Os ventos chicoteavam o penhasco em que eu estava, criando uma melodia disforme.
As ondas subiam alto e quebravam violentamente nas rochas, salpicando meus pés e meu rosto com água salgada.
Uma Tempestade se formava no horizonte.
Peguei meu celular e disquei um número familiar.
- William, onde você está seu idiota. Tem uma Tempestade se formando.
- Uma tempestade? Mas não tem chuva.
-Não esse tipo de tempestade idiota, o que quero dizer é que tem um amontoado de Ayakashis não muito longe da praia.
- Tá beleza, aquela mesma praia da mensagem?
-Sim.
- Ok, já chego ai.
- Vem logo antes que eu morra, porque meus planos para hoje era só tomar sorvete.
- SEM MIM?!?!?
- Você pode vir depois de matar os Ayakashis. - ouvi um suspiro na outra linha.
- Você tem que achar uma shinki logo.- ele falou.
- Eu sei.
-//-
- Onde ele está…?- falei pra ninguém em particular.
Olhei para a praia.
Havia crianças e famílias brincando.
Olhei para o mar e ele se acalmou, obediente, se tornando uma superfície quase lisa.
Parecido como um espelho d'água.
- Parece que terei que segurá-los por um tempo. - falei me afastando da borda do penhasco.
Apenas para correr e pular dele de encontro com mar estranhamente calmo que me esperava logo abaixo.
-//-
Corri sobre a água.
Meus passos levantavam gotículas de água e formavam anéis ondulantes como se fossem pegadas.
Olhei para a grande massa de Ayakashis na minha frente e percebi o erro que cometi.
Não eram vários Ayakashis pequenos.
Era apenas um gigantesco e ele se aproximava lentamente da praia cheia de pessoas.
Eu me equivoquei.
-//-
- WILL!!- gritei quando o Ayakashi pegou ele e começou a balançá-lo.
Corri sobre o dorso do Ayakashi na esperança de chegar até o tentáculo ( acho que era meio que a mão do troço ) que segura Will.
Mas a Coisa me viu ou sentiu e me jogou para longe.
Então uma massa de água semelhante a uma mão se ergueu e me pegou no ar.
Senti o gosto amargo de sangue na boca
Cuspi um pouco de sangue ,limpei os lábios com as costas da mão e me pus a correr em direção do Ayakashi mas fui lançada longe de novo.
Bati contra uma rocha e o ar escapou dos meus pulmões.
Cai na água e boiei por alguns segundos atordoantes olhando para a lua que já tomava seu lugar no céu.( William já deve ter mudado sua aparência, explico depois é que é meio complicado )
Foi quando eu a vi.
Seu brilho era prateado ligeiramente esbranquiçado.
Como a luz da lua.
Fui cambaleante em sua direção.
Era uma garota.
Parecia estar ainda na adolescência.
É uma idade meio difícil...
Estava próxima ao Ayakashi, escondida entre duas rochas no meio do mar.
Comecei a subir novamente o dorso do Ayakashi enquanto pronunciava as palavras:
- A você, que não tem pra onde voltar nem como seguir em frente...
… Eu darei um lugar a que possa pertencer.
Meu nome é Annie.
De posse do teu nome, detenho-te aqui.
Concedo-te um póstumo e faço de ti meu servo.
O ente leva o nome. A peça, o seu homógrafo.
Pela minha vida, torno-te instrumento.
O ente é "Gina"
A peça é "Aosenshi"
Venha, Senshi!
As duas espadas em que Senshi se transformou vieram á minha mão.
Corri pelo braço/tentáculo do Ayakashi e cortei fora a mão em que Will estava.
Will usou sua própria Shinki e deu um
golpe no Ayakashi.
E enquanto ele tentava pegar Will, pulei do topo da "mão" da Coisa ,alto o bastante para olhar de cima o Ayakashi tentar bater inutilmente em Will.
Enquanto eu caia, as memórias de quando Gina era viva vieram à minha mente.
E… por um momento…
…Eu escondi meus olhos com o antebraço.
E me permiti derramar uma lágrima.
A gravidade me puxou para baixo, me jogando na água com muita força.
Um humano não teria sobrevivido.
Fui em direção ao Ayakashi já fraco e desferi um último e certeiro golpe. Ele caiu na água e desapareceu.
Então meus joelhos cederam e desabei de exaustão, fechei os olhos e descansei, aproveitando a brisa suave e morna daquela noite.
Sinto alguém boiar ao meu lado.
- Você morreu? - pergunto á William, sem abrir os olhos e segurando Senshi firme contra o peito, meu coração martelando as lâminas.
- Não. - Will responde num tom cansado.
- Tem certeza?
- Sim.
- Então tá…
-…Ei, Annie- chamou Will depois de alguns minutos.
- O que foi?- respondi.
- Estamos no paraíso?
- Você não acabou de dizer que definitivamente NÃO estava morto?!- falei num tom falso de indignação.
- Eu sei mas… Está tão perfeito e calmo agora…
Suspirei.
- ...Eu entendo. - Respondi.
-E…Will?- chamei-o
- Oi?
- Por que você está segurando a minha mão?
- Elas estão frias.
- Elas são frias.
- Dizem que quando as mãos de alguém estão frias a pessoa está se sentindo solitária.
Encarei as estrelas e a imensidão negra que era o céu.
-…Solidão… - comecei.
- Não é uma sensação de que você está sozinho, é um sentimento de quando ninguém se importa.
Soltei sua mão me levantei.
- Giname!- chamei.
Uma garota de cabelos negros ligeiramente azulados e olhos verdes brilhantes apareceu na minha frente.
- O que…?!- ela começou ,olhei para sua expressão confusa e sorri.
- Olá Gina. Você deve estar muito cansada. - falei tirando meu casaco e pondo em seus ombros. Ela bocejou e piscou demoradamente.
- Quem é você?- Gina perguntou
- Sou sua mestre, sua companheira e guardiã. Eu vou cuidar de você nesse "pôs-vida".
- Então eu morri mesmo? É que eu… eu tinha a sensação e o conhecimento de que morri… mas acho que estava... apenas não queria acreditar. - dei um meio sorriso, ela parecia ter apenas catorze anos.
Ela era tão jovem…
Me abaixei ligeiramente para ficar à altura de seus olhos.
-Quer carona?- falei apontando para minhas costas.
- Claro!- ela falou dando outro bocejo.
- Ah! Só mais uma coisa.
- O que ?- perguntei já aguardando que ela subisse em minhas costas.
- Como estamos andando sob a água?- ela perguntou subindo nas minhas costas e deitando a cabeça.
- Por minha causa.- respondi.
- Mas já chega de perguntas.
- Durma, Gina. - falei enquanto a carregava.
-//-
P.o.v. Will
Já estávamos na cidade, Gina ainda dormia, eu e Mei não tínhamos falado muito no caminho.
- Mei. - começo.
- Oi. - ela responde.
- Você chorou quando recebeu as memórias de Gina, não foi? - eu havia mandado minha Shinki ir na frente e comprar algo para comermos.
- Sabe Will.- ela começou a falar olhando para o céu estrelado, entrando num devaneio.
- Gina mentiu ao dizer que estava bem. Mas… Há uma razão para mentira: funciona.- ela continuou.
-É uma verdade básica da condição humana que todo mundo mente. A única variável e sobre o quê.
Minha shinki veio com comida. Comemos nas mesas de uma cafeteria e depois todos fomos para a casa de Annie, era uma mansão, assim como a minha, digna de uma deusa ancestral. Entramos na casa , ela deu roupas apropriadas para Gina e nos ofereceu quartos para passar a noite.
Quando eu já estava de pijama e deitado na cama alguém bate na minha porta. Era Annie. Ela entrou, fechou a porta atrás de si e sentou com as costas apoiadas nela.
- William. A dor nos faz tomar decisões erradas. O medo dela também.
- O que você quer dizer?
- Ás vezes a voz Dela me diz coisas e me faz pensar. Will, o mar está em épocas sombrias. - os olhos de Annie escureceram de uma forma assustadora, eles pareciam ondas, ameaçadoras, batendo contra a praia e levando consigo o que nunca mais poderia voltar, às vezes levando vidas. Eles me davam arrepios.
- então ela começou a falar num tom sombrio:
-O mar esta em perigo
Posso sentir...
Posso sentir a revolta nascer no fundo da gota
que cai solitária no mar de tudo que nos cerca...
Posso sentir o movimento minúsculo da areia
se remexendo sob a água que finge-se parada...
Há uma tormenta por vir..
Posso sentir...- ela parou de falar e encarou o chão por alguns minutos.
- Boa noite Will, durma bem. - e se retirou do quarto.
Muitos usuários deixam de postar por falta de comentários, estimule o trabalho deles, deixando um comentário.
Para comentar e incentivar o autor, Cadastre-se ou Acesse sua Conta.