O vento soprava ao leste, mas pouco importava. O porto pequeno da cidade fora visto por um dos empregados, que trabalhavam dias seguidos limpando o navio e outros entregando as mercadorias para homens ricos, em terra firme. Seu capitão, um jovem cabeça de água, como o mais velho da frota, Adelbert, um marujo por toda a vida, que servira o falecido pai do rapaz, o chamava. Arjen Arken, perdera o antigo dono da embarcação há 7 anos, quando completara a maioridade, 18 meses de cada um dos doze. Cobus em seus 50 anos, ganhara uma fortuna, perdera outra e ao filho mais novo deixara apenas o barco e um baú. Ao filho mais velho, Daan uma bela casa no Norte do mundo onde nascera, para sua filha, entre os dois homens, conseguira um casamento com um nobre e deixara-lhe suas moedas 100 mil dracons, dinheiro suficiente para comprar mais de 100 barcos de Arjen em lugares com preços menores. Elly, a favorita do pai, todos falavam. Cobus pensara que agradara seus filhos. Daan apenas pedia-lhe um lugar para morar e plantar. Arjen era um homem do mar. Elly gostava da riqueza e do luxo, dos baile reais de cada povo, dos nobres e seus trejeitos engomados demais para os irmãos.
Quanto à cidade, povos, muitos povos. Morenos, negros, brancos e amarelos, elfos, anões e até mesmo alguns gnomos foram vistos por Arjen. Ele pegou apenas algumas de suas moedas, 5 dracons. Esperava que durasse mais ali, uma cidade onde um saco de batatas custava centavos e espadas de aço élfico nunca passavam de 30 dracons. Seu sorriso ao descer do navio deu-se também pelo estranhamento para a terra firme. Um mercador ao seu lado gritava na língua que pouco aprendera, mas sabia que vendia peixes e os chamava de baratos. O rapaz sabia como dizer barato e não em qualquer língua, para comerciar, é claro. Ao seu lado, um garoto de 15 anos, daquela mesma terra, porém ao Sul nascera. Ashok fugira de casa, aprendera a escrever em poucos meses e trabalhara para mandar uma carta para seu pai e um pouco de dinheiro, na terra árida onde viviam. Seu cabelo liso e a pele morena mostravam de onde era, do Reino Mazaboot. Encontrara o barco de Arjen aos 13 anos e sabia falar boa parte do idioma do capitão, chamado de nordene. Aprendera com um velho, que alguns chamavam de bruxo, mas nunca o fora. Apenas se denominava homem da ciência, não das religiões, pois apenas a ciência era o que via e apenas nela de fato acreditava. Arjen precisava de alguém para ajuda-lo com o idioma de Ashok, o aceitou e deu-lhe comida, dinheiro e um dracon.
— Ashok? Esse peixe é bom?
— Eu não sei, muito bien. Eu não sei muito bem — corrigiu-se, o sotaque aberto, com L no lugar U, em muitas vezes renderam alguns comentários de Arjen. O garoto não desejava ouvi-los outra vez. — Deve ser bom, Alguns dizem que é bom. Deve ser bom.
— Compre para mim, pois vou comer hoje este peixe. Tem algum dinheiro com você, agora? Ou vou precisar de dar uma de minhas lindas moedas de ouro? — perguntou, com a mão no bolso onde guardara o pequeno saco de moedas. Alguns ladrões existiam ali e mesmo com a adaga que aprendera a usar, sentia-se desprotegido ao mostrar tal coisa para seu empregado.
— Tenho, eu tenho. Posso comprar para toda a nossa tripulação?
— Compre para metade. A outra metade, eu tenho certeza que dormira fora do barco por várias noites e precisaremos procurar pela cidade — riu. — Não compre metade, pois há sempre alguns que já enjoaram-se de peixes. São borages — falou, chamando-os de chatos e inconvenientes, borage significava a duas coisas. — Você é um dos poucos que faz o que eu peço e nunca reclama de nada. Se parece comigo, quando eu tinha a sua idade, ou menos. É menos, bem menos. Com 10 anos eu já queria conhecer o mundo.
— Vai em algum lugar aqui?
— Vou naquela pequena loja da esquina onde tem aquela taverna. A taverna do... Como se chama mesmo o dono daquele lugar, hein, Ashok? Aquele velho que me apresentou da última vez que estivemos aqui? — Arjen fora ao lugar três meses antes e sua viagem para o oeste dera-se por um pedido de um nobre para seu exército. Distanciar-se do Reino de Mazaboot parecia-lhe mais difícil em cada dia. Seus pensamentos, em todas as pequenas cidades que passara chegavam ao lugar quente e árido. O dono da taverna, tão moreno quanto o marujo dele, mais alto, mais gordo e com uma barba rala e longa, tinha um nome incomum para o capitão. Como lembraria de tal estranheza? Arken tentava não esquecer, porém não conseguia êxito quase nenhum. O dono do lugar, possuía uma família grande, ao menos lembrava. Vários filhos fumando cigarro de palhas e suas filhas ajudavam a servir os clientes, nem sempre pacíficos.
— O dono da taberna, senhor? Taberna é onde se vende coisas, comidas, não é? — questionou, com a certeza de algum gesto inóspito do outro. Viera, um estalo e a mão direita ao rosto. — Ele se chama Anupam, senhor. O nome dele é Anupam. Eu tenho um tio com esse nome. Eu tenho muitos tios, na verdade. Sabe que nossa população está crescendo muito, mas ainda morrem muitas pessoas.
— Eu sinto muito. Pois é isto. Eu vou para a esquina daquela taberna e depois eu volto para o barco, quando terminar. Hoje aproveitaremos a cidade, porém amanhã entregaremos a encomenda que o Deheer Andreis nos pediu — falou o nome de um dos nobres de seu pequeno reino, porém rico e superlotado. Burtzee, um lugar frio durante o inverno, o outono e parte da primavera, todavia o verão colocava um pouco mais de claro em tais terras. Seu maior desafio sempre fora produzir comida para todos e conseguira, com os métodos élficos de plantio. Seu rei na época, Lars III, pagara mais de um milhão de dracons, em uma época de maior valorização da moeda, aos estudiosos orelhudos. Com o problema resolvido, os barcos dos humanos chegaram em diversos continentes, inclusive no Reino de Mazoboot. Alguns burtzelandeses moravam no lugar, inclusive Andreis, que cuidava de uma fazenda e ajudava os locais a governarem a cidade das regiões. Mais de 500 mil pessoas desembarcaram no lugar para seguirem seus senhores e o país se misturava, cada vez mais. Apesar da colonização já durar quase 300 anos, poucos ali falavam burtzelandês e as colônias de estrangeiros estavam cada vez fechando-se em maior quantidade.
— Eu vou então comprar o que o senhor falou para eu comprar, é claro. — O garoto, vestido com uma camisa verde, de um material macio e caro, seguiu o seu caminho, sem fazer questão de olhar para trás e ver o capitão, sempre muito lento, para vigiar bons produtos nas barracas de rua. As mangas curtas e a calça listada de azul, colocada no joelho o protegiam de sentir muito calor. Os sapatos foram deixados no barco e seu dinheiro guardado no bolso.
Arjen, como o menino imaginara, observara quase tudo que era vendido aos poucos, perto do cais. Muitos estrangeiros, de várias partes do mundo atracavam ali e compravam as iguarias e melhores partes de tal lugar, para fazerem-se um pouco mais felizes quanto aos bens que possuíam. Quando ele chegara no grande Império do Norte, onde a neve reinava e o frio permanecia por todo o ano, o Império Oer, escutara um dos amigos que fizera perto dos barcos, entre a madeira e o ar. O homem falara que aquele desconhecido do Sul e do Oriente, nunca comprara algo realmente interessante, de fato diferente, algo colorido e chamativo. Ao chegar no lugar bem falado, Arjen encontrou o prometido.
As ruas sujas, limpavam-se com empregados de senhores burtzelandeses. O novo prefeito, eleito por aristocratas comerciantes, prometera mantê-las com bom cheiro e afastar as pessoas mais pobres de lugares bem frequentados. Era do reino o governante, mas sua lealdade estava muito longe.
Arjen chegara até a esquina prometida para o seu empregado. Pensara em entrar na taberna, beber algo, porém a língua seria uma barreira. Preferiu ir mesmo na loja, onde o dono falava seu idioma muito bem, por ser de seu reino. O lugar pintado com cores azuis e com vários andares, parecia cheio, com colunas estreitas entre os produtos. Os passos contidos do rapaz, pararam, ao observar uma folha de papel amarelado. As inscrições em sua língua foram bem entendidas, não só pelas palavras, mas por desenhos. O mapa do grande mundo que tivera o prazer de conhecer muito bem em sua vida, para ele. Sabia que um ou dois continentes foram pouco visitados, outros três não chegara a pisar, todavia sim, conhecia muito do mundo em que vivia e ninguém poderia falar o contrário. Suas mãos pegaram a folha, da qual vira o verso e abriram-na, com cuidado e um sorriso visto na boca do rapaz com mais frequência durante sua infância de descobertas no barco de seu pai. As ilhas que existiam no gigantesco mar, lembravam-lhe mais que apenas a terram, após dias navegando e cantando as músicas dos marujos e piratas, notou também outra memória, a de um amor, correspondido, deixado e talvez, mal aproveitado. Seus olhos correram pelo mapa, continentes e mais continentes, nomes impronunciáveis.
Duas moças e um homem, com roupas caras e com peles tão brancas quanto a de Arjen, pediram-lhe licença para passar. Não notara o que fizera, não notara a obstrução antes.
— Passem, me desculpem, estava empolgado — sussurrou a última parte, movendo-se para mais perto dos outros pergaminhos. Pensou que não escutaram tudo, porém, a moça mais nova entendera e mandara-lhe uma pequena risada, tão indecifrável como os nomes daquele lugar.
O preço do mapa passara-lhe pela cabeça. Compara um por 500 miltavos de dracons há meses. Pensara que o preço girava em tornou de 600 miltavos, ou algo parecido, pois naquela loja, mapas sempre saíam caros.
Deixou o pergaminho, colocando entre dois outros, menores e com apenas algumas partes do mundo. Talvez precisasse de outros, mais específicos e também com preços baratos, porém deu de ombros ao pensar na possibilidade prosseguiu pela loja, com a boca franzindo-se.
Seus dedos tocaram a madeira da estante que segurava os produtos e assim, ele viu-se um pouco mais feliz que antes. A madeira lisa, dava-lhe um prazer estranho, gostava do material .Seu pai fizera um banco no barco que possuíam quando ele era muito pequeno para que brincasse, e assim a parte da árvore, bem polida, fez também parte de sua infância. Era o mesmo tipo de árvore, conhecida por ser importante para bruxos, todavia bruxos não importavam para ele. Ver um bruxo estava fora de sua lista de desejos. Alguns dos grandes personagens do mar, possuíam sim poderes mágicos, todavia seu interesse estava em heróis e piratas malvados.
— Vamos ver o que existe neste lugar — falou para si. Andou ao interior do lugar e a escada para o segundo piso surgiu-lhe, com o ar convidativo de quatro pessoas subindo-a. Deu de ombros, parecia bom. O que procurava na loja poderia estar ali pelo que lembrava-se. A moça que antes sorrira-lhe, chamara a outra para segui-lo, não com tal intenção, mas estavam atrás dele.
Mais prateleiras lotadas e pessoas com a vontade de comprar de bússolas às pequenas adagas do local. Sereias e tubarões, pintados em pequenos círculos de madeiras para decorar barcos grandes ou pequenos. Arjen, nunca vira um barco médio com tal coisa, não sabia o motivo, mas sabia o que ocorria nos mares em que conhecera.
— Interessante — a moça falou para a outra. — Seria bom vermos uma sereia e termos todos os encantos que elas possuem, imagine. Seria muito bom. Você teria o marido rico que tanto deseja — debochou, com as mãos chegando à madeira pintada com o fundo branco. — Você prefere o sobrinho do Deherr Anderis ou algum aristocrata?
— Deuses, o que passa por sua cabeça? — perguntou, meneando a cabeça para negar.
— Deherr Anderis — Arjen repetiu. As duas o olharam, com olhos arregalados, ainda que ele desconfiasse que uma das jovens apenas ganhara o que desejava. — Eu conheço ele. As senhoritas tiveram a mesma oportunidade que eu?
— Ah, sim. Nós costumamos ir para os bailes dele — a jovem respondeu, a ponto de cutucar a outra. — E o senhor? O conhecê-lo. Também trabalha para ele? Bem, o meu irmão, que deve estar no andar debaixo, ainda, se os deuses me ajudarem, também trabalha para ele, como um administrador. Todos nessa cidade aprecem trabalhar para ele, na verdade, mas o senhor não deve estar muito interessado em quem trabalho ou não para o Deherr. Eu também não me interesso muito, mas pode ser um ele entre nós dois, pelo que vejo, Senhor...? Qual é mesmo o seu nome? Não me lembro de tê-lo dito para nós duas ainda, mas é do país do Deherr e consequentemente do nosso, não é?
— Sim, eu sou do país dele, mas agora sou mais conhecido como capitão de um navio. Eu só quero fazer uma entrega para ele amanhã, na verdade foi a única vez que trabalhei para ele. Gosto mais da liberdade que tenho agora, senhoritas. Meu nome e Arjen Arken. Bem, é um prazer conhece-las, senhoritas, que eu ainda não sei o nome — sorriu.
— Ah, fui um pouco tola — a moça retribuiu sua expressão. — Como eu me chamo? Esta é Eveline, minha irmã e eu sou Hedy van Blanken. Meu irmão se chama Harm, se quiser saber, Sr. Arken. Ou eu deveria dizer Cap. Arken? — brincou.
— Não sei. Mas na verdade eu não sou de nenhum exército e muito menos gostaria de perder minha vida por reis imbecis, então, talvez seja melhor chamar-me de Sr. Arken. Bem, eu não sei muito sobre onde posso encontrar uma corda nesse lugar, imaginem. Também procura outra coisa, muito importante para mim. Estavam falando sobre sereias. Pois bem, eu não tenho muito problemas com essas belas moças, que adoram cantas nos ouvidos bonitos de meus marujos, mas eu tenho outros problemas quando estou dentro do mar. Há muitos monstros. Devem saber que os mares estão cada dia mais mortais. Eu fico muito preocupado e poucas lâminas podem cortar tão bem como o aço élfico, porém há mais que aço élfico em meus desejos — continuou, sem tirar os olhos de Hedy. — Quero uma caixa de pó de longitude. Talvez tenha essa nome por manter os monstros muito longe dos navios. Tem um cheiro muito desagradável para eles, além de também disfarçar o aroma humano. Sabem onde posso encontrar?
— Deve ser mesmo por aqui. Meu pai, antes de voltar para o nosso país comprou isso e disse que perto havia esses desenhos de sereia. Lembra-se disso Eveline? — perguntou. — Meu pai foi viajar, há dois anos. Faz algum tempo que não nos manda cartas, porém papai sempre foi assim, um homem do mundo. Ele queria estar outra vez em nosso reino. Eu pedi para ir com ele, mas falou que trataria de negócios muito importantes e não poderia dar nenhuma atenção para mim enquanto estivesse lá. Eu desisti de dizer alguma coisa melhor para ele. Meu pai sempre possuiu alguns problemas com o mar, porém nunca deixou de viajar também.
— Meu pai morreu — fez uma careta sofrida.
— Meus sinceros sentimentos.
— Não se preocupe. Ele deve estar melhor agora. Quando era vivo minha mãe vivia brigando com ele. Depois ela morreu e ele conseguiu amantes ainda piores. Não se preocupe com o meu pai. Minha irmã também tirava qualquer tipo de sono que ele possuía. Precisava ver como as coisas funcionavam lá em casa. Nada muito agradável, eu devo dizer.
— Então, não vai comprar o que precisa? — Eveline quis saber, preocupada com a conversa da irmã com um estranho.
— Não, tenho o dia todo para ficar na companhia de tão belas moças. Não se preocupem comigo. Eu estou muito bem aqui. Tenho um marujo que é dessas terras, um pouco quentes, áridas. Eu prefiro o frio do Norte, de onde eu vim. Adoro o Norte da forma que ele é, quase inóspito, mas um lugar de paz para aqueles que encontram sua força na neve branca. Bem, nunca ouvi dizer que neves tem outra cor — riu.
— Eu nasci lá — Hedy contou. — Mas logo vim morar aqui. Minhas lembranças daquele lugar se perderam, infelizmente se perderam. Eveline se lembra mais daquele lugar, que eu, não é, Eveline?
— Sim. Era muito frio, muito frio. Não sei se gostaria de voltar agora. Eu sou dois anos mais velha que ela, mas nosso irmão é quatro anos mais velho que eu — contou, para tentar assustar o rapaz.
— Interessante. Onde seu irmão está?
— No outro andar, ainda — Eveline contou. — Mas bem, penso que é a hora de irmos nos encontrar com ele, pois já deve estar preocupado com nossa demora aqui em cima, não pensa Hedy?
— Não. Ele sempre fica conversando com alguém também e precisamos esperar, esperar e esperar. Para mim é pior, Sr. Arken, pois essa moça aqui — apontou para a irmã — sempre reclama e eu preciso ouvi-la todos os dias em que saímos. Nosso irmão agora será pai e faz um escarcéu para sairmos por ele pelas ruas imundas da cidade. Como ele me irrita fazendo isso. A esposa dele, finge estar passando mal todos os dias, não gosta de sair aqui, como eu. Tenho certeza que em nosso país eu seria muito mais feliz.
— Bem, eu garanto que não é mesmo um lugar ruim, porém não possuo nenhuma resistência ao reino onde estamos. A sua cunhada vivia no Norte?
— Sim, mas o pai dela recebeu dinheiro o suficiente para mandá-la para cá sem pensar metade de uma vez. Ela reclama de tudo, mas também;.. Não deve gostar muito de meu irmão....
— Hedy — Eveline interrompeu.
— Bem, devem ficar em nosso país, se desejam, mas um filho muda as coisas. Eu sempre pensei que aqui as pessoas casavam mais cedo, porém vejo que ... Eu estava errado, ou um pouco errado.
— Fazemos isso para mantermos as tradições do nosso país e para mostrarmos a diferença social. Claro, não concordo com sermos superiores, porém é nossa cultura — Hedy explicou. Arjen sorriu, outra vez, abobado, porém algo mudara. Ela não agia como as outras, apenas interessada em riquezas e agradar seus maridos parvos. Não gostava daquele lugar, mas também desejava muda-lo, entendeu.
— Bem, eu vou tentar procurar o que preciso e depois podemos nos ver — andou para o lado.
— Sr. Arken — chamou Hedy. — Meu irmão trabalha para o homem que verá amanhã. Não é difícil descobrir endereços. Não é difícil saber onde nós moramos. Se quiser, qualquer coisa, aproveite que somos do mesmo país e falamos a mesma língua, mas não importa tanto.
— Não tenho dúvidas disso, Srta. van Blanken. — Ele continuou seu caminho, fugiu da jovem. Gostaria de perguntar-lhe 1000 vezes e depois que terminasse seria noite e a levaria para jantar, depois para algum hotel luxuoso no centro da cidade, para pessoas de seu país, do Reino Burtzee. Não poderia, porém o jogo não havia chegado em seu final, logo pensou.
Rodou a loja para encontrar o que desejava. O segundo andar dera-lhe os produtos. No primeiro piso encontrara um lugar para pagar e deixar a loja. Não vira se os van Blanken haviam partido, apenas concentrou-se em fazer o que necessitava. Atravessou as ruas que o separavam se seu barco com pressa, não olhara mais nada. Sua camisa branca e as botas o deixaram com calor. A tarde chegava em seu fim e adoraria ver o Sol se pôr dentro do Mar.
Entrou dentro do navio, após um pulo rápido e alto. Ali enxergara uma das mulheres que viajava com ele. Uma meio elfo, de cabelos dourados certa vez conhecera-o, na cidade onde nascera e crescera e pedira-o ajuda para fugir do lugar, para fugir do pai, quase obrigando-a com os estudos sobre magia que sempre detestou. Pouco para alguém que tanto pensara em ser melhor que vários outros, mesmo de sua espécie, chamada de a Grande Espécie por alguns elfos orgulhosos de serem quem eram.
— Senuni — chamou ele, vendo-a observar o balanço das águas e os peixes que rodeavam o navio. — Não quer nadar um pouco comigo? Eu estava andando e digamos que é mais quente que eu me lembrava — contou. Seus pequenos sacos com os produtos foram deixados nas escadas em uma das extremidades do barco. — Não vai me deixar nadar sozinho, não é?
— Não — ela virou-se para ele. — Eu não gosto de deixa-lo nadar sozinho. Eu fiquei para assegurar o barco para os outros. Até aquele orc que contratou gostou bastante da cidade. Eu não sei, mas não gosto muito de andar aqui. Tem diferenças para a minha cidade, não há árvores muito grandes, ou pessoas que falem nossa língua em todos os lugares.
— É um lugar interessante para mim, mas não passa muito disso também — sorriu, franzindo as bochechas brancas, sem nenhum fio de barba aparente. Arjen era conhecido por seus marujos como vaidoso, quase uma mulher nobre dos Reinos do Norte, dos Impérios do Sul. — Mas hoje aconteceu algo um pouco diferente do que costuma quando estou aqui. Conheci uma jovem do meu país e a irmã dela também. As duas pareciam esnobes para mim, porém, porém, porém — brincou. — A mais nova sorriu-me e fui atrás, quero dizer, ela foi atrás de mim no segundo andar da loja. Eu não sabia que essa cidade era tão divertida assim. Nós dois conversamos muito sobre este lugar e então ficamos um olhando para o outro, com aquela expressão de não saber o que fazíamos. Também falamos sobre o nobre que vou entregar tudo para ele amanhã. Ele me parece uma moça interessante, muito interessante.
— O que deseja? Ela é do seu país, deve fazer parte da classe mais alta desse reino. Eu não entendo suas esperanças com ela — encostou-se na borda do barco, que ficava áspera com o vento e o Sol. — Não é possível que seja mais de uma brincadeira dela, Arjen.
— Esqueceu quem meu pai era. Era neto de um grande nobre, e isso também me faz nobre.
— Sua irmã tem todo o dinheiro e seu pai agora. Não acredito que ela se casaria com você por puro amor e mesmo se fizesse, os parentes não permitiriam isso — apontou. Por vezes, Arjen parecia-lhe muito sonhador, mesmo sendo o capitão de todos eles, o homem que de tudo faria para vê-los mais feliz e satisfeitos com o trabalho que ali possuíam, para sobrar-lhe um bom lucro, além da força em batalhas com espada que demostrara ter. Ainda era um menino, que desejava ser feliz em um mundo de conto de fadas, porém como sabia, o mundo parecia mais com o conto onde as bruxas más venciam os príncipes e princesas.
— Eu tenho o baú do meu pai.
— Você não sabe o que está dentro daquele baú Arjen. Se esqueceu disso? O que pensa que há lá dentro. Um gênio da lâmpada e é claro, a lâmpada do gênio? Vamos voltar para a realidade, o máximo que há lá dentro é algum pouco de ouro, alguma espada rara e um mapa para um tesouro — debochou. — não, não deve haver mais que 1000 dracons lá dentro.
— Meu pai, antes de morrer falou que eu deveria abrir quando sentisse que precisasse e que havia algo muito poderoso lá dentro. Eu ainda fico a pensar no que pode ser. Sabe que meu pai sempre foi um homem misterioso. Talvez possa mesmo haver um grande mapa para o tesouro, mas meu pai não era um pirata. Piratas estão presos. Navegamos todo o Mar e sabemos disso. Eu você sabemos muito bem que essa lenda de piratas e seus tesouros hoje, são apenas isso.
— Vamos nadar Arjen.
— Eu gostei dela, de fato gostei muito daquela menina. Eu quero conhecê-la melhor— falou, antes de tirar a camisa, jogá-la e pular na água.
O Sol brilhante, mesmo dentro da água, esquentou o dia, a água e mandou embora qualquer lembrança que alguém possuía do frio naquela cidade. Arjen imaginara que fora por todo o país. Quando retornou ao seu navio, o orc, alguns anões, outros humanos e Ashok esquentavam seu peixes na paria ao lado da gigantesca Marina e quando estes ficavam prontos voltavam para o barco. O garoto levou o peixe para seu capitão, com o molho picante que alegava gostar, porém o menino desconfiava que era apenas mais uma estratégia para parecer muito forte.
Dormiu em sua cabine, após as músicas que um dos bardos de sua frota cantou. O anão Argão, possuía cabelos ruivos e um instrumento de cordas sempre consigo. Sorria e bebia o bastante para todos gostarem dele e de sua música. As canções de amor, poucas, mas tocantes, nunca haviam feito tanto efeito no capitão, que encontrou-se pensando em Hedy. Não entendera muito bem os seus próprios sentimentos. Não conhecia, não sabia se preferia chá ou café, se gostava mais da noite ou do dia, se preferia rosa ou roxo, pois vestia amarelo, no vestido que deixava aparente seus ombros e de tecido fino, usado pelas mulheres naquele local.
Acordou cedo no dia seguinte, não bebera de noite, não sentira nada mais que calor ao jogar o lençol que o protegia dos mosquitos ali. Colocara sua camisa, jogada no chão. Mal lembrava-se de como a roupa fora parar ali. Suas botas foram calçadas logo depois. Sentara-se na cadeira que fora de seu pai, bem como a mesa em sua frente, com o mapa de todo o mundo. Em todas as manhãs ele observava cada ponto do mapa e pensava neles. Quase como um ritual, escrevia um diário de capa preta, sempre ao lado do grande pergaminho desenhado. Fazia aquilo desde criança. Aquele era o décimo livro, mas tentava escrever com a letra pequena, todavia a tinta e a pena não gostavam de servi-lo como gostaria.
Ashok conversava com um dos marujos, fora do barco. O garoto não parecia bêbado, mas o cheiro de cerveja, misturada com alguma outra bebida, chegara até Arjen. Aart trabalhara para Cobus, trabalhara para o novo capitão. O homem era conterrâneo do líder do navio, falava muito onde quer que pisasse e junto com suas falas as bebidas. Ele perdera a família jovem demais. Com 17 anos, tinha um filho, uma esposa, mas os deuses levaram-nos com tuberculose. Os outros tripulantes imaginavam que aquele era o principal motivo para o homem beber muito e Arjen não discordava muito. Ashok, não sabia muito bem como, mas tornara-se o melhor amigo do homem assolado pelo álcool
— Aart, gostou do meu Reino, então? — perguntou.
— Sim. Gastei muito ontem. Havia tudo que eu gosto. Havia a melhor cerveja que já provei no Oriente inteiro, menino. Eu adorei esta noite. Arjen poderia ficar por mais um mês e eu estaria muito feliz —falou, encostado em um grande poste que prendia o caminho à terra, abaixo da água do Mar. — Vamos ficar para sempre — brincou.
— Eu fui embora desse país — Ashok lembrou. — Eu não gosto tento de ficar. Parece muicho normal para mim ficar aqui, o senhor sabe como é normal ficar em casa. Eu sempre sinto que nada de estranho está acontecendo e assim fico um pouco triste comigo mesmo, pois queria estar mais perto de meus sonhos, mais longe de casa.
— Hoje eu não vou beber. Minha cabeça vai doer muito. Isso não é algo que eu queira. Vou dormir no barco, tomar um bom banho no mar e voltarei a dormir. Preciso comer mais. Ontem eu comi um pouco, mas preciso comer mais — afirmou o homem loiro, com a barba por fazer. Já passara dos 50 todos sabiam, porém não tinham certeza de quantos anos. Nascera no quarto dia Agung, a maioria sabia, mas não em que ano.
— Nossos deuses devem ajudar-lhe com a cabeça — Ashok apontou para a sua própria.
Arjen resolveu intervir. Sua fome pequena não chamara-o para o outro canto do barco, onde alguns tripulantes comiam os pequenos damascos que compraram no dia anterior. Seus olhos fitaram Ashok.
— Algue alguns cavalos em carroças e depois venha me ajudar a transportar os baús, menino. Por favor, faça isso para mim se puder, é claro. Ah, eu quero logo estar em terras diferentes, mas agora as coisas mudaram.
— Do que está falando Arjen? — Aart sorriu para o capitão.
— Do que mais além de mulheres eu poderia estar falando. — Ele fez um gesto com a cabeça. — Entre e vá dormir. Pode ser no escuro também. Não se importe muito em ver o Sol. Sei que você é um homem da noite, eu tenho certeza qu você é muito mais um homem da noite — sorriu para o seu marujo, sem brincadeiras, apenas por fazer.
— Sim, senhor, Arjen. Estou indo — ele falou. — Vou dormir no escuro, como os piratas adoravam fazer na época onde nossos antepassados conquistaram todos os mares do mundo das mãos de outro reinos que não possuíam nenhuma vergonha em suas fazes, como eu já sei.
— Vamos falar de coisas melhores que piratas — Arjen pediu. — Eu estou indo pegar os produtos. Faça o que lhe pedi Ashok, faça o que lhe pedi — apontou o jovem. — Hoje o dia pode ser mais longo. Vá fazer o que lhe mandei logo, pois também preciso fazer outras coisas além de entregar a mercadoria.
— Bom dia, irmãs. Bom dia minha esposa — Harm cumprimentou, antes de puxar sua cadeira e sentar-se à mesa com os três mulheres. — Hoje vou trabalhar como mais um dia. Deuses, eu não sei se estou muito satisfeito — comentou.
— Aquele seu patrão ajuda muito — Hedy ironizou. O homem sisudo, Deherr Anderis, não passara ainda pela casa dos quarenta anos, mas havia quem apostasse que estava perto dos cinquenta, não pela aparência e os músculos bem definidos, mas por sua forma de pensar, de falar e de ser. — Eu não sei como ele conseguiu arrumar um bom casamento.
— Eu estudei com a esposa dele — Harm lembrou. — Ele é muito rico e ela adora ter dinheiro para comprar boas joias. Por qual outro motivo você deduz que uma mulher casa?
— Harm, pelos mesmos motivos que um homem como você casa também, ora. As mulheres casam por poder, dinheiro, família, amor e aquela outra coisa que não devo dizer agora, ou seria expulsa da casa do meu próprio pai — falou. Harm, mexeu nos cabelos pouco acima dos ombros. Odiava que a irmã mais nova falasse de mais, porém não poderia evitar que tal coisa acontecesse.
— Cale-se — ordenou. — Fique calada, antes que eu lhe mande para o seu quarto agora. O seu pai foi quem me deixou no comando e ele também era meu pai. Na fale asneiras. Acabara sendo uma péssima influência para a minha esposa. Eu odeio este seu modo de pensar que tudo está bem com você aqui. Fique muito quieta — alertou. — Não quero mais piadas dentro desta casa. Escutou.
— Agnes — chamou a cunhada. — Me perdoe por ter um irmão assim. Ele só deve ter casado com você por algum motivo de força maior, não é? Harm fale a verdade para a sua esposa sempre que preciso, meu querido.
— Suba, eu estou farto.
— Subo — falou. Ela aproveitou para pegar um pedaço de biscoito e sorriu ao irmão. — Bem, até mais tarde, se não desejam a minha presença aqui, então. Adoro quando falam mal de mim.
Subiu, rápido o bastante para ofegar no final da escada. Em todo o dia permaneceu em seu quarto, lendo, tricotando, e observando os vizinhos brigarem da posição privilegiada que era a janela. Um dos empregados trouxe-lhe o almoço. Ela comeu pouco, não estava com fome, pensou, todavia algo tirava qualquer vontade que possuía percebeu. Arjen, Arjen voltaria a falar com ela? Penspu se deveria realizar uma loucura qualquer, como fugir com o capitão e livrar-se de Harm em uma única tacada. Não, na metade da tarde desconsiderou a hipótese, enquanto lia um dos livros de romance, chatos para ela, melosos. Quando viu a mocinha fugir com seu amado desconhecido começou a ter novas ideias. Seu desejo de vingança contra o irmão pedia algo maior que uma simples fuga, imaginou, porém era muito trabalhoso armar algo. Passou a ler sem nenhuma pretensão. Um noivo rico tirar-lhe-ia dali, em dois anos, três no máximo, como sua irmã estava com o casamento quase marcado. Dormiu com a chegada da noite, logo acordou A fome chamava-a, como uma velha amiga para fazer algo errado. Sair do quarto não poderia. Passos baixos chegaram até sua porta. Uma das empregadas bateu.
— Senhorita, posso abrir. Tenho duas coisas que penso que gostará. Sua irmã pediu que eu desse-lhe comida e uma carta chegou há algumas horas. Espero que fique melhor.
— Claro. Abra. Estou mesmo precisando de alguma comida nessa hora da noite. E a carta é de quem? — perguntou, com a resposta em mente. A empregada abriu a porta e surgiu com uma bandeja, entre papel e comida.
— A carta e do rapaz que está lá embaixo. — Maldita casa na qual poucos sons interessantes eram ouvidos. — Ele é de seu país, senhorita. Escutei dizer que é um capitão e conseguiu o endereço para falar diretamente com o seu irmão. Eu não sei o que ele quer.
— Arjen Arken. Esse é o nome dele, não é?
— Se não erro, deve ser isso, sim. Quer comer agora?
— Eu quero a carta que ele me mandou primeiro.
— Claro — entregou. Colocou a bandeja no móvel ao lado da ampla cama de Hedy.
Ele desfez a embalagem com rapidez e olhou para ao fita dourada que o rapaz escolhera. Seus olhos vibraram com tal cor, com tal coisa.
— Eu não estou acreditando que ele veio mesmo aqui. Eu não estou acreditando que ele quer mesmo algo. Eu não confio nele, mas me mostrou que deveria.
— Quem é ele, senhorita? — perguntou a empregada, parada na frente de Hedy, sem entender o ocorrido que deixou a jovem animada demais para alguém que passara o dia trancada.
— Ele é um capitão. Eu vou com ele. Eu vou procurar o meu pai no Norte — revelou. Se ele gosta mesmo de mim, ou ao menos quer me ver, bem, eu devo procurar o meu pai. Ele não manda nenhuma carta há seis meses, o que quer dizer que pode estar desparecido entre a neve. Eu não quer over o meu pai desaparecido entre a neve.
— Senhorita, não é um....?
— Está muito tarde para eu deixar os meus irmãos nessa casa, isso sim. Eu odeia essa ideia de ficar em casa para agradar esses dois. Que dia ele falou que partirá? Ele falou alguma coisa sobre isso.
— Falou que irá amanhã muito cedo e que veio até aqui para conversar com seu irmão.
— Preciso descer. Ele pode ser um estranho, mas é o único que pode me tirar dessa casa e me levar até o meu pai. Eu tenho certeza que ele conseguirá fazer o que eu pedir para ele.
Ela desceu, sem comer, ou ler a carta. Seu irmão estava no escritório. Ouviu parte da conversa. Cumprimentou Arjen e este iria embora logo em seguida. Alguma permissão para corteja-la fora dado, pelo que entendera.
Depois que Arjen cruzou a porta e Hedy sentou-se na janela, mais triste que antes, vira-o passar pela rua. Não teve outra opção. Chamou-o.
— Arjen. Li sua carta. Sei que gostou de mim. Amanhã, me espere, pois estarei bem cedo em seu navio.
— O que está dizendo? Eu não tenho permissão para leva-la, ainda. Seu irmão me pareceu feliz que alguém queira lhe conhecer, mas ele não estaria se alguém fugisse com você, é claro.
— Me espere, eu vou estar lá, na hora que for sair eu irei com você. Não se preocupe quanto ao resto. Posso deixar uma carta. Bem, eu não vou fugir para ficar com você, não sou louca. Preciso descobrir o que meu pai esta fazendo e onde ele está. Disse que procuraria algo no Norte, em nosso país e depois estaria de volta. Eu não quero mais ficar com o meu irmão. Eu estou cansada da vida que tenho aqui.
— Norte?
— Ele disse que há um tesouro no Norte. Bem, talvez ele possa ter ser perdido ou ficado sem dinheiro. Poderia me ajudar a encontra-lo e fazer bons jantares para mim no navio.
— Está certo.
— Eu não posso aceitar o tratamento que tenho aqui.
— Se quiser, venha comigo — sorriu. — Agora eu preciso ir.
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