História O Cheiro da Lua - Maturidade

Tsc. Odeio quando me subestimam, ainda mais quando é uma mulher que o faz.

- Vai ficar me seguindo até quando? - bufei ao parar.

Havia entrado na floresta para poder conversar diretamente com essa loba.

- Até você considerar a minha proposta. - resmungou, parando logo atrás de mim.

- Quantas vezes eu tenho de dizer que não quero entrar para uma alcateia?! - virei-me para encará-la.

Ela manteve a pose e ergueu uma sobrancelha, essa atitude estava me irritando.

- Não é uma questão de querer, e sim de precisar! - ela se aproximou mais um pouco e ergueu a cabeça para me encarar.

A loba era tão pequena que sua cabeça batia abaixo do meu peito, teria rido da sua cara se a mesma não tivesse começado a me cutucar.

- Não me ignore, novato! 

Como me irritava ser chamado assim, só que não conseguia ficar bravo com ela.

- Você não vai me deixar em paz nunca? - resmunguei.

- Não. - curta e grossa. - Me dê uma chance de te convencer.

Não sei se foi o seu cheiro, a sua voz ou os seus olhos, mas acabei cedendo.

- Você não vai se arrepender! - sorriu. - Sou Lorena, e você?

- Triton. - revirei os olhos mostrando minha falta de paciência, não que essa nanica se importasse.

Lorena dá um giro e caminha em direção a uma pedra, sentando-se.

- Não vai se sentar? - apontou para o lado e piscou, estava achando que já a consideradava uma amiga.

Ignorei seu comentário e me encostei em uma árvore, Lorena deu de ombros e começou a falar. Ela tentou me convencer de todos os jeitos possíveis, mas nada me interessou ao ponto de entrar para uma alcateia e ter de obedecer a um alfa.

- Por que você vive sozinho? - perguntou assim que me preparei para ir embora.

- Por que se importa? - rebati.

Seu sorriso dizia que eu havia caído no seu jogo. Merda.

- Porque somos lupinos, e nos preocupamos com os da nossa espécie. - respondeu calmamente.

Ergui uma sobrancelha, Lorena suspirou e se levantou.

- Você é mesmo teimoso, Triton. - comentou. - Mas não pense que vou desistir de você. - e simplesmente virou as costas e foi embora.

*

Finalmente havia conseguido me livrar dela e mesmo assim as suas palavras enchiam a minha mente.


Por que você vive sozinho?


Há anos que evitava essa palavras e suas derivadas: solitário, isolado, abandonado. Depois daquele dia, não suportava ficar despovoado, por isso andava pelas cidades grandes. Com o tempo, parei de temer e comecei a curtir a vida, sem criar laços e sem preocupações.

A vida de lupino ajudava muito nesse meu novo modelo de viver, muitos anos para fazer o que bem entender. Sempre foi bom e simples, então por que justo agora que eu fizera vinte e sete anos - maturidade - essa mulher vem e bagunça a minha cabeça?

Admito que nunca parei para pensar em alcateias e pretendia continuar assim, já que a ideia de lobos e lobas juntos remete a uniões, amigos e família - laços - sendo assim, sempre há perdas futuras.

Portanto, era simples e direto, não queria isso para a minha vida, pois não passaria por aquilo de novo. Nunca mais! 


Já havia perdido tempo demais com isso tudo, foi então que decidi sair para uma balada. Aqui, eu pensava apenas para fazer o que eu queria e nunca chegava cedo, porque todos estavam sóbrios e chatos até a uma da manhã.

As duas, a situação começava a ficar interessante, bebida à vontade com mulheres dançando sensualmente. Mas depois das três da manhã era a melhor parte, mulheres já não estavam mais bêbadas, mas animadas sem vergonha alguma... Momentos perfeito para ganhar benefícios noturnos.

Sexo no banheiro não era dos melhores, embora nenhuma delas tenha reclamado até hoje. Além de que só levava para casa, as mais tentadoras, aquelas que valiam a pena passar a noite inteira na cama.

E esta noite havia me rendido duas gostosas e desafiadoras mulheres que considerei valerem a pena.

*

Acabei acordando mais cedo do que o usual, as duas permaneciam esgotadas na cama, o que não era surpresa depois de três horas de sexo. Realmente, não tinha do que reclamar, depois que terminei a faculdade ficou muito mais simples viver, eu até conseguia dormir uma noite inteira sem ter pesadelos com aquele dia.

- Refletindo sobre o passado? - a voz daquele loba surgiu a minha frente.

- Como você? Não, o que você está fazendo aqui? - tive de me esforçar um pouco para enxergá-la no sofá.

- Simples... Eu te segui. - afirmou como se fosse algo natural. - E não, não estou apaixonada por você.

Ignorei-a e fui até a cozinha, talvez agora eu estivesse tendo alucinações... Que ótimo!

- Vai continuar negando? - ela me seguiu, logo deduzi que não estava ficando louco.

- Não estou negando nada. - respondi. - A não ser que te evitar seja considerado negação. - sorri me divertindo.

Ela rosnou e depois respirou fundo, andou até a mesa e puxou uma cadeira, embora só a tenha usado para se apoiar.

- De verdade, Lorena, certo? - fingi desinteresse. - O que você quer tanto comigo?

- Primeiro, quero que você pare de fugir. - revirou os olhos. - E segundo, quero que você entenda que precisa de uma alcateia.

- E por que você ainda acha que eu preciso de uma alcateia? - virei-me, encarando-a.

- Você fica se escondendo, fica fingindo que é forte e que não precisa de ninguém. - ela riu. - Pois vou te dizer que esses são os mais carentes.

Ergui uma sobrancelha, o que ela tanto queria comigo? Por que não podia deixar eu viver a minha vida do jeito que estava?

- Você sabe do que estou falando... Seu passado te tortura, e você não quer mais se aproximar dos outros porque tem medo que a história se repita. - afirmou sem medo.

Rangi os dentes de raiva, o que era pior do que alguém que entendia seu maior medo e ainda lhe jogava na cara?

- E devo acreditar que você e toda a sua bondade vieram me ajudar, levando-me para uma alcateia onde não haverá perdas? - zombei-a.

- Não seja estúpida, perder alguém é algo natural, talvez nem tanto em nossa espécie, mas ainda sim é difícil não haver mortes. - comenta com uma cara séria. 

- Então qual seria a diferença de eu continuar como estou e entrar para uma alcateia? - cruzo os braços, mas ela não desiste.

- Aqui com humanos, você nunca vai se apegar a alguém, vai viver sozinho vivendo de sexo à toa. - declarou. - Numa alcateia, você vai aprender a ficar mais forte, a usar os laços para crescer, amadurecer... Até poderia criar uma família.

Família. Eu já tive uma, amei-os mais que tudo e no fim, sofri sozinho.

- E por que eu repetiria o ciclo? - cerro os punhos. - Fiquei sozinho por anos e não é agora que vou sofrer tudo de novo.

- Você não precisa repetir o ciclo, mas se continuar vivendo nessa vida... - sua cara demonstrava uma preocupação que eu não entendia.

- Por que se importa tanto? - perdi a paciência. - O alfa da sua alcateia dá brindes para quem tras membros novos, por um acaso?

- Meu irmão. - notei a dor em seus olhos, do mesmo modo que eu me via no espelho. - Quando meus pais morreram por causa da guerra, bom... Ele entrou em depressão e alguns anos depois ele se matou...

De repente, não tinha o que falar, minha boca ficou fechada enquanto minha cabeça tentava formar uma sentença.

- É por isso que não posso desistir de você... A alcateia me salvou e ela pode salvar você, Triton. - afirmou olhando nos meus olhos. - Sei que depois de ver os pais serem mortos, a gente não confia em ninguém... Mas tenho uma proposta a lhe fazer.

Continuo quieto deixando que ela prossiga.

- Venha comigo para a alcateia, entre nela e me dê um mês para te mostrar como pode ser bom. - a tensão era muito grande.

- E se eu não gostar? 

- Você pode ir embora... - aquilo parecia doer nela.

- Tudo bem. - respirei fundo, ainda não sabia o motivo de estar concordando. 

Mas o sorriso que ela deu ao me ouvir concordar, foi motivo suficiente para não voltar atrás da minha decisão.

- Tenho certeza que seus pais querem que você siga em frente. - comentou.

- Quem sabe... - murmurei e fui arrumar a minha mala.

- Te encontro no parque daqui uma hora. - Lorena ri animada, todo a dor e preocupação de agora a pouco se foram, porém eu sabia que ela não estava encenando. - Não se atrase, novato!

E ainda continuava me irritando! Já ía xingá-la quando a porta se fechou, a nanica era rápida e esperta, suspirei e fui até meu quarto. Ao ver as duas mulheres deitadas na cama, percebi como a minha vida era monótona.

Olhei pelo vidro da janela, o sol já estava forte, comecei a rir bem alto quando me dei conta de que, depois de tantos anos, fiquei com vontade de conhecer gente nova.