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História O anjo de vidro - Capítulo XI - Echo


Escrita por: Greenselves

Notas do Autor


OI

VOCÊS VIRAM O BEIJO SUCHEN? Se não viram recomendo, corram pra ver o vídeo que foi louco! Acho que vou até deixar o link nas notais finais ahshashash

Não tão atrasada dessa vez, eu trago agora o culpado pelo atraso de Ruber por duas semanas! Ou foram três? Ah foi muito tempo! Echo estava sendo tão problemático para mim que eu reescrevi várias partes mais de uma vez, e simplesmente me senti perdida! Capítulos de transição sempre me deixam assim... e no fim das contas, ele é o maior capítulo até agora. Bem, acho que essa confusão aconteceu por conta do planejamento da fanfic, eu notei que o planejamento para os capítulos estavam muito acelerados, não faziam sentido com o ritmo da estória, então estou tendo que ajeitar!

Problemas à parte, quero agradecer pelo feedback da semana passada, e a todos que estão lendo, mesmo sem comentar! É obvio que eu preferiria os comentários, mas só de saber que tem gente lendo já fico feliz! Esses quase 50 favoritos deixam meu coraçãozinho nas nuvens hehe.

Echo não tem amiguinhos novos, mas é bem importante, então... boa leitura!

Capítulo 12 - Capítulo XI - Echo


Fanfic / Fanfiction O anjo de vidro - Capítulo XI - Echo

Capítulo XI – Echo

<Eco>

 

Casa nº 122.

 

Baekhyun encarava vidrado o livro de geografia em suas mãos, mas não era difícil perceber que, embora seus olhos estivessem no papel, sua mente vagava em um lugar bem longe dali, pensando em algo que definitivamente não tinha nada a ver com formações rochosas ou relevo.

Vez ou outra, ele suspirava pesadamente, sacudia a cabeça e piscava os olhos com força, tentando prestar atenção na matéria. Porém, não demorava muito para o mesmo olhar distante voltar a aparecer e o ciclo começar novamente, e novamente, e novamente.  Baek estava naquilo desde que Sehun tinha me deixado de babá para ver Tao e tínhamos começado a “estudar”, agora quem estava com dificuldades para ler era eu. Sinceramente, eu ainda vou reprovar por causa dessas coisas.

- Você vai fazer um furo no livro se continuar tentando atravessá-lo com o olhar. – Falei como quem não quer nada.

Em um movimento rápido, Baekhyun fechou o livro o jogou-o para o outro lado do sofá irritado. Ergui meus olhos devagar e levantei uma sobrancelha.

- O que é que você tem? – perguntei.

Ele cobriu o rosto com as mãos e deu um suspiro exausto.

- Nada... – ele disse sem olhar para mim – eu só não estou conseguindo me concentrar de jeito nenhum!

Empurrei meu livro para longe de mim, marcando a página com um lápis.

- Notei. – Sorri quando ele descobriu o rosto e fez um bico frustrado. – Quem sabe se você me falar o que é que está te incomodando você não consiga?

Baekhyun sustentou um olhar desconfiado por alguns segundos.

- Você já foi mais discreta, Cathy. – Ele abriu um sorriso. – Eu nem sei por que ainda tento esconder as coisas de você!

- Eu também não. – Concordei convencida.

- Ei, pare de se achar! – Ele atirou uma almofada de veludo roxo em mim.

Peguei a almofada do chão e joguei de volta, porém ele conseguiu pegá-la e colocou de volta no sofá. Bem, nem tudo na vida é justo.

- Essas almofadas da sua mãe são assustadoras... – passei os braços em volta do meu corpo como se estivesse tendo calafrios – ainda bem que você não herdou esse gosto estranho.

Ele desceu do sofá e veio sentar ao meu lado no chão, apoiando a cabeça e meu ombro.

- Ela ficaria magoada se te ouvisse falando assim! – Baekhyun disse em um tom divertido.

Revirei os olhos pra ele.

- Você também acha engraçado todas essas coisas. – Me referi à decoração exagerada repleta de cores vibrantes e texturas aveludadas que não combinavam em nada.

- Claro que eu acho! É bizarro, mas eu não digo na frente dela... tenho amor à minha vida, ainda que eu esteja na merda. – Ele riu sarcástico da própria desgraça.

- Eu nunca disse nada na frente dela. – Me defendi. – E cara, você está me ofendendo quando diz que está na merda, você está na merda enquanto está aqui apoiado em mim? Meu Deus, eu queria estar na merda assim também!

Baekhyun passou os braços em volta de mim e se aconchegou mais ainda.

- Sua idiota, você sabe do que eu estou falando.

- Claro que eu sei. – Levei minha mão até seus cabelos. – E, sabe, você não pode ficar na merda pra sempre, foi isso que eu quis dizer. A fase de curtir a fossa já passou faz tempo, Baekhyun.

Ele riu soprado.

- Parece bem fácil quando você fala...

- Na verdade não é tão difícil assim... apesar de ser bastante complicado. – Falei de modo tranquilo, sem tentar piorar a situação. Eu queria falar sobre aquilo há algum tempo, mas precisei de vários dias para tomar coragem. Eu não aguentava mais vê-lo daquele jeito.

- Do jeito que essa conversa está indo eu não me surpreenderia se você me dissesse que eu preciso sair e conhecer pessoas novas. – Ele se afastou e colocou a mão na minha testa. –Catherine, você está doente?

- Não brinque Baek! – Afastei a sua mão. – Não é nada disso.

Ele bufou e pendeu a cabeça para trás, apoiando-a no assento do sofá atrás de nós dois.

- Estou quase me arrependendo de ter começado essa conversa.

- Olha que eu vou embora se você continuar assim... – comecei a me levantar e ele rapidamente segurou meu braço com algo quase parecido com desespero.

- Espera! – Ele falou um pouco mais alto. – Não vai não, eu não estava falando sério, senta aí!

Fiz uma careta.

- Você é impossível. – Resmunguei voltando a me sentar direito.

- E você uma grande dramática. – Baekhyun passou um dos braços pelos meus ombros, como se quisesse se certificar de que eu não me levantaria novamente.

- Olha só se não é a drama queen suprema sendo hipócrita! – Provoquei e ele me empurrou levemente. – Ei!

- Aish, não dá pra ficar discutindo desse jeito com você!

- Claro que dá, apesar de que você sabe que vai sempre concordar com o que eu digo no final. – Dei de ombros e continuei sem esperar que ele reclamasse. – Então é melhor você me ouvir de uma vez: saia da fossa logo, antes que eu perca a paciência!

- Wow! – Ele se virou para mim e disse fingido. – Quem te ver assim pode até pensar que você morde!

Franzi a testa.

- Eu estou falando sério, Baek. – Suspirei séria, eu precisava que ele parasse de brincar e ouvisse o que eu estava falando.

Baekhyun limpou sua garganta e perguntou cordial.

- E o que você... – Seu tom mudou no meio da frase, como se ele estivesse realmente interessado no que eu estava dizendo – sugere que eu faça?

Nos encaramos por algum tempo sem dizer uma palavra, eu tentando acumular coragem e ele torcendo para que eu não conseguisse. Baekhyun provavelmente já imaginava o que eu iria dizer, e eu realmente precisava falar, assim como ele precisava ouvir.

- Está na hora de você colocar um ponto final nisso, Baek. – Fechei os olhos. – Enquanto as coisas não forem esclarecidas, você acha que realmente vai seguir em frente?

Seus olhos escuros fugiram dos meus na primeira oportunidade que tiveram, ainda que estivéssemos perto um do outro. Ele se encolheu e respirou fundo.

- Ele já colocou um fim nisso quando apareceu com aquela garota. – Baekhyun pronunciou cada palavra como se falar fosse dolorido. – Eu ainda tinha alguma esperança antes de vê-lo, por mais que fosse das mais idiotas... mas agora, não acho mais nada. Eu não sei o que devo achar. – Ele completou olhando de relance para mim.

Dessa vez fui eu quem apoiou a cabeça no ombro dele.

- Aquilo não foi um ponto final, ele estava fugindo de você. – Compartilhei minha suposição. – Não estou tentando te dar esperanças sobre voltar com ele, mas acho que as coisas devem ser esclarecidas. Ele parecia... um pouco estranho da última vez em que eu o vi.

Como um raio, ele se afastou para me encarar.

- Como assim você foi vê-lo? – Sua voz era um misto de surpresa e indignação.

Respirei fundo, eu precisava contar para ele ainda que me doesse falar sobre aquilo. Mesmo que eu estivesse querendo ver a cabeça de Chanyeol bem longe de seu corpo, nada tirava da minha cabeça que ele devia aquilo a Baek, uma explicação, qualquer coisa. Bem no fundo de toda aquela mágoa, eu acreditava que, se Baekhyun fosse até ele, as coisas seriam diferentes. Talvez eu estivesse ainda mais iludida que o aceitável com a ideia desse encontro que eu nem sabia se aconteceria.

- Eu fui até a casa dele umas semanas atrás já que ele não estava nos atendendo. – confessei – Eu não te contei nada por que não estava confiante nem de dizer o nome dele na sua frente, ainda mais depois que ele apareceu acompanhado daquela garota.

Mesmo abalado com a minha resposta, Baekhyun continuou firme.

- E... como foi?

- Nada bom, eu nunca o vi tão na defensiva, – ri desgostosa – ele nem me deixava falar direito.

- E o que é que te faz pensar que ele vai me deixar falar algo? – Ele perguntou com um olhar triste.

- Bom, não era para mim que ele estava devendo explicações. – Fui direta.

Baekhyun passou a mão pela nuca e apoiou a cabeça nas pernas dobradas, exausto com a quantidade de informações e pedidos da minha parte. Ainda que eu pensasse estar ajudando, tudo o que eu tinha feito fora trazer mais questionamentos para atrapalhar seu sono durante a noite.

- Eu não sei se consigo fazer isso, Cathy.

- Eu sei que é difícil, foi muito ruim pra mim também. – Contei, apesar de saber que para ele seria muito pior. – Mas eu acho que pelo menos assim você não terá mais dúvidas. Ele deve respostas a você.

- Preciso pensar. – Ele disse por fim. – Mas não posso te prometer nada.

Do lado de fora, uma tempestade tinha começado a cair de forma barulhenta, fazendo um vento ainda mais gelado entrar pela fresta da janela.

- Não é a mim que você precisa prometer. – Me levantei para terminar de fechar a janela e ele me seguiu com o olhar. – Céus, esse inverno está cada vez mais frio.

- Eles dizem que a primeira neve não vai demorar muito para chegar... – Baekhyun aproveitou o assunto mais leve que estava surgindo, precisávamos mesmo de uma pausa.

- Que agonia! – Respondi. – Às vezes acho que a única coisa boa nessa estação é o natal...

Ele revirou os olhos, dramático.

- Você diz isso por que sempre passa o natal em Seul! – Senti uma pontada de inveja em sua voz.

Passei por ele e me sentei no sofá.

- Não dessa vez, pequeno gafanhoto. – Cutuquei-o com meu pé e ele logo tratou de tentar mordê-lo. – Você vai ter que me aguentar durante as férias de inverno esse ano também.

Ele ergueu uma sobrancelha.

- Mas e o seu tio? Com quem ele vai passar o natal? – Ele se referiu ao irmão da minha mãe que morava na capital.

Sorri feliz.

- Na casa aqui do lado.

 

~X~

 

Final da praia.

 

O mar quebrava com alarde suas ondas na praia enquanto Park Chanyeol encarava vidrado o horizonte azul acinzentado à sua frente, com o pensamento possivelmente bem longe dali. As nuvens escuras que se aproximavam apressadas indicavam que uma tempestade não demoraria a desabar em cima da pequena cidade. Porém, avulso a todo aquele estardalhaço, o humano de Tao continuava a encarar o mar, resistindo ao vento que maltratava seu corpo como as águas de um rio açoitavam as pedras que estavam no caminho de seu curso. Resistindo a algo que ele sabia que não poderia impedir, mas que sabia que passaria. Uma hora ou outra haveria de passar.

- Ele está pensando nela. – Tao quebrou o silêncio escandaloso do lugar, me trazendo de volta do quadro à minha frente.

- Em quem? – Virei lentamente para ele para perguntar. – Na garota com quem ele estava saindo antes? – Me referi à Seohyun.

Tao negou com a cabeça antes de me responder.

- Não. Ele está pesando na Catarina. – Ele fitou Chanyeol por uns instantes antes de voltar a encarar meu rosto. Eu estava surpreso, por que ele estava pensando nela? – Sabe como é nós não podemos ler a mente deles, mas tem algumas coisas que eles gritam tão alto que é impossível não ouvir.

Olhei mais uma vez para o humano alto na areia, aquele que era responsável por grande parte do sofrimento de meu Baekhyun, e me enchi de dúvidas sobre o porquê de ele estar pensando tão insistentemente na garota. Seria possível que todos queriam tirá-la de Baek? Primeiro aquele chinês, agora ele também? Eu não conseguia levar esse ato como algo normal quando a amizade preciosa de meu protegido estava em jogo, e como o bom anjo da guarda que eu era, precisava tirar satisfações.

- Sei. – respondi o comentário de Tao. – Mas o que é que tem a ver com ela que está incomodando Chanyeol tanto assim?

O outro anjo se inclinou para frente e estreitou os olhos, se concentrando para tentar entender melhor todo o caos de seu humano.

- Ah! – Ele exclamou angustiado. – Ele está... muito arrependido.

Franzi as sobrancelhas, confuso, Chanyeol estava arrependido de quê?

- Ele fez alguma coisa pra ela? – Perguntei espantado. – Que eu saiba eles não se veem faz um bom tempo, isso não faz sentido...

- Você não sabe? – Ele soou surpreso.

- Não sei do quê? – Perguntei levemente frustrado com a situação, como assim havia acontecido algo?

Tao olhou para os lados desnecessariamente, como se estivesse conferindo que estávamos sozinhos e que ninguém iria nos ouvir.

- Catarina veio atrás dele há algumas semanas, achei que soubesse.

O “achei que soubesse” de Tao ecoou repetidamente na minha cabeça enquanto meu cérebro tentava processar sobre aquilo e achar um motivo para que eu não soubesse, mas é claro que eu não encontrei nenhum. Mesmo que a nossa sociedade tivesse começado há pouco tempo, não fazia sentido ela não me contar algo tão relevante quanto um encontro com o humano de Tao. Não havia uma regra clara sobre contar tudo que tivesse a ver com o assunto, mas eu realmente acreditava que essa era uma daquelas coisas que não precisavam ser esclarecidas. E pelo visto só eu pensava daquela maneira.

- Ela não me contou nada! – tentei soar contido, mas sem sucesso. – Vamos Tao, me fale tudo sobre isso!

- Olha, Sehun, eu não sei se sou a pessoa... o ser certo para te falar sobre isso em detalhes. – Tao respondeu desconfortável, jogando seu peso de uma perna para outra.

Aquela foi a primeira vez que ele me negou alguma coisa, e sua expressão demonstrava que eu não deveria tentar fazê-lo ceder. Confesso que me senti um tanto magoado com aquilo, principalmente com o que estava nas entrelinhas da fala do anjo.

- Você por acaso está sugerindo que eu vá perguntar para Catarina, Tao?

Ele olhou para mim ligeiramente irritado.

- E para quem mais você perguntaria? Para o Chanyeol é que não dá!

Abri a boca, desacreditado.

- Vocês adoram ressaltar que eu não tenho ninguém para conversar, não é? É tão divertido assim? – Resmunguei revirando os olhos.

- Sem drama comigo, Sehun! – Tao me censurou seriamente. – Você sabe muito bem que não foi isso que eu quis dizer, eu sou o último que pode falar sobre isso por aqui! Não se faça de desentendido quando eu lhe disser coisas óbvias, por favor. – Ele se abraçou protetoramente e completou com a voz mais baixa. – Você pelo menos pode falar com a Catarina, mas e eu?

Suas palavras caíram como uma enxurrada em cima de mim e eu não consegui dizer nada a ele. Seus olhos escuros pareciam guardar segredos demais, e ele estava cansado de guardar tudo aquilo só para ele, mas ainda assim, Tao sabia que nem tudo deveria ser dito. Em alguns momentos, ele parecia ser alguém bem diferente do anjo de algumas semanas atrás.

- Você realmente está mudado. – Falei com pesar na voz. Muita coisa tinha acontecido desde que eu o acordara, e hoje eu não conseguia mais decidir se tinha sido um erro ou um acerto. Submetê-lo àquilo era péssimo, mas me imaginar sem ele ali parecia ainda pior. – Parece mais forte.

Tao me encarou longamente com aqueles olhos profundos.

- São tempos difíceis, Sehun. Eu não tive escolha além de me fortalecer, Chanyeol precisou muito de mim. – Ele apertava as mãos umas às outras, incomodado com o que dizia, injustiçado. – Ainda precisa.

Ficamos em silêncio enquanto o mar ainda reinava em seu caos e Park Chanyeol ainda o observava fazer isso. Resolvemos que era hora de ir quando os primeiros pingos de chuva começaram a cair.

- Venha mais vezes. – Tao pediu sorrindo enquanto voltávamos pela trilha na restinga, acompanhando o humano que fugia da chuva que estava engrossando. – Eu sempre quero te visitar, mas não tenho a mesma flexibilidade que você... – ele confessou fazendo manha.

Não pude deixar de devolver o sorriso ao ver que ele voltava a agir como de costume, feito uma criança.

- Acho que alguém andou sentindo a minha falta... – Provoquei-o passando meu braço por cima de seus ombros.

Tao riu enquanto nossas asas tocavam umas nas outras e começavam a pesar por conta da água.

- Claro que eu senti! É proibido sentir falta dos amigos agora?! – Ele respondeu sem olhar para mim.

Me senti aliviado, mais leve, como se aquele momento fosse uma pausa na tempestade, um conforto, um pequeno luxo cedido à nós. Algo que eu não queria que fosse embora.

- Não. – Sorri satisfeito ao notar que eu o estava perturbando. – Combina bastante com você.

- Ah, vai embora Sehun! – Ele me empurrou irritado, correndo em disparada até a casa. Ele não poderia arriscar ficar para fora nessa chuva. – Eu retiro o que disse!

Minha risada se perdeu entre os trovões e a chuva que caía. Fui dando passos para trás enquanto me afastava dele e da casa de Chanyeol. Eu queria guardar seu rosto na memória o quanto fosse possível.

- Eu virei te ver, Tao! – Gritei para que ele pudesse me ouvir. – E eu também senti sua falta!

O outro anjo revirou os olhos e fez um gesto para que eu me apressasse para ir embora, totalmente impaciente.

Fiquei rindo sozinho da conversa e da situação em que eu me encontrava novamente enquanto ia correndo pela beira-mar, desejando chegar logo em casa para fazer minhas perguntas à Catarina. Minhas asas molhadas faziam peso extra e dificultavam minha corrida, porém eu não me incomodava. Eu estava com uma vontade insana de chegar em casa e falar com aquela garota, incomodá-la e levar as notícias que eu tinha. Estranhamente feliz por ter um assunto para conversar.

Porém, as coisas ficaram realmente estranhas quando eu cheguei ao ponto onde ficava o último lugar onde eu queria estar na face da Terra. O hospital.

 De repente, o peso das asas me cansou e minha respiração se tornou descompassada, como se não existisse mais espaço para o ar e meus pulmões, e então me senti novamente como naquele dia. Era como se eu estivesse naquele mesmo momento, sentindo o mesmo vento, sendo molhado pela mesma chuva fria.

Minhas pernas simplesmente travaram nas lajotas de cimento da orla, e eu precisei parar. Era como se o prédio estivesse olhando para mim, falando comigo, me cobrando algo. E eu sabia exatamente o que é que estava me sendo cobrado. Só não sabia que teria que pagar aquela dívida tão cedo.

Eu não podia negar que eu havia tentado a todo custo não pensar naquela promessa, mas agora minha consciência estava inquieta.

Não faria mal dar uma passadinha na ala abandonada, não é mesmo? Na sorte ele estaria sozinho. No azar eu toparia com aqueles dois demônios. Que convidativo.

O que eu tinha a perder além da minha existência?

Maldito coração mole.

 

~X~

 

Hospital.

 

Eu já tinha perdido as contas de quantas vezes já tinha desistido e dado meia volta quando me deparei com a porta que dava acesso ao amplo espaço aberto onde ficava a outra ala. Eu não tinha certeza se meus sentidos estavam mais aguçados ou se realmente havia uma quantidade maior de anjos da morte no hospital naquela noite chuvosa. Era como se eu fosse encontrá-las a cada virada de corredor, o que me deixava em um estado de alerta anormal. Meu verdadeiro medo era que eu fosse levado por elas, apesar disso fazer tanto sentido quanto o sol nascer triangular.

De qualquer modo, em meio aos meus questionamentos sobre ir embora ou não, eu cheguei no meu destino, e agora não havia mais tempo para titubear, ou eu passaria por aquele jardim abandonado, ou iria embora. Ou uma ou outra.

Eu não sabia se me xingava ou não quando guiei minha mão até o trinco destrancado da porta de metal e o vento gelado me atingiu em cheio junto com a chuva que era levada por ele nas direções mais insanas possíveis. Minhas asas pareciam pesar uma tonelada e o caminho até o outro prédio pareceu ainda maior do que da última vez, assim como mais lamacento e mais escorregadio. Como naquela noite, a construção abandonada imperava toda a sua desgraça sobre os varais vazios e o jardim morto, sendo acertada pela chuva que, por mais que fosse intensa, não era capaz de lavar tudo aquilo que estava impregnado na alma do lugar. Desde o limo até os segredos.

Alcancei os degraus velhos e passei com rapidez para debaixo da cobertura que antecedia a entrada parcialmente destruída, e fiquei a salvo da maior parte da chuva (a outra parte passava toda pelos buracos nas telhas antigas). A porta de madeira ainda pendia para dentro, deixando o tamanho certo para a passagem de algum curioso que tivesse coragem ou burrice suficiente para entrar ali em qualquer horário do dia, convidando a quem quisesse entrar. E contraditóriamente, ela não parecia nada convidativa.

A chuva barulhenta embalou meus últimos momentos fora do prédio onde eu tinha vivido momentos extremamente desagradáveis uns dias atrás, assim como também ficou registrada na imagem da minha última espiada por cima do ombro antes de entrar lá.

Uma vez do lado de dentro, fui engolido pela escuridão tão rápido que a impressão que tive foi como se nunca houvesse existido claridade, como se o interruptor que acende o sol nunca tivesse sido ligado. As goteiras ficaram mais altas, a poeira no ar mais densa, e as correntes de ar furtivas e geladas. Eu não podia ver nem minhas próprias mãos, mais uma vez.

Sozinho no saguão, fechei meus olhos e respirei devagar, tentando me acalmar. Diferente da última vez, não haviam vozes ou barulhos de passos ecoando, nada além de mim e dos insetos e ratos que corriam silenciosos no escuro.

Não havia sinal algum da pessoa estranha que eu tinha encontrado antes.

“E-espera! Você vai voltar para me ver não vai?”

Estralei meu pescoço irritado com aquilo, eu não deveria estar perdendo tempo com alguém que eu não conhecia, eu deveria estar indo para casa, assim como eu deveria ter ido da outra vez.

Afinal, o que poderia me garantir que ele realmente existia?

Decidido, dei meia volta, indo em passos firmes na direção da porta. Não era hora para caprichos egoístas.

- Sehun? – A voz de Junmyeon bateu nas paredes altas quando eu já estava com metade do meu corpo para o lado de fora do prédio. – Sehun, é você?

Apertei com força minha mão na porta de madeira.

Eu não tinha tempo para aquilo, eu precisava ficar com Baekhyun.

Eu nem sabia o que ele era.

- Eu sabia que você viria me ver outra vez! – O outro disse mais alto, com animação e um certo alívio.

Suspirei forte quando voltei a entrar. Catarina iria acabar comigo quando eu chegasse em casa.

- Oi. – Respondi meio sem jeito por ter sido pego no flagra indo embora, mas Junmyeon não pareceu reparar. – Achei que você não estava por aqui...

- Não fale bobagens! – Eu não conseguia vê-lo muito bem no escuro. – Eu moro aqui! – Ele disse como se achasse muito engraçado.

- Ahnn... – cocei minha cabeça – e então, como você tem passado?

Ele demorou um pouco para me responder.

- Não sei. – respondei sincero. – Por que está fazendo caretas, Sehun?

Fiquei surpreso. Ele provavelmente estava tão acostumado com aquela escuridão que conseguia me ver tranquilamente, enquanto eu estava tão cego quanto uma toupeira.

- Eu não consigo te enxergar direito. – Balancei minhas mãos no espaço à minha frente.

- Ah, claro, como não pude pensar nisso antes? – Junmyeon falou consigo.

- Nisso o quê?

Antes de receber minha resposta, senti sua mão na minha, macia e quentinha, muito diferente da pele do demônio que estava aqui da outra vez.

- Tem um lugar que não é tão escuro aqui! – Dito isso, sem mais nem menos, ele me puxou pela mão como um cão guia.

Enquanto eu estava sendo praticamente arrastado pelo escuro por Junmyeon, eu tentava não tropeçar nas inúmeras coisas que estavam no assoalho e dar com a cara direto no chão. Contudo, o “dono da casa” não parecia ter notado aquilo, julgando pela animação com que me conduzia.

- Cuidado com o degrau! – Ele avisou em cima da hora, me fazendo bater com as canelas na escada e gemer de dor.

- Valeu por avisar... – resmunguei irônico.

- Não tem de quê! – Ele disse feliz sem entender o que eu realmente quis dizer.

À medida em que eu ia seguindo-o pela escada velha, a luminosidade do lugar ia aumentando gradativamente, até que eu já era capaz de enxergar melhor o outro a minha frente. Junmyeon pisava sem medo nos degraus de madeira que pareciam chorar a cada passo, ameaçando despencar com tudo. A subida até o primeiro andar pareceu eterna para mim.

A claridade do fim do dia invadiu minha visão sem aviso prévio, e precisei fechar meus olhos com força por conta disso. Ali em cima, uma fileira de janelas acompanhava a parte alta da parede, coberta com tábuas de madeira que praticamente não estavam mais realizando seu trabalho, já que a maioria jazia no chão, podre.

Cômodos com portas abertas e sem janelas como os do térreo serviam de depósito para caixas e outras tranqueiras, uma enorme baderna de sujeira à meia luz que passava por aquelas janelas escassas. Pela careta inicial de Junmyeon ele não gostava muito de ficar por ali.

- Pronto. – Ele anunciou sorrindo, sem soltar a minha mão. – Eu não venho muito aqui, mas agora você pode me ver!

Sorri um pouco espantado com todo aquele empenho, eu não em recordava de alguém ter feito algo assim por mim tão rapidamente antes.

- Valeu por isso. – agradeci – Esse lugar é realmente enorme... você não se sente sozinho vivendo aqui?

Junmyeon olhou para baixo e depois levou a mão até a nuca, passando os dedos pelos fios mais compridos do cabelo escuro. Era quase engraçado como ele conseguia parecer bonito mesmo com aquela jaqueta gigante e aquele cabelo desengonçado.

- Eu não costumo pensar muito sobre isso... mas eu não estou sozinho agora, não é mesmo? Eu tenho você aqui comigo! – Ele sorriu satisfeito – Agora eu fico até sem jeito em lembrar que cheguei a pensar que você não voltaria...

De repente, fiquei com vergonha por ter pensado em nunca mais pisar naquele lugar. Junmyeon parecia estar tão feliz em me ver ali que agora eu me sentia o pior ser do mundo inteiro, sem contar sobre o fato de que eu estava me espantando muito com a maneira com que ele me tratava. Aquele pseudo estranho agia como se me conhecesse há mais tempo do que eu pudesse me lembrar.

E eu me sentia acolhido, apesar de tudo.

- Você não fala com muita gente, não é mesmo? – soltei minha mão da dele discretamente.

- Você me perguntou a mesma coisa da última vez. – ele respondeu fazendo uma careta engraçada que me fez rir. – O que foi?

- Nada, você tem razão, desculpe por esquecer. – limpei minha garganta tentando ser discreto ao abafar a risada, o que só me fez engasgar.

- Você está bem? – ele chegou mais perto com um semblante preocupado.

Fiz um gesto indicando que estava tudo bem.

- Estou, Junmyeon. – respondi voltando a me indireitar.

Assim que terminei de falar, o rosto de Junmyeon se iluminou com um enorme sorriso, como se ele tivesse ouvido algo muito bom ou se lembrado de algo especial.   

- Fale de novo. – ele pediu com uma expressão ansiosa, um pouco hesitante.

- Falar o quê? – perguntei sem entender o que ele queria que eu repetisse.

- O que você acabou de dizer. – o sorriso estampado no rosto dele era extremamente parecido com aquele que Baekhyun dava quando queria alguma coisa de Catarina, mas não queria dizer com todas as palavras.

Ergui as sobrancelhas.

- Ok, então: eu estou bem. – falei ainda confuso.

O outro começou a balançar as mãos em sinal de negação.

- Não, não isso! – ele exclamou desapontado. – A outra coisa que você falou!

Fiquei uns bons segundos olhando para a cara dele sem perceber o que é que ele queria. Eu era um péssimo adivinho.

- Seu nome? – perguntei ainda sem ter certeza.

Ele balançou a cabeça em confirmação várias vezes, tenso como se quase não se atrevesse a respirar.

Eu não fazia ideia do porquê ele estava me pedindo para dizer aquilo, mas eu me sentia estranho, espantado com a paciência que eu nem sabia que tinha. Minseok hyung ficaria orgulhoso de mim se e visse nesse momento, já Luhan hyung provavelmente começaria a debochar por eu estar obedecendo um pedido tão tosco. Mas aquilo parecia importante demais para ser recusado.

Pigarreei a garganta teatralmente e me endireitei, tentando desamassar a camisa e tudo. Junmyeon me encarava com tanta vontade que chegava a ser engraçado.

- Junmyeon. – Enfatizei.

Foi como se eu tivesse tirado um enorme peso de seus ombros quando falei, pois ele imediatamente relaxou, sorrindo aliviado. Ele era mais estranho do que Tao em seus primeiros dias “acordado”. A grande diferença era que eu não fazia a mínima ideia do que ele era, a única coisa que eu sabia era que ele não parecia perigoso.

- Mais uma vez, por favor... – sua voz saiu fraca.

- Junmyeon. – Repeti sem entender. – Por que quer tanto assim ouvir seu nome?

O rosto pálido dele ganhou um pouco de cor-de-rosa.

- Eu... faz muito tempo desde que eu não ouço meu nome correto vindo de uma voz amiga.

Cocei minha nuca curioso.

- E eu não disse da última vez que te vi? – Perguntei.

Junmyeon ergueu seus olhos escuros para mim.

- Uma vez só. Mas eu não sabia se veria você de novo.

Abaixei a cabeça incomodado com a vergonha que sentia, quase como se tivesse cometido um crime. Foi enquanto eu encarava o chão sujo e cheio de entulhos velhos que me deparei com algo que eu não me lembrava sobre ele. Em meio àquela poeira, os pés ossudos e brancos de Junmyeon estavam descalços e maltratados, como se ele tivesse corrido uma longa distância sem calçados. Os machucados pareciam não ser muito antigos, e alguns nem tinham começado a cicatrizar ainda.

Afinal, há quanto tempo ele estava ali?

- Ei, o que houve com os seus pés?

Quando me abaixei para tocá-los, ele se afastou abruptamente.

- Não toque neles! – Junmyeon pediu assustado, deixando bem claro que era melhor eu não tentar novamente encostar em seus pés. Levantei sem pressa com as mãos para o alto, tentando mostrar que eu não ia fazer nada.

Diferente do que eu pensei que ele faria, a expressão desconfiada não abandonou seu semblante. Ele estava agindo exatamente como da última vez em que eu estive ali, mudando de humor sem razões claras.

De repente eu não me sentia mais tão confortável assim.

- Desculpe. – Pedi depois de algum segundos pesados. – Eu só queria saber se estava tudo bem com os seus...

- Ninguém pode tocar nos meus pés além Dele. – Fui interrompido.

Junmyeon não parecia mais tão adorável quando voltou a tocar no assunto que praticamente tinha me feito correr para casa na outra noite. Seja lá quem fosse Ele, era alguém sobre quem Junmyeon era incrívelmente sensível.

- Mas isso não está doendo? – Insisti no assunto, encasquetado com aquela história de Ele. Quem era Ele?

- Está. – Respondeu deixando claro que tinha achado a pergunta estúpida. – Mas logo Ele vai trazer os curativos e todas aquelas coisas que os humanos usam... – sua voz foi ficando menos arisca. – talvez amanhã. Já está muito tarde para que ele venha, vocês não vão se conhecer de novo... – ele estava desapontado.

Apertei a barra da camisa um pouco nervoso com o rumo da conversa. Cada vez mais eu tinha a impressão de que ele estava devaneando.

- Por que Ele não veio hoje? – Perguntei hesitante.

Junmyeon achou minha pergunta engraçada.

- Você não sabe? Ele tem muitas coisas com que se preocupar... – o tom de sua voz fazia parecer como se ele estivesse tentando se convencer daquilo – provavelmente precisou ajudar a irmã em alguma coisa. É, só pode ter sido isso.

Foi quando eu notei que ele estava falando de um humano. Imediatamente, tive vontade de alertá-lo sobre confiar nesse tipo de ser, mas ele obviamente não estava aceitando conselhos sobre aquele assunto. Continuei observando-o com cuidado. A cada palavra dita por ele, parecia que algo estava terrivelmente desajustado naquela história, como se várias peças de um quebra cabeça estivessem faltando ali, mas só ele se lembrasse de como a figura ficava no final do jogo. Ou fosse uma das peças perdidas.

- E o que você vai fazer agora? – Indaguei.

- Vou continuar esperando. – Ele sorriu de forma fraca. – Amanhã ele virá, eu tenho certeza.

Havia algo de engraçado na maneira com que ele tinha dito aquilo.

- Como você pode ter tanta certeza? – Não pude evitar a pitada de sarcasmo maldoso em minha voz. Junmyeon estava esperando um humano há sabe-se lá quanto tempo, sem nem ao menos suspeitar que talvez tivesse sido enganado.

O sorriso ingênuo continuava em seus lábios.

- Porque Ele me prometeu.

No meio de toda aquela loucura me peguei pensando que, se o mistério fosse alguém, possivelmente seria aquele cara. Junmyeon tinha alguma coisa intrigante que fazia com que eu só quisesse saber mais sobre todas as esquisitisses das quais ele falava, saber mais sobre ele. Era bizarro, mas eu sentia quase como se eu tivesse a ver com tudo aquilo. Mas eu não tinha. Óbvio que não.

- Então é por isso que você está aqui? – Resolvi tentar discretamente descobrir.

- Isso! – Junmyeon respondeu animado. – Estou esperando, como tínhamos combinado!

Senti um nó se formar em minha garganta quando ele disse aquilo. Algo me dizia que ele estava ali há mais tempo do que o combinado para o encontro entre ele e o tal humano. Eu só não entendia por que ele continuava esperando, se, claramente, ninguém viria.

Eu nem sabia se humanos poderiam vê-lo.

- Mas por que vocês marcaram de se encontrar aqui? – olhei desgostoso para o ambiente acabado – Eu sei que é sua casa, mas... não acha que está um pouco abandonado?

Junmyeon passou os dedos pela parede empoeirada e os esfregou para se livrar da sujeira que havia ficado em suas mãos brancas.

- Ele gostava muito desse lugar, do hospital inteiro na verdade. – olhou ao redor nostálgico. – Então pedi para que ele viesse aqui.

O olhar que os olhos escuros de Junmyeon sutentavam parecia estar distante, em outro tempo, outra situação. O ar se tornou mais pesado quando ele me mirou, ainda perdido entre o lá e o cá, olhando para mim e olhando para o nada.

- Você me lembra um pouco dele. – confessou por fim.

As palavras fugiram de minha mente, eu não sabia o que responder.

- Vocês tem um cheiro parecido... – ele continuou, se aproximando de mim e cheirando meu ombro – na verdade, esse não era exatamente o cheiro dele, e sim o cheiro que vinha com ele. – Junmyeon comentou enigmático, como se fossemos cúmplices naquele segredo.

Limpei minha garganta discretamente, tentando me recompor.

- Acho que isso foi um elogio, certo? – perguntei tentando quebrar o clima sério – Eu sei que eu sou cheiroso!

Junmyeon franziu a testa.

- Esse cheiro não é seu. É um cheiro que veio com você, mas não é seu.

Muito confuso, comecei a puxar a camisa para cheirá-la, mas como sempre, não sentia cheiro de nada. De que cheiro ele estava falando?

- Eu não estou sentindo nada...

Ele riu soprado como se fosse uma piada que só ele tivesse compreendido.

- É claro que não... já que está sempre em você, do mesmo modo que estava nele. – Junmyeon dava pequenos passos com as mãos entrelaçadas nas costas, em um pedido mudo para que eu o seguisse. – Só seja cuidadoso com isso.

- Cuidadoso? Com o quê? Esse cheiro? – perguntei já ao seu lado.

Ele fez que sim.

- Quando perceber que ele se foi, vai querer voltar a sentí-lo. – deu mais uma de suas respostas confusas.

- Se você diz... – dei de ombros.

- Espero que Ele ainda tenha esse cheiro quando eu o ver de novo. – falou mais para si do que para mim – Sinto falta disso como louco.

Eu não fazia ideia de que cheiro era aquele, mas parecia ser muito importante para ele. Na verdade, no fundo eu só queria saber se era bom, já que eu não estava exatamente interessado em saber que estava fedendo por aí sem saber disso.

- Deve ser um cheiro muito bom então... – comentei curioso.

- É cheiro de lar.

 

~X~

 

Casa nº 122.

 

Eu já estava há pelo menos quinze minutos sentado na janela do quarto de Baekhyun enquanto esperava a garota aparecer. Diferente de quase todas as outras vezes em que eu chegava à casa de meu humano depois de “passear” por aí, eu o encontrei sozinho, sem sua melhor amiga. Eles andavam tanto juntos que era um pouco estranho o ver sem ela ao seu lado em qualquer momento.

Era como se a casa estivesse mais vazia.

Baekhyun estava visivelmente perdido ali, sem ninguém na casa cheia de objetos coloridos e extravagantes. Era noite de plantão de seus pais, que só chegariam pela manhã do outro dia. Ele ficou um bom tempo parado encostado ao balcão da cozinha antes de subir para tomar um banho e se deitar, sozinho no silêncio do lugar. De todas as peculiaridades de meu humano, a mais fácil de perceber era que ele detestava ficar sozinho, odiava não ter com quem conversar. Sem Catarina e Chanyeol ele ficava sem ninguém, e ficar sem ninguém significava a visita dos pensamentos mais indesejáveis que estavam guardados dentro de gavetas que ele não planejava abrir, mas que se destrancavam sozinhas na memória, sem permissão.

O barulho do mar ecoava distante naquela noite quando ele finalmente pegou no sono, mais rápido do que nos outros dias. Ainda não era meia noite quando isso aconteceu, e desde então, eu estava sentado na janela, alternando minha visão entre ele e o quarto do outro lado. A janela do quarto de Catarina estava fechada, mas sua cortina não. A luz acesa denunciava que ela ainda estava acordada, mas não havia sinal da garota no cômodo.

Foi na volta de uma descida até a cozinha para ver se ela estava no térreo da casa que acabei encontrando-a. Parada no meio de seu quarto, Catarina estava olhando para uma foto em silêncio, o cabelo curto estava molhado e ela já estava de pijama. Mesmo não tão perto eu conseguia notar que ela não estava exatamente feliz enquanto olhava para a fotografia, a garota estava agindo do mesmo modo que Junmyeon agiu quando falou da promessa que o humano tinha feito.

Tive que me lembrar de que precisava falar com ela para sair daquele transe, eu não conseguiria resposta alguma a observando. Eu estava quase jogando um dos bonequinhos de Baekhyun no vidro dela quando fui notado.

- O que você está fazendo com essa action figure? – Ela perguntou depois de abrir a janela, se referindo ao boneco que estava em minha mão. – Coloque isso exatamente no lugar, se o Baekhyun notar ele vai ficar uma fera!

Olhei para o objeto em minha mão, não entendendo importância nenhuma nele, já que Baekhyun sempre o deixava com os outros estacionados na estante empoeirada. Decidi não discordar e só o coloquei no lugar.

- Uma grande recepção como de costume. – me sentei na janela, com as pernas penduradas para o lado de fora – Bom ver você também, Catarina. – Sorri irônico.

A humana revirou os olhos.

- Não está meio tarde pra você ficar de gracinha comigo? – Cutucou mal humorada.

Segurei meu queixo em uma posição forçadamente pensativa.

- Hmm... não acho que eu tenha horários para gracinhas, pensei que você já soubesse.

- Você é incorrigível, Sehun. – ela resmungou.

- Mas pelo menos eu não escondo isso de ninguém. – comentei em um tom sugestivo.

Ela ergueu as sobrancelhas.

- Isso foi uma indireta?

- Até que você não demorou muito pra perceber. – senti uma pontada de irritação enquanto ela olhava para mim sem entender – Eu fui falar com o Tao hoje.

Catarina se apoiou na janela, os olhos castanhos intrigados.

- E...?

Aquela falta de interesse com o assunto estava começando a afetar a minha paciência. Será que ela me considerava tão pouco assim que pensava que eu não era digno de saber sobre as coisas que estavam acontecendo?

- Achei que nossa “sociedade” envolvesse contar um para o outro sobre tudo o que tivesse a ver com o assunto. – soltei sério.

Sua expressão mudou no instante em que ela ouviu a frase. A humana se desencostou da janela e parou de olhar para mim, parecendo pensar muito no que dizer em seguida.

- Tao contou que eu fui falar com o Chanyeol, certo?

Fiz que sim.

- Ele não quis me contar o que aconteceu. – esclareci – Disse que era algo que eu tinha que saber de você... mas pelo visto não é o que você acha.

Eu estava disposto a fazê-la se sentir culpada por ignorar o trato que tínhamos feito, mas algo aconteceu assim que ela olhou para mim. Havia alguma coisa naquele olhar que me fez sentir o pior ser da face da Terra, como se fosse eu quem estivesse errado em exigir que ela me contasse aquilo. Minha postura séria ficou desequilibrada.

- Tao é mais sensato do que parece ser. – Catarina suspirou abalada – Chanyeol é um idiota, mas tem um anjo incrível.

Eu não estava em posição de discordar do que ela dizia.

- Catarina... – comecei hesitante – aconteceu alguma coisa? Digo, quando você encontrou o garoto.

Ela demorou a responder. Perdeu algum tempo olhando para o pedaço da rua que era possível ver entre o vão das duas casas.

- O que você sabe sobre isso? – ela perguntou levemente desconfiada, dando a entender que mediria as palavras para mim sobre o assunto. E também, depois de ver sua reação, eu não me sentia confortável em exigir coisas demais.

- Só que o humano de Tao está arrependido. – contei.

Catarina riu com um desdém que eu nunca tinha visto vindo dela. Seus olhos não escondiam que ela não considerava mais aquele garoto como alguém importante na sua vida, eles deixavam bem claro todo o rancor. Nem Baekhyun eu tinha visto agir daquela forma.

- Arrependido, sei! – disse sarcástica – E o que mais ele disse? Que viu uma tartaruga voar?

- Não acho que ele esteja mentindo sobre isso. – falei preocupado – Anjos sabem o que seus humanos sentem, Tao não mentiria sobre isso. E, além do mais, ele não me contou mais nada.

Ela continuava com aquele sorriso assustador no rosto.

- Quer tanto assim saber o que aconteceu naquele dia Sehun, quer mesmo?

A garota não me deu chances para responder.

- Eu estava cansada de ver o Baek chorar e não receber nenhuma resposta vinda de Chanyeol, então peguei a minha bicicleta e fui até a casa dele ver o que estava acontecendo. – seu tom era o de quem contava uma piada, mas ela não parecia estar achando graça – Só que, de todas as coisas que eu tinha imaginado, a banalidade com que ele tratou o assunto foi a única que não tinha me passado pela cabeça... e agora eu me sinto uma idiota. Uma idiota por que eu fui atrás de alguém que eu não conhecia.

Seu olhar agora parecia um misto de tristeza, culpa e raiva, como se ela se sentisse responsável por tudo aquilo que estava acontecendo há dois meses. Aquela foi a primeira vez que eu a tinha visto furiosa, e ela não parecia mesmo estar para brincadeiras. Catarina agora sentia ódio de Park Chanyeol, ódio por ter juntado as dores de Baekhyun com as suas.

- Tao me disse que ele está...  muito confuso de se entender. – comentei depois de algum tempo, receoso de continuar naquele assunto.

Ela fechou os olhos brevemente.

- Eu sei. – suspirou – Ele não está fazendo o que quer, mas sim o que o pai dele quer.

Franzi as sobrancelhas, levemente confuso.

- Como assim? Você diz que ele está sendo obrigado pelo pai dele?

- Quem dera. – ela sacudiu a cabeça em negação, falando em um tom triste – Ele acha que se fizer o que o pai acha certo, vai acabar achando certo também.

Eu definitivamente não estava entendendo mais nada do que ela estava falando, e não foi preciso uma palavra para que ela compreendesse isso.

- Ele está tentando se convencer de algo que não acredita, não está sendo ele mesmo. Chanyeol acha que se colocar na cabeça que nunca gostou do Baek e que isso é errado, vai parar de gostar dele. – Ela explicou.

Eu não sabia que ficaria tão surpreso quanto fiquei ao ouvir o que realmente estava acontecendo naquela loucura. Foi ali que eu me deparei que não sabia praticamente nada do que estava acontecendo entre aqueles três humanos que do dia para a noite viraram estranhos um para os outros. Me senti como uma criança no meio de adultos que tinham segredos e problemas demais.

- Ele não faria isso... – tentei me agarrar a uma esperança que eu não fazia ideia que tinha.

Catarina olhou para mim como se tivesse pensado o mesmo antes de descobrir a verdade. Como se aquela decepção fosse grande demais para se acreditar.

- Mas está fazendo. – Ela disse com a voz carregada de tristeza.

Ao vê-la daquela maneira, tão convencida do que falava, senti algo muito esquisito. Uma aflição estranha me foi subindo pelo corpo, e meu coração começou a ficar apertado demais dentro do meu peito, como se o espaço de repente tivesse ficado pequeno. Então notei que, de todos os momentos em que eu havia me relacionado com ela, aquele era o primeiro onde ela estava falando de um problema seu diretamente para mim, sem ser uma conversa que eu ouvi por acaso por acompanhar o Baekhyun. Só ela sabia o que tinha acontecido na conversa com Chanyeol, era ela quem se lembrava de todos os detalhes, de cada palavra, cada gesto, cada indignação. Não importava quantas vezes ela contasse para alguém, era algo tão pessoal que não poderia ser transmitido. E tudo isso por que, por mais que eu me esquecesse na maioria das vezes, ela não era amiga do humano de Tao por que ele namorava o Baek, mas sim por que ela queria ser amiga dele.

Aquela foi a primeira vez em que eu me senti triste por alguém que não era o meu humano. Eu quase tinha me esquecido o quão horrível era a sensação de tomar as dores de outra pessoa.

- Agora entendi por que ele está arrependido então. – eu disse com calma, apesar de tudo.

Catarina ergueu os olhos castanhos para me olhar, esperando que eu continuasse.

- Um anjo me disse uma vez que não importa para quem se mente, nada é tão perigoso quanto mentir para si mesmo. Isso porque, diferente das outras mentiras, as desse tipo podem não ter a perna curta. E então, quando se nota o erro... já é tarde demais.

Depois disso, ficamos em silêncio por um bom tempo, ouvindo as ondas baterem na praia a algumas quadras de nós. Ela parecia estar pensando em como tudo aquilo estava daquela maneira, sendo que não muito antes estava tudo bem. Em como tanta coisa estressante poderia acontecer a uma só pessoa nessa vida. Em como ela poderia ajudar para que as coisas se consertassem de uma vez por todas. Não importava o quanto eu imaginasse, eu nunca poderia descobrir sobre o que ela estava pensando durante aquele tempo em que ficamos quietos, eu pensando nela, e ela em algo que eu nunca poderia descobrir.

Observando-a daquele jeito, eu não conseguia parar de pensar o quão pesado deveria ser não ter um anjo da guarda para ajudar a controlar toda a gama de sentimentos que corriam por sua cabeça humana, para cuidar e apaziguar. Eu podia não saber exatamente o que Baekhyun pensava, mas era muito fácil descobrir, já que eu acabava sentindo a maioria das coisas que ele sentia, dividindo com ele o peso de tudo. Eu me perguntava se ela não estava cansada de carregar tanto sozinha.

- Você até que é bem agradável quando não está fazendo piadinhas toscas. – ela quebrou o silêncio.

Ri soprado.

- Sabe que eu volto ao normal em dois segundos, não sabe?

Catarina olhou longamente para mim antes de responder.

- Claro que sei. – respondeu com um sorriso frágil – Se isso não acontecesse, não seria você.

Desviei meu olhar dela, sentindo meu rosto esquentar.

- Você até que é bem esperta... mas não acha que já está na hora de você dormir? – mudei de assunto ao me lembrar do horário. Se Baek já não dormia direito, o mesmo podia-se dizer dela.

Diferente do que eu esperava, ela não revirou os olhos ou resmungou qualquer coisa sobre eu não ser seu pai ou que eu não era seu anjo. Simplesmente deu de ombros e começou a fechar a janela em silêncio, um lado de cada vez.

- Boa noite, Sehun. E obrigada por hoje. – falou antes de fechar tudo.

E então, eu não vi mais nada além das cortinas se fechando e sua sombra apagando as luzes. Eu estava sozinho sentado na janela, com Baekhyun suspirando levemente em seu sono na cama, com metade dos cobertores para fora da cama. Fui até ele para cobri-lo, ainda meio surpreso por Catarina ter ido dormir tão de repente.

Um, dois, três, quatro com o que estava no chão. Eu não estava sendo nada responsável deixando a janela aberta durante a noite se estava tão frio a ponto do garoto se cobrir com quatro camadas de tecido felpudo. Tentei ajeitar os cobertores que estavam na cama sem conseguir entender como é que Baekhyun conseguia fazer toda aquela bagunça enquanto dormia, parecia até que estava lutando com as cobertas. A expressão de meu humano se suavizou quando eu o cobri, ficando parecida com a que ele carregava todos os dias quando o vi pela primeira vez. Despreocupado e feliz, como se nada estivesse dando errado.

Sacudi a cabeça para espantar os pensamentos e me virei para ir fechar a janela. Contudo, meus pés se cravaram no chão assim que dei meia volta.

Eu tinha uma visita indesejada de última hora.

Empoleirado na janela do quarto, elegante como um gato, o último ser que eu esperava ver no mundo me encarava tão quieto quanto o próprio silêncio. Parecendo fazer parte das sombras do cômodo, o demônio de pele leitosa carregava a expressão de quem não estava muito a fim de estar ali, mas o fazia por que não tinha mais nada de interessante para fazer. Fechou os olhos escuros como dois besouros por uns instantes antes de falar com sua voz de chocolate derretido.

- Já não era sem tempo. – comentou entediado – Achei que nunca mais iriam terminar aquela conversa...

E, como se eu não estivesse mais ali, Kyungsoo voltou sua atenção às abotoaduras nas mangas do paletó cor de sangue, extremamente empenhado em ajeitá-las.

Pisquei algumas vezes antes de sentir o ar voltar aos meus pulmões, ainda não totalmente recuperado do susto que tinha levado, na verdade, nem um pouco recuperado. A forma melodiosa com que ele se movia me dava calafrios, fazendo a imagem da última vez em que eu o vi não parar de vir à minha cabeça. O sorriso que ele me lançou antes de sair porta afora da ala abandonada estava guardado na minha memória no mesmo lugar onde os olhos vermelhos de Kai estavam, no espaço que eu trancava a sete chaves, escondido de mim mesmo.

Ter medo dele era diferente de ter medo de Kai. A sensação que eu tinha era que o outro agora parecia uma criança indefesa perto do ser que estava sentado no batente da janela, ainda que eu tivesse muito mais justificativas para temê-lo do que para temer Kyungsoo. Algo me dizia que, se tivesse sido ele ao invés do demônio moreno quando eu ainda era um anjo caçador, eu não estaria aqui para contar essa história. Apesar de tudo, eu não tinha a ânsia de fugir ao vê-lo parado ali, como tive quando vi Kai. Eu sabia que, se ele quisesse fazer alguma coisa comigo, não estaria ali parado na janela.

- Você...

- Não precisa se preocupar. – ele me interrompeu – Eu vim sozinho.

Franzi a testa.

- Não era isso que eu iria falar.

Ele ergueu as sobrancelhas em um espanto desinteressado.

- Não? Bom, eu não posso acertar sempre.

- Como foi que me achou? – disparei sem paciência.

Seus lábios se retorceram em um sorriso de lado, achando engraçada minha reação.

- Você parece um gatinho, arisco desse jeito. – o demônio passou as duas pernas para o lado de dentro e se escorou preguiçosamente ao lado da janela, mais escondido nas sombras do quarto – Foi bem fácil te achar, na verdade, eu só te segui quando você saiu do hospital. Nada dessas coisas que vocês anjos acham que nós demônios fazemos, eu não segui seu cheiro ou algo do tipo. Vim andando bem atrás de você, para ser bem sincero.

Senti as penas das minhas asas se eriçarem de leve, ao ouvir que eu tinha sido seguido durante todo o caminho até aqui por ele sem nem perceber ou ao menos sentir seu cheiro de enxofre. Me senti tão estragado como anjo que quase dei risada.

- Você até que fala bastante para o cara que mal abriu a boca no outro dia. – comentei irritado com a situação.

Ele riu soprado.

- E você é bem mais corajoso sem o Jongin aqui. – ergueu as sobrancelhas, deixando claro que não era o único que parecia diferente – Falando nele, você deveria me agradecer, foi difícil convencê-lo a ficar na ala ao invés de vir junto. Sei que você não gosta muito dele, apesar de ele não se convencer disso. Sabia que ele está magoado?

O modo como ele agia me deixava tão irritado que eu queria empurrá-lo janela abaixo. Ele estava ali parado perto da janela como se fôssemos amigos de longa data e tivéssemos muito que conversar, colocar em dia. Sendo que eu não fazia ideia do por que dele estar ali, falando de modo tão natural que até fazia parecer normal uma conversa entre um anjo e um demônio, coisa que acontece todo dia sem motivo.

Ele não estava lá quando encontrei Kai da primeira vez. Se fosse o outro ali, por mais que eu odiasse pensar assim, haveria um motivo para o encontro. Mas aqui? Eu não encontrava nada. Eu não tinha nenhuma dívida com ele.

- Está meio tarde para ficar de nove horas, você não acha? Fale de uma vez que diabos você está fazendo aqui. – eu disse firme, sem paciência para aquela embolação toda. Eu não tinha assuntos com ele, e não estava disposto a deixar meu humano exposto a um demônio de graça.

Kyungsoo deu alguns passos e parou em frente à estante de Baekhyun, pegando um de seus bonequinhos entre os dedos. Passou-o de uma mão para outra, virando-se para me olhar com os orbes de escuridão.

- Vim conversar, só isso. – respondeu sem irritação alguma – Achei que deveria te passar algumas informações sobre certos assuntos do seu interesse. – ele jogou o bonequinho para cima, prendendo-o de novo entre os dedos de unhas curtas.

Olhei para ele desconfiado, sem entender que assuntos eram aqueles dos quais ele falava.

- Que assuntos?

- Seu humano, por exemplo. – Kyungsoo indicou Baekhyun, embolado entre as cobertas – Kai tem um interesse um tanto estranho relacionado a ele, a vocês dois, na verdade. Agora eu finalmente entendo o porquê. – abriu um sorriso assustador.

Imediatamente me aproximei da cama de Baekhyun, interrompendo a visão do demônio, que não parecia nada comportado. Eu poderia aguentar comentários sobre mim, mas não sobre Baek. Eu não sabia muito bem o tipo de coisas que demônios daquela estirpe faziam com humanos, e não estava nem um pouco disposto a descobrir.

- Não se aproxime dele.

Kyungsoo riu.

- Relaxe, anjo! – colocou o boneco em cima da escrivaninha ruidosamente – Não vou fazer nada com ele, pode acreditar em mim.

- Acreditar na palavra de um demônio? Você é bem engraçado, Kyungsoo. – falei cheio de sarcasmo.

O outro suspirou.

- Vocês tem uma ideia tão arcaica de nós. – se referiu aos demônios – Achei que você fosse mais esperto que isso, Sehun. Temos muito mais para fazer do que ficar procurando encrenca, os tempos são outros, as pessoas acreditam cada vez menos em nós, não sei se você percebeu. Só algumas crianças feito o Kai ainda fazem essas coisas, mas ele só tem alguns séculos.

Apesar de não dar crédito àquela conversa fiada que ele tentava me passar, eu sabia que ele não estava disposto a fazer nada no momento, o que também não era o suficiente para me fazer sair de perto de Baekhyun. Nunca é bom dar sorte ao azar.

- Se ter alguns séculos é ser novo, quantos você tem para se intitular mais velho? – perguntei curioso.

Meu interesse nele pareceu engraçado, julgando pelo seu sorriso.

- Mais do que você pode imaginar. – respondeu enigmático. – E menos do que o início do mundo.

- E o que está fazendo nesse lugar então? – cutuquei – Achei que demônios mais velhos não gostassem muito de andar pela Terra.

Kyungsoo caminhou calmamente até o lugar onde estava antes, perto da janela. Era incrível como todos os seus gestos pareciam serenos, hipnotizantes. Ele e Kai não eram como a maioria dos demônios que eu costumava encontrar pela terra, com toda aquela graciosidade e elegância.

- Você deveria parar de achar tanta coisa, eu já disse que vim te contar algumas coisas. – apesar das palavras parecerem rudes, seu tom não foi.

Então me lembrei sobre o que ele tinha dito sobre Baekhyun.

- O que você quer me dizer sobre o meu humano? – perguntei convencido, certo de que eu sabia de tudo sobre Baek.

Ele sorriu ao notar que eu estava interessado.

- Na verdade, essa parte é algo que Kai me pediu. – fechei minha expressão à menção do nome do demônio de olhos vermelhos – Ele ficou magoado por você não ter notado seus esforços de comunicação, apesar de ser algo que não te deixou nada feliz. Mas fazer o quê, eu prometi contar... – deu de ombros.

Virei minha cabeça para o lado, sem tem ideia do que ele falava.

- Não sei do que você está falando.

- Oh, - mais uma vez, a surpresa desinteressada – você realmente não notou. Foi ele quem mandou aqueles homens irem até o ponto de ônibus onde seu humano e o namorado estavam naquela noite. Os dois iriam passar despercebidos, mas quando Kai te notou achou que seria uma boa forma de te chamar atenção... só na cabeça dele é claro.

- O quê? – eu perguntei rindo – Do que você está falando?

- Que tudo isso que está acontecendo é culpa do Kai. – Kyungsoo respondeu a pergunta como se não houvesse nada de mais.

Eu estava estático, o sorriso tinha sumido do meu rosto. Eu olhava para o demônio, que olhava para mim sem nenhuma expressão em especial, enquanto uma enxurrada de pensamentos inundava a minha cabeça. Tudo poderia estar bem. Tudo poderia estar como era antes na vida daquele garoto se eu não fosse seu anjo da guarda. Ele e Chanyeol ainda estariam juntos, Catarina ainda seria amiga dele. Baekhyun voltaria a ser um humano saudável, com noites de sono normais e risadas a cada minuto. As coisas estariam em seu lugar se, em vez de ter fugido, eu tivesse explodido em areia dourada como deveria ter acontecido.

Os olhos do demônio, apesar de discretos, pareciam agora evidenciar o que era óbvio: não havia nada que eu pudesse fazer. Não adiantava gritar, xingar, partir para cima de alguém. Estava feito. A vida daquele que eu mais me importava estava um caos, e a culpa era minha.

- Ah, eu sabia que você iria reagir assim! Me sinto mal por ter trazido essa notícia agora. – apesar da declaração, era claro que ele não parecia nem um pouco arrependido do que havia dito – Mas eu não poderia recusar o pedido de meu dongsaeng, não é mesmo? Não se faz esse tipo de coisa, apesar de tudo.

Eu simplesmente não era capaz de responder coisa alguma. Eu estava preso dentro do meu próprio erro, entendendo só então todas as consequências que ele tinha desencadeado para tanta gente inocente.

 Isso pareceu comovê-lo, se é que algo assim fosse possível.

Com aqueles passos densos, ele se aproximou, colocando a mão fria sobre meu ombro.

- Tente não pensar muito nisso. – a voz de chocolate soou distante, apesar da proximidade – O que está feito está feito. – ele puxou o ar para respirar ruidosamente – Temos muito o que conversar, mas não acho que você esteja no clima depois disso.

Seus dedos gelados rumaram até minhas asas, me fazendo acordar do entorpecer e me afastar. O demônio deu um passo para trás, como se já esperasse aquela reação.

- Não terminamos isso por aqui? – indaguei com a voz fraca, perturbado com tudo aquilo.

- Nem começamos, para falar a verdade. – ele sorriu indo na direção da janela, finalmente fazendo menção de sumir da minha vista.

- Não venha atrás de mim aqui de novo, não onde ele estiver. – falei me referindo a Baekhyun.

Já na janela, ele olhou para mim e concordou com a cabeça, compreensivo demais para um demônio.

- Até a próxima, Sehun. E a propósito, belas asas. Suho era extremamente bonito quando as tinha também. – Kyungsoo disse de costas, antes de desaparecer na noite.

 

~X~

 

Como um anjo caído

Fiz questão de esquecer

Que mentir pra si mesmo

É sempre a pior mentira

Quase Sem Querer, Legião Urbana.

 

   ~X~


Notas Finais


Obrigada por ler!

Primeiramente, gostaria de dizer que por dentro estou triste, e por fora Temer.
Em segundo, o beijo Suchen, é claro: https://www.facebook.com/kimjongdaebr/videos/1778240782444857/

Decidi que de agora em diante, alguns capítulos terão trechos de músicas no final, mas só quando eu sentir que tem tudo a ver mesmo! Então vai ser mais raro, mais um capricho.

Masss vamos para a recapitulação, por que recordar é viver!

Teve Cathy e Baek deixando a gente com inveja mais uma vez da amizade incrível deles, e um pedido meio pesado da parte da nossa Catherine. Vou deixar bem no ar mesmo sobre o Baek ir procurar o Chan hehe! Depois disso o Tao negando coisas ao Sehun pela primeira vez, e o Chanyeol bem arrependido das idiotices que faz. Em seguida, uma visitinha ao nosso mendigo preferido, esperando "Ele" e pirando legal por causa do pé. Por penúltimo, Sehun e Catherine sem se matar pra alegria dos shippers e, por último, mas não menos importante, Satansoo fazendo uma visitinha ao quarto do Baek e deixando uma frase final bem sugestiva pra reflexão.

É, até que aconteceu bastante coisa... mais do que eu estava prevendo, para falar a verdade. Jogando a real, o capítulo 12 nem tá escrito ainda, mas não me matem, tenho uma parte muito importante dele que escrevi há dois meses atrás durante a aula de filosofia, e ó, fichou show e-e. E como é o início do capítulo, creio que será um bom pontapé para o resto dele.

Enfim, eu adoraria de verdade saber o que vocês acham!

Obrigada por tudo, e até o próximo!


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