fazer o favor de cortar pra vocês.

Tiffany passou os pratos descartáveis e Yuri serviu iguais fatias de bolo neles. Sunny e eu nos ocupamos em encher os copos de refrigerante, já que Sooyoung estava ocupada comendo o seu pedaço. O bolo, a propósito, estava tão bom quanto parecia estar. Chocolate e morango sempre é uma boa combinação. Eu não costumo pensar sobre essas coisas, mas morango talvez seja minha fruta favorita. Ou manga.

Algumas pegaram mais pedaços de bolo, eu roubei uns morangos a mais de Yuri e sorri quando fui pega em meu ato. Depois elas partiram para os Doritos com chocolate. Eu preferi ficar só com os morangos, mas Yuri não se conformou com isso.

- Vai, Sica, larga de ser fresca. Se não fosse bom eu não estaria comendo. – Yuri insistia ao me oferecer um salgado banhado em chocolate.

- Tem gente que come inseto. – Virei a cabeça ao fazer cara de nojo. – Pode ficar com sua porqueira.

- Ai, que chata. Só uma mordidinha, é meu aniversário. – Yuri fez biquinho e eu olhei do salgadinho para ela, temerosa. – Se não gostar, cospe.

- Certo... – Eu cedi, mas iria cuspir em seu prato se não fosse bom. Mordi apenas a ponta, onde tinha mais chocolate do que nacho artificial. Mastiguei com cuidado. Para a sorte de Yuri, eu não achei tão ruim assim.

- E aí? – Yuri perguntou quando terminei de mastigar.

- Prefiro só com o chocolate, mas é comestível. – Dei o meu veredicto, decepcionando um pouco as expectativas de Yuri.

- Poxa... – Yuri riu e colocou o resto do salgadinho na boca. – Aposto que gostou e não quer admitir.

- Não quando posso molhar o morango no chocolate.  – Sorri amarelo com a ideia que acabara de ter.

- Nem pense em depenar o bolo, Jung. – Sooyoung reclamou e eu mandei que ficasse quieta com um chiado. – A Yuri vai dividir o que sobrar com a gente, não é?

- O bolo é dela, olhuda! – Tiffany repreendeu Sooyoung com um tapa e Sunny riu das duas.

- O seu pedaço vai ser o menor só por isso. – Yuri ameaçou a shikshin, que tentou fazer um bico fofo, mas só pareceu engraçado quando ela tinha chocolate no canto da boca.

Nos empanturramos de doce, salgado e doce com salgado até nossas barrigas não aguentarem mais. Provavelmente estaríamos arrependidas disso mais tarde. Sunny disse que tinha que voltar para o quarto para estudar e Sooyoung a acompanhou, dizendo a Tiffany para não esperar por ela. “Estudar”. Tiffany embalou o que sobrou da comida na caixa e foi levar de volta ao carro. Disse que passaria pela coordenação de curso antes de passar pelo refeitório, para irmos para casa.

- Ainda tem festa hoje? – Perguntei a Yuri. Agora ela estava meio apoiada, meio sentada na mesa. Eu também havia me levantado quando Tiffany disse o que iria fazer, mas ela nos mandou esperar.

- Não. O máximo que vou fazer vai ser sair com uns amigos pra pizzaria. – Yuri explicou. Me lembro dela ter mencionado algo a respeito.

- Ainda aguenta mais pizza? – Perguntei e ela riu, batendo na barriga.

- Talvez uns três. Depende do que for. – A chamei de gulosa e ela deu de ombros. – Hm... Jessica, posso conversar contigo rapidinho?

- Pode... – Concordei, com um traço de dúvida, mas arriscava dizer que sabia em que assunto Yuri queria tocar.

- Sobre o beijo. Eu não sei se deixei muito direito de escolha e você só topou por bebida ou momento, então desculpa. Eu não queria causar constrangimento. – Eu sei que eu não deveria estar pensando nisso quando ela tenta ser tão séria, mas o jeito como suas mãos não paravam no lugar e suas bochechas estavam vermelhas era muito fofo.

- Tudo bem. Você disse para eu te afastar, se eu não quisesse. Não é como se não fosse consentido. – Tentei soar o mais natural possível, afastando minha timidez.

- Eu sei, mas – Como percebi que Yuri iria voltar a se enrolar, decidi cortá-la.

- Não precisa se justificar tanto. – Eu sorri e ela riu encabulada. – Não se preocupe com isso, eu estou bem, de verdade.

- Isso é difícil. – Yuri riu fraco e eu não tive certeza se deveria perguntar sobre ou não, então fiquei quieta. – Ficou bem mesmo? Deve ter sido horrível. – Eu sorri aliviada quando Yuri decidiu levar o assunto na brincadeira.

- Sua “sorte” é que eu devo ter sido tão boa quanto, e que nem tenho capacidade para julgar. – Eu sorri, cruzando os braços.

- Sabe... – Yuri começou. Sua mão foi parar em minha cintura e ela me puxou para mais perto. Eu não deveria ficar nervosa sabendo que se tratava de uma brincadeira. Ou quase isso. – A gente pode tentar de novo.

- Está confiante quanto a isso? – Perguntei. Entrar na brincadeira deveria ser o melhor a se fazer.

- Nem um pouco. – Yuri confessou, com um sorriso tímido. -  Eu não deveria brincar desse jeito. Eu nunca nem perguntei se você gosta de alguém ou coisa do tipo. – Percebi que Yuri me olhava curiosa e, por mais que não tenha sido uma pergunta direta, eu deveria responder.

- Na verdade, eu gosto de alguém. – Respondi sem pensar muito. Era a melhor forma de ser honesta comigo mesma. Yuri entreabriu os lábios como se fosse falar mais alguma coisa, mas um som de garganta sendo coçada atraiu nossa atenção.

- Desculpa atrapalhar o momento das duas, mas eu não quero chegar tarde em casa. – Tiffany olhava para nós com os braços cruzados, se segurando para não rir.

- Não tem momento. – Yuri disse depressa. Soltou minha cintura e eu me afastei, ajeitando a mochila em um dos ombros.

- Que seja, vamos. – Tiffany sorriu com deboche e nós a seguimos em silêncio. Eu até então não sabia se deveria me sentir salva ou não pela interrupção de Tiffany, mas tinha certeza de uma coisa: Yuri não deixaria o assunto morrer por ali.

 

...

 

No fim de semana, Kris me chamou para ir ao shopping. Num domingo, para ser mais especifica. Tinha um filme que nós queríamos assistir e surgiu a oportunidade de irmos juntos. Domingo era meia entrada para o público em geral, ou seja, não precisávamos nos preocupar em levar carteirinha de estudante. Nós tomamos um ônibus às cinco para a sessão das seis, chegando com uma meia hora de antecedência em nosso destino.

Não sei se é coisa minha, mas considero o cheiro de cinema um dos melhores. A manteiga ou o caramelo da pipoca combinados, não sei ao certo. Não sei se vem da pipoca ou é algo proposital, para estimular o consumo, como algumas marcas de sapato fazem com perfumes docinhos, acho que vocês sabem de que estou falando.

Fosse pelo cheiro de cinema ou não, nós pegamos um balde de pipoca e dois refrigerantes. Não nos importamos muito com a fila, pois sempre tem aqueles minutos de trailers antes dos filmes e a melhor coisa a respeito desse cinema, que era a demarcação dos lugares. Se você comprasse seu ingresso antes, não teria de ficar olhando para cima, nas primeiras fileiras, nem se chegasse meia hora atrasado.

Nós chegamos antes do filme começar, mas a sala já estava toda escura. Não sei se eles acham que aquelas luzinhas vermelhas ajudam muito para que não topem com os degraus, ou se eu que sou desastrada. Decidi ser cara de pau e passei a pipoca para Kris, para poder usar a luz da tela do celular como lanterna, na mão livre.

Sentamo-nos em nossos lugares e comemos alguma pipoca enquanto discutíamos sobre como filmes 3-D eram horríveis. Kris porque usava óculos, e eu porque não conseguia entender o que estava na tela. Tenho mania de querer olhar para além do que está em foco, e o efeito tridimensional deixava tudo meio distorcido. Ver um filme nesse formato e não ver dava quase na mesma para mim. É, estou exagerando de novo, mas chega de conversa, era hora de Star Wars.

O filme foi muito bom. Confesso que fiquei preocupada por se tratar de um spin-off, mas foi ótimo, no geral, com cenas de fazer um fã perder a cabeça. A última foi incrível, e eu não fui a única a surtar com a referência. Só foi esquisito quando a Marcha Imperial tocou pela primeira vez. Eu tive uma crise de riso sozinha pela aparição do meu personagem favorito. Kris deve ter morrido de vergonha, coitado.

Depois do filme, nós continuamos no shopping e comemos Temaki como janta. Nenhum de nós estava com muita fome depois da comilança do cinema. Essa é a única forma de eu comer comida japonesa: com alguém que não fosse meus pais. Ainda não sei como não podem gostar de peixe, ou a maioria deles. É uma pena, porque não curto muito comer sozinha. Se eles forem pedir pizzas, que eu vá de pizza também, por mais que minha boca esteja aguando por salmão cru.

Não ficamos muito tempo no ponto de ônibus e o transporte também estava vazio àquele horário. O ponto de descida ficava em uma avenida próxima às nossas casas, então ainda teríamos de andar mais umas quadras e eu tinha uma parada planeja em mente. Arrastei Kris comigo até uma loja de instrumentos musicais ali por perto. As melhores ficavam no centro, mas esta me bastava para o que eu queria.

Meu plano não era perder muito tempo ali, mas... Cheiro de loja de instrumentos musicais também é uma das melhores coisas, sem contar o apelo visual. Eu teria perdido um bom tempo ali, me fazendo de curiosa pra testar alguns dos instrumentos, mas tudo que fiz foi babar por alguns deles, incluindo minha guitarra dos sonhos, em Arctic Ice, braços em maple. Era uma das minhas cores favoritas para esse modelo.

- A gente veio para você ficar paquerando a guitarra ou você vai comprar a corda? – Kris brincou de me apressar. Eu estava prestes a chamar um vendedor, isso foi bom da parte dele.

- Infelizmente hoje eu vou levar só a corda. – Me afastei de onde a guitarra estava afastada e suspirei. – Não é sexy?

- Me diz que você não tá falando da guitarra... – Kris me olhou com cara de desacreditado e eu sorri amarelo. – Você precisa ser estudada.

- Eu preciso de cordas novas. – Foi triste, mas tive que ir ao balcão. Atrás dele ficavam todas as cordas, cabos, correias e coisas menores do que os instrumentos das paredes. O atendimento foi rápido, já que eu sabia que conjunto queria. Aproveitei para pegar uma palheta nova. Eram bem baratinhas, só não peguei mais porque uma já vinha de brinde com o encordoamento.

Foi bem esquisito quando eu deixei o comércio. De primeira, eu pensei que havia enlouquecido, como acontece em doramas, quando a mocinha passa a ver o protagonista em lugares em que ele não está. Eu pisquei duas vezes para ter certeza de que era mesmo ela vindo em sentido contrário ao nosso, mas, quando Yuri sorriu, minhas dúvidas acabaram.

- O que você está fazendo por aqui? – Eu sei que eu deveria ter soado um pouco feliz, mas eu estava curiosa. Acho que Kris também.

- Vim te seguir. – Yuri deve ter brincado com o fato de eu ter lhe contado onde iria, antes de sair de casa. – Minha madrinha mora aqui, na verdade. Acabei de sair da casa dela. Só não disse nada porque não queria atrapalhar.

- Imagina, não atrapalha nada. – Kris começou, gentil. Eu sabia que não viria coisa boa dali. - Eu já vou indo para casa, aliás. Tenho que estudar para a prova de amanhã. – Eu disse. “Não se preocupe, eu trago a Jessica em casa”, dizia ele para a minha mãe quando na verdade acenava e me largava sozinha. Quero dizer, mais ou menos.

- Que folgado... – Eu reclamei em quase um sussurro e ouvi a baixa risada de Yuri.

- Está ocupada agora? – Yuri perguntou. – Queria te acompanhar num lugar, se não tiver problema. – Eu procurei as horas no celular. Não estava tarde, eu poderia ganhar uns minutos se avisasse que chegaria mais tarde em casa, sem levar broncas por isso.

- Não, podemos ir. – Concordei mesmo sem saber para onde seria lavada. Acompanhei Yuri, seguindo em sentido contrário ao que antes ia com Kris.

- Você vai gostar, eu vou sempre que venho pra cá. – Yuri sorriu confiante. – Como foi o filme?

- Foi legal. Assistiria duas vezes. – Isso em minha classificação significava muito bom. Sou muito preguiçosa para assistir a vídeos com mais de vinte minutos. Reassistir é um privilégio para poucos longas.

- Viciada. Tá muito pesado isso aí? – Yuri brincou ao apontar para a pequena sacola que eu tinha em mãos.

- Não se preocupe, acho que aguento. – Ri ao levantar todo aquele peso. Não me perguntem quanto, sou horrível para esse tipo de medida.

Nós fomos até uma lanchonete, que também tinha uma espécie de buffet de sorvetes. Uma garota de Palo Alto me mostrando coisas novas em minha própria cidade... O lugar era bem bonito, com piso de pedra e revestimento de blocos nas paredes. As mesas e cadeiras de madeira junto à decoração feita de plantas em maior parte davam o toque de um estabelecimento próximo à costa.

Nós fomos pelo sorvete. Yuri pediu um de Céu – tudo que eu sei dizer sobre ele é que era azul – e um de chiclete. Decorou seu copo com calda de chocolate branco, com aqueles biscoitos de waffle listrados, balas de goma, daquelas em formato de dentadura. O meu foi mais simples: creme, chocolate e os canudinhos de biscoito. Não sou muito fã de caldas, e bala não é algo que eu como com sorvete. Yuri ainda pensou em pedir batatas, mas achou melhor não. Isso ela comeria sozinha.

- Depois fala da Sooyoung. – Ri de seu estado pouco exagerado com comida.

- Eu aguentaria a batata, mas um dia nós voltamos aqui pelo salgado. – Yuri disse aquilo em tom de compromisso e eu aquiesci. Talvez ignorasse as batatas, mas não teria problema com os hambúrgueres.

Até que as balas ficavam gostosas com sorvete. Bem, melhor do que salgado com chocolate, pelo menos. Os sorvetes de Yuri também estavam muito bons, e era interessante como a calda ficava em estado quase sólido quando em contato com a massa gelada. Yuri também pegou um pouco do meu sorvete, mas aposto que ela já havia provado dele antes. Depois da última parada do dia, eu poderia me considerar falida.

Nós saímos de lá em direção à minha casa. A lanchonete ficava a uns cinco ou seis quarteirões de distância, e isso serve de prova que eu não saio muito do quarto. Eu já deveria ter visto aquilo, apesar de não ficar em uma rua tão movimentada. Eu pensei que Yuri mudaria de direção no meio do caminho, mas ela disse que me acompanharia até em casa. Eu tentei convencê-la de que estava tarde ou que era desnecessário, porém, à essa altura, vocês devem saber de sua teimosia tanto quanto eu.

- Então é aqui que Jessica Jung mora. – Disse Yuri, com as mãos em seus bolsos e olhos presos na fachada da construção. Eu aquiesci.

- Kris mora ali do lado. – Apontei para casa tão à direita da minha que as duas eram quase coladas.

- Sorte sua que é ele quem mora ali. Eu iria encher teu saco o dia inteiro, jogando pedrinhas em sua janela. – Yuri riu de sua própria ideia.

- Iria viver de cortinas fechadas. – Retruquei antes de sorrir também. – Volte pra casa da sua madrinha, você ainda tem aula amanhã cedo.

- Eu sei, eu já vou, mas quero uma despedida decente dessa vez. – Yuri se inclinou para frente e apontou para a sua bochecha. Eu pensei em hesitar, mas...

- Pelo sorvete. – Disse séria e ela assentiu ao que eu disse. Eu juro que mirei em sua bochecha, mas fui inocente de mais em não contar que Yuri poderia ter virado seu rosto bem na hora. Eu fiz de tudo para parecer brava com o contato.

- Eu queria ver como seria sua reação se eu roubasse um selinho em frente à sua casa. – Yuri sorriu amarelo e eu lhe empurrei pelos ombros, sem grosseria.

- Vai pra casa, idiota. – Ela riu, mas eu sabia que não era por conta disso que suas bochechas estavam rosadas. – Até amanhã. – Me despedi ao correr os degraus para cima e acenei uma última vez antes de fechar a porta, vendo ela responder ao gesto.

Passei o resto da noite desmontando e limpando a guitarra para trocar as cordas, pensando em filmes nerds, sorvetes coloridos e selinhos roubados, tudo que não fosse a vida adulta e seus problemas. Tirando  a parte de que minha carteira foi dissecada, havia sido um bom fim de semana.


Notas Finais


Dessa vez eu não traduzi o porque eu achei que ficava melhor assim. Eu pensei em Dive, mas era muito depressiva, How Would You Feel era muito avançada para o estado atual das coisas. What Do I Know? combinou com o estado de espírito da Jessica nesse capítulo. Acho que vocês entenderam, eu queria colocar uma música do Divide aqui. Tem a letra na descrição: https://www.youtube.com/watch?v=6B9J3lEyffA


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